Cidade de Nova York, 17 de dezembro de 2019. 21:32 PM
"São 5 dólares." Digo para o ultimo cliente em meu café. Um homem com cerca de uns trinta anos, sozinho. Ficou a noite inteira reclamando da vida. De como sua mulher o trocou por um adolescente e que em seu emprego que ele está ha 13 anos, uma pessoa que chegou ha 2 anos já consegue subir de cargo, e ele não.
"Obrigado pela atenção." Ele diz enquanto joga uma nota de 5 dólares no balcão.
É, talvez eu não seja muito diferente dele. Estou aqui, com meus 26 anos, sozinha. Não que eu não tenha passado a maior parte da minha vida sozinha também, mas é natal. É triste passar o natal sozinha. Talvez na véspera eu vá para algum bar na cidade, encha a cara e faça a mesma coisa que esse homem. Reclame.
Ascendo um cigarro e vou até a porta pra colocar a placa 'fechado'. Nunca consegui perder o vicio depois que comecei na adolescência. Parei por um mês, depois que tomei outro fora, comecei de novo. Eu sempre faço isso, depois que o último cliente se vai, eu ascendo um cigarro e tomo meu café.
Eu sei, um pouco triste pra uma garota que quando era adolescente, todos juravam que teria tudo, o mundo aos seus pés. Eu também acreditava nisso, até eu engravidar e tudo virar de ponta cabeça. Eu poderia até fingir que nada tinha acontecido, mas eu sabia de tudo que eu tinha passado. Cada esbarrada de algum idiota insensível no corredor da escola; cada noite que eu chorei sozinha na casa de pessoas que eu mal conhecia; cada olhar fulminante das pessoas daquela cidade maldita. Eu sei, eu sei, foi há muito tempo atrás. Eu conheci Beth, agora ela tem 6 anos, e ela é uma garotinha linda, tem muito sorte de ter a mãe que tem. Shelby cuida dela muito melhor do que eu cuidaria. E isso me conforta, conforta a dor de não ter minha filha comigo.
Mas ainda assim, uma semana para o natal, e estou aqui no meu 'café', fazendo o que eu faço todas as noites, sozinha.
Estou sentada em frente ao meu notebook, com meu cigarro no cinzeiro, quando ouço o sino da porta da entrada balançar, sinal de que alguém entrou. "Ninguém entende a palavra 'fechado'"? Penso em voz alta. Corro para a entrada para ver quem é que precisa de café às 22:00 horas da noite e a pessoa, uma mulher, esta de costas, olhando pelo vidro da porta para o lado de fora, parece estar se escondendo de alguém. "Hey" eu grito. "Não viu que está fechado?".
"Eu sei, me desculpa, eu..." Ela se vira.
Deus, eu nunca imaginei que iria ver ela de novo, não além de nas noticias da TV e nos jornais. A garota que no colegial eu fazia da vida um inferno na terra, a garota que eu chamava de perdedora e se tornou uma das maiores celebridades da atualidade. A morena judia que se achava feia, que está e sempre foi linda, linda.
"Quinn?" Ela tem a sobrancelha franzida, o cara de surpresa, eu também devo estar mais ou menos assim, porque não consigo ver meu rosto agora. Mas devo estar em choque.
"Rachel..."
"Oh meu Deus, Quinn Fabray?"
Eu sorrio de leve, algumas coisas nunca mudam. Rachel provavelmente vai fazer um belo de um drama agora. Ela ainda está parada olhando pra mim, provavelmente esperando minha confirmação.
"Sim, Quinn Fabray. E você, se não for alguém muito parecida com Rachel Berry, é ela mesma, não é?"
Pergunto tirando sarro da situação. Ela abaixa a cabeça, percebo um pequeno sorriso em seu rosto, ela levanta o rosto com um sorriso fechado. "Sim, sou eu".
Agora fechamos o primeiro ato. Reconhecimento de ambas feito, vamos iniciar o segundo ato.
"Meu Deus, Quinn. O que você esta fazendo aqui?" Ela me pergunta se aproximando.
