- Por Merlin!! Vocês não têm jeito mesmo!! Sinceramente!!
Eram quatro garotos quase correndo num dos vários e imensos corredores do castelo, porém, a impressão que as poucas pessoas nos arredores realmente tinham era de uma cavalaria passando por ali.
- Pode praguejar o quanto quiser, Moony, mas eu me nego terminantemente a te deixar sozinho com aquele cara-de-fuinha.
Este era James Potter falando. Sirius Black, Peter Pettigrew e ele seguindo apressadamente um extremamente irritável Remus Lupin.
- Como, como vocês podem ser tão intransigentes e chatos?!
- Nós, intransigentes??- Sirius ergueu uma sombrancelha- Acho que isso se aplica bem mais a você...
- Qual é, somos seus amigos, queremos seu bem!- James garantiu, mas nem era preciso dizer, claro, disso Lupin simplesmente jamais duvidou.
- Isso mesmo cara!- disse um meio-empolgado-mas-nem-tanto Peter
- Mas você não pode ser tão ingênuo e confiar num sonserino tão nojento e... sonserino!
- Um comentário típico de quem não tem argumentos, Sirius.- retorquiu Lupin num tom arrogante e superior que fê-lo encolher sua postura e olhar meio que desgostoso aos outros dois.
- Remus, apenas nos escute.- pediu James como a última cartada- Em quê você se baseia para aceitar ser cobaia de uma poção inventada sabe-se lá como, ou tirada sabe-se lá de onde por aquele Snivellus??
- Eu já falei mil vezes que essa poção é de um livro extremamente raro que eu nem sabia que existia em Hogwarts; era uma lenda! E ele está prestes a fazer o seu N.I.E.M em Poções, Prongs, isso já é...
- E por que então Dumbledore nunca mencinou uma poção que pudesse te curar?!- indagou Peter
- Vai ver ele não sabia...- Remus sabia que isso era impossível, mas não queria dar o braço a torcer
- Desde quando Dubledore não sabe de alguma coisa??- Peter de novo
- E todos nós sabemos que o Snivellus tem uma queda, ou melhor, um abismo por você, Moony! E se ele te der algo pra te controlar, ou... uma poção do amor??
Sirius o havia interrompido, e como conseqüência deste comentário Lupin parou. Os três frearam nos calcanhares e Peter quase trombou no jovem lobisomem.
Ainda sem se virar ele disse, ou melhor, grunhiu, o que mostrava que essa história já lhe havia enchido a paciência:
- Eu não creio que vocês estão pensando nisso de novo...
- Mas é verdade!- exclamou James
- E você sabe disso!- adicionou Peter
Lupin levantou o braço direito, ainda de costas aos outros, e sua mão aberta era sinal que eles deviam encerrar o assunto por ali mesmo. E depois de um suspiro de auto-controle, essa mesma mão foi levada ao seu cabelo e começou a alisá-lo meio que impacientemente. Ele então virou-se, encontrando três rostos cheios de cisma, com o de Sirius se destacando ainda mais porque parecia inflexível em sua crença.
- Se vocês acham mesmo que ele gosta de mim, então eu me preocupo menos ainda pois quem gosta quer o bem da outra pessoa, e eu vou recorrer a qualquer coisa que qualquer um me ofereça, porque eu sei que NADA pode ser pior do que o que vai acontecer hoje á noite SE EU NÃO FIZER NADA PRA IMPEDIR!!!!!!!!
Com isso, os três davam mostras de ter entendido a situação em que Remus se encontrava. Aquela seria a primeira noite de lua cheia do mês. Logo que o crepúsculo aparecesse, a transformação se iniciaria mais uma vez, e mais uma vez ele sentiria as profundas dores, escondido de todos com exceção de seus três melhores amigos, no esconderijo do Salgueiro Lutador, e por um período de sete dias- uma semana- ele seria uma besta selvagem que podia atacar qualquer um independente de quem fosse. Disso, é claro, os três sabiam. Entretanto, o que eles não tinham compreendido até o presente momento era a urgência de Lupin em dar um basta em tudo isso. Estava farto de sofrer todos os meses de todos os anos com algo que era tão contra seus princípios e sua natureza pacífica, e é aí que entra Severus Snape.
No dia anterior, o aluno sonserino mais odiado entre os Marotos (o que não servia para Lupin já que ele meramente reconheceria o garoto não fosse por Sirius e James, que faziam questão de perseguí-lo diariamente) endereçou um bilhete a Remus J. Lupin e pedia respeitosamente que pudessem ter uma conversa séria, e particular. O jovem de cabelos castanho-claros e olhos de um âmbar canino considerou o pedido com certa estranheza, e depois de aceitar decidiu não comunicar aos seus amigos para que eles não lhe importunassem exatamente como estavam fazendo agora. Então, na mesma tarde quando Sirius e Peter foram assistir ao treino de Quadribol de James, Remus rumou à biblioteca onde Snape disse para encontrá-lo caso aceitasse ter a conversa. Já no local combinado, Lupin percorreu o corredor olhando entre cada uma das imensas estantes de livros de todas as espécies, onde ficavam as mesas para que os alunos pudessem estudar e pesquisar (inclusive ele mesmo fazia isso quase todos os dias), até achar o remetente do bilhete sentado em uma das raras mesas desocupadas, pra lá do meio do corredor quilométrico.
*//FLASHBACK\\*
Apesar de estar esperando por ele, Snape não pôde deixar de sobressaltar- se, ainda que discretamente, quando Remus Lupin apareceu no final do corredor entre as estantes, virou-se e veio em sua direção. Aquele rapaz alto e magro, de dezessete anos- mesma idade que a sua- que vestia um uniforme visivelmente gasto por baixo de uma capa pesada, onde havia aquela estrela dourada e reluzente com duas consoantes HB cravejadas em letras pretas, logo abaixo do escudo da Grifinória, que significava que ele era um dos atuais monitores-chefes da escola, era realmente, realmente lindo. Se estava com tantas roupas era pelo frio enregelante que estava longe de terminar, estando eles ainda no começo de janeiro. E isso lembrava Snape de que aquele seria o último ano que ele passaria torturando-se com o amor não correspondido que sentia por Lupin. Mas ele não sabia ao certo o que era ou seria pior: vê-lo e não tê-lo, ou não vê-lo e não tê-lo. E embora ele conhecesse a citação "O que os olhos não vêem o coração não sente", era dolorosa a idéia de não poder mais ter sua visão preenchida pela beleza daquele rapaz.
Longe de resolver seu dilema, o sonserino se deu conta de que Lupin estava parado em pé à sua frente, e questionando-o com os olhos. Sentiu-se constranger na mesma hora.
- Er... olá, Lupin.- cumprimentou levantando-se, distinto como sempre. E desta forma era bem mais fácil disfarçar tudo o que sentia ao tê-lo ali, tão perto de seu próprio corpo.
- Olá, Snape.- Lupin cumprimentou de volta- Confesso que me surpreendi com seu bilhete, mas estou curioso.
