Heart's on fire

By Theka Tsukishiro

Disclaimer: Saint Seiya não me pertence... Pertence sim ao tio Kurumada e etc, etc e etceteraetal. Se você não gosta de Yaoi e Lemon (cenas de sexo entre homens) não comece a ler essa fic. Pode fechar ali em cima no xizinho, ou mesmo clicar em voltar em seu navegador, pois não vou aceitar nenhum tipo de reclamação ou comentário maldoso. Ler é por sua conta e risco. Essa fic é sem fins lucrativos, apenas para diversão minha e de quem ler.

Lembretes: Essa fic é UA, angst (um pouco), Deathfic, romance e não apropriada para menores de 18 anos.

Agradecimentos: Agradeço à minha beta e amiga querida, Nana por sempre estar presente nas horas mais inusitadas, mostrando-me que eu conseguiria sair das maluquices em que eu me colocava. Também quero agradecer a Eliz por muitas vezes aturar minhas neuras e me dar uns toques e por último, mas não esquecida; a minha irmã Tay-chan por que... Ah bem... Ela sabe! Adoro vocês!

Presente de Amigo Secreto do Fórum Saint Seiya Dreams 2009

Virgo-chan

Confesso que quando comecei a escrever essa fic, nem me passou pela cabeça que ela poderia ficar desse tamanho. Querida Virgo, espero que goste do que acabou de ler. Tentei muito agradar-lhe. Se por ventura não ficou de seu agrado, peço que me desculpe, pois não tenho costume de unir ao casal Poison e Ice o geminiano gostoso. Tentei, pelo menos posso dizer que tentei! E me sinto realizada.

Mais uma vez espero que goste.

Beijos de sua amiga não mais secreta. ~.^

oOoOoOo

Capítulo 1

Para sempre seu

Verão de 2007 – Grécia

Por mais que estivesse no país há mais de sete anos, ele não conseguia acostumar-se com as temperaturas elevadas daquela estação. Voltou seus olhos para os lados. Os óculos de sol protegendo-lhe a visão. Constatou que estava sozinho. Caminhou alguns poucos passos e parou fixando o olhar em um ponto, mas não um qualquer. Fechou os orbes castanho-avermelhados tentando forçar-se a não acreditar em nada do que estava passando, mas acontecera não? Suspirou.

Voltou seu rosto para o céu azul, límpido. Nem mesmo a leve brisa refrescante amenizava a tortura à qual era submetido. Fitou a rosa em sua mão direita. Rosa de um vermelho escarlate, quase vinho em algumas partes, que era levemente agitada ao sabor da brisa. Levou-a até próximo às narinas, inalou a suave fragrância e, com um beijo nas pétalas sedosas, deixou-a repousando sobre a grossa camada de mármore. Essa é considerada a rainha das flores e consagrada pelos amantes como a flor dos enamorados... Do amor.

"Símbolo do amor!" – Bufou. Não se prendia a essas crendices. Menosprezava-as, assim como fazia com tudo o que lhe parecia subjetivo. Para ele, apenas o racional tinha lógica. Acreditava naquilo que podia comprovar. Nada mais. E, exatamente por culpa disto, agora estava ali. Havia controlado-se até aquele momento. Permanecera impassível, mas não fora tão forte. Uma única lágrima marcara-lhe o rosto alvo. Tinha de manter as aparências. Era considerado, por motivos muito óbvios, uma pessoa fria. Um dos pilotos mais condecorados. O exemplo para muitos aspirantes. Limpou o rosto discretamente.

"Hipócrita! É isso que sou! Não passo de um medíocre covarde!" – Pensou ao volver sua cabeça um pouco para trás. Parado perto dos carros avistou seus amigos. Voltou seus olhos para a rosa e esqueceu-se novamente da presença deles ali. Baixou um pouco a cabeça.

Não devia tê-lo deixado partir. Ignorou os sinais que lhe foram dados. Não seguiu assumindo a responsabilidade quando esta fora necessária. Deixou-o ir. Seu amado! Partiu sozinho e ele não derramou uma lágrima sequer. Não sentiu? Sim, sentiu. Um aperto no peito, um nó na garganta e a impotência de muitas vezes nada dizer-lhe. De não demonstrar seus sentimentos quando necessário.

Sua mente vagou pelo tempo, pelo espaço. Sua vida desde o momento que em terras helênicas chegara, passou feito um flashback. Sentiu-se estranho. Quem costumava divagar era o homem alto, loiro de olhos claros. Músculos perfeitos. Olhar ora doce, ora malévolo. Não era bom. Não era mal. Era, apenas, o homem que amava. Ciente disso, sentia agora a frustração de não tê-lo segurado ao seu lado, de não ter conseguido convencê-lo de não fazer aquilo. De não partir.

