Sombra & Luz
Age of Empires
Personagens Principais: Surion x Helkersim; Outros.
Gênero: Yaoi/ Lemon
Capítulo 01
Status: Incompleto

Sumário: A paz entre os Drows e os elfos "dourados" era frágil como uma folha de outono preste a cair de uma árvore. Para protegê-la é celebrado um casamento entre o rei Drow e uma elfa do norte. Dessa união, nascera o atual soberano Drow, um mestiço cujo sangue carregava a etnia das duas raças inimigas. Mas os príncipes da corte, elfos "azuis" de raça "pura", almejando o poder absoluto do soberano de olhos claros, querem derrubá-lo do Trono a qualquer custo e recomeçar a guerra. Nesse conturbado ambiente de traições palacianas, um amor proibido nasce sob a égide de bênçãos e maldições divinas.

( Uma fanfiction baseada no Rolling Playing Game Age of War)


Sombra & Luz

- Capítulo 01 -


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No horizonte o céu já se tingia de laranja, vermelho e amarelo... O sol pálido de outono desaparecia. Diante da água límpida do lago sua imagem era refletida como nos grandes espelhos emoldurados das casas dos humanos abastados. O vento frio da tarde não lhe dizia coisas belas como deveria ser e nem ele conseguia ouvir sua música. Seu coração estava pesado e já não tinha alegria no decorrer dos dias e suas noites eram tristes muito tristes... Tristes e sem esperanças!

Agora sabia porque era tão diferente dos irmãos, porque parecia mais alto, porque não parecia envelhecer... Sim, agora sabia porque muitas vezes as coisas pareciam muito estranhas em sua casa... HELKERSIM era seu nome élfico e significava para os humanos: Lágrima Mágica do Norte, sua mãe tinha dito! Mas será que dessa vez ela teria falado a verdade? Há dias estava ali no meio da mata, percorrendo a floresta em passos lentos esperando não sabia o que, talvez uma inspiração, um alento... Talvez esperando que a deusa o guiasse, se é que a deusa o reconhecia e sabia que ele existia... A verdade sobre seu nascimento tinha mesmo calado fundo em sua alma...

Sua mãe no leito de morte tinha confessado... Sim ele era diferente, por isso crescia de modo diferente dos irmãos.

Não, não era retardado mental como muitos diziam a princípio e nem tinha problemas de masculinidade como os outros humanos de perto de casa achavam que tinha... Zombavam deles por suas longas mãos feminis e sua boca rosada. Não era... Pior... Era um Meio-Elfo... Uma lágrima deslizou de seus olhos azuis translúcidos e caiu na água do lago... Outra vez reparou em sua aparência esguia e andrógena que via no reflexo da água clara... Seus cabelos eram muito louros quase brancos e sua pele muito clara, como não tinha percebido antes que tinha a pele quase tão clara como as dos Elfos que via por vezes correndo pelas matas?

Agora sua mãe estava morta e ele não tinha um lar... Fora colocado para fora de casa... O homem que agora sabia ter sido apenas seu padrasto nunca gostara dele isso ele sempre tinha percebido, mas agora sabia o porquê! Ele na verdade não era Andréas, e sim Helkersim, e seu pai era um Elfo das terras do Norte. O amor eterno de sua mãe.

Por que não tinham ficado juntos? O que acontecera? Não sabia... A mãe morrera antes de falar tudo e o padrasto se sabia de alguma coisa jamais falaria! Colocara-o para fora, dizendo:

"Agora não preciso mais olhar para sua cara! SUMA! SUMA! ESPERO QUE MORRA DURANTE O INVERNO E QUE OS ORCS DESPEDACEM SEU CORPO!".

Helkersim estremeceu. Olhou para o céu! O inverno não demoraria mesmo a chegar e prometia muito ser rigoroso... Em Grimmer por vezes demoravam-se meses até o gelo derreter e a primavera resplandecer. Sem um lugar para ficar... O que aconteceria com ele? O futuro era uma incógnita completa. Na verdade toda sua história era uma incógnita completa e seu passado, uma mentira.

