A Caixinha
Apesar de tudo, ela colecionava fitas. Quem era ela? A guerra ao seu redor pronta para destruí-la e ela colecionava fitas.
Mas mantinha isso em segredo, em uma caixinha de papel cinza. Mas a caixinha era envolta por uma fita. Cinza. E ela brilhava porque, enquanto outros colecionavam sofrimento, ferimentos e lápides, sua coleção era de fitas.
Quem quer que abrisse a caixinha cinza-pálida encontraria o brilho colorido dela em cada rolinho de fita que guardava uma e outra cor. Aquele mundo tão cinza quanto a caixinha abrigava uma garota tão colorida quanto suas fitas – cada uma com uma textura, um comprimento e largura, uma cor e um tom – mas todas faziam parte de sua coleção e todas faziam parte dela.
Ela não sabia.
Mas ele sabia, e isso era suficiente. Quem era ele? Quem – no mundo – era aquele ser que se sentia suficiente para saber de seu segredo? Bem, talvez seu inimigo mortal. Ambos sabiam que não, porém. Naquela guerra, sabiam, ele era apenas um boneco – uma marionete. O fazia por razões maiores do que ele. Mas, numa tarde descobrira uma caixa cinza, envolta por uma fita de cetim e, dentro estavam todos os cachos do cabelo dela. Dentro estavam suas cores, suas texturas. Ela poderia começar outra coleção de fitas, mas ele nunca encontraria outra. E, por isso, ela nunca mais vira sua caixinha cinza novamente, seus sonhos emaranhados em forma de tão palpáveis, coloridos, pedaços de tecido. Tão organizada como era, sabia que não a perdera. Ela a cedera. Cedera para alguém que precisasse de sonhos tão bonitos aos quais se agarrar, se prender, se perder.
Entretanto nunca descobriria que seu legado fora cedido para aquele menino, menino-prateado que se parecera tanto com a caixinha, outrora.