Isso era verdade, mas além de apenas curioso, Remus estava apreensivo. Já era de tempo que Sirius, Peter e James inistiam em dizer que Snape gostava dele, e tanta insistência conseguia penetrar em seu bom senso e fazê-lo ficar com um pé atrás. E se ele lhe dissesse que lhe amava; se declarasse? O jovem lobisomem grifinório preferia afastar esse pensamento da cabeça.
- Sente-se então, vou direto ao assunto.- disse Snape indicando a cadeira ao lado da sua, e se sentando logo após o outro.
Ficaram um de frente ao outro, a uma certa distância não comprometedora. Isso não agradava muito ao rapaz de pele muito branca e macilenta, seus cabelos atros e escorridos, com uma aparente textura que lhe rendera seu apelido entra os Marotos; Snivellus. Porém ele jamais ousaria se aproximar mais.
- Bem, primeiramente gostaria que me ouvisse até o final e—
- Eu não sou como eles, não se preocupe.- entrecortou Remus com um sorriso generoso. "Eles" eram seus adoráveis amigos que Snape odiava, sem dúvida e com razão.
"Certamente que não é" pensou Severus, meio imobilizado pelo sorriso que o outro lhe dirigira, e que nunca o havia feito antes.
- Então eu... bem, tenho algo a lhe oferecer.
Remus arqueou as sombrancelhas e agora parecia pêgo de surpresa. Talvez um pouco mais que isso; temeroso.
- É algo que eu sei que você quer muito...- acresceu rapidamente mas a expressão do outro não mudou.
- Pode falar... do que se trata?
- Os grifinórios e sonserinos sempre tiveram aula de Poções juntos, e nós não fugimos à regra. Há sete anos temos essa aula em conjunto e, apesar de seus melhores amigos fazerem de um tudo para me atrapalhar, você sabe que sou o melhor nesta matéria.- Lupin assentiu- Tanto é assim que este ano eu prestarei meu N.I.E.M nesta área e não há outra coisa que eu faça nos últimos quatro meses senão estudar, estudar, estudar e estudar, além de claro, praticar.
Isso também era verdade; Remus sabia porque a freqüencia de Snape na biblioteca vinha frustrando os planos que James e Sirius tinham de infernizá-lo, já que depois de Dumbledore e McGonagall, madame Archey da biblioteca era a pessoa que eles mais temiam e/ou respeitavam.
- E estes dias eu achei algo que a você pode interessar muito numa de minhas pesquisas.
O jovem lobisomem viu Snape levantar-se e puxar um grosso livro da estante. Era um livro de cor verde-folha e algo estava escrito em dourado na frente. O sonserino exibiu a capa do livro e Lupin pôde ler as palavras que as tais letras douradas formavam: "CÁLICE DE OURO", e embaixo letras menores mas da mesma cor diziam: "Nível Avançado- Poções Raras da Antigüidade".
Remus se ergueu a cadeira e pegou o livro nas mãos, olhando estonteado para o que ele sabia ser muito valioso e tão raro quanto o próprio conteúdo, sentindo a aspereza do material duro que formava sua capa. Snape abriu o que se pode chamar de sorriso, já que isso era coisa que ele não fazia e não tinha certeza se sabia fazer.
- Nossa, eu... até hoje só vi o "CÁLICE DE BRONZE" e foi uma edição apenas... Merlin, eu nunca imaginei que aqui em Hogwarts houvesse nem o "CÁLICE DE PRATA" quanto mais o "DE OURO"!
- Esta é a prova de que há, e o "DE PRATA" também deve estar em algum lugar desta biblioteca.
- É, não me resta dúvidas de que você realmente vem aqui para pesquisar, Snape. Mas... o que tem aqui que pode me interessar tanto? Além do livro em si, é claro...
Severus tomou gentilmente o livro das mãos dele. Abriu-o mais ou menos no meio, e folheou mais algumas páginas velhas e amarelas para frente. Um mais discreto sorriso tomou seu rosto e ele entregou a raridade para Lupin novamente. Este olhou; depois olhou de novo, arregalou os olhos e na mesma atitude de assombro ao contrário, sentou-se. Snape fez o mesmo, esperando as palavras de seu secreto amor. Demorou um pouco, pois ele parecia estar lendo as duas páginas. Lupin agora arfava violentamente e não conseguia nem falar nem tirar os olhos daquelas páginas. Então Snape achou melhor começar, assistindo o vapor da respiração do outro sair tão intermitente que parecia uma locomotiva.
- Talvez você não esteja acreditando no que vê, mas é isso mesmo.
Remus o encarou boquiaberto e fê-lo sentir um misto de felicidade e ansiedade, algo que não experimentava há muitos anos.
- Aonde... aonde você quer chegar com isso, Snape?...
- Olhe, eu sei que amanhã será a primeira noite de lua cheia deste mês e sei o que vai acontecer... mas com esta poção você pode evitar, você pode usá-la como antídoto contra essa... maldição...
Era uma grande surpresa para Lupin que Snape pudesse ter se preocupado com isto. Mais uma vez as palavras de James, Peter e Sirius, principalmente do último, martelavam sua mente dizendo "Ele gosta de você!". Mas ainda assim, se Snape sabia de sua origem lupina era culpa de Sirius também, que deixou escapar o segredo num incidente que ele nem gostava de lembrar. Entrementes, Lupin não fazia idéia que existisse uma poção, ou qualquer outra coisa que servisse... de antídoto, como ele dissera, para algo que parecia simplesmente inevitável.
A poção chamava-se "ANTI- NATURE", e, aos olhos do jovem lobisomem era complexa e até demorada. Duvidava que pudesse ser produzida a tempo para o dia seguinte. A primeira página dedicada à poção aparentemente falava sobre ela, e a outra continha sua fórmula, bem grandinha por sinal. Ao ver os ingredientes desta, Lupin percebeu que nunca havia ouvido falar nem na metade deles, e os outros ele sabia que dificilmente seriam encontrados.
- Me diga, Snape... como você pretende que eu faça esta poção?- ele perguntou enquanto relia a fórmula.
- Primeiro, não é você quem vai fazê-la, sou eu; quem é o bom em Poções aqui? E não se preocupe com estes ingredientes, eu posso conseguir tudo com o professor Moudini, aquele homem me traria até um pé de trasgo se eu lhe pedisse...
- Em troca de quê?... digo, por que você está se propondo a tudo isso se nem mesmo sou seu amigo, e meus amigos vivem te atormentando...
- Como você mesmo disse, você não é como eles... e isso já é um bom motivo.- Snape respondeu, no mesmo tom contido e sem emoção de smepre.
- Mas...
Remus estava confuso, porém achou mais sensato parar por ali. Se ele não queria ouvir a verdadeira resposta então não continuaria perguntando. E agora ele não queria pensar nisso.
- Você leu a parte que fala sobre a poção?- ele interrompeu os devaneios de Lupin sem querer.
- Ahn... não, na verdade.