Não estava revoltado, apenas muito triste e sozinho. Levantou-se e se afastou do lago... Logo anoiteceria e ele não queria passar mais uma noite sem um teto sobre a cabeça. Tinha sido informado de que havia um templo da deusa Galana, mas para o leste... Talvez o alcançasse antes de escurecer e talvez os Clérigos o acolhessem pelo menos por uma noite...

Os Clérigos eram guardiões e eram os responsáveis por levar a palavras dos deuses pela Terra. Com certeza o ajudariam e talvez então se decidisse para onde ir... Talvez para Nova Britânia que era governada pelo Lord British, que era portador de um dos cinco artefatos... Talvez lá pudesse começar a tentar descobrir algo sobre sua existência, sorriu triste, ou talvez ficassem no templo mesmo se lhe fosse permitido...

o 0 o

Já faziam quase duas horas que Helkersim caminhava rumo a leste, em direção ao templo de Galana. O horizonte, agora, estava com aquela cor dourada e púrpura, com o sol poente se mesclando com as primeiras estrelas do manto azul prússia que ia cobrindo a terra. Uma visão de rara beleza. Visão essa que foi maculada subitamente com o som ruído do galope de vários cavalos que surgiam na estrada. A princípio, o meio elfo não se preocupou. Era comum romarias e caravanas de comerciantes passarem por ali rumo a região do templo, pródiga em feiras de comércio e escambo.

O meio elfo ajeitou o capuz de seu manto, que o cobria por completo, protegendo dos olhares curiosos e também do frio. Odiava sua aparência linda e etérea, era essa a verdade. Era comum os humanos acharem que cortar os cabelos dos elfos para usar como amuletos trazia sorte. Um costume antigo e sem sentido, proibido agora através de lei por Lorde British, mas que imperava ocultamente entre humanos medíocres...

Lembrava-se das estórias horríveis que ouvira na aldeia onde, até então, vivera com seus meio-irmãos e padrasto... Alguns até matavam elfos, porque acreditavam que beber o sangue deles, ou carregar as orelhas longas empalhadas, dava ao portador daquelas relíquias fúnebres a mesma longevidade que os elfos tinham... Ele, Helkersim, não tinha orelhas longas, mas sua aparência andrógena e etérea já era alvo de curiosidade e escárnio... Por via das dúvidas, era melhor ficar oculto sob o manto.

O erro de Helkersim foi não correr para dentro da mata fechada. Não eram comerciantes, muito menos romeiros, que passavam. Eram os mercenários das Terras antigas de ficavam além da Nova Britânia, um lugar sem lei, onde o que valia mais era a força bruta.

Essas hordas de cavaleiros sem uma bandeira para comandá-los, trabalhavam pelo pagamento, apenas, e não acreditavam nos deuses.

Infelizmente, mesmo os governantes de Britânia, toleravam aqueles soldados pagos, e faziam vista grossa para os abusos que cometiam nas terras dos governantes donos dos cinco artefatos...

Eles resolveram cercar o elfo com seus alazões azulados, considerados quase mágicos, devido a alta velocidade que tinham.

- Você! Acenda a fogueira e cuide dos nossos cavalos. Vamos acampar hoje aqui.

Helkersim pensou em desobedecer, mas mudou de idéia. Eram seis humanos e dois meio-orcs, fortemente armados por machados e espadas. O jeito era ser servil, e tentar manter o manto e o silêncio como defesa...

Puxou o cavalo do mercenário que gritara com ele, fazendo uma saudação servil com a cabeça, mas sua estratégia não deu certo. O brutamontes ficou irritado com seu recato de monge...

- Você, vamos ver o que tem aí embaixo do pano...

Houve um burburinho de admiração quando o homem puxou o manto e os cabelos de Helkersim brilharam com os últimos raios de sol... O olhar dele, translúcido como o cristal, brilhava com uma raiva mal contida. Os homens foram se aproximando como um bando de lobos...

- Um elfo...

- Não... Não tem orelhas longas...

- Um mestiço...

Riam... Os olhares eram atrevidos...

O brutamontes que falara primeiro puxou a espada e encostou-a no rosto excessivamente bonito.

- Tem voz, mestiço?

Helkersim não respondeu. Seu olhar de ódio e raiva mostrava que não tinha medo deles, mas a verdade é que estava em desvantagem ali.