"Na verdade acho que eu deveria estar fazendo essa pergunta." Ela me olha com espanto, acho que nem se lembra da razão de ter entrado aqui em primeiro lugar, devido ao choque inicial de ter encontrado a ex-cheerleader que atormentava a vida dela e chamava-a de nomes horríveis no colégio.
"Eu... Eu estava na casa do meu namorado, num prédio aqui perto. Quando eu saí havia provavelmente um milhão de paparazes a minha espera" Eu viro os olhos. Mesma modéstia de sempre. Ela continua a explicar. "Então, eu precisava entrar no lugar publico mais próximo. Desculpe, eu nem sequer li a placa. Eu só girei a maçaneta e quando abriu, eu entrei." Ela sorri pra mim, tentando pedir desculpas com o sorriso. O que ela esta fazendo, eu deveria estar pedindo desculpas. Não que eu vá fazer isso, mas ainda posso pensar, ela não pode ler meus pensamentos.
"Tá ok, Rachel. Imagino que pra você ter entrado aqui realmente haja um razão." Se não uma razão dela, provavelmente dos Deuses, ou o universo, sei lá.
Ela ainda esta parada me encarando com esses grandes olhos castanhos. Rachel não mudou muito. Ela está com o cabelo mais comprido, ainda com sua franja cobrindo a testa. Em alguma revista eu li que essa é sua grande marca. Ela está usando um casaco, devido ao frio que estava lá fora, mas logo imagino que ela tire, devido ao ar condicionado. Agora ela está tirando, e lá estão elas, mesmas pernas torneadas e bronzeadas, ela esta usando um vestido azul escuro, nem muito comprido e nem muito curto. Uma coisa que realmente mudou nela: Ela obviamente aprendeu a se vestir melhor, a não ser que ela tenha algum tipo de personal stylist na casa dela, se bem que sendo Rachel Berry, eu não duvido.
"Esse lugar é seu?" Ela pergunta girando-se, olhando pra o interior do lugar.
"Sim, meu." Respondo acompanhando ela, olhando para o lugar também.
"Há quanto tempo você está aqui?" Ela pergunta agora voltando seu olhar pra mim.
"Dois anos."
Ela ainda está me olhando. Droga! Provavelmente ela está esperando que eu conte toda a história da minha vida.
Eu suspiro e continuo.
"Logo depois que eu me formei na faculdade, eu voltei pra Lima, devido a notícia que meu pai havia falecido."
Ela abre a boca, pronta pra dizer uma palavra de conforto, mas eu a corto a tempo.
"Tá tudo bem." Eu digo, ela concorda com a cabeça e espera pra que eu continue minha história.
"Ele deixou grande parte do dinheiro pra família. Pra verdadeira família dele. Então, eu peguei a minha parte e me mudei pra cá. Precisava aplicar o dinheiro em algum lugar. E vi que esse lugar estava a venda, então, eu o comprei." Termino minha explicação com o balançar dos ombros.
Ela está olhando pra mim ainda, procurando palavras, talvez.
"Uau!" Ela finalmente diz. "Eu nunca poderia imaginar tudo isso. Quer dizer, eu nunca poderia imaginar nada disso. A única pessoa do ensino médio que eu mantenho contato é Kurt. Mas, porque ele está aqui também. Nunca tive notícias dos outros, e você esteve aqui durante dois anos, por que não me procurou?"
Eu ri. Sério que ela está me perguntando isso?
"Rachel, por favor. Como eu poderia sequer me aproximar de você? Você é super famosa, provavelmente alguns do seus seguranças iria me dar um empurrão... e"
"Claro que não, Quinn!" Ela quase grita. "Eu nunca permitiria algo assim." Ela me encara. "Nem com você e com ninguém. Ninguém deve ser tratado assim."
Ok, ela está certa, agora quem fez drama fui eu. Na verdade eu sempre quis procura-la. Só não havia a menor possibilidade de isso acontecer. Claro, eu não iria chegar 'Hey, Rach, quer ser minha amiga? Desculpe-me por tudo e vamos esquecer o passado? Eu prometo que não vou te chamar de manhands'.
