Uma Dança
Dizem que a vida é marcada por surpresas, e, dentre essas, há aquelas surpresas boas que nos motivam a seguir em frente.
Teoria linda, mas na prática o buraco é muito mais embaixo... Ao menos ao que se refere à minha vida.
Aqueles acontecimentos bons que deveriam estar me incentivando a continuar a viver e a batalhar por tudo que acredito e quero, infelizmente, não estão ocorrendo.
Uma prova incontestável de que está tudo uma merda é o fato de eu estar em um baile sem o meu acompanhante. Isso me lembra que o motivo para estar acontecendo o baile já é outro fato que prova a minha teoria de que os acontecimentos bons em minha vida são escassos.
Houve um acidente com um dos ônibus que levava os alunos para o spar de Asamuchi. O ônibus perdeu o controle, caiu em um barranco e muitos alunos se machucaram. Felizmente nenhuma morte – a única coisa boa.
Para ajudar a comprar um ônibus novo e a pagar os tratamentos necessários dos alunos acidentados, foi organizado esse baile. Não faço parte do comitê estudantil, mas acho que deve ter arrecado um bom dinheiro, já que todos estavam bem solidários e pagaram os ingressos. Eu mesma achei o preço uma exploração de solidariedade, mas quem sou eu para dar uma de revoltada e reclamar de algo que ninguém esta reclamando?
E quanto ao meu par...? Bem, primeiro ele me liga avisando que teve problemas na casa dele e me pediu para vir ao baile, que me encontraria aqui. E aqui estou observando todos dançarem enquanto fico aqui, com a minha perna quebrada, lamentando o fato do meu par ainda não ter chegado.
A propósito, acho que esqueci de mencionar: eu estava no ônibus.
O ingresso deveriam ter sido de graça para mim, já que sou uma das pessoas que eles querem ajudar.
Novamente a minha teoria de que os malditos acontecimentos bons da minha vida não estão acontecendo e aquele incentivo que eu deveria ter para seguir em frente, não existe também.
O baile é de mascara e até que está tudo muito bem decorado, musica agradável. Droga, o Kouga está muito atrasado. Estou começando a ficar muito mais que incomodada, brava e impaciente. Apesar do baile ser de mascaras, eu sou a única que está com a perna quebrada; não existe possibilidade dele não me reconhecer.
- Alguém está mal humorada. – Sango sentou ao meu lado tomando o resto do meu suco.
- Existe alguma forma de me divertir? – indiquei a minha perna quebrada.
- Está mal humorada por que o Kouga não chegou ainda?
- Mal humorada porque estou sozinha nessa mesa.
- Vou ficar aqui com você, então.
- Não, Sango. Aproveite o baile com o Miroku.
- Oba, vou ser prestigiado com a companhia de duas musas. – brincou Miroku tirando a mascara e sentando ao lado de Sango que o imitou tirando a mascara também.
- É serio gente, vão se divertir, eu estou bem...
- Bem brava. – completou Miroku.
Os dois riram enquanto eu rolava os olhos. Miroku se levantou e foi buscar bebida para nós, não demorou muito para ele estar novamente na mesa ajudando a Sango a me fazer rir. Confesso que meu mau-humor desapareceu logo em seguida e eu já estava rindo como uma débil das idiotices desses meus dois amigos. Incrível a má influência que o Miroku é para Sango, ela era tão seria antes de começo do namoro, agora é essa palhaça...
- Desculpa a demora. – finalmente Kouga chegou e sentou na única cadeira vaga da nossa mesa.
- Kagome está soltando fumaça pelas ventas por sua culpa, Kouga.
- Não exagera, Sango.
- Desculpe. – Ele repetiu, fiz um gesto displicente com a mão voltando minha atenção para as pessoas que dançavam... Maldita perna quebrada.
- Já que seu par chegou... Vem, Sangozinha, tem um cantinho escuro logo ali.
- Olha, que legal. – Miroku sorriu. – Por que eu ia querer ir lá? – o sorriso do Miroku desapareceu.
- Precisamos aproveitar nossa juventude, Sangozinha.
- Fazendo safadezas com você no cantinho escuro?
- Exatamente.
- Vou ficar com a minha amiga. – e ela me abraçou, Kouga e eu rimos da careta descontente do Miroku.
Claro que o Miroku não se daria por satisfeito até conseguir fazer Sango ir dançar com ele, que me deixou uma pitada de inveja: ela pode dançar, eu não posso. Vou mordê-la quando ela voltar.
Kouga começou a analisar o local, não precisei me esforçar para descobrir o local que ele estava olhando. Ayame. Ela veio com um outro garoto, o qual não sei o nome e nem tenho vontade de saber. Sem escolha o Kouga me trouxe para o baile, claro que eu fiz um charme quando ele pediu.
Disse que ia pensar no caso dele, depois de uma careta de "fala serio, Kagome", eu desisti do charminho e concordei em vir com ele.
- Quer parar de me trair em pensamento e a gente começar a falar mal do povo. – Perguntei sorrindo e felizmente o meu amigo desviou atenção daquela menina magrela que está me irritando por estar partindo o coração DO MEU AMIGO!
- Kagome, pare de fazer caretas.
- Não estou fazendo caretas.