Um deles gritou:

- Ande, faça a comida...

- Não sou seu servo. Sou livre.

- Vai ser um livre morto se não obedecer...

O meio-elfo bufou de raiva, mas resolveu não discutir. Apanhou a sacola de mantimentos que lhe foi jogada nos braços.

Os cavaleiros foram desmontando. Armaram um estábulo improvisado com gravetos enquanto observavam o elfo fazer uma fogueira e por para aquecer um manto de carne defumada.

Distraído que estava com a preparação do alimento, Helkersim não percebeu a hora em que o homem que o parara na estrada se pôs atrás dele. Somente se deu conta da perigosa proximidade quando era tarde demais para reagir.

O mercenário o agarrou pelos cabelos, puxando-o para o chão como se fosse um saco de lixo. Helkersim gritou de ódio, tentou lutar puxando sua adaga, mas ela foi jogada longe por um chute violento.Um novo chute, agora nos rins, fez o mestiço gritar de dor. Helkersim foi segurando por um outro agressor, enquanto o brutamontes se punha sobre ele. Gritou de asco quando sentiu a boca do outro tocar sua pele e as mãos grosseiras rasgarem sua roupa...

- Vamos ver o que mais você sabe fazer... - As risadas de luxúria feriam seus ouvidos. - Se for bonzinho, vai ser a nossa mascote, vivo, se não for, vamos arrancar o seu coração e cabelos para nos dar boa sorte... E jogamos os resto para os abutres...

Nada na sua vida o havia preparado para aquilo, Se Helkersim achava que a vida ao lado de padrasto, que por vezes fora violento com ele era difícil, ele ainda não sabia como os humanos de fato poderiam ser violentos...

Olhou em volta para ver se entre aqueles homens, alguém poderia lhe ajudar ou ao menos interferir naquele ato vil, mas, no entanto, sua decepção foi total. Aquele que não estavam interessados no que acontecia ali, estavam cuidando de suas coisas, totalmente indiferentes...

Helkersim ainda tentou fugir, escapar das mãos brutais que o prendiam, mas não tinha mesmo a menor chance...

- Por... Favor! Isso não, eu...

Apenas gargalhadas grosseiras e comentários chulos. No instante seguinte estava nu no chão, dois homens o seguravam, erguiam suas pernas alvas, marcando-as deixando-as roxas na hora. Enquanto o que parecia mandar por ali desnudava seu sexo avantajado. Sua boca foi amarrada com um trapo sujo para que não mordesse seus agressores... Suas partes íntimas expostas despudoradamente. O mestiço chorava de raiva, os olhos lindos brilhavam de ultraje, o que parecia fazer o mercenário ficar ainda mais excitado. Ávido, e sem nenhum aviso, o homem forçou a entrada de seu ânus... Suas mãos se fecharam com força, ele sufocou o grito no pano esfarrapado...

Violência, estupro, dor, ódio, desespero, medo, terror... As emoções se mesclavam num calidoscópio macabro, formando um hediondo pesadelo que se tornava real. Nem em seus mais remotos temores, poderia imaginar passar por algo tão ultrajante.

A dor física e a humilhação eram tão intensas, que ele, fremindo de ódio, preferia morrer ali, naquele mesmo instante, a continuar como vítima, mas nem sequer essa escolha ele tinha. Esta ali, bem vivo, suportando o horror de ser violado. Seus gritos abafados. Não sabia dizer mais se eram de medo, dor ou ódio.

Por ser meio-elfo, sua natureza era sempre cândida e inocente. Aquela inocência agora estava sendo irremediavelmente marcada. Para sempre.

o 0 o

O homem bufava e gemia em cima dele, dilacerando sua carne alva sem a menor piedade. O animal fremia, já sentindo os primeiros espasmos do gozo. A saliva dele pingou no rosto de Helkersim. Na hora exata em que sentiu o sêmen do outro explodir dentro dele, Helkersim soltou um grito de espanto sob sua mordaça, porque sentiu um outro líquido, quente, espirrando em seu rosto. Sangue! Com a velocidade um raio, a cabeça do seu algoz havia sido cortada, e ele tombava, decepado, sobre ele, Helkersim, inundando seu corpo de vermelho.