De jeito nenhum. Eu posso ter mudado bastante, mas, eu ainda sou eu. Eu ainda sou orgulhosa e uma bitch. Ok, não realmente uma bitch, mas, eu tento.
"E você, mantem contado com alguém do Glee Club?" Ela me pergunta enquanto eu volto buscar meu café e meu cigarro.
"Não... Quer dizer, eu fiz faculdade com Santana, mas depois, nunca mais falei com ela pessoalmente. Às vezes ela me manda e-mails, mas, nada mais que isso." Eu respondo enquanto ascendo meu cigarro. Ela parece estar morrendo de vontade de me falar todos os males que o cigarro faz, mas não somos tão intimas assim, não é Rachel?
"Que faculdade você fez?" Ela me pergunta sentando no banco ao meu lado, a frente do balcão principal.
"UCLA." Eu digo tragando meu cigarro.
"Sério?" Ela parece bem empolgada. "O que você cursou?"
"Design Communication Arts."
"QUINN!" Agora eu quase derrubo meu café. "Isso é maravilhoso! Quer dizer, quantos do Glee Club resolveram seguir artes? Eu achava que era só eu e Kurt, eu nunca imaginei que você faria algo relacionado, Quinn!"
Como ela pode ser tão feliz? Ela parece não ter notado que eu não estou exercendo nada relacionado ao meu trabalho, não é? Atrás de um balcão em Nova York, claro, tirando as fotografias que eu tirei que estão na parede, não vejo muita arte ao meu redor.
"Rachel, não se empolgue tanto, ok?" Digo tentando acalma-la, e ela parece estar se recompondo. "Eu não estou trabalhando com isso. Todo meu trabalho está aqui. Literalmente." Agora ela olha pras paredes do local, se aproximando de algumas fotografias. "O que eu realmente gosto de fazer, é fotografar."
"Você tirou todas essas fotografias?" Agora ela andava observando cada foto na parede do local.
"Sim." Respondo.
"Elas são muita boas, Quinn." Agora ela vira-se pra mim. "Você é muito boa."
Ok, agora ela me pegou. Ninguém nunca disse isso sobre minhas fotos. Sobre mim. Nem minha ex-namorada que parecia realmente gostar de mim. Eu sei, eu sei. Ex-namorada? Sim, eu gosto de meninas. Mas eu não ando com uma placa no meu pescoço escrita – Hey, eu sou lésbica. Até porque não me considero lésbica, eu só, gosto de meninas. Isso não é um fato recente também. Faculdade, sabe? Tudo muda na faculdade, ainda mais quando você divide o quarto com um tal Santana Lopez. Bom, ai já têm alguns detalhes que eu prefiro não contar.
"Obrigada, Rachel." Digo olhando pra ela.
23:20 PM
Agora estamos na mesa, parei de agir feito uma idiota e finalmente ofereci um café pra ela. Conversamos bastante desde a hora que ela surpreendentemente entrou aqui. Estou me sentindo mais à vontade agora, ela, como sempre, parece sempre à vontade. Conversamos mais sobre assuntos da faculdade, Rachel realmente queria saber cada detalhe da minha vida. Confesso, eu acho isso divertido. Há muito tempo não vejo ninguém sentir algum interesse assim por mim, quer dizer... Pela minha vida.
Conversamos bastante sobre a carreira dela também. Ela se tornou realmente uma estrela. Depois de atuar na Broadway por dois anos ela foi chamada pra fazer filmes, muitos deles de sucesso. Ela é uma grande atriz e cantora, mais do que isso. Ela tem talento. Ela tem esse brilho nos olhos que quando você realmente não aprecia as qualidades dela, chega a irritar. Eu muito bem sei disso. Mas quando você reconhece o talento, esse olhar não incomoda, mas sim, te faz ter um tipo de... Esperança.
"Então, Quinn, como está sua vida? Quer dizer... você está solteira, casada?"
Oh, Rachel, sério que você está me perguntando isso? Não olhou o suficiente pra minha mão e não viu nenhuma aliança, não é? É, não iria demorar muito pra esse assunto chegar.
"Eu estou sozinha, e bem longe de estar casada."