Deixou que novo suspiro escapasse de seus lábios. Fincou os olhos na rosa sobre o granito. O vermelho sedoso remetendo-o para um tempo onde tudo ainda era diferente. Onde seu coração ainda não havia sido quebrado e debilmente ferido. Parecia até que, ao fechar os olhos, poderia ouvir o tão conhecido barulho de seu antigo bimotor. Deixou que a lembrança o tomasse e o arrebatasse para um lugar um tanto mais calmo.

o~o~o~o

No silencioso infinito azul, borrões cruzam os céus. A paz e a tranquilidade sendo quebradas pelo barulho de duas aeronaves cortando as nuvens e vencendo a distância que separa a França da Grécia. As hélices dos bimotores girando velozmente impulsionavam-nos para que logo chegassem ao seu destino. As cores berrantes, vermelho e amarelo, faziam que os hidroaviões lembrassem dois borrões vistos de terra firme.

Dentro, homens valentes que arriscavam suas vidas em prol do próximo. Intrépidos combatentes terrestres das chamas e dois cavaleiros alados em seus reluzentes bimotores. Pelo rádio, comunicavam-se pouco e só o faziam para passar o tempo. A viagem não era longa, mas estavam sobrevoando as águas azuis do mar Adriático* já há algumas horas.

Os melhores entre os melhores haviam sido escolhidos para que fossem prestar auxílio no que poderia ser considerada a maior das calamidades daquele ano em terras helênicas. Muitos países estavam prestando socorro à Grécia para controlar e extinguir as áreas de queimadas, mas as altas temperaturas e os incêndios propositais estavam quase destruindo toda uma parte de floresta nativa e chegando a pequenas cidades, ameaçando a vida da população local.

Todos estavam cientes dos perigos que enfrentariam, mas mesmo assim ali estavam: prontos para levar esperanças e tentar conter uma desgraça que poderia ser maior. Ao avistarem a costa grega, novamente o rádio foi acionado.

- Roux, estamos quase lá. – A voz levemente rouca invadiu-lhe os ouvidos pelos fones.

- Oui, eu já tinha visto, Blond. Creio que pelos meus cálculos, mais uns vinte minutos de voo e estaremos sobrevoando a base da Brigada de Incêndio Grega de Corinto. – Respondeu ao olhar os instrumentos. Ao longe, nuvens negras carregadas de fuligem podiam ser vistas a noroeste. O contraste com o céu límpido era gritante. – Pelo visto, teremos muito a fazer. – Comentou ao acaso.

- Tem razão, mon ami. Mas estou pronto para bombardear esse 'foguinho'. – Riu debochado ao pronunciar a última palavra.

Revirando os olhos, o primeiro piloto fez uma leve manobra alterando o curso. Foi seguido prontamente pela segunda aeronave. Blond] entendia perfeitamente que quando seu amigo Roux nada dizia era com certeza por que deveria ficar quieto. Ele estava concentrando-se para a nova missão e não deveria ser atormentado. Muito sério e competente, com apenas vinte e dois anos já era reconhecido no que fazia, e fazia muito bem.

Deixando a imensidão azul do mar, os dois bimotores Canadair CL-215 começaram a sobrevoar terra firme. Muito pouco comunicaram-se entre si para prestar atenção às coordenadas que eram passadas pela torre de comando do aeroporto de Corfu. Desviados das rotas de aviões comerciais e de voos domésticos, em pouco tempo Roux e Blond avistaram ao longe o canal de Corinto.

- Monsieurs, estamos chegando. – Avisou ao resto dos homens que acomodavam-se entre muitas coisas dentro do bimotor. – Foxtrot – Charlie – Bravo – dois – cinco – um, procedente da base de Paris pedindo permissão para pousar, over. – O leve sotaque francês misturado ao inglês, o tom frio e impessoal. Estava a serviço e a seriedade sempre fora uma de suas mais marcantes características.

- Foxtrot – Charlie – Bravo – dois – cinco – dois, solicitando também permissão para pousar, over. – Blond identificou-se, também esperando receber as coordenadas para o pouso.

- Avião Foxtrot – Charlie – Bravo – dois – cinco – um. Favor pousar na pista um à sua direita. Foxtrot – Charlie – Bravo – dois – cinco – dois. Favor ficar no aguardo enquanto a pista dois é liberada, over. – O controlador da base remexeu-se na cadeira. Os olhos ávidos e muito azuis acompanhando a aproximação das duas aeronaves no radar. Pressentindo que não estava mais sozinho, voltou-se para saber quem era e abriu um leve sorriso. – Eles chegaram, Mask!

O italiano, que há mais de cinco anos encontrava-se no grupamento, voltou seus olhos para as grandes janelas da torre. No horizonte, já podia-se ver as aeronaves, pequenos borrões no infinito azul.

- Hmm... – Grunhiu ao coçar o queixo. Os olhos estreitos. Os óculos de sol protegendo-os contra os raios fortes do sol do meio dia. – Estão chegando em boa hora, Sentry! – A voz grossa, o olhar arguto por sobre os óculos. O barulho chamando a atenção de ambos.

- Oh, droga!

- O que está acontecendo? – Perguntou Mask. Aproximou-se do radar e localizando o ponto brilhante com a identificação do Bombardier 415 de Voyage. – Sentry, eles estão em rota de colisão. – A voz alterada, o semblante carrancudo.