Completamente aturdido, viu o corpo do seu agressor ser chutado para longe dele. Olhou para cima, perplexo. A criatura que executara o estuprador estava de pé, ao seu lado. A espada manchada de sangue, os cabelos prata brilhando incrivelmente sob a luz da lua... A pele de um azul tão escuro que chegava a parecer a própria noite: era brilhante, linda, misteriosa.Helkersim ficou tão surpreso que não conseguia compreender aquela aparição... Um Drow!

Drow era o nome de uma raça élfica surgida de uma antiga cisão entre os elfos. Devido a pele sedosa e reluzente, de um azul escuro como o da noite de verão, eram também chamados de elfos negros. Helkersim já ouvira a lenda e a estória deles, mas jamais vira um pessoalmente...

O elfo negro, que aparecera subitamente entre seus comandados, jogou seu manto sobre o corpo do rapaz e olhou desafiante para os outros três mercenários que estavam ali com o intento de usaram a carne tenra do mestiço:

- Mais alguém vai enfrentar a minha espada?

Um deles, o irmão do morto, o olhou com ódio...

- Vai defender um maldito mestiço? Justo você, um Drow?

Helkersim, embora ainda tomado pelo ódio, deduziu corretamente que o Drow era o comandante daquela tropa! Estava sem entender nada. Um drow, comandando meio-orcs e humanos? Aquilo era totalmente inesperado...

O elfo negro lançou um olhar tão gélido para o outro, que o homem deu dois passos para trás, recuando.O drow respondeu, altivo:

- Odeio elfos, todos eles, mestiços ou não. Por mim, ele não passa disso, uma cadelinha élfica. Mas fui claro quando disse que vocês não deveriam chamar a atenção até que eu voltasse.Violar jovens e crianças, é mais do que chamar a atenção! Além disso, esse garoto poderá pegar um bom preço com os mercadores de escravos, se vocês não destruírem a mercadoria!

O bando concordou com o chefe, mas o outro estava inconformado com a morte do irmão...

- Temos o direito ao saque das vilas que tomamos!

Surion, o elfo negro, fez sua voz soar cortante e perigosa...

- Têm esse direito, desde que eu escolha o botim primeiro, por ser o líder. Se discorda, me avise, e irá fazer companhia ao seu irmão no inferno criado pelo Senhor de Mon Dor.

O homem, ao ouvir no nome da montanha maldita, se aquietou. Do mesmo modo que os elfos eram tidos como criaturas auspiciosas e mágicas, os elfos negros eram considerados, pelos humanos, malditos, seres malignos capazes de amaldiçoar uma alma para sempre.

O fato também dos dois meio-orcs, fiéis ao Drow, terem se colocado ao lado do amo, como sinal de que lutariam ao favor dele caso o bando se rebelasse contra o chefe, também fez o outro se calar covardemente, mas era evidente, que, naquela noite, o elfo negro havia obtido um inimigo. O homem se afastou, deixando o corpo do irmão para trás.

O Drow apanhou o manto do morto e limpou sua espada. Disse para um dos meio-orcs, olhando para as próprias mãos, afinadas e majestosas, com um ar de desdém e enfado.

- Cuidem desse pirralho e sumam com o corpo. O mestiço pode valer um bom dinheiro nas praças de Vynn, ou talvez eu o ofereça de presente ao governador da cidade em troca de vantagens... Um nobre fodendo esse pirralho vai ser mais proveitoso para mim do que ele sendo dilacerado por um bando de cachorros...

Um dos meio orcs pegou Helkersim no colo de maneira bastante desajeitada e o colocou ao lado da fogueira onde, há pouco, os indiferentes se aqueciam, enquanto outros sodomizavam o mestiço. Também os meio-orcs não eram 'bonzinhos', mas respeitavam muito mais as ordens de seu amo para fazer qualquer coisa que não estivesse dentro das normas dele...

Helkersim gemeu ao ser jogado ao chão, mas procurou não fazer nenhum barulho. Tudo o que queria era mesmo passar desapercebido e arrumar uma forma de fugir dali... Jamais esqueceria aquele dia, nunca, nunca mesmo seria capaz de esquecer aquilo... Encolheu-se dentro da capa do Drow. Ela ainda parecia conservar o calor do elfo negro. Tinha ainda o cheiro dele, uma mistura de almíscar e sândalo...