- Bem, existem algumas coisas sobre ela que você precisa saber.- sentiu o olhar do grifinório cair sobre si cheio de tensão- Como a maioria das poções deste livro, esta foi descoberta quase que por acaso e depois de muitos estudos verificou-se que é muito antiga. Não obstante, pouco é conhecido sobre ela além do retirado de relatos dos índios bruxos amazônicos, que foi de onde ela surgiu. Eles a usavam como antídoto para o vampirismo, muito comum na região e também contra os efeitos da mordida de um lobisomem. Mas o único cacique-bruxo que realmente conhecia os efeitos da ANTI-NATURE estava incapacitado de falar, por conseqüência de um recente ataque das plantas-carnívoras Amanã que é típica de lá. Sendo assim, não posso te afirmar o que vai acontecer a você após a ingestão da poção, mas você sabe que todas as poções do "CÁLICE DE OURO" são, de fato, poderosas.
Um breve silêncio ocorreu entre os dois, quebrado apenas pelos passos das pessoas que circulavam pela biblioteca e suas vozes sussurradas. Remus continuava a mirar as páginas do livro aberto em seu colo, porém seu pensamento divagava no que Snape acabara de contar-lhe. Ele sabia que era comum que as poções antigas tivessem seus efeitos desconhecidos, mas não se importava.
- Então teremos que arriscar para ter certeza.- afirmou ele no que Snape forçou-se a controlar o contetamento que lhe invadiu.
- Ótimo.- ele apenas disse, e continuou- Só mais uma coisa: a poção demora dezoito horas para ficar pronta, então eu começarei a aprontá-la hoje mesmo. Depois de ingerí-la, você terá que esperar por volta de uma hora para que ela surta efeito, então sugiro que você a tome um pouco antes das cinco horas da tarde de amanhã, para que ao anoitecer ela já esteja no seu organismo. E se correr tudo bem- os dois estremeceram levemente- você terá que repetir o processo durante toda a semana de lua cheia.
- Tá.
Os dois rapazes se encararam por alguns instantes, e o sonserino logo ficou sem-jeito e resolveu encerrar a conversa mais que satisfatória.
- Bem- ele se levantou e Lupin fez o mesmo- vou começar a agilizar tudo, preciso falar com o professor Moudini. Nos encontraremos de novo amanhã às quatro e meia da tarde na sala vazia ao lado do quadro do "Cão Alado", no quinto andar, entendido?
- Sim- Remus se sentia como uma criança marcando consulta com um médi- bruxo.
- Então até mais ver- ele ia saindo- Ah, e com licença- ele pegou o "CÁLICE DE OURO" e levou-o consigo.
O jovem lobisomem sentiu a angústia levar-lhe parte da capacidade de respirar. Sentou-se, o olhar desfocado e a expressão vaga... Estaria prestes a realizar o sonho de livrar-se das horrendas transformações mensais? Quais seriam os efeitos da poção ANTI-NATURE? E será que seus melhores amigos estavam certos sobre Snape? Lupin debruçou-se na mesa e caiu num sono não-intencional, acordando assustado horas depois.
*//FIM DO FLASHBACK\\*
- Moony, você sabe que pode contar conosco para tudo, não sabe? Você sabe que é horrivel para nós vê-lo sofrer, não é?- indagou James, soando muito fraternal agora. Remus apenas assentiu.
- E por isso mesmo nós não te deixaremos sozinho nesta hora tão importante- adicionou Sirius- E não é só por causa de Snivellus não, mas porque de qualquer forma, ninguém sabe o que pode realmente acontecer...
- Mas eu ainda acho que nós devíamos is falar com Dumbledore.- insistiu Peter
- Bem Wormtail, eu também acho mas não temos tempo para isso.- disse Lupin, que depois sorriu e concluiu- Obrigado Marotos, não sei o que seria de mim sem vocês...
Os quatro sorriram um para o outro e se abraçaram daquele jeito que só eles tinham, e depois da pieguice toda Remus falou, mais tranqüilo:
- Vamos logo que já vai dar quatro e meia e nós estamos aqui no quarto andar ainda...
Então os Marotos continuaram o trajeto a passos largos, a ansiedade aumentando conforme diminuía a distância.
***
Lupin via da janela o dia se esvair bem aos poucos. Um dia atípico de inverno, onde o céu não exibia nuvens e o sol brilhava forte, embora transmitindo um calor quase nulo. E ao avançar das horas, o frio e o vento ficavam mais cortantes.
A sala onde estavam, ao lado do quadro do "Cão Alado", que no momento em que chegaram estava na moldura ao lado da sua, caçando fadas mordentes, era uma sala mediana e com poucas carteiras. Nas paredes sustentavam-se archotes que provavelmente acendiam-se à noite. Sirius e James sentaram-se lado a lado, e Peter estava na outra extremidade tentando, sem sucesso, abrir um armário. Remus apenas olhava a paisagem através da janela.
Sirius já ia dizer que Snape não viria e que ele socaria a cara do sonserino quando a porta se abriu, e ninguém menos que ele adentrou a sala.
Severus não esperava (e depois se achou tolo por isso) encontrar os Marotos acompanhando Lupin naquele momento. Sirius e James ergueram-se imediatamente. Peter parou de mexer no armário e agora parecia apreensivo, só não mais que o próprio Remus.
Houve aquele silêncio extremamente incômodo.
- Pettigrew, Black, Potter...- Snape cumprimentou a cada um fora de ordem, muito discretamente e com uma linha de nervosismo em sua expressão. Nenhum dos três cumprimentaram de volta.
Os olhos de Severus pousaram no grifinório que, lá atrás, o encarava numa fervorosa agonia. A luz do sol que transpassava a janela refletia cada detalhe de seu rosto, e tudo nele parecia ter a cor dourada: seus cabelos, seus olhos, sua pele... era incrível a combinação entre ele e os raios luminosos do dia.
- Bem, Lupin, não temos tempo a perder. É melhor você tomar logo a poção—
- Antes disso- interpôs Sirius, muito rudemente- é melhor que você saiba, Snivellus, que se algo acontecer ao nosso amigo, você vai se arrepender de ter nascido, seu—
- Padfoot...- advertiu Lupin, indo até ele e pondo a mão em seu ombro.
- E tem mais- agora era James- Você vai ficar aqui conosco até que nós tenhamos certeza de que nada deu errado. E é melhor, pra você, que não dê.
Snape definitivamente não temia as ameaças dos dois amigos de Lupin. O único problema era que ele não tinha como saber se tudo ia sair nos conformes, como ele tanto desejava.
- Padfoot, Prongs, nós já falamos sobre isso.- disse Remus- E Snape, onde está a poção?
- Aqui- respondeu ele dirigindo-se ao armário que Peter insistentemente tentou abrir. Sacou sua varinha, apontou-a à fechadura e disse "Diffindo!", a porta se abriu logo depois.