- Sierra – X Ray na escuta? Manobra de retorno à direita agora, over! – Sentry não desviava os olhos da tela do radar. Ele não esperava que Voyage voltasse tão cedo. – Sierra – X Ray... Voyage? Você está na escuta?

Com um binóculo, Mask voltou as poderosas lentes na direção do hidroavião. – Caspita! Ele está sem rádio! – Disse ao notar a falta da antena acima da cabine do piloto. Ágil e sem muito pensar, o italiano sentou-se ao lado do controlador de voo, plugou um dos fones e observou quanto tempo tinha. – Foxtrot – Charlie – Bravo – dois – cinco – um. Favor arremeter à esquerda e subir para quatro mil pés! Arremeter à esquerda e subir para quadro mil pés, over!

Nos céus, Roux arregalou os olhos ao ver-se em linha de colisão com o Bombardier. Ao escutar as ordens da torre de comando, puxou o manche o mais rápido que pode e virou à esquerda fazendo o Canadair ganhar altitude.

- Entendido. Over! – Respondeu sem demonstrar o que estava sentindo.

Acompanhando a tudo pelo radar, Sentry e Mask levantaram-se das cadeiras e seguiram para a janela lateral com o intuito de terem certeza de que nenhuma fatalidade fosse ocorrer. Os dois hidroaviões desviaram com alguma sobra de espaço evitando assim o acidente. Após trocarem uma rápida olhadela, Sentry deixou o italiano e voltou para seu posto. O ar escapando lentamente de seus pulmões.

- Torre de comando o que estão tentando fazer? Estou com quinze pessoas dentro deste Canadair. Over. – Roux reclamou. A voz fria não revelando a raiva que estava sentindo.

- Foxtrot – Charlie – Bravo – dois – cinco – um, ao que parece um dos nossos está com pane no rádio. Aguarde até nova liberação, isso também serve para você dois – cinco - dois, over. – Sentry bufou e fechou o canal do rádio assim que ouviu uma resposta afirmativa do segundo bimotor. Com os olhos, procurou pelo italiano sisudo que há pouco havia assumido o comando da base. Ele apertava fortemente o cabo do fone de ouvido nas mãos. Sabia só de vê-lo daquele jeito que estava bravo e muito bravo. – "Céus! Voyage que se cuide!" – Pensou. O piloto em questão era um dos melhores, para não dizer o melhor e, até mesmo por isso, sempre passava dos limites, colocando em risco sua vida e o patrimônio da nação. Voltou seus olhos para o radar. Os dois hidroaviões franceses voavam em cíirculo sobrevoando a uma altura de mais de quatro mil pés sobre o campo. O silêncio dos pilotos para ele nada dizia, mas o de Mask sim. Levantou-se da cadeira e parou a poucos passos dele. – Mask... Eu sei que não tenho desculpas. Eu me distraí por dois segundos e...

- Sentry, não aconteceu nada. Só peço mais atenção. Você sabe que é nosso melhor controlador de voo. – Deu um meio sorriso, mas ao escutar o Bombardier pousar, saiu sem dizer nada. Voyage iria ouvir mais uma vez.

Assim que a pista dois foi limpa e desobstruída, o controlador informou ao segundo hidroavião que este poderia pousar na pista em questão. Em seguida foi a vez de liberar o pouso na pista um para o outro hidroavião que tivera de arremeter.

Após taxiar e desligar os motores, Roux fez a checagem dos instrumentos. Os bombeiros que havia trazido já se encontravam retirando suas coisas do interior do hidroavião e quando este finalmente saiu, encontrou Blond e outro homem conversando.

- Roux, venha! Esse é Enzo Ferruccio, ou Mask. Ele é quem está no comando aqui na base. – Blond chamou o amigo e fez as apresentações.

Estreitando os olhos, Roux aceitou a mão que lhe era oferecida.

- Seja bem vindo. – Saudou-o.

- Merci! Mas o que raios aconteceu? – Perguntou sem demonstrar seus verdadeiros sentimentos e ocultar a vontade que tinha de voar no pescoço do piloto imprudente. Não era de se deixar levar, mas naquela situação tinha de apurar os fatos. Era o responsável naquela missão e não queria deixar que nada prejudicasse o bom andamento.

- Roux, s'il vous plaît! Blond revirou os olhos. Eram difíceis os rompantes do amigo, mas não raros.

- Como ia dizendo ao Blond... – Mask continuou não fazendo conta do comentário do recém chegado. – É uma dessas coisas que acontecem e não existe explicação. – O rosto impassível. Nos olhos, o brilho calmo, mas nos lábios um sorriso demoníaco.

Roux estreitou os olhos, o que chamou a atenção de Mask e de Blond. Os olhos frios cravaram-se no piloto que se aproximava. A desconfiança era inevitável. O homem alto, cabelos loiros longos presos em um rabo de cavalo baixo, parou ao lado do responsável do local. O macacão vermelho com o símbolo da força aérea Helênica era a única diferença para os que os franceses estavam usando.

