Esta é a primeira estória – completa – da trilogia Cores, "O Mundo (aos teus pés) em preto e branco". É uma resposta ao desafio de Marck Evans para o Potter Slash Festival Brasil : "Quim Shacklebolt tem dois pontos fracos : homens problemáticos e pés bonitos. Quando sem querer ele descobre que aquele bruxo tinha essas duas características fica difícil para ele se controlar."
Título:
"Aos Teus Pés"
Autor: Lilibeth
Classificação:
M, segundo o Fanfiction.
Casais: Kingsley Shacklebolt / Severus
Snape
Resumo: Opções diferentes de vida acarretam em formas às vezes estranhas de prazer.
Disclaimer: Os direitos pertencem a J. K. Rowling, Bloomsbury, Scholastic, Warner Brothers, etc. Em resumo : a dona de tudo é a JK, eu sou apenas o palhaço que se diverte brincando de ser feliz com os personagens dela.
Aviso : ah, é uma fic slash, viu ? Essa palavra só te lembra o conjunto de rock e não te diz mais nada ? Não tem problema, a tia Lili explica : pensa num mocinho LINDO de morrer. Agora coloca ele junto com O NAMORADO dele. Bem juntinho. Mais juntinho ainda... Isso é slash. Não é tua praia ? Tudo bem, ninguém é perfeito. Aperta o botãozinho de volta e vai pra outra fic mais "normal"...
Nota: Agradeço ao meu adorado beta-vítima Marck Evans que teve paciência de ler isso aqui e ainda continuar meu amigo depois de tudo que eu fiz com o desafio dele . E ao povo do Potter Slash Fics por ter agüentado minha maluquice e ausência enquanto eu viajava na maionese ao escrever esse delírio
Aos teus pés
Tus pies
Cuando no puedo mirar tu cara
miro tus pies.
Tus
pies de hueso arqueado,
tus pequeños pies duros.
Yo se'
que to sostienen,
y que tu dulce peso
sobre ellos se
levanta.
...
Pero
no amo tus pies
sino porque anduvieron
sobre la tierra y
sobre
el viento y sobre el agua,
hasta que me encontraron.
Pablo Neruda
Chuva. Mórbida, fria, pestilenta chuva. Como os dedos de um dementador, ela entranhava-se nas vestes e deixava o frio externo congelar-se de encontro ao vazio interno. Olhando pelo lado bom, pelo menos dava maior credibilidade aos "sinais" plantados da passagem de Sirius Black por ali. Estava ficando cansativo achar novas pistas esdrúxulas por onde o Black passava. Algumas beiravam a infantilidade, e Kingsley Shacklebolt se perguntava se realmente alguém era tão estúpido de acreditar que um "aristocrata bem criado" – leia-se alguém de uma família tão intensamente ligada às artes das trevas – deixaria pistas tão óbvias. Mas a sua realidade no último ano dizia que sim. Sim... todos enxergavam apenas o que queriam ver. Até estarem cegos... ou mortos. Mas tinha de ter constante atenção com Lucius Malfoy e suas perguntas.
Percebendo-se subitamente tenso, endireitou-se, esticou as costas e resolveu parar de pensar. Afinal, não estava sendo pago para isso. Pensar era uma atividade que não se coadunava com a figura de um Auror bem treinado. Era apenas reflexo e instinto. Puro. Simples. Básico. Mas efetivo. Como aquela chuva gelada.
Chapinhou um pouco mais na lama, criando mais sinais de uma pseudo-luta e aparatou em frente à sede do Ministério, para fazer outro relatório insípido como sua vida.
Mas, antes de tudo, carinhosa e quase reverentemente limpou a lama de suas botas.
Xoxoxoxoxoxoxoxoxoxoxoxoxoxoxoxoxoxoxoxoxoxo
- Black escapuliu debaixo de nossas fuças ! Como, eu me pergunto, COMO os melhores aurores não conseguem prender esse homem ?
- Talvez porque ele tenha sido o único bruxo em toda a história que conseguiu fugir de Azkaban ? – o sussurro para Tonks pode ser ouvido também por Olho-Tonto, que lançou um olhar de fúria (ou seria de diversão ? com aquele olho mágico nada podia ser realmente determinado) mas o recado foi compreendido : era deixar o Ministro vociferar, e fazer-se – novamente - de vítima impotente de um bruxo do mal. Afinal, era de conhecimento comum que os aurores do Ministério eram uns incompetentes, mesmo.
