DISCLAIMER: os personagens (exceto pela OC) e o universo onde estão pertencem à J.K. Rowling, eu sou uma mera mortal brincando com eles de madrugada.


PRÓLOGO


O cigarro já estava quase chegando aos seus dedos quando Evelyn Greenwood acordou do seu transe ao lado da janela e o apagou no cinzeiro improvisado no canto do parapeito. Expeliu a fumaça do seu último trago com pesar, levou as mãos à cabeça e se deixou descansar nesse abrigo temporário. Sua têmpora latejava e ela começava a ver alguns pontos de luz no horizonte. De repente se deu conta de que estava muito mais frio do que seu pijama poderia aguentar e puxou um casaco grosso das costas de uma cadeira, jogando-o sobre seus ombros. Respirou fundo e olhou pela janela mais uma vez, antes de baixar os olhos para o papel que tinha deixado ao lado do cinzeiro. Era uma carta que ela não esperava receber, embora o conteúdo dela não fosse nenhuma surpresa; ela aguardava essa notícia há anos, mas esperava vê-la primeiro nos jornais, e não em uma carta endereçada a ela; nos últimos anos, tinha adquirido o hábito de somente passar os olhos pelo jornal local, mas escanear minuciosamente o jornal de seu país de origem. Mas, embora as manchetes tivessem se tornado cada vez mais sangrentas nos últimos tempos e ela tivesse visto o nome dele algumas vezes - quase todas fazendo com que seu estômago revirasse de leve ao pensar em que tipo de pessoa ele havia se tornado -, ela se pegou naquela noite lendo naquela letra familiar, inclinada e cuidadosa, a notícia que ela, ao ir embora de casa aos 18 anos, tinha evitado ao máximo de receber. Mas, seja lá por qual motivo exatamente, alguém se lembrou dela, e ela agora relia pela milésima vez a carta que dizia que Severus Snape estava morto.


CAPITULO 1


A primeira vez que se falaram foi numa sexta-feira gelada pouco antes do recesso de Natal do seu quarto ano em Hogwarts. Os dois haviam ingressado na escola no mesmo ano e haviam sido selecionados para a mesma casa, mas, curiosamente, nunca haviam interagido - já que para ser considerado como uma interação o ato requer ação de ambas as partes. Ela já havia tentado se aproximar dele, mas ele nunca havia sequer olhado para ela. Se Severus era alvo de alguma atenção, mesmo que negativa, por parte de algumas pessoas na escola, como aqueles garotos da Grifinória, ela não chegava nem a isso: as pessoas não se lembravam que ela existia. Ela já havia se incomodado muito com isso, mas havia se acostumado. Era melhor assim, evitava qualquer tipo de incômodo. Então naquele dia, quando estava atravessando os terrenos, tentando enfiar o exemplar da biblioteca de Poções muy potentes na sua bolsa já cheia demais, ela não sabe muito bem o que a fez agir como agiu. As vozes vieram de algum lugar à sua esquerda e ela imediatamente as reconheceu: era um dos grifinórios, Black, discutindo com Severus. A família dela era próxima à de Black, e embora eles se conhecessem desde crianças, haviam optado por se ignorarem mútua e solenemente na escola, já que não tinham nenhum motivo real para serem amigos ou inimigos; a melhor opção era fingir que não existiam. Sem pensar, desacelerou o passo, olhou demoradamente na direção de onde vinham as vozes e seguiu para lá. Atrás de uma das estufas encontrou os dois: varinhas apontadas um para o outro, Severus com o semblante tenso, Black com o mesmo ar despojado e despreocupado de sempre.

- Anda, Snivellus. Estou te dando a vantagem do primeiro movimento.

Eles se mediam e Severus parecia calcular cada movimento que pudesse vir a fazer. Ela pisou num galho seco, que estalou e distraiu os dois: Severus se virou rapidamente na direção dela, enquanto Black, que se desconcentrou por um instante mínimo, levantou novamente a varinha, pronto para lançar uma azaração em Severus. Antes que Evelyn se desse conta do que estava fazendo, sua varinha já estava apontada para Black, e com um clarão, surgiu um corte fino no rosto dele.