- Eu gostaria de desculpar-me com o piloto do Canadair que quase me choquei. – A voz máscula, os olhos azuis esverdeados brilhantes. A boca carnuda em um meio sorriso jocoso. Quem resistiria ao charme daquele homem? Ele sabia do que podia fazer e exercer sobre homens e mulheres, mas o que via naqueles olhos frios... Ah! Talvez ele houvesse encontrado alguém imune ao seu poderio. À sua sensualidade.

- Deveria era tomar mais cuidado. – Roux mirou-o de soslaio. Os olhos castanhos quase avermelhados ganhando um brilho frio. – Sua imprudência poderia ter causado um grave acidente.

- Hei! Tive um pequeno problema com a antena de minha aeronave. – Estreitou os olhos e fixou-os na identificação do outro. – Roux, enquanto você estava cruzando um oceano, eu já estava ajudando a equipe de terra a dar um jeito naquele inferno. – Apontou na direção contrária. Na voz, o timbre irônico. – Nessa nossa profissão temos de arriscar tudo. Vidas dependem de nós.

Mask estranhou aquela troca de gentilezas entre os dois. Em outros tempos, poderia até achar graça e colocar mais lenha na fogueira. Mordeu a língua para não fazer um comentário mordaz e, assumindo um ar sério, até mesmo perigoso, meteu-se no meio de ambos.

- Creio que temos muitas coisas para nos preocuparmos agora. Vocês precisam de um descanso para poder entrar em ação. – O italiano estava a ponto de perder a paciência com aqueles dois. – Vou pedir para alguém levá-los até os alojamentos. E você... – Voltou-se para Voyage com cara de poucos amigos. – Temos de conversar mister Evel Knievel! – Ao avistar um dos mecânicos fez-lhe sinal. – Podem seguir ao Doc, ele os levará aos alojamentos. – E sem mais nada dizer, saiu fazendo com que Voyage o seguisse.

Roux ficou por algum tempo parado observando o aviador grego afastar-se. Estava irritado com ele e ao mesmo tempo intrigado.

o~o~o~o

A recordação parecia fundir-se à vida real... Ao tempo real. Ele parecia ouvir a voz de Blond chamando-o, mas não lembrava em nada o timbre afrancesado do amigo. Já fazia tanto tempo que não se viam, mas nunca confundiria a voz dele. Sentiu um toque em seu ombro e balançou a cabeça antes de voltar os olhos para o lado.

- Roux, o que foi? Podemos ir embora?

- Pardon, Sentry... – Desculpou-se. – Estava apenas pensando um pouco. Ainda não consigo entender, mas ele preferiu assim, não? – Com uma última olhada para a rosa, o francês acompanhou o amigo e sem mais nada dizer, entrou no carro da base. Não olhou para trás.

Mask já encontrava-se ao volante e assim que o controlador sentou do lado do carona, saiu com o carro lentamente. Pelo espelho retrovisor, observou as feições de Roux. Ele não queria demonstrar, mas estava na cara que seu silêncio era por que estava fechando-se em seu mais profundo ser.

- Camus... – Pigarreou para limpar a garganta.

Ao ouvir seu nome e não o codinome, o ruivo sabia que a coisa era muito séria.

- Todos nós já passamos por algo parecido, não é algo que possa ser esquecido de uma hora para outra e... – Mask fez uma pausa.

- Enzo, já sei o que vai me dizer, mas eu não quero ficar em terra. Estamos enfrentando altas temperaturas e temos focos de incêndio espalhados para todos os lados do território grego. Use o bom senso! – Fez uma pausa.

"Céus! Lá vem ele com o uso do bom senso!" – Pensou Afrodite ao remexer no banco do carona.

- Use o bom senso você! – Mask atalhou-o. – Eu não estou falando como um amigo, estou falando como seu superior e lhe dando uma ordem. – Os nós dos dedos tornando-se esbranquiçados por segurarem muito forte no volante. Se pudesse, torceria o pescoço daquele empoado. – Está afastado até segunda ordem. – Grunhiu dando fim ao falatório. Ou tentando dar um fim.

- Mas Mask...

- Sem essa de: Mas Mask! – Parou o carro no acostamento e voltou-se para trás. – Você viu o que aconteceu ao Hunter, não viu? Não quero perder outro piloto para o medo e está fora de discussão seja lá o que queira me falar. Tire esse tempo de folga, temos pilotos vindo de outros países para nos ajudar. – Voltou-se para frente e com o canto dos olhos procurou apoio em seu namorado.

Afrodite esticou a mão e tocou lentamente a coxa de seu italiano. O gesto não passou despercebido ao francês. Seu coração falhou uma batida. Controlou a vontade que tinha de deixar as emoções tomarem conta de si e cravou as unhas nas palmas das mãos.

Ele precisava mostrar que conseguiria exercer suas funções mesmo com a partida de Voyage. Pensativo, Camus nem viu quando Mask parou o carro em frente à sua casa. Era tão estranho voltar para lá. Tudo ficara tão vazio...