"Sério"?" Surpresa. "Eu sempre achei que quando nós chegássemos aos 26 eu seria quem estaria sozinha." Uau, essa doeu, e ela percebeu. "Desculpe." Ela disse tomando um gole de café, tentando esconder a vergonha atrás da xícara.
"Certo, e você?" Pergunto tentando não deixa-la desconfortável, apesar dos pesares.
"Bom, como eu disse, meu namorado vive aqui perto." Ela diz com um sorriso no rosto. "Na verdade ele é mais que um namorado, ele é meu noivo." Hum, eu já tinha notado a rocha em cima no anel dela. "Vamos nos casar logo depois do natal, em fevereiro."
"Por favor, não diga que seu noivo é Finn Hudson." Digo isso em um tom cômico, fazendo a morena na minha frente gargalhar. É bem aquilo, 'Um dia vamos rir do garoto que nos fez inimigas no passado'.
"Não, não é o Finn. Na verdade, você o conhece também." Ela diz mordendo os lábios logo em seguida. Eu levanto minha sobrancelha, "Eu não quero dar meu palpite porque eu tenho medo que seja ele, então é melhor você dizer de uma vez." Digo mais uma vez tentando fazer graça, ela ri de novo.
"Jesse St. James." Ela diz rapidamente.
"O que? Você está brincando comigo, não é?" Agora eu estava bem surpresa.
"Não." Ela diz.
"Rachel, esse cara é um idiota, ele jogou uma granja em você!" Ela virou os olhos e suspirou.
"Bom, você também não foi uma das melhores pessoas comigo." Ah, agora ela quer discutir.
"Sim, mas você não vai se casar comigo." Digo sorrindo.
Ela está com um olhar muito esquisito agora. Meio tentando entender o que eu acabei de dizer, mas também parece aquele olhar quando ela está com raiva de alguma coisa. Ok, agora mudou, ela realmente parece estar com raiva. Do que? Será do que disse? Será que ela quer se casar comigo? O Que diabos eu estou pensando?
Ela pega o celular dela pra ver a hora. "Está tarde, eu devo ir."
Ela se levanta, eu me levanto também. Ela anda até a entrada, pega seu casaco e o veste. Ela me de um ultimo olhar. "Obrigada por deixar eu me esconder aqui." Ela diz num sorriso fechado, pronta pra abrir a porta. E eu não quero que ela vá? Espera, tem algo de errado, ela não pode ir simplesmente assim, pode? Não deveríamos trocar telefone, email, endereço ou qualquer coisa? E antes que eu pudesse me controlar.
"Hey!" Digo pegando no pulso dela.
Ela olha pra minha mão segurando o pulso, provavelmente essa é a primeira vez que eu a toco, tirando a vez que eu bati nela. Ugh, não acredito até hoje que eu fiz isso.
"O que?" Ela me pergunta surpresa. Claro que ela esta surpresa. O que você pensa que está fazendo Quinn Fabray?
"Eu, eu... talvez nós pudéssemos sair algum dia desses, quer dizer. Você mesma disse que eu deveria ter entrado em contato com você. E bem, agora, nós já fizemos contato e sei lá, não seria estranho... pra você, seria?"
Que diabos eu estou parecendo uma idiota? Sério? Primeiro eu agarro o pulso dela e depois começo a gaguejar como se eu tivesse a chamando para um encontro? Espera, ela está rindo, isso bom, eu acho.
"Claro, Quinn." Ela me diz sorrindo. "Talvez eu passe aqui pra tomar um café." Ela diz olhando nos meu olhos, mordendo o canto da boca. E Isso sim foi realmente estranho e... sexy.
Ela deixa o local, e eu assisto pelo vidro da porta ela atravessando a rua e pegando um taxi.
Volto-me para o balcão, pego minhas chaves, desligo a luz da parte de trás. Venho andando pelo canto, olhando pra parede que continha minhas fotografias. Chego até a porta de entrada, apago as luzes de dentro, e ligo a luz que ilumina o nome do lugar 'Blue Spoon Coffee'.
Deixo o local e vou até meu carro, e dirijo até meu apartamento.
"Foi uma noite de surpresas..." Penso em voz alta enquanto dirijo.