- Ah, me esqueci deste feitiço!- resmungou Wormtail
Uma baforada de vapor se libertou de dentro do armário, e ao dissipar-se revelou um caldeirão de médio porte, contendo talvez quatro ou cinco litros de um líquido verde, tão viscoso que parecia piche. O estômago de James se revirou ao ver aquilo, mas sua careta de nojo estava igual à de Sirius e Peter. Lupin fitava a poção como se seu futuro dependesse dele.
Snape pegou uma taça que havia deixado ali para esta finalidade, uma concha, e encheu o recipiente com a poção ANTI-NATURE. Depois foi até Remus, que estava cercado por Sirius e James, e sentiu os olhares pesarem sobre si. Estendeu a taça e o jovem lobisomem pegou-a. Mas ele olhava parecendo pedir por uma espécie de garantia de que tudo sucederia bem.
- Tome logo.- disse o sonserino e depois quis se matar por não conseguir nada melhor pra dizer.
Lupin encarou o conteúdo da taça procurando sentir seu aroma. Ficou surpreso ao descobrir que tinha cheiro de pão caseiro, e mais surpreso ainda quando tomou um gole e viu que o gosto fazia jus ao cheiro. Só que a espessura do líquido dificultava o ato de engolir, e por um momento parecia estar tomando massa de pão.
Enfim, após acabar com a poção da taça, ele entregou-a novamente a Snape.
- Moony?- chamou Sirius, olhando-o interrogativo- Tudo bem com você? Está se sentindo—
- Ah, não seja estúpido Black- cortou Severus, exasperado- A poção demora uma hora pra fazer efeito.
- Eu não sabia disso.- retrucou Sirius irritadiço.
Snape deu de ombros pensando "Você nunca sabe de nada, seu leso" e foi guardar a taça de volta no armário, enfeitiçando-o novamente.
- Bem, sente-se então caro Snivellus, pois você vai esperar com a gente até que seja produzido o efeito.- disse James num tom divertido de arrogância.
- O único problema disso tudo- replicou o sonserino, muito seco- é ter de olhar para as caras de vocês três.
Sirius, James e Peter se entreolharam e desataram a rir copiosamente. Remus rezou pra que eles não tivessem pensado no que ele próprio pensou.
- Então- Sirius começou entre ataques de riso- se você quiser, claro, olhe só para o Moony...- os três se olharam novamente e riam tanto que James se ajoelhou no chão, quase rolando.
Snape arregalou os olhos e presumiu (certo) ter ficado tão vermelho como se tivesse comido cem feijõezinhos sabor pimenta-malagueta, e não se atrevia a olhar nem de esguelha para Lupin.
Este estava irado com o comentário feito por Padfoot embora ele tivesse imaginado a mesma coisa em cima do que Snape dissera. Mas ele cuidaria disso mais tarde. Deu as costas aos seus amigos que riam desesperados, e voltou à janela para ver que o sol, agora, estava muito próximo à linha do horizonte.
***
A luz que antes dava tons dourados aos contornos de Remus Lupin, agora ocupava a sala com uma bela combinação de laranjas e rosas, oriundos de um crepúsculo cada vez mais presente. Todos sabiam que a noite chegava.
Remus não saíra de frente da janela um minuto sequer desde a hora que deixou Sirius, James e Peter se matando de rir do episódio com Snape. Os três agora estavam sentados e quietos, lado a lado, e Wormtail por vezes cochilava na cadeira. Mas Paddy e Prongs simplesmente não olhavam para outra direção que não fosse a de Severus, que mais à frente, estava sentado de costas para eles. Às vezes, quando escutavam o menor barulho vindo de onde Moony se encontrava, se viravam assustados para ver se estava tudo bem. E logo depois voltavam a encarar as costas do sonserino.
Snape tinha uma boa sensação de que ficaria tudo bem. Até porque, se a poção não funcionasse eles já teriam sabido. Fazia pouco mais de uma hora que Lupin havia bebido a ANTI-NATURE, e mesmo sem poder ver, presumia que a lua-cheia já despontara no céu. E no caso de uma falha, o jovem teria começado a se transformar há alguns minutos atrás. Portanto, a única preocupação era ter certeza de que Lupin não sofreria nenhum efeito colateral.
Remus também raciocinava desta maneira. Ele, mais do que ninguém, sabia a exata hora onde começaria a se sentir os nervos repuxando, os músculos formigando, sua cabeça doendo como se um rolo-compressor estivesse esmagando-a bem lentamente. Era insuportável. Ao longo dos anos, ele imaginava como sobrevivera a essas seções de tortura mensais. Talvez porque era algo que já fazia parte dele, sua sina, então ele não morreria disso. Mas ele pensava que se toda aquela dor fosse aplicada a uma pessoa comum, ela não resistiria nem para lembrar de como é sentir-se bem novamente.
O sol agora não passava de um arco de fogo desaparecendo por trás de uma linha transparente. As estrelas, ele via, surgiam como lantejoulas prateadas em meio a um azul ainda cortado por raios avermelhados. E em algum lugar onde sua vista não podia alcançar, ele sabia, estava a lua. Uma grande bola de cor que se perdia entre o prata e o dourado já estava estampada no céu a esta hora. E isso era... incrível...
Houve uma reação em cadeia quando os outros quatro ouviram um baque e um arrastar de cadeira vindo lá de trás. Peter quase caiu da cadeira onde cochilava naquele momento. Sirius e James levantaram-se tão rápidamente que o primeiro até derrubou a carteira, e Snape mais a frente ergueu-se alarmado. Ao olharem, Remus estava sentado numa cadeira ao lado da janela onde permanecera em pé por todo este tempo.
Os três últimos citados correram até ele, que mantinha uma expressão assustadoramente vazia na face. Os archotes simétricamente distribuídos nas paredes da sala se acenderam, pois agora a escuridão da noite é que reinava.
- Moony?! Moony o que foi?!!- James o sacudiu, Sirius ao seu lado e Snape logo atrás dos dois. Sempre precipitado, Padfoot já ia se virar pra começar a culpar o sonserino quando Remus voltou a si, com um baita sorriso idiota nos lábios e os olhos brilhando como o fogo dos fachos que se acenderam no lugar. Ele pôs-se de pé repentinamente e abraçou seus dois amigos com uma força e intensidade que não demonstrava tão freqüentemente.
- Vejam! Vejam!! Olhem pra mim!! Sou eu! Eu, eu, não aquilo que eu costumo virar, sou eu!!!- ele exclamava com a voz meio embargada, enquanto apertava Sirius e James e dava uns pulinhos histéricos. Depois se afastou, lágrima escorrendo-lhe dos olhos, esticou os braços e os checou, assim como os dois a sua frente, pôs as mãos no rosto, olhou-as, tocou e apalpou cada parte do próprio corpo e constatou, com uma alegria e emoção que não cabiam em si, que absolutamente nada havia mudado. Era um milagre.
Peter se juntou aos outros três Marotos e eles ficaram lá, pulando abraçados, rindo, exultados e exclamando coisas que faziam parte do vocabulário próprio deles.
Snape sorriu, vendo seu amado tão feliz, e decidiu por não atrapalhá-los. Saiu da sala e deixou-os para trás com sua comemoração.