O calor do fogo começou a fazer efeito e Helkersim sentiu os músculos começarem a relaxar. De onde estava, via os dois meio-orcs se movimentando, e o irmão do morto estendido em um cobertor um pouco mais distante. Apesar das dores que sentia por todos os músculos, o cheiro da comida que os mestiços orcs preparavam mexeu com o estomago do meio elfo. Não tinha comido nada substancial, além de umas poucas frutas da floresta, nos últimos dias... Estremeceu e se aconchegou no manto aveludado... As narinas sentindo o perfume delicioso do sândalo...Um drow... Nunca imaginou que pudessem existir de verdade...

Adormeceu numa espécie de torpor, onde a mente tentava reparar o mal físico e esquece-lo por completo! Perdeu-se na inconsciência benfazeja, o fogo aquecendo seu corpo, mas, logo depois, acordou sobressaltado ao ouvir o barulho de botas chegando perto dele...As folhas secas do outono eram pisadas por passos implacáveis... Encolheu-se o mais que pode dentro do manto. Seus olhos muito claros de arregalaram, iluminados apenas pelo brilho da fogueira, pois a noite já havia surgido por completo e a lua estava escondida agora por uma nuvem tão amedrontadora quanto o Drow parado a sua frente...Os cabelos prateados tinham um brilho bruxuleante, quase irreal, ao receber as luzes do fogo...

Ficaram se olhando... Helkersim sentiu seu coração disparar, a adrenalina correndo solta em suas veias. Quando o drow se agachou a sua frente, o meio-elfo chegou a prender a respiração. Será que apesar de tê-lo salvo, ele agora iria...

Não teve tempo de completar seus pensamentos. Drow sorriu e seus dentes eram tão brilhantes que Helkersim pareceu ficar hipnotizados por eles até que a boca bonita de Surion se moveu... O drow parecia ter-lhe adivinhado o medo:

- Fique sossegado mestiço! Se me obedecer, não tem que se preocupar comigo! De qualquer forma, eu apenas cortaria sua cabeça para fora do pescoço, jamais usaria você a força, como aquele cretino estava fazendo. Eu... Esperaria você me chamar. Nunca o contrário.

Helkersim estremeceu, ultrajado. Jamais chamaria ninguém para uma coisa daquelas!

Sem conseguir se conter, se endireitou no manto e perguntou:

- Como posso ter certeza de que estou seguro?

Outra vez o drow sorriu...

- Atrevido! Não está em posição de duvidar de nada...

- Ele era seu subordinado...

- E daí? Ele não agiu de acordo com minhas ordens, e mereceu morrer. Humanos não prestam jamais, prefiro mexer com bichos... Pior do que isso...

Surion deu um olhar frio para o menino...- Apenas um mestiço éfico... Como você...

- Mas...

- Agora cale sua boca e coma! Sairemos daqui ainda antes que amanheça, quero estar no meu destino antes que a primeira geada chegue...

Helkersim mais uma vez não se conteve:

- Deixe-me aqui! Eu de nada serviria...

- Depois do inverno você valerá um bom dinheiro no mercado! Não confunda as coisas, rapaz... Não sou um mensageiro de Galana que apareceu para salvá-lo! Eu apenas sei como aproveitar melhor a minha mercadoria... Mas entenda logo para sobreviver: para mim, é isso o que você é: uma coisa, exatamente como era para o homem que eu matei.

Surion colocou a comida ainda quente ao lado de Helkersim e se afastou...

o 0 o

Surion tinha o pensamento muito distante, mas seus sentidos todos em alerta.Por isso escutou facilmente os passos vacilantes de Helkersim se aproximarem de onde ele estava... Ficou quieto, esperando... Os passos pararam a uma distancia segura, sinal de que o menino não vinha armado... Depois de uns segundos, soou uma voz doce e suave, tão doce como a dos elfos de mais pura linhagem...

- Drow...

- Surion é o meu nome!

- Surion...

Muito doce àquela voz... Perigosa.

- Nunca se aproxime assim, poderia estar morto a essa hora...

- Você é um mercenário não é?

