Se

Eu tive um sonho uma vez. Nesse sonho você lutava ao meu lado em uma guerra sem fim de ilusões e mentiras. Depois dessa noite eu nunca mais me deitei sem pensar em você.

oOoOo

No início eu nem olhava direito pra você. Sempre que estávamos juntos não passávamos de amigos, irmãos e companheiros. Mas depois de um tempo as provocações começaram, nem me lembro ao certo quando, só sei que teve lugar de repente, sem avisar ou qualquer coisa.

Depois disso eu comecei a olhar você, ficava vermelho quando, durante os intervalos, você sussurrava em meus ouvidos ou então me esbarrava, tomando o cuidado de sempre deixar nossos lábios a uma ínfima distância. Era sempre assim e você nunca se cansava. Até mesmo quando eu dizia palavras irritadas você me vinha com um sorriso, tão doce que era impossível resistir.

Foi esse sorriso que ofuscou meus sonhos, dando um brilho diferente e melancólico às minhas noites mal dormidas. Depois desse sonho, nunca mais tive paz. Acabei sucumbindo ao seu irresistível charme, como tantos outros fizeram antes.

E você sempre fazia questão de mostrar que sabia dessa minha paixão resguardada, como se pudesse ler minha mente ou soubesse ver meus sonhos. Bem, talvez você pudesse, pois estava em todos eles.

O mais incrível é que eu jamais cogitei a possibilidade de estar com você realmente. Meus sonhos me diziam tudo que eu sempre quis, mas nunca minha mente me dizia ser possível. E sempre que você me provocava com gestos e palavras eu negava aquilo que ardia dentro de mim.

Depois de um certo tempo essas provocações começaram a ficar sérias. Já não eram tão inocentes, tinham um certo charme e sensualidade que, em você, era tão natural. Você sabe... É e sempre foi o mais bonito da escola, capaz de deixar qualquer um suspirando. Ah... Nunca soube dizer realmente se era seu jeito misterioso e despreocupado, ou se era aquele ar rebelde com a franja a esconder-lhe os olhos... Acho mais que era tudo. Tudo em você seria capaz de me fazer perder a cabeça.

Eu comecei a ter sonhos mais quentes também, mas nunca chegava até o fim com você. Por quê? Não sei dizer, só sei que eu acordava vermelho, arfando e gemendo durante a noite... E você pensava que era apenas um pesadelo. 'Coitado, sempre tendo pesadelos.', lembro de ter ouvido de você uma vez, quando conversava com Potter em uma tarde. Mas você no fundo sabia que era você e só você que fazia aquilo comigo.

Assim foi... As provocações verbais e gestuais viraram toques nada inocentes que com o tempo foram se tornando mais indiscretos. Todos já reparavam e comentavam sobre sua repentina adoração por mim, o que na visão alheia era realmente perturbador. Nunca me acharam merecedor de sua atenção, quanto mais de seu amor.

Mas você nunca se importou realmente com essas pessoas e deixava seus gestos o levarem por um caminho sem volta. Você me tocava de formas que conseguiam me deixar sem graça e sempre me olhava como se me despisse. Como eu podia resistir a isso?

Sua conquista não falhou, mas eu ainda tinha receios. Sempre os tive, fosse por ser quem eu era, fosse por sermos tão distintos ou talvez porque éramos iguais. E mesmo quando você me vinha dizendo: 'Você tem que largar a mão do não', nem assim eu me livrava de meus medos e inseguranças para estar com você.

As coisas então foram se tornando mais explicitas entre nós, de modo que falávamos sobre isso abertamente e sabíamos das opiniões um do outro. O primeiro convite seu foi lançado, mas eu não o aceitei, ainda queria pensar, queria me perder nos sonhos com você, antes de transformá-los em realidade. Como eu disse, jamais achei que pudesse acontecer.

Mas mesmo assim você insistia. Brigava comigo, quando eu impunha condições e colocava empecilhos no caminho. 'Só dizer sim ou não, mas você adora um se...', pra você podia ser simples assim, mas para mim era muito mais que um sim ou um não.

E lá estava eu, sentado no imenso banco da Grifinória, durante o jantar, quando você e Potter sentaram-se junto a mim, molhados da chuva fina de início de inverno que encharcava o campo de Quadribol. Eu não ousei levantar meus olhos e correr o risco de encontrar os seus, mas sorri amigável e continuei a comer.

-Está esfriando... – Lembro-me de Potter comentar. Você concordou e se esticou por cima de mim para alcançar uma travessa que nem ao menos estava longe... Mas mesmo assim você fez questão de esbarrar em mim e novamente confundir nossas respirações.