CONTINUA...
Eram quatro garotos quase correndo num dos vários e imensos corredores do castelo, porém, a impressão que as poucas pessoas nos arredores realmente tinham era de uma cavalaria passando por ali.
- Pode praguejar o quanto quiser, Moony, mas eu me nego terminantemente a te deixar sozinho com aquele cara-de-fuinha.
Este era James Potter falando. Sirius Black, Peter Pettigrew e ele seguindo apressadamente um extremamente irritável Remus Lupin.
- Como, como vocês podem ser tão intransigentes e chatos?!
- Nós, intransigentes??- Sirius ergueu uma sombrancelha- Acho que isso se aplica bem mais a você...
- Qual é, somos seus amigos, queremos seu bem!- James garantiu, mas nem era preciso dizer, claro, disso Lupin simplesmente jamais duvidou.
- Isso mesmo cara!- disse um meio-empolgado-mas-nem-tanto Peter
- Mas você não pode ser tão ingênuo e confiar num sonserino tão nojento e... sonserino!
- Um comentário típico de quem não tem argumentos, Sirius.- retorquiu Lupin num tom arrogante e superior que fê-lo encolher sua postura e olhar meio que desgostoso aos outros dois.
- Remus, apenas nos escute.- pediu James como a última cartada- Em quê você se baseia para aceitar ser cobaia de uma poção inventada sabe-se lá como, ou tirada sabe-se lá de onde por aquele Snivellus??
- Eu já falei mil vezes que essa poção é de um livro extremamente raro que eu nem sabia que existia em Hogwarts; era uma lenda! E ele está prestes a fazer o seu N.I.E.M em Poções, Prongs, isso já é...
- E por que então Dumbledore nunca mencinou uma poção que pudesse te curar?!- indagou Peter
- Vai ver ele não sabia...- Remus sabia que isso era impossível, mas não queria dar o braço a torcer
- Desde quando Dubledore não sabe de alguma coisa??- Peter de novo
- E todos nós sabemos que o Snivellus tem uma queda, ou melhor, um abismo por você, Moony! E se ele te der algo pra te controlar, ou... uma poção do amor??
Sirius o havia interrompido, e como conseqüência deste comentário Lupin parou. Os três frearam nos calcanhares e Peter quase trombou no jovem lobisomem.
Ainda sem se virar ele disse, ou melhor, grunhiu, o que mostrava que essa história já lhe havia enchido a paciência:
- Eu não creio que vocês estão pensando nisso de novo...
- Mas é verdade!- exclamou James
- E você sabe disso!- adicionou Peter
Lupin levantou o braço direito, ainda de costas aos outros, e sua mão aberta era sinal que eles deviam encerrar o assunto por ali mesmo. E depois de um suspiro de auto-controle, essa mesma mão foi levada ao seu cabelo e começou a alisá-lo meio que impacientemente. Ele então virou-se, encontrando três rostos cheios de cisma, com o de Sirius se destacando ainda mais porque parecia inflexível em sua crença.
- Se vocês acham mesmo que ele gosta de mim, então eu me preocupo menos ainda pois quem gosta quer o bem da outra pessoa, e eu vou recorrer a qualquer coisa que qualquer um me ofereça, porque eu sei que NADA pode ser pior do que o que vai acontecer hoje á noite SE EU NÃO FIZER NADA PRA IMPEDIR!!!!!!!!
Com isso, os três davam mostras de ter entendido a situação em que Remus se encontrava. Aquela seria a primeira noite de lua cheia do mês. Logo que o crepúsculo aparecesse, a transformação se iniciaria mais uma vez, e mais uma vez ele sentiria as profundas dores, escondido de todos com exceção de seus três melhores amigos, no esconderijo do Salgueiro Lutador, e por um período de sete dias- uma semana- ele seria uma besta selvagem que podia atacar qualquer um independente de quem fosse. Disso, é claro, os três sabiam. Entretanto, o que eles não tinham compreendido até o presente momento era a urgência de Lupin em dar um basta em tudo isso. Estava farto de sofrer todos os meses de todos os anos com algo que era tão contra seus princípios e sua natureza pacífica, e é aí que entra Severus Snape.
No dia anterior, o aluno sonserino mais odiado entre os Marotos (o que não servia para Lupin já que ele meramente reconheceria o garoto não fosse por Sirius e James, que faziam questão de perseguí-lo diariamente) endereçou um bilhete a Remus J. Lupin e pedia respeitosamente que pudessem ter uma conversa séria, e particular. O jovem de cabelos castanho-claros e olhos de um âmbar canino considerou o pedido com certa estranheza, e depois de aceitar decidiu não comunicar aos seus amigos para que eles não lhe importunassem exatamente como estavam fazendo agora. Então, na mesma tarde quando Sirius e Peter foram assistir ao treino de Quadribol de James, Remus rumou à biblioteca onde Snape disse para encontrá-lo caso aceitasse ter a conversa. Já no local combinado, Lupin percorreu o corredor olhando entre cada uma das imensas estantes de livros de todas as espécies, onde ficavam as mesas para que os alunos pudessem estudar e pesquisar (inclusive ele mesmo fazia isso quase todos os dias), até achar o remetente do bilhete sentado em uma das raras mesas desocupadas, pra lá do meio do corredor quilométrico.
*//FLASHBACK\\*
Apesar de estar esperando por ele, Snape não pôde deixar de sobressaltar- se, ainda que discretamente, quando Remus Lupin apareceu no final do corredor entre as estantes, virou-se e veio em sua direção. Aquele rapaz alto e magro, de dezessete anos- mesma idade que a sua- que vestia um uniforme visivelmente gasto por baixo de uma capa pesada, onde havia aquela estrela dourada e reluzente com duas consoantes HB cravejadas em letras pretas, logo abaixo do escudo da Grifinória, que significava que ele era um dos atuais monitores-chefes da escola, era realmente, realmente lindo. Se estava com tantas roupas era pelo frio enregelante que estava longe de terminar, estando eles ainda no começo de janeiro. E isso lembrava Snape de que aquele seria o último ano que ele passaria torturando-se com o amor não correspondido que sentia por Lupin. Mas ele não sabia ao certo o que era ou seria pior: vê-lo e não tê-lo, ou não vê-lo e não tê-lo. E embora ele conhecesse a citação "O que os olhos não vêem o coração não sente", era dolorosa a idéia de não poder mais ter sua visão preenchida pela beleza daquele rapaz.
Longe de resolver seu dilema, o sonserino se deu conta de que Lupin estava parado em pé à sua frente, e questionando-o com os olhos. Sentiu-se constranger na mesma hora.
- Er... olá, Lupin.- cumprimentou levantando-se, distinto como sempre. E desta forma era bem mais fácil disfarçar tudo o que sentia ao tê-lo ali, tão perto de seu próprio corpo.
- Olá, Snape.- Lupin cumprimentou de volta- Confesso que me surpreendi com seu bilhete, mas estou curioso.