- E daí, onde quer chegar com essa pergunta idiota?

Helkersim jogou como nunca pensou ser capaz de jogar em sua vida. Tinha ficado acordado, pensando em um jeito de escapar daquilo durante todo aquele tempo...

- É um mercenário ou não?

- E se eu for? O que você tem para me oferecer além do corpo vendável?

Helkersim jogou alto...

- Não sou um bastardo qualquer. Me ajude a encontrar minha família élfica que receberá muito ouro e muita glória. Meu pai é um elfo muito abastado e...

- Porque eu acreditaria nisso?

- Porque não tem nada a perder! Se eu estiver mentindo ainda pode me colocar no mercado e vender minha carne! Precisa me ajudar a achar meu pai... Disso depende muita coisa e com certeza será muito bem recompensado... Mais do que jamais imaginou...

Surion sorriu. Um sorriso lindo, que fez Helkersim imaginar pérolas brancas sobre metal polido azul. Como um mau caráter podia ter um rosto de aparência traiçoeiramente confiável como aquele?

- Se fosse mesmo um mestiço de posses, não estaria sozinho a beira da estrada...

- Escute, eu juro...

- Escute você, garoto, para não sofrer nessa vida maldita. Você vai ser tratado como um boi antes de ir ao matadouro. Meus servos vão alimenta-lo, vesti-lo e depois, na sua melhor aparência, depois do inverno, vai ser exibido como gado. Se Marduk, meu contratante, gostar de você, talvez façamos negócio, senão, você vai trabalhar num dos bordeis de Vynn, que alias... - O elfo olhava sério para o menino, como se fosse um irmão mais velho falando com o mais novo. - é da minha propriedade. Você ficaria assombrado com o preço que os humanos pagam por amantes de linhagem élfica... Homens ou mulheres...

Helkersim sentiu seu coração disparar de aflição... O cara não podia estar falando sério...Não iria viver "aquilo" de novo!

- Prefiro morrer!

O Drow riu, um riso amigável, até...

- Todos dizem isso, no começo, depois, se acostumam com o luxo e os presentes. Não, não me olhe com essa cara de vestal assustada. Entenda de uma vez por todas que você não vai ter um destino tão ruim assim... Desde que aprenda a ser servil!

- ...

- Sabe, o meu servo, o capataz de lá, é sádico, adora castigar e dar ordens, mas não ousa desobedecer uma ordem minha, exatamente como esses dois meio-orcs. São como crianças sem cérebros, controláveis e previsíveis... Vou mandar ele ser cortez com você, mas você deve compreender que não vai ter todo o inverno para se decidir a colaborar...

- Isso é... Nojento.

- Claro que é. Como a vida criada nas terras dos deuses. Um palco para o capricho deles, nada mais... Quanto mais cedo você perceber isso, mais chances vai ter de continuar vivo.

- Já disse, eu prefiro não viver...

Surion riu.Puxou a pequena adaga élfica que tinha na bainha e a passou ao mestiço...

- Então vá em frente, vou lhe dar esse direito. Morra.

As mãos de Helkersim seguraram a adaga, aflitas. Ele a posicionou contra o próprio peito, disposto a enterrá-la no coração. Chegou a pressionar a ponto de fazer uma pequena perfuração de onde o sangue escorreu, mas suas mãos vacilaram ainda mais, e ele não conseguiu levar aquilo adiante. Não podia! Seu amor à vida e à força da juventude falaram mais alto. Ele, desesperado, preferiu desviar a adaga e atacar Surion com todas as suas forças. O drow, que já esperava esperando por aquela reação, desviou com rapidez sobre-humana e contra atacou, dobrando os braços de Helkersim para trás e o prendendo contra o seu corpo.A adaga caiu no chão.O meio elfo gritou de dor e ficou ali, a mercê do outro, tremendo de raiva e frustração. O drow, segurando o meio-elfo contra si, acariciou os cabelos dourados com doçura:

- Não, mestiço... Você não nasceu para ser um guerreiro. Nasceu para brilhar nos salões de Vynn e conquistar os poderosos... Não seja tolo, porque a vida é impiedosa com os tolos.