- Pronto, Camus! Espero não ver sua cara na base por um bom tempo. Pelo menos até que você sinta-se apto a voar novamente, mas fique uns dez dias descansando. – Mask voltou-se para olhá-lo.

Fuzilando-o com os olhos por cima dos óculos de sol, o francês desceu do carro sem nada dizer. Ele tinha muito no que pensar e voar estava tornando-se o menor dos seus problemas.

Assim que o carro entrou em movimento, Afrodite voltou seus olhos para Mask.

- Tem certeza que fez a coisa certa? Precisamos dele e da experiência que tem. – A voz calma e levemente rouca.

- Mia flor, já não tenho certeza de nada. O jeito é esperar. O tempo é o melhor remédio para que as feridas sejam cicatrizadas.

oOoOoOo

Atenas – Horas antes

Dizem que notícias desagradáveis, notícias ruins e até mesmo constrangedoras não tardam a chegar. Parece até que o vento as impulsionam fazendo com que estas cheguem mais rápido. E foi com certo pesar e relutância em acreditar no que ouviam que as bases da Brigada de Incêndio receberam a notícia da partida de Voyage.

A base situada nos arredores de Atenas foi uma das primeiras a receber o comunicado. Muitos pilotos, mecânicos e até mesmo a alta chefia não acreditavam no que liam. Aquela fora a primeira base de Voyage - à qual sempre regressava quando dele precisavam.

Dizia a boca pequena que o experiente piloto seria convidado para assumir o comando do local tão logo o atual aposentasse. Outros que ele seria instrutor, mas com aquela notícia tudo caía por terra.

Dentre todos na base, Venon, um experiente piloto de helicóptero, fora pego de surpresa como todos os outros e sentira muito. Sentira calado, guardando para si a tristeza. Quanto tempo não o via? Quanto tempo fazia que haviam perdido contato? Na verdade, aquilo já não tinha mais tanta importância. Conhecia muito bem Voyage, sabia do que o loiro era capaz e nunca imaginara ouvir nada similar àquela novidade.

"Seu maluco! Disse várias vezes que eu era muito imprudente e veja agora. Você nos deixa quando mais precisamos." – Pensou enquanto prendia os longos cabelos que lhe cascateavam pelas costas em ondas dos mais belos fios dourados.

Sabia estar atrasado. Acreditava que nem deveria aparecer, mas uma força maior o impulsionava. Devia aquilo a si mesmo... a Voyage! Tinha de estar presente. Colocou o capacete, abriu a viseira e ajeitou os óculos de sol. Olhou para seu helicóptero parado ao longe. Havia perdido as contas de quantas vezes ajudara indo e voltando dos arredores da cidade, lançando litros e mais litros de água nas labaredas que lambiam as árvores, toda a vegetação rasteira e o que quer que se encontrasse em seu caminho.

Estreitou os olhos. Fora ele quem o salvara...

Passou habilmente a perna direita por sobre o tanque da moto preta esportiva. Acomodou-se no acento. Voltou mais uma vez seus olhos para o helicóptero. Um sorriso jocoso iluminou-lhe os lábios. O barulho de um hidroavião fez com que ele voltasse os olhos para os céus sobre sua cabeça. Um Canadair sobrevoando o campo. Venon não conseguiu suprimir o saudosismo.

Deu partida na moto e saiu cantando os pneus. O vento entrando pela viseira aberta dava-lhe a sensação de liberdade. Acelerou mais, fazendo o motor da moto rosnar feito um gato selvagem. A velocidade o fascinava. O barulho de um helicóptero voltando à base sobrepôs ao ronco do motor. Parou à saída da base. Voltou os olhos para trás a tempo de ver o pouso do aparelho que mais lembrava uma libélula. Recordações bombardearam-lhe a mente. Venon pareceu reviver os momentos de alguns anos atrás. Parecia que havia sido no outro dia. Era tão real... Tão palpável...

o~o~o~o

- Voyage, eu não consegui liberar todo o caminho de escape para a equipe de terra.

- Está perdendo seu toque, Venon? – A voz grossa, uma pitada de ironia. – Deixe aqui com o melhor. – Riu.

- Ora seu grandessíssimo egocêntrico! – Replicou Venon. – Deixe um pouco de árvores em chamas para mim.

- Pensarei no seu caso. Vejo-o na base, Venon. Vá logo encher a cesta reservatório no lago.

Com um riso debochado, Venon moveu o manche para a esquerda, dando a volta. Precisava de nova carga de água. Sobrevoando um lago, baixou lentamente e deixou que a água invadisse o compartimento suspenso por cabos de aço. Novo movimento no manche e voltou pela mesma rota.

A fumaça alta dificultava todo o serviço. Ao longe, avistou algo vermelho incandescente cortar os céus... um sinalizador. Sabia tratar-se da outra equipe de terra. Diminuiu a altura um pouco e quando estava acima do local, deixou a água cair. Sorriu de lado ao avistar a clareira aberta. Checou seu painel de controle. Precisava voltar, pois não teria combustível para mais uma carga.