Isso era verdade, mas além de apenas curioso, Remus estava apreensivo. Já era de tempo que Sirius, Peter e James inistiam em dizer que Snape gostava dele, e tanta insistência conseguia penetrar em seu bom senso e fazê-lo ficar com um pé atrás. E se ele lhe dissesse que lhe amava; se declarasse? O jovem lobisomem grifinório preferia afastar esse pensamento da cabeça.
- Sente-se então, vou direto ao assunto.- disse Snape indicando a cadeira ao lado da sua, e se sentando logo após o outro.
Ficaram um de frente ao outro, a uma certa distância não comprometedora. Isso não agradava muito ao rapaz de pele muito branca e macilenta, seus cabelos atros e escorridos, com uma aparente textura que lhe rendera seu apelido entra os Marotos; Snivellus. Porém ele jamais ousaria se aproximar mais.
- Bem, primeiramente gostaria que me ouvisse até o final e—
- Eu não sou como eles, não se preocupe.- entrecortou Remus com um sorriso generoso. "Eles" eram seus adoráveis amigos que Snape odiava, sem dúvida e com razão.
"Certamente que não é" pensou Severus, meio imobilizado pelo sorriso que o outro lhe dirigira, e que nunca o havia feito antes.
- Então eu... bem, tenho algo a lhe oferecer.
Remus arqueou as sombrancelhas e agora parecia pêgo de surpresa. Talvez um pouco mais que isso; temeroso.
- É algo que eu sei que você quer muito...- acresceu rapidamente mas a expressão do outro não mudou.
- Pode falar... do que se trata?
- Os grifinórios e sonserinos sempre tiveram aula de Poções juntos, e nós não fugimos à regra. Há sete anos temos essa aula em conjunto e, apesar de seus melhores amigos fazerem de um tudo para me atrapalhar, você sabe que sou o melhor nesta matéria.- Lupin assentiu- Tanto é assim que este ano eu prestarei meu N.I.E.M nesta área e não há outra coisa que eu faça nos últimos quatro meses senão estudar, estudar, estudar e estudar, além de claro, praticar.
Isso também era verdade; Remus sabia porque a freqüencia de Snape na biblioteca vinha frustrando os planos que James e Sirius tinham de infernizá-lo, já que depois de Dumbledore e McGonagall, madame Archey da biblioteca era a pessoa que eles mais temiam e/ou respeitavam.
- E estes dias eu achei algo que a você pode interessar muito numa de minhas pesquisas.
O jovem lobisomem viu Snape levantar-se e puxar um grosso livro da estante. Era um livro de cor verde-folha e algo estava escrito em dourado na frente. O sonserino exibiu a capa do livro e Lupin pôde ler as palavras que as tais letras douradas formavam: "CÁLICE DE OURO", e embaixo letras menores mas da mesma cor diziam: "Nível Avançado- Poções Raras da Antigüidade".
Remus se ergueu a cadeira e pegou o livro nas mãos, olhando estonteado para o que ele sabia ser muito valioso e tão raro quanto o próprio conteúdo, sentindo a aspereza do material duro que formava sua capa. Snape abriu o que se pode chamar de sorriso, já que isso era coisa que ele não fazia e não tinha certeza se sabia fazer.
- Nossa, eu... até hoje só vi o "CÁLICE DE BRONZE" e foi uma edição apenas... Merlin, eu nunca imaginei que aqui em Hogwarts houvesse nem o "CÁLICE DE PRATA" quanto mais o "DE OURO"!
- Esta é a prova de que há, e o "DE PRATA" também deve estar em algum lugar desta biblioteca.
- É, não me resta dúvidas de que você realmente vem aqui para pesquisar, Snape. Mas... o que tem aqui que pode me interessar tanto? Além do livro em si, é claro...
Severus tomou gentilmente o livro das mãos dele. Abriu-o mais ou menos no meio, e folheou mais algumas páginas velhas e amarelas para frente. Um mais discreto sorriso tomou seu rosto e ele entregou a raridade para Lupin novamente. Este olhou; depois olhou de novo, arregalou os olhos e na mesma atitude de assombro ao contrário, sentou-se. Snape fez o mesmo, esperando as palavras de seu secreto amor. Demorou um pouco, pois ele parecia estar lendo as duas páginas. Lupin agora arfava violentamente e não conseguia nem falar nem tirar os olhos daquelas páginas. Então Snape achou melhor começar, assistindo o vapor da respiração do outro sair tão intermitente que parecia uma locomotiva.
- Talvez você não esteja acreditando no que vê, mas é isso mesmo.
Remus o encarou boquiaberto e fê-lo sentir um misto de felicidade e ansiedade, algo que não experimentava há muitos anos.
- Aonde... aonde você quer chegar com isso, Snape?...
- Olhe, eu sei que amanhã será a primeira noite de lua cheia deste mês e sei o que vai acontecer... mas com esta poção você pode evitar, você pode usá-la como antídoto contra essa... maldição...
Era uma grande surpresa para Lupin que Snape pudesse ter se preocupado com isto. Mais uma vez as palavras de James, Peter e Sirius, principalmente do último, martelavam sua mente dizendo "Ele gosta de você!". Mas ainda assim, se Snape sabia de sua origem lupina era culpa de Sirius também, que deixou escapar o segredo num incidente que ele nem gostava de lembrar. Entrementes, Lupin não fazia idéia que existisse uma poção, ou qualquer outra coisa que servisse... de antídoto, como ele dissera, para algo que parecia simplesmente inevitável.
A poção chamava-se "ANTI- NATURE", e, aos olhos do jovem lobisomem era complexa e até demorada. Duvidava que pudesse ser produzida a tempo para o dia seguinte. A primeira página dedicada à poção aparentemente falava sobre ela, e a outra continha sua fórmula, bem grandinha por sinal. Ao ver os ingredientes desta, Lupin percebeu que nunca havia ouvido falar nem na metade deles, e os outros ele sabia que dificilmente seriam encontrados.
- Me diga, Snape... como você pretende que eu faça esta poção?- ele perguntou enquanto relia a fórmula.
- Primeiro, não é você quem vai fazê-la, sou eu; quem é o bom em Poções aqui? E não se preocupe com estes ingredientes, eu posso conseguir tudo com o professor Moudini, aquele homem me traria até um pé de trasgo se eu lhe pedisse...
- Em troca de quê?... digo, por que você está se propondo a tudo isso se nem mesmo sou seu amigo, e meus amigos vivem te atormentando...
- Como você mesmo disse, você não é como eles... e isso já é um bom motivo.- Snape respondeu, no mesmo tom contido e sem emoção de smepre.
- Mas...
Remus estava confuso, porém achou mais sensato parar por ali. Se ele não queria ouvir a verdadeira resposta então não continuaria perguntando. E agora ele não queria pensar nisso.
- Você leu a parte que fala sobre a poção?- ele interrompeu os devaneios de Lupin sem querer.
- Ahn... não, na verdade.