- O que…? - ele começou a dizer, sentindo algo quente em seu rosto, e ao tocá-lo com os dedos e ver o sangue, seus olhos se estreitaram na direção dela, mas ele abaixou a varinha. - Então agora você tem uma namorada pra te proteger, Snivellus? Bom, eu não levanto minha varinha contra garotas… a gente se vê por aí, quando você não estiver usando ela de escudo.

Ele passou por Evelyn, os olhos ainda estreitos, e seguiu em direção ao castelo. Ela abaixou a varinha lentamente, evitando olhar na direção de Severus, embora sentisse o olhar dele nela. Lentamente se conscientizando de que ofegava, tentou controlar a respiração, ajeitou a bolsa no ombro e se virou para continuar seu caminho.

- Por que você fez isso?

Ela parou. Podia sentir a presença dele, aguardando uma resposta. Ela não sabia se devia responder, principalmente porque não tinha realmente uma justificativa para ter feito o que fez. Virou-se, olhou para ele, que parecia genuinamente interessado em saber o que ela tinha a dizer. Ela deu de ombros, sem graça.

- Os sonserinos devem cuidar uns dos outros, certo?

Ela viu surgir um vinco entre as sobrancelhas dele.

- Eu não preciso que você cuide de mim.

- Eu sei.

Ele veio andando na direção dela, que sentiu o rosto esquentar, mas ele abaixou e estendeu alguma coisa para ela.

- Você deixou isso cair.

Ela pegou o livro que estava tentando colocar na bolsa quando ouviu as vozes dos dois. Mal havia tocado o livro quando viu que ele havia também estendido sua mão num cumprimento.

- Snape. Você é Greenwood, certo?

- Eu- sim. Pode me chamar de Evelyn.

Ela jamais esqueceria o toque frio da mão dele na mão recém-saída da luva dela. Talvez fosse ilusão, mas sempre que se lembrasse daquele momento, iria jurar ter visto um esboço de sorriso no canto da boca dele. Por um momento pareceu que andaria juntos para o castelo, mas rapidamente a cena se desfez. Murmurando uma despedida qualquer, ele acelerou o passo e seguiu na frente dela. Ela desistiu de colocar o livro na bolsa e seguiu em frente com ele na mão.

Que tolice tinha sido achar que aquilo os transformaria em amigos! Ele não tinha nenhum motivo para ser amigo dela. Ninguém tinha interesse em ser amigo dela - e, de qualquer forma, ele já tinha uma amiga. Evelyn tinha visto os dois juntos algumas vezes ao longo desses quatro anos que estudavam juntos: com muita frequência no primeiro ano, um pouco menos no segundo, menos ainda no terceiro, e podia contar no dedos o número de vezes que tinha visto os dois interagindo esse ano. Eles não pareciam ter brigado, entretanto; provavelmente era só um movimento natural; ela nunca tinha entendido como um garoto como ele, da Sonserina, andando com as pessoas que ele andava e tendo conflitos com os garotos mais populares da escola, poderia ter algum tipo de amizade com aquela garota bonita, da Grifinória, que parecia ter sempre uma luz em torno dela. Parecia natural que, fosse qual fosse o histórico da amizade deles antes da escola, aquelas circunstâncias os afastassem.

Mas, ainda assim, era mais do que ela tinha: todas as pessoas que conhecia quando entrou na escola haviam se afastado dela por algum motivo (e ela não reclamava de nenhum dos casos): Sirius achava que ela era sonserina demais; os sonserinos achavam que ela era sonserina de menos. Então ela se acostumou a não ter dupla nas aulas, a não ter companhia na hora do almoço, a não ter com quem comentar os deveres. Ela respondia o que era perguntado a ela, perguntava quando não tinha outra alternativa; a isso se resumia suas interações sociais na escola, e ela estava bem assim.

Por isso havia ficado tão incomodada com a própria atitude naquele dia; por isso havia ficado tão sem ação quando Severus se dirigiu a ela; por isso não sabia o que fazer quando, sentada na mesa de almoço aquele dia, vendo do outro lado do salão o olhar de Sirius Black diretamente dentro dos olhos dela, teve a visão bloqueada por Severus, que se sentou a sua frente e disse, claramente lutando contra si mesmo para fazer as palavras saírem:

- Então você gosta de Poções?