Ao começar a ganhar altitude, a explosão de um pinheiro fez com que as labaredas lambessem a parte debaixo do helicóptero. Este também foi atingido por alguns pedaços de madeira.

- Uou! Quente, quente! – Venon reclamou. – Base, over!

- Na escuta, Venon! Prossiga!

- Fui atingido por chamas e pedaços de árvores. Tudo parece estar bem. Estou próximo da base, na verdade, a poucos quilômetros. – Informou.

- Todo o equipamento está funcionando direito?

- A princípio. Já estou bem próximo da cabeceira da pista. – Venon voltou seus olhos para o painel de controle ao ouvir um barulho conhecido.

- Venon, o que está acontecendo? – A pergunta fora inevitável. O piloto esquecera o rádio aberto. – Que aviso é esse?

- Sky, estou perdendo combustível. Não sei o que aconteceu.

- Droga, Venon! – Sky arregalou os olhos. Deslizou a cadeira de rodinhas e fez soar o alarme.

Em pouco tempo, a equipe de socorro e bombeiros estava esperando pela aterrissagem do helicóptero.

- Vamos, belezura! Vamos! Só mais um pouco. – As mãos do piloto seguravam fortemente o manche. – Isso, só mais um pouquinho... aguente, eu tenho compromisso à noite. Não me faça perder. – Voltou os olhos para o marcador de combustível e prendeu a respiração.

Com um binóculo, Sky, o controlador de voo, acompanhava da torre a aproximação da aeronave. Faltando muito pouco para que esta tocasse solo firme, o rotor e a hélice começaram a falhar. A altura caindo rapidamente. O baque forte pode ser ouvido ao longe. A fumaça negra elevando-se ao céu como uma nuvem macabra.

- Merda! – Sky aproximou-se do rádio e do radar. Teria de fazer com que todos os pousos e decolagens fossem para a pista dois. Sem delongas, deslizou com a cadeira de rodinhas para perto do telefone e já avisou ao hospital que um dos pilotos chegaria em breve, para que uma equipe ficasse de prontidão. Ao desligar o telefone, não teve como não pensar em Voyage. Ele tinha absoluta certeza que o piloto mais velho estaria entre o pessoal de socorro na pista. Suspirou. Não havia muito a fazer. O jeito era esperar para ter notícias de Venon.

Assim que liberou sua última carga de água misturada com terra, Voyage voltara para a base. Nem fazia ideia do que estava acontecendo com Venon e, ao ouvir o alarme disparar e ressoar em toda base, imaginou que fosse um dos hidroaviões com alguma avaria ou pane seca.

Um tanto curioso, parou ao lado de alguns bombeiros da equipe de segurança da base e voltou seus olhos para o horizonte. Alguns minutos se passaram e, bem próximo de umas árvores, o helicóptero revelava-se. Já apresentava sinais de avaria. O rotor da cauda e as hélices falhavam.

Ao seu lado, muitos torciam, afinal, ninguém gostaria de perder um companheiro de combate tão bestamente. Andando um pouco entre os tantos que ali aglomeravam-se, Voyage pediu um binóculo emprestado. Suspeitava que algo não estava bem e, realmente não estava.

- Venon! – Murmurou ao avistar o prefixo da aeronave. – Droga! – Devolveu o binóculo para seu dono e tentou correr para mais perto, mas foi detido pelo bombeiro chefe da segurança ao tentar passar por este. Voltou seus olhos indignados para o homem, mas ao escutar os comentário e buchichos fincou o olhar no aparelho.

Sem o auxílio do rotor de cauda, o helicóptero começou a girar em seu próprio eixo. Qualquer piloto em sã consciência sabia que quando aquilo acontecia, a situação do piloto passava para mero passageiro dentro de sua própria aeronave. Em outras palavras, não havia muito a fazer.

A altura foi sendo perdida e o baque forte no chão estremeceu a todos. Mais um pouco que o rotor aguentasse, Venon teria conseguido pousar, mas não adiantava pensar nos 'se nãos'. Salvar o piloto era o que mais importava. O primordial em toda aquela situação.

Como toda a equipe de segurança, Voyage correu para perto do helicóptero. Um principio de incêndio estava sendo controlado. Uma parte da equipe jogava água na fuselagem para, com isso, resfriar o tanque e evitar que algo pior acontecesse caso ainda existisse um pouco de combustível no reservatório.

Sem importar-se consigo mesmo, Voyage tentou abrir a porta para poder retirar o loiro de dentro da cabine. Tinham de ser rápidos, tanto ele quanto os demais.

- Venon... Venon... – Chamou-o. Sem resposta, notou que ele estava desacordado. Um filete de sangue escorria da têmpora do piloto, o que deixou Voyage mais preocupado. – Venon! Droga! – Praguejou ao forçar novamente a porta emperrada.

- Voyage, dê espaço para que forcemos a porta. – Um dos homens do resgate pediu-lhe. Este tinha em mãos uma ferramenta que mais parecia um alicate enorme.