- Bem, existem algumas coisas sobre ela que você precisa saber.- sentiu o olhar do grifinório cair sobre si cheio de tensão- Como a maioria das poções deste livro, esta foi descoberta quase que por acaso e depois de muitos estudos verificou-se que é muito antiga. Não obstante, pouco é conhecido sobre ela além do retirado de relatos dos índios bruxos amazônicos, que foi de onde ela surgiu. Eles a usavam como antídoto para o vampirismo, muito comum na região e também contra os efeitos da mordida de um lobisomem. Mas o único cacique-bruxo que realmente conhecia os efeitos da ANTI-NATURE estava incapacitado de falar, por conseqüência de um recente ataque das plantas-carnívoras Amanã que é típica de lá. Sendo assim, não posso te afirmar o que vai acontecer a você após a ingestão da poção, mas você sabe que todas as poções do "CÁLICE DE OURO" são, de fato, poderosas.
Um breve silêncio ocorreu entre os dois, quebrado apenas pelos passos das pessoas que circulavam pela biblioteca e suas vozes sussurradas. Remus continuava a mirar as páginas do livro aberto em seu colo, porém seu pensamento divagava no que Snape acabara de contar-lhe. Ele sabia que era comum que as poções antigas tivessem seus efeitos desconhecidos, mas não se importava.
- Então teremos que arriscar para ter certeza.- afirmou ele no que Snape forçou-se a controlar o contetamento que lhe invadiu.
- Ótimo.- ele apenas disse, e continuou- Só mais uma coisa: a poção demora dezoito horas para ficar pronta, então eu começarei a aprontá-la hoje mesmo. Depois de ingerí-la, você terá que esperar por volta de uma hora para que ela surta efeito, então sugiro que você a tome um pouco antes das cinco horas da tarde de amanhã, para que ao anoitecer ela já esteja no seu organismo. E se correr tudo bem- os dois estremeceram levemente- você terá que repetir o processo durante toda a semana de lua cheia.
- Tá.
Os dois rapazes se encararam por alguns instantes, e o sonserino logo ficou sem-jeito e resolveu encerrar a conversa mais que satisfatória.
- Bem- ele se levantou e Lupin fez o mesmo- vou começar a agilizar tudo, preciso falar com o professor Moudini. Nos encontraremos de novo amanhã às quatro e meia da tarde na sala vazia ao lado do quadro do "Cão Alado", no quinto andar, entendido?
- Sim- Remus se sentia como uma criança marcando consulta com um médi- bruxo.
- Então até mais ver- ele ia saindo- Ah, e com licença- ele pegou o "CÁLICE DE OURO" e levou-o consigo.
O jovem lobisomem sentiu a angústia levar-lhe parte da capacidade de respirar. Sentou-se, o olhar desfocado e a expressão vaga... Estaria prestes a realizar o sonho de livrar-se das horrendas transformações mensais? Quais seriam os efeitos da poção ANTI-NATURE? E será que seus melhores amigos estavam certos sobre Snape? Lupin debruçou-se na mesa e caiu num sono não-intencional, acordando assustado horas depois.
*//FIM DO FLASHBACK\\*
- Moony, você sabe que pode contar conosco para tudo, não sabe? Você sabe que é horrivel para nós vê-lo sofrer, não é?- indagou James, soando muito fraternal agora. Remus apenas assentiu.
- E por isso mesmo nós não te deixaremos sozinho nesta hora tão importante- adicionou Sirius- E não é só por causa de Snivellus não, mas porque de qualquer forma, ninguém sabe o que pode realmente acontecer...
- Mas eu ainda acho que nós devíamos is falar com Dumbledore.- insistiu Peter
- Bem Wormtail, eu também acho mas não temos tempo para isso.- disse Lupin, que depois sorriu e concluiu- Obrigado Marotos, não sei o que seria de mim sem vocês...
Os quatro sorriram um para o outro e se abraçaram daquele jeito que só eles tinham, e depois da pieguice toda Remus falou, mais tranqüilo:
- Vamos logo que já vai dar quatro e meia e nós estamos aqui no quarto andar ainda...
Então os Marotos continuaram o trajeto a passos largos, a ansiedade aumentando conforme diminuía a distância.
***
Lupin via da janela o dia se esvair bem aos poucos. Um dia atípico de inverno, onde o céu não exibia nuvens e o sol brilhava forte, embora transmitindo um calor quase nulo. E ao avançar das horas, o frio e o vento ficavam mais cortantes.
A sala onde estavam, ao lado do quadro do "Cão Alado", que no momento em que chegaram estava na moldura ao lado da sua, caçando fadas mordentes, era uma sala mediana e com poucas carteiras. Nas paredes sustentavam-se archotes que provavelmente acendiam-se à noite. Sirius e James sentaram-se lado a lado, e Peter estava na outra extremidade tentando, sem sucesso, abrir um armário. Remus apenas olhava a paisagem através da janela.
Sirius já ia dizer que Snape não viria e que ele socaria a cara do sonserino quando a porta se abriu, e ninguém menos que ele adentrou a sala.
Severus não esperava (e depois se achou tolo por isso) encontrar os Marotos acompanhando Lupin naquele momento. Sirius e James ergueram-se imediatamente. Peter parou de mexer no armário e agora parecia apreensivo, só não mais que o próprio Remus.
Houve aquele silêncio extremamente incômodo.
- Pettigrew, Black, Potter...- Snape cumprimentou a cada um fora de ordem, muito discretamente e com uma linha de nervosismo em sua expressão. Nenhum dos três cumprimentaram de volta.
Os olhos de Severus pousaram no grifinório que, lá atrás, o encarava numa fervorosa agonia. A luz do sol que transpassava a janela refletia cada detalhe de seu rosto, e tudo nele parecia ter a cor dourada: seus cabelos, seus olhos, sua pele... era incrível a combinação entre ele e os raios luminosos do dia.
- Bem, Lupin, não temos tempo a perder. É melhor você tomar logo a poção—
- Antes disso- interpôs Sirius, muito rudemente- é melhor que você saiba, Snivellus, que se algo acontecer ao nosso amigo, você vai se arrepender de ter nascido, seu—
- Padfoot...- advertiu Lupin, indo até ele e pondo a mão em seu ombro.
- E tem mais- agora era James- Você vai ficar aqui conosco até que nós tenhamos certeza de que nada deu errado. E é melhor, pra você, que não dê.
Snape definitivamente não temia as ameaças dos dois amigos de Lupin. O único problema era que ele não tinha como saber se tudo ia sair nos conformes, como ele tanto desejava.
- Padfoot, Prongs, nós já falamos sobre isso.- disse Remus- E Snape, onde está a poção?
- Aqui- respondeu ele dirigindo-se ao armário que Peter insistentemente tentou abrir. Sacou sua varinha, apontou-a à fechadura e disse "Diffindo!", a porta se abriu logo depois.
- Ah, me esqueci deste feitiço!- resmungou Wormtail
Uma baforada de vapor se libertou de dentro do armário, e ao dissipar-se revelou um caldeirão de médio porte, contendo talvez quatro ou cinco litros de um líquido verde, tão viscoso que parecia piche. O estômago de James se revirou ao ver aquilo, mas sua careta de nojo estava igual à de Sirius e Peter. Lupin fitava a poção como se seu futuro dependesse dele.