Surion soltou o menino com um tranco. Sabia agora, pelo menos, que o garoto não conseguiria tirar a própria vida... Ótimo. Todavia, não duvidava que seria um longo inverno até tornar aquele pequeno potranco em uma mercadoria dócil...

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Helkersim não saberia, depois, dizer a ninguém que lhe perguntasse como tinha chegado até os domínios de Surion. Andara muito a pé, um pouco fora carregado pelos mestiços orcs, quando suas pernas já não agüentavam mais dar nem um passo, e, por fim, quando pensou que o próprio destino se encarregaria de sua morte, pois sentia uma fraqueza cada vez maior, foi colocado sobre o cavalo do próprio Drow, na frente da mesma sela que passaram a dividir. Helkersim ficou rígido, a princípio, evitando encostar – se ao outro... Ouviu o riso cínico do elfo negro, que percebeu a sua tentativa inútil de não encostar-se nele, mas não podia vê-lo uma vez que estava sempre vendado para que não pudesse perceber os caminhos que levavam à fortaleza.

- Se não fosse tão teimoso, e comesse o que temos lhe oferecido, não estaria assim tão fraco...

- ...

Helkersim não respondeu... Tinha feito a si mesmo um juramento: Não comeria nada além do necessário para manter-se em pé. Não seria alimentando como um porco para engorda e abate! E também não falaria com Surion, não responderia as suas perguntas e muito menos as suas ironias!

O riso seco de Surion foi seguido por um solavanco do cavalo o que obrigou Helkersim a encostar-se nele, para não cair.

O tempo foi passando e um sono que era um torpor de puro cansaço, ia bailando o corpo do meio elfo.

O barulho ritmado do trote do cavalo o fez, aos poucos, voltar a consciência. Pela primeira vez em dias se sentia quente e confortável, como se estivesse num casulo protetor. Não queria se mexer... Desejava permanecer naquele calor reconfortante para sempre... Lembrou-se da mãe... Pareceu sentir o perfume dela, e também dos pães deliciosos de queijo e das tortas quentinhas de amora silvestre que ela fazia... Teve vontade de chorar...

Subitamente ouviu a voz de Surion falando com seus comandados numa língua rude e se lembrou onde estava realmente. Sentiu o trote do cavalo diminuir o ritmo e percebeu que o barulho que ouvira até então, ritmado também, fora o do coração do Drow e o calor que sentia era o do manto do seu algoz, agasalhando seu corpo. O calor do próprio elfo negro...

Mexeu-se devagar, pois não queria chamar atenção sobre si...

- Até que fim acordou garoto! Estava confortável?

- ...

Helkersim sentou ereto na sala o mais distante possível do corpo do drow.

- Estamos quase chegando... Quero que repense essa idiotice de greve de fome e rebeldia. Vou dizer apenas mais uma vez: Seja esperto e poderá ter qualquer coisa...

A mão de drow passou pelos cabelos de ouro e retirou a venda que usara por todo o caminho...

- Agora você já pode ver onde está indo...

Estavam subindo uma montanha, onde árvores secas do outono ladeavam um lado e outro. Por vezes, uma ou outra flor, um pouco mais resistente ao frio, quebrava o tom marrom que imperava nas folhas caídas que formavam um manto dourado no chão...

Depois de mais uma curva a fortaleza de Surion surgiu... Helkersim prendeu o fôlego Era mesmo um forte medieval... Um castelo imenso, cercado por um fosso largo e profundo. Enquanto cruzavam a ponte elevadiça, várias criaturas os cercaram. Helkersim, surpreso, conseguia identificar elfos negros,anões e alguns meio-orcs.Uns poucos humanos também, mas eram minoria... Várias línguas eram faladas ao mesmo tempo, enquanto as mãos se estendiam para saudar Surion e tocar nele, o meio elfo! Muitos gritavam de curiosidade e excitação ao ver seus cabelos claros e sua pele alva. Mesmo sem querer, assustado com o frisson que sua pele clara causava, Helkersim voltou a encostar-se no drow numa atitude inconsciente, como se procurasse proteção!

O drow acelerou o cavalo para chegar logo no outro lado da ponte, e ordenou que ela fosse elevada.