Com o olhar decidido, pulou por cima dos destroços e passou para o outro lado do aparelho. A outra porta não estava tão danificada e ele não teve problemas em abri-la. Bateu a mão na trava do cinto e puxou o loiro para fora. Mesmo inconsciente, este gemeu dolorido. Talvez tivesse quebrado alguma coisa, mas não era a hora para averiguar. Retirou-o do helicóptero quando o pessoal já estava extinguindo o incêndio. Uma maca foi colocada próxima aos dois pilotos. Com cuidado, Voyage depositou-o lentamente sobre esta.

- Tomem cuidado, pessoal. Acho que Venon quebrou alguma coisa. Suspeito que seja o braço esquerdo. – Voyage informou. Sem dizer mais nada, acompanhou todo o trajeto que a maca fez até a ambulância. Esta encontrava-se um tanto mais afastada. Entrou após os paramédicos e sentou-se ao lado do jovem piloto.

A sirene estridente pedia passagem. Carros, ônibus e motos saíam da frente da ambulância dando-lhe passagem. Os paramédicos examinavam Venon e a única e maior preocupação era a batida na cabeça. Mesmo estando com o capacete, um hematoma feio se fazia presente na têmpora do lado direito. O braço esquerdo fora imobilizado com uma tala, assim como o colar cervical também fora posto imobilizando o pescoço do loiro como medida de precaução.

O grego mais velho tinha o olhar preocupado e seus pensamentos pareciam não querer ajudar. No hospital, ele não pode entrar na emergência e fora um tormento aguardar na sala de espera até que alguém fosse falar com ele. Após algumas burocracias que Voyage achou o fim do mundo, finalmente conseguiu entrar no quarto onde o outro estava sob observação.

Parou admirando as feições bonitas do loiro. A testa enfaixada. Suspirou. Puxou uma cadeira para perto da cama e segurou a mão direita do outro entre as suas. Venon era uma pessoa importante. Na verdade, alguém que fazia com que ele se sentisse bem. Mas não era o que o outro queria...

Voyage não soube dizer quanto tempo ficou ali velando-lhe o sono induzido pelos sedativos. Sim, sono, pois a ele fora dito que Venon estava fora de perigo e apenas sedado para não sentir muita dor no braço. Seus olhos ardiam e começaram a pesar. Sua cabeça pendeu um pouco para frente. Recostou-a nas mãos de ambos e depositou um beijo no dorso da mão do amante. Novamente deixou um suspiro escapar pelos lábios.

Sentia-se um tanto mal por ter com ele apenas algo de ocasião. Tinha tesão por estarem juntos, mas nada mais que isso. Não havia cobranças da parte dele, Venon nunca lhe cobrara nada, mas sabia que ele queria algo a mais do que lhe oferecia. Talvez o amasse um pouco, talvez não... – "Maldita instabilidade... Inconstância!" – Pensou ao bufar. Venon é um homem forte, mas ele não podia dar-lhe aquilo que via estampando nos bonitos olhos azuis. Não o amor que ele almejava, mas não era insensível e muito menos ordinário. Não diria nada a ele, nem sobre a ida para a outra base... Não naquele momento. O acidente havia prejudicado um pouco os planos que há muito escondia do amante. Só o tempo se encarregaria de tudo. Naquele exato momento, tudo o que ele almejava, o que mais desejava era que o 'acidentado' abrisse os olhos.

Sentiu sua mão ser apertada. Voltou o olhar para o rosto bonito. Já havia acordado? Quanto tempo fazia que estava ali? Buscou por um relógio ou algo do gênero, mas não encontrou nada. Sua atenção foi novamente cobrada por aquele que encontrava-se deitado.

- Hei... Hei egocêntrico! – A voz levemente rouca. – Eu ainda não morri. – Gracejou. Os olhos brilhantes buscando informações. Olhando para todo lado tentando saber se era um sonho, se estava no céu ou se realmente aquilo era um hospital. Detestava hospitais!

- É... – Um riso malicioso iluminou o rosto de Voyage. – Você ainda não passou dessa para uma melhor.

- Hmm... Melhor seria sair daqui e ir para casa. Já estou me sentindo bem e creio estar pronto para outra. – Venon sorriu. Tentou sentar-se e gemeu levando a mão com o soro até próximo a testa. Voltou seus olhos para o outro braço e observou pela primeira vez o gesso. – Pelo visto estraguei tudo, não é? – Perguntou referindo-se ao encontro deles mais à noite.

- Não te preocupe com isso, o médico já informou que terá de ficar essa noite em observação. – O olhar sério. Sabia que o amante não iria aceitar muito bem aquilo.

- Droga, Voyage!

- Você precisa, sabe disso. Pense assim: terá roupa limpa, um 'pijama' que é muito sexy e minha companhia que é a melhor parte. – Egocêntrico e cheio de si deveriam ser o pré nome e sobrenome de Voyage.

- Bem... Assim desse jeito fica até aceitável e tolerante, mas...

- Mas o quê? – Sabia que lá vinha alguma daquele maluco.

- Mas essa cor não combina com os meus olhos! – Gracejou rindo descontraidamente e contagiando ao outro.