Vida definitivamente besta, pensava enquanto lustrava um pouco as botas de encontro às vestes, e quedava-se tentando ver – hábito terrível – os pés de todos por ali. Malditas vestes ! Pelo menos nisso os Muggles eram melhor servidos, pensou enquanto forçava-se a olhar com ar contrito e costas eretas para o Ministro, ainda em suas perorações, pescando aqui e ali frases soltas enquanto pensava em algo infinitamente mais interessante : bruxo das trevas (neve gelada e fofa sob os pés descalços, dor e prazer na medida certa) , imperdoáveis liberadas (refrescar as pernas e pés no lago de Hogwarts aos quinze anos), maior empenho (se continuassem buscando Black daquele jeito, iria precisar de botas de pele de iaque, e não de dragão) e foi automaticamente que se levantou e despediu-se do Ministro ainda pensando na cor das botas de iaque.
Negras, naturalmente.
Xoxoxoxoxoxoxoxoxoxoxoxoxoxoxoxoxoxo
Foi de forma quase divertida que fez seu relatório informal – verdadeiro, dessa vez – na sede da Ordem da Fênix sobre os acontecimentos daquela madrugada. Dumbledore estava com os olhos azuis brilhantes ouvindo sobre o "episódio Fudge desta noite" quando Severus Snape chegou, evidentemente com o seu mau humor característico e eternas capas esvoaçantes.
Não era à toa que ele e Sirius nunca tinham se entendido, a cada respiração era evidente que Severus não sabia viver. Bem, na verdade sabia, pois estava vivo até agora. Mas, definitivamente, era alguém que não sabia sorver da taça da vida, ou não teria se metido com Voldemort tão jovem. Mas, como ele, Kingsley também tinha seus segredos impronunciáveis, e isso o deixou menos propenso a odiar tão gratuitamente Snape. Se Dumbledore confiava no Seboso, ele não o odiaria. Pelo menos até prova em contrário, ele era inocente. Seu único crime fora a ambição dos solitários, e essa Shacklebolt compreendia bem.
Se a escolha de Snape fosse outra, talvez fossem até colegas de trabalho, pois ele era excepcionalmente bom em feitiços. Nunca compreendera como alguém tão hábil não era o Professor de Defesa contra Artes das Trevas de Hogwarts, mas esse era outro dos segredos bem guardados de lá.
Segredos.
E, instintivamente e sem aperceber-se disso, ele baixou o olhar até os pés de Snape.
Nada. Apenas a fímbria das vestes.
Suspiro : como sempre, nada. Como com todo mundo, nada. E moveu-se inquieto ao sentir-se flagrado no que tinha feito, levantando rapidamente o olhar e cruzando-o com as negras adagas reluzentes das íris de Snape firmemente fixas nas suas.
Defesa acionada, seu olhar virou-se como se nada tivesse acontecido para o lado dos adolescentes,onde os gêmeos Weasley e Tonks mexiam em algo e riam alto, ladeando o dono da casa. Para desta e definitiva vez encontrar-se com as íris azuis de Sirius Black interrogativas e curiosas.
Decididamente seus olhos estavam errando muito, hoje, pensou Kingsley enquanto esfregava as pálpebras cansadas e endireitava as costas doloridas. Devia ouvir mais Olho-Tonto Moody e sua frase predileta "Vigilância Constante !" e parar de pensar em dar um sentido à sua inexistente vida amorosa.
- Oooops ! - ouviu-se a voz eternamente adolescente de Tonks.
- Segura, segura, segura, ainda não está pron...
Tarde demais, pois a caixinha já estava voando pela sala, abrindo-se e deixando escapar um lindíssimo balão multicor com algo reluzente dentro. Melhor preparar-se, desastre à vista, pensou rapidamente Kingsley enquanto preparava-se para puxar a varinha. Mas antes que qualquer um pudesse sequer pensar em reagir, Kingsley viu o elegante e rápido meneio de um vigilante Snape, e o balão colorido e barulhento que tinha escapado da caixinha Weasley pousava docemente aos pés de Severus Snape.
- Mas que diabos...Weasley ? Isso tem ... ÁCIDO ! Evanesca !
- Desculpa aí, hein,Professor ! Ainda não tá pronto, hi... melhor arrumar outra bota... e outras vestes ... Fred, acho que isso corrói couro e tecido, pelo jeito !
- É, de volta à velha prancheta.