Depois da ponte, continuou fazendo o cavalo trotar, sem pressa. Sabia o efeito assombrosamente assustador que as altas torres do castelo, com suas gárgulas sombrias, causavam mesmo a luz do dia. Estava deixando que a mente de Helkersim se impregnasse com a grandiosidade do castelo...

Disse ao menino:

- Nós, os drows, já havíamos nos tornados filhos escuros da montanha maldita há mais de um século, quando Leshdas, o nosso líder, resolveu sair da montanha de Mon-Dor e investir contra Wind, a cidade cuja lenda dizia ser ela um portal entre os mundos... Nós conseguimos conquistar uma boa parte das terras entre Wind e Wishar... E começamos a construir uma cidade fora da montanha maldita, chamada Diablerie... Uma cidade negra e reluzente como o ébano...

Surion parou com o cavalo e fez uma pausa. Quando viu que Helkersim o ouvia com os olhos vidrados de curiosidade e fascínio, continuou sua narrativa:

- Mas o Senhor Negro, com seus orcs, fez uma guerra de contra-ofensiva. Depois de muitas baixas, de ambos os lados, Leshdas e o senhor negro fizeram um acordo... A cidade Diablerie teve que ser abandonada e os Drows desocuparam o território de Wind. Enquanto o Senhor Negro dominar a montanha de Mon-Dor não deveremos mais invadir as terras de Wind.É um fato. Porém, os herdeiros de Leshdas e o seu povo ganharam toda uma região entre Wishar e a saída da montanha maldita. Nos tornarmos os guardiões da montanha, e nenhuma outra raça pode nela entrar... É justamente aqui que nós estamos, num elevado que antecede a montanha maldita dos elfos negros, Mon-Dor... Diablerie tornou-se uma cidade perdida,abandonada, mas, cuja localização alguns antigos drows sabem com precisam, mas juraram guardar segredo...

Surion desceu do cavalo e fez com que Helkersim também descesse. Os servos correram para serví-los.

- Descanse, depois, lhe contarei mais as estórias sobre o meu povo... Mas, peço-lhe... Não ande pelo castelo sem estar coberto por manto e capuz...

- Por quê?

Um brilho de preocupação cintilou nos olhos bonitos do drow...

- Você não sabe nada sobre a estória élfica, mestiço?

Helkersim sentiu seu rosto corar de vergonha... Não. A mãe sempre mentira sobre sua origem...

- Não.O que eu deveria saber?

Surion fez menção de dizer algo, quando foi interrompido por uma figura elegante que corria em sua direção...

- Surion, Surion!

Helkersim ficou perplexo diante da beleza da mulher. Era um drow, uma mulher de pele azul escura, sedosa, olhos de gata, cabelos da cor da prata reluzente. Helkersim estava pasmo, nunca havia visto uma mulher tão... Sedutora. Todo o corpo dela, seus gestos e voz, pareciam terem sido feitos para enfeitiçar qualquer homem, mortal ou não. Pela qualidade do diáfano vestido que usava, e pelas jóias, era uma pessoa de altas posses... Ou talvez...

O sorriso da mulher morreu e ela fremiu de ódio quando viu o acompanhante de Surion. Cuspiu no chão...

- Não é possível! Você trouxe um elfo para os nossos domínios! SACRILÉGIO!

Surion não se abalou. Deu de ombros...

- Lisandra, não me lembro de ter chamado você a minha presença. Volte para o harém e fique lá. E escute bem, não comece a criar problemas com sua boca grande, o menino não vai ficar por muito tempo...Quero que você controle a curiosidade das mulheres e providencie para que ele seja alimentado e vestido.

Ela estremeceu de raiva por ter sido dispensada... Ajoelhou-se diante do amo.

- Senhor! Um elfo da luz aqui é mau agouro! Mate-o.

Surion riu...

- E perder a mercadoria mais cobiçada de Vynn? Lisandra, quando eu precisar de conselhos, eu peço.Agora vá.

Ela lançou mais um olhar mortal para Helkersim antes de sair da presença deles. Surion disse, bem humorado...

- Parece que minha serva já lhe mostrou o que é que um Drow mais odeia na vida... Elfos. E isso inclui os mestiços, como você...

-

CONTINUA...


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Beijos
Jade Toreador