Snape pegou uma taça que havia deixado ali para esta finalidade, uma concha, e encheu o recipiente com a poção ANTI-NATURE. Depois foi até Remus, que estava cercado por Sirius e James, e sentiu os olhares pesarem sobre si. Estendeu a taça e o jovem lobisomem pegou-a. Mas ele olhava parecendo pedir por uma espécie de garantia de que tudo sucederia bem.
- Tome logo.- disse o sonserino e depois quis se matar por não conseguir nada melhor pra dizer.
Lupin encarou o conteúdo da taça procurando sentir seu aroma. Ficou surpreso ao descobrir que tinha cheiro de pão caseiro, e mais surpreso ainda quando tomou um gole e viu que o gosto fazia jus ao cheiro. Só que a espessura do líquido dificultava o ato de engolir, e por um momento parecia estar tomando massa de pão.
Enfim, após acabar com a poção da taça, ele entregou-a novamente a Snape.
- Moony?- chamou Sirius, olhando-o interrogativo- Tudo bem com você? Está se sentindo—
- Ah, não seja estúpido Black- cortou Severus, exasperado- A poção demora uma hora pra fazer efeito.
- Eu não sabia disso.- retrucou Sirius irritadiço.
Snape deu de ombros pensando "Você nunca sabe de nada, seu leso" e foi guardar a taça de volta no armário, enfeitiçando-o novamente.
- Bem, sente-se então caro Snivellus, pois você vai esperar com a gente até que seja produzido o efeito.- disse James num tom divertido de arrogância.
- O único problema disso tudo- replicou o sonserino, muito seco- é ter de olhar para as caras de vocês três.
Sirius, James e Peter se entreolharam e desataram a rir copiosamente. Remus rezou pra que eles não tivessem pensado no que ele próprio pensou.
- Então- Sirius começou entre ataques de riso- se você quiser, claro, olhe só para o Moony...- os três se olharam novamente e riam tanto que James se ajoelhou no chão, quase rolando.
Snape arregalou os olhos e presumiu (certo) ter ficado tão vermelho como se tivesse comido cem feijõezinhos sabor pimenta-malagueta, e não se atrevia a olhar nem de esguelha para Lupin.
Este estava irado com o comentário feito por Padfoot embora ele tivesse imaginado a mesma coisa em cima do que Snape dissera. Mas ele cuidaria disso mais tarde. Deu as costas aos seus amigos que riam desesperados, e voltou à janela para ver que o sol, agora, estava muito próximo à linha do horizonte.
***
A luz que antes dava tons dourados aos contornos de Remus Lupin, agora ocupava a sala com uma bela combinação de laranjas e rosas, oriundos de um crepúsculo cada vez mais presente. Todos sabiam que a noite chegava.
Remus não saíra de frente da janela um minuto sequer desde a hora que deixou Sirius, James e Peter se matando de rir do episódio com Snape. Os três agora estavam sentados e quietos, lado a lado, e Wormtail por vezes cochilava na cadeira. Mas Paddy e Prongs simplesmente não olhavam para outra direção que não fosse a de Severus, que mais à frente, estava sentado de costas para eles. Às vezes, quando escutavam o menor barulho vindo de onde Moony se encontrava, se viravam assustados para ver se estava tudo bem. E logo depois voltavam a encarar as costas do sonserino.
Snape tinha uma boa sensação de que ficaria tudo bem. Até porque, se a poção não funcionasse eles já teriam sabido. Fazia pouco mais de uma hora que Lupin havia bebido a ANTI-NATURE, e mesmo sem poder ver, presumia que a lua-cheia já despontara no céu. E no caso de uma falha, o jovem teria começado a se transformar há alguns minutos atrás. Portanto, a única preocupação era ter certeza de que Lupin não sofreria nenhum efeito colateral.
Remus também raciocinava desta maneira. Ele, mais do que ninguém, sabia a exata hora onde começaria a se sentir os nervos repuxando, os músculos formigando, sua cabeça doendo como se um rolo-compressor estivesse esmagando-a bem lentamente. Era insuportável. Ao longo dos anos, ele imaginava como sobrevivera a essas seções de tortura mensais. Talvez porque era algo que já fazia parte dele, sua sina, então ele não morreria disso. Mas ele pensava que se toda aquela dor fosse aplicada a uma pessoa comum, ela não resistiria nem para lembrar de como é sentir-se bem novamente.
O sol agora não passava de um arco de fogo desaparecendo por trás de uma linha transparente. As estrelas, ele via, surgiam como lantejoulas prateadas em meio a um azul ainda cortado por raios avermelhados. E em algum lugar onde sua vista não podia alcançar, ele sabia, estava a lua. Uma grande bola de cor que se perdia entre o prata e o dourado já estava estampada no céu a esta hora. E isso era... incrível...
Houve uma reação em cadeia quando os outros quatro ouviram um baque e um arrastar de cadeira vindo lá de trás. Peter quase caiu da cadeira onde cochilava naquele momento. Sirius e James levantaram-se tão rápidamente que o primeiro até derrubou a carteira, e Snape mais a frente ergueu-se alarmado. Ao olharem, Remus estava sentado numa cadeira ao lado da janela onde permanecera em pé por todo este tempo.
Os três últimos citados correram até ele, que mantinha uma expressão assustadoramente vazia na face. Os archotes simétricamente distribuídos nas paredes da sala se acenderam, pois agora a escuridão da noite é que reinava.
- Moony?! Moony o que foi?!!- James o sacudiu, Sirius ao seu lado e Snape logo atrás dos dois. Sempre precipitado, Padfoot já ia se virar pra começar a culpar o sonserino quando Remus voltou a si, com um baita sorriso idiota nos lábios e os olhos brilhando como o fogo dos fachos que se acenderam no lugar. Ele pôs-se de pé repentinamente e abraçou seus dois amigos com uma força e intensidade que não demonstrava tão freqüentemente.
- Vejam! Vejam!! Olhem pra mim!! Sou eu! Eu, eu, não aquilo que eu costumo virar, sou eu!!!- ele exclamava com a voz meio embargada, enquanto apertava Sirius e James e dava uns pulinhos histéricos. Depois se afastou, lágrima escorrendo-lhe dos olhos, esticou os braços e os checou, assim como os dois a sua frente, pôs as mãos no rosto, olhou-as, tocou e apalpou cada parte do próprio corpo e constatou, com uma alegria e emoção que não cabiam em si, que absolutamente nada havia mudado. Era um milagre.
Peter se juntou aos outros três Marotos e eles ficaram lá, pulando abraçados, rindo, exultados e exclamando coisas que faziam parte do vocabulário próprio deles.
Snape sorriu, vendo seu amado tão feliz, e decidiu por não atrapalhá-los. Saiu da sala e deixou-os para trás com sua comemoração.
CONTINUA...