E a saída intempestiva dos dois gêmeos só foi suplantada pelo esgar de Snape ao ver suas botas continuarem a sumir, lentamente, mesmo proferindo uma série de encantamentos em voz rápida e cada vez mais alta :
- Persistire ! Libertas ! FINITE INCANTANTEM !
Reflexo e Instinto, você é um Auror : Kingsley Shacklebolt abaixou-se e como um zagueiro de futebol trouxa pegou Snape como um fardo e saiu correndo escadas acima, pulando os degraus de três em três : quarto, quarto, banheiro, o feitiço Imersias! berrado, para finalmente jogá-lo dentro da banheira cheia de água.
- Eficiente, Shacklebolt.
- Por nada, Snape. Lamento pelas vestes.
- Lamente pelas botas, eram melhores que as vestes.
Instinto e reflexo, o olhar preocupado com o companheiro incendeia-se com a visão : Severus Snape era o dono dos mais esplêndidos e másculos pés que Shacklebolt há tinha visto : artelhos longos e bem delineados, pés brancos (agora bem vermelhos por conta das queimaduras que a poção que os gêmeos abençoadamente tinham inventado) e nitidamente macios ao toque, como eram para a visão... era um refrigério para seus olhos eternamente vendados.
A profunda inspiração quase erótica, o quedar-se absorto observando detidamente os pés de Severus, e o sentir a presença de alguém entrando– instinto e reflexo - , o aproximar-se do objeto desejado como se não o afetasse...
- Acredito que vá precisar de uma pasta para essas queimaduras. As pernas também ?
Controle e Calma , teu nome é Kingsley, dizia a si mesmo enquanto fingia observar as queimaduras dos pés, sem ousar tocá-los. Precisa pensar em neve gelada, água gelada... água, não, gelo, chuva bem fria, sim...
- Não, apenas os pés, não se preocupe.
- Vou pedir a Molly uma Poção com Callendula e Millenium.
- Obrigado, Shacklebolt, mas eu mesmo direi a Molly os componentes corretos da poção.
Suspiro... Para que pensar em algo anti-erótico que não fosse ouvir as palavras gentis do próprio Snape ? Ele faria o coração do maior dos amantes congelar-se de desesperança. Exato e preciso como a receita de uma poção, é claro.
- Compreendo. Chamo-a já ou você prefere colocar uma roupa mais apresentável antes ?
Pois se você sabe ser desagradável, Snape, eu sei ser mais ainda.
- Não se preocupe comigo, Shacklebolt, descerei em seguida, a reunião está se atrasando por causa de uma brincadeira de crianças.
- Não, Severus, a reunião irá ser mais tarde porque um dos membros da Ordem foi ferido – atalhou finalmente Dumbledore da porta -. Aqui tem vestes novas, negras como você prefere. Pedirei a Molly para que venha ouvir suas orientações sobre a confecção da poção e somente depois é que faremos nossa reunião. Pelo visto, terá que ficar descalço até seus pés ficarem melhores, portanto está dispensado da Reunião de hoje. Tem algo que eu deva transmitir aos demais membros ?
- Com licença, vou pedir a Molly para subir em seguida.
E enfiar minha cabeça em uma tina de água gelada. Ou pedir a fórmula aos gêmeos Weasley e mergulhar meu próprio cérebro nele. Tantos bruxos sobre a face da Terra, eu tinha que ver – e apaixonar-me perdidamente à primeira vista – justamente os pés do Snape... exatamente como minha vida às avessas : aquele que é considerado o melhor Auror, o mais esperto, o mais experiente, o mais preparado – quanta tolice junta! - era um fetichista podólatra que não conseguia desvencilhar-se da visão dos pés perfeitos de Severus Snape, o maior cretino que fazia parte da Ordem da Fênix.
É, a vida não é justa quando se escolhe um caminho diferente,pensou aprumando-se em toda sua altura, instintivamente acariciando o brinco de ouro no lóbulo da própria orelha. Segredos, instinto e auto-carícias, esse sou eu, Kingsley Shacklebolt, considerado o melhor Auror do mundo bruxo...
Os teus pés
Quando
não te posso contemplar
Contemplo os teus pés.
Teus
pés de osso arqueado,
Teus pequenos pés duros,
Eu
sei que te sustentam
E que teu doce peso
Sobre eles se ergue.
Mas
se amo os teus pés
É só porque andaram
Sobre a terra e sobre
O vento e sobre a água,
Até
me encontrarem.
Pablo Neruda