Meu rosto imediatamente se esquentou, adquirindo uma coloração avermelhada, enquanto eu ficava de boca aberta, bobamente olhando meu garfo suspenso. Potter me chamou a atenção, rindo de minha distração, mas você sabia ser o provocador dela, por isso apenas me sorria malicioso.

Depois desse jantar você me chamou, fomos até uma sala vazia e novamente me fez o convite. Eu o acusei de estar apenas brincando comigo, mas você me respondeu sério: 'Eu levo a sério, mas você disfarça'. Eu disfarço? Talvez... Eu sabia de toda sua paixão, mas preferia meus sonhos.

Naquela noite você me roubou um beijo, me deixando sem fôlego só de sentir sua língua na minha e seus braços fortes rodeando minha cintura. Mas eu o afastei, perturbado demais com as batidas aceleradas do meu coração. Saí correndo daquela sala e ficamos um bom tempo sem nos falarmos.

Ah... Talvez tenha sido a estupidez maior da minha vida. Durante dias eu sofri por não falar com você. Mas ainda assim preferia meus sonhos e certezas a me jogar de cabeça naquela relação maluca que você propunha.

Potter tentava abrir meus olhos, me dizendo sempre que eu era certinho demais e deixava de viver. Mas eu preferia não ouvir meu amigo. E o tempo foi passando. Voltamos a nos falar, mas as provocações acabaram. Nossas conversas e palavras trocadas com malícia se foram, nunca mais brincamos e implicamos um com o outro. Mas os sonhos ficaram.

Agora eu abro os olhos na escuridão, segurando um papel em minhas mãos, manchado de lágrimas. Eu leio e releio, sem acreditar de fato que o momento é real. Mas é, dessa vez não é sonho.

oOoOo

Nesse dia James veio correndo até mim. Era inverno e o Natal se aproximava, como sempre você não tinha voltado pra casa para passar as festas e eu acabei ficando com você e James na Escola. O castelo era apenas uma pedra fria naquela imensidão branca dos jardins e eu mais frio ainda.

-Remus, Sirius me pediu que te entregasse essa carta... Ele disse que se após ler você quiser falar com ele, deve ir até a sala da primeira vez. Não sei o que ele quis dizer com isso, mas ele disse que você saberia o que fazer. – Eu, bobamente sorri e peguei o envelope das mãos de Potter. Esperei que ele saísse da sala comunal para abri-lo e só então manchar o pergaminho e sua caligrafia em tinta com minhas lágrimas.

A sala da primeira vez fora a mesma onde ele me beijara no ano anterior, em nosso sexto ano. Hoje, já um ano mais velho, a tentação subitamente se tornou muito maior e eu não podia mais conter a paixão.

-Ah Sirius... Por que faz isso comigo? – Eu sorrio, leio mais uma vez o bilhete e volto a sorrir em meio às lágrimas.

Era uma poesia. Uma poesia que você me fez, relatando o que sentia e o que pensava. E eu sabia o que tinha que fazer quando li o que veio escrito junto à composição.

'Você disse que não sabe se não
Mas também não tem certeza que sim
Quer saber?
Quando é assim
Deixa vir do coração
Você sabe que eu só penso em você
Você diz que vive pensando em mim
Pode ser
Se é assim
Você tem que largar a mão do não
Soltar essa louca, arder de paixão
Não há como doer pra decidir
Só dizer sim ou não
Mas você adora um se...

Eu levo a sério, mas você disfarça
Você me diz à beça e eu nessa de horror
E me remete ao frio que vem lá do sul
Insiste em zero a zero e eu quero um a um
Sei lá o que te dá, não quer meu calor
São Jorge, por favor, me empresta o dragão
Mais fácil aprender japonês em braile
Do que você decidir se dá ou não.

Remus... Eu sei que você é um cabeça dura indeciso, mas eu sou teimoso e só desisto se você me disser que não. É a última chance, se ainda me quiser eu estou naquela sala onde roubei um beijo seu no ano passado, venha até aqui. Se não, pode rasgar a carta e eu nunca mais te perturbarei com isso.

Te amo.

Sirius.

Como recusar um convite desses? Meu coração pulava por antecipação e eu sentia um irresistível frio na espinha que me acompanhou durante todo o caminho, até a sala onde ele me esperava.

Continua...

N/A: Fic de presente de aniversário atrasado pra Narcisa... Minha primushka querida!

Bom, tem mais um capítulo com lemon e acaba!

Bjus pessual...