- Olha o vestido daquela menina, será que os seios delas vão sair pelo decote? – Perguntou Kouga mudando totalmente o rumo da conversa e me deixando um tanto desnorteada por alguns segundos até a menina que ele falava entrar no meu campo de visão. – Eu torço para que saiam.
Não foi uma cena linda de se ver. Quer dizer. Se você acha bonito uma garota de dezesseis anos cuspir metade do suco para fora em um acesso de gargalhadas, foi uma cena bonita de se ver, caso contrário... Não.
- Vou buscar mais suco para você. – Kouga se levantou rindo.
Quando ele voltou com o suco, eu ainda estava rindo. Respirei fundo com a idéia em mente de que não poderia ser confundida com uma hiena.
- Não quer dançar?
- E como acha que vou conseguir essa proeza, Kouga?
- Eu seguro você, sou bem forte.
- Não quero pagar o mico do ano caindo nós dois na pista de dança.
- Ei.
Os próximos quinze minutos se resumiram em Kouga tentar me convencer que era o Arnold Schwarzengger versão japonesa. Só faltou ele falar que ergue a traseira de um carro em cima dos ombros.
- Vamos, Ka.
Soltei um longo suspiro e terminei de tomar o meu suco.
- Kouga, eu não vou dançar de muletas.
- Eu já disse que te seguro, mulher!
- Ok!
Ele sorriu se levantando... Eu me senti uma pena. Ele me ergueu com tanta facilidade que por alguns segundos eu cogitei a idéia de não possuir peso algum. Foi assustador, ele me levou com tanta facilidade para pista de dança. Não estou dizendo que o Kouga seja um Arnold versão japonesa, mas que ele é bem fortinho, isso é incontestável.
Segurei a mão dele e esperei ele segurar a minha cintura, mas esse ato não ocorreu. Balancei a mão na frente dos olhos dele, chamando sua atenção.
- O que houve?
- Ayame saiu correndo.
- O que está esperando? Vai atrás dela.
Ele me observou.
- Vou te levar na mesa antes.
- Kouga, vai logo! Ayame não é tipo de pessoa que sai correndo, o Miroku e a Sango estão logo ali, eu chamo eles. E eu só estou com a perna engessada, não estou sem ela.
- Tem certeza?
- Vai!
Ele mordeu o lábio inferior, hesitante. Senti um peso desconhecido sobre meu ombro, quando olhei, vi uma mão. Ergui o olhar lentamente... Mão, braço, ombro... Um rapaz. Cabelo comprido, prateado e uma máscara que me deixava ver apenas seus olhos dourados.
- Posso dançar com a moça? – ele perguntou, Kouga me olhou.
- Claro. – Falei . – Kouga já estava indo, né?
- Kagome...
- Anda logo, ela está de salto, mas se você ficar enrolando muito não vai conseguir alcançá-la.
- Qualquer coisa me liga. – Foi a ultima coisa que ele falou antes de sair correndo. soltei um suspiro.
Espero que ele consiga alcançá-la. Sinceramente, Kouga é muito lerdo. Demorou demais para convidá-la e está demorando demais para se confessar, tento colocar um pouco de juízo na cabeça desse lesado, mas...
Senti meus pés sairem do chão. Foi quando notei que o rapaz de cabelo prateado estava me segurando no ar se movendo conforme a musica. Meu corpo estava grudado no dele, devo ter atingindo tons nunca visto de vermelhos antes. Principalmente quando notei que ele me olhava nos olhos e estava com um meio sorriso.
- Posso saber seu nome, ao menos? – Perguntei tentando ocupar minha mente com pensamentos que não fossem "meus seios contra o peito dele".
- Seria mais divertido você tentar descobrir quem sou depois do baile. Como naqueles filmes baratos de comédia romântica.
Rolei os olhos.
- Não é sempre o rapaz que tenta descobrir quem é garota do baile?
- Dessa vez a garota que vai tentar descobrir quem é o rapaz do baile. – Ele me pressionou contra ele. – Está escorregando.
- Melhor parar de dançar. – Sugeri com esperança de parar de atingir tons inexploráveis de vermelhos e sentir o rosto ferver de tanta vergonha, mas ele sorriu.
- Talvez seja melhor. – Foi quando ele me pegou no colo e começou a caminhar a passos largos, segurei seu pescoço - vai que esse maluco me deixa cair. E ele é gostoso também, não sou boba. – A mesa que está é a com muletas?
- Existem mais garotas com perna quebrada aqui?
- Pergunta idiota...
- Resposta cretina.
- Você é das minhas. – Ele me colocou na cadeira. – Foi bom dançar com você, Kagome.
- Não vai mesmo me falar seu nome?
- Não existem muito garotos de cabelo prateado e olhos dourados nesse colégio, Kagome. Se realmente quiser saber quem sou, não vai ser difícil descobrir.
E ele saiu a passos largos enquanto Sango vinha ao que eu sabia que seria um interrogatório, o qual começou com a seguinte pergunta:
- Quem é o gato?
E resultou na seguinte resposta:
- Gato? Eu jurava que era um homem.
E a conseqüência foi um tapa muito bem dado na minha nuca pela minha melhor amiga.
Quem sabe a vida não deixa de ser tão cretina e começa a me trazer coisas boas?