- Veja se da próxima vez pousa direito aquela libélula que usa para apagar incêndios.

- Da próxima vez mandarei um recado para que as árvores não explodam quando eu estiver sobrevoando-as. – Respondeu de travessado. Voyage às vezes conseguia ser irritante, mas tinha uma coisa boa... Um senso de proteção enorme.

- Obrigado por me ajudar!

Voyage sorriu. Ficou de pé e aproximou o rosto do dele. Sem palavras, pois não era necessário, beijou-lhe os lábios possessivamente. Separou apenas para que recuperassem o ar. – Agora descanse, ou seu médico pode querer segurar-te mais que o necessário aqui.

- Mais que um dia ficarei louco. – Venon bufou o que fez com que o loiro ao seu lado caísse na gargalhada. Se pudesse, cruzaria os braços ou até replicaria, mas não estava com vontade.

o~o~o~o

Inconscientemente, Venon elevou uma das mãos ao lábio. Fazia tanto tempo! Já havia se livrado do sentimento forte que tinha pelo outro, mas o simples fato de recordar-se o fizera sentir-se saudosista. Balançou a cabeça ao ouvir uma leve buzinada atrás de si. Buscou pelo espelho retrovisor o que seria. Uma das viaturas precisava sair e ele havia parado bem no meio da saída.

Acelerou a moto e saiu deixando uma nuvem negra de fumaça. Queimara o pneu traseiro. Sorriu de lado. Tinha pouco tempo e precisava vencer oitenta quilômetros de estrada. O trajeto todo ele foi imaginando se veria alguém conhecido. Expert, o mecânico de Voyage, havia seguido o piloto para a nova base, mas não tinha certeza se ainda estava por lá. Bem, o melhor era não pensar mais em nada, não devia nada a ninguém.

Ao cruzar a ponte Rio-Antirio, Venon deixou para trás o canal de Corinto. Estava muito próximo de seu destino, talvez chegasse em cima da hora, talvez não. Dependia dele não se perder. Reduziu a velocidade ao entrar na cidade. Sabia que teria de seguir como quem fosse para a base da Brigada. Poucas placas indicavam o caminho certo. Perdeu-se por duas vezes até finalmente encontrar o lugar. Parou a moto a certa distância. Tirou o capacete deixando-o sobre o retrovisor. Recolocou os óculos escuros e aproximou-se um pouco do lugar onde muitas pessoas estavam presentes. Ficou oculto atrás de uma árvore de tronco grosso. Era bom em ocultar-se quando queria. Não estava com vontade de ser visto. Não sabia se Voyage estava sozinho. Não importava-se muito com isso, mas com aquela situação, não queria causar constrangimentos a quem quer que fosse.

O pessoal começou a dispersar. Ficaram apenas um pequeno grupo de pessoas próximo aos carros e outra pessoa parada no mesmo local. Parecia algo particular. Bufou. Revirou os olhos e recostou-se um pouco na árvore. Não sabia dizer se era uma jovem que se encontrava sozinha e, se fosse, não estava com vontade de vê-la aos prantos. Não tinha nada contra mulheres, apenas preferia uma pegada mais forte. Definitivamente, homens lhe chamavam mais a atenção, não que fosse sempre assim, mas sua vida mudara da água para o vinho quando conhecera Voyage.

Torceu um pouco os lábios e, por entre o tronco e a sebe que crescia bem ao lado, viu que a jovem de longos e lisos cabelos ruivos não se encontrava mais sozinha. Não podia ouvir o que estavam conversando, mas não soube dizer por que não conseguia desviar o olhar. Na verdade, não conseguia nem piscar.

"Ruiva?" – Pensou ao arregalar os olhos e sentir-se embasbacado. – "Pelos deuses do Olimpo! Como eu pude enganar-me de tal maneira?" – Arqueou a sobrancelha ao medir com os olhos o corpo másculo de cima a baixo. Como poderia ter se enganado e quase cometer uma gafe tremenda? Seus pensamentos não foram nada castos e ao voltar um pouco seus olhos para o mármore escuro, a lembrança de onde estava e do por quê viajara tanto caíram-lhe como uma bomba sobre seus ombros. Sentiu-se um perfeito canalha. Ali não era lugar para ficar paquerando e achando-se um predador atrás de sua presa.

Bufou. Desencostou da árvore e somente quando teve certeza de que estava sozinho, rumou para perto do local onde minutos antes estivera o ruivo. Baixou o corpo e pegou a rosa que a brisa havia conseguido derrubar do mármore negro. Antes de colocá-la no lugar em que fora deixada, observou atentamente a escuridão da pedra a brilhar sobre os efeitos do sol.

"O que ele era para você, Voyage? Um amigo dedicado? Algum parente?" – Perguntou-se ao colocar a rosa no lugar. – "Ou será que o egocêntrico senhor 'eu não sei amar' finalmente deixou-se apaixonar? Deixou-se enamorar?" – Não entendia por que sentia-se tão ultrajado. Tão chateado que não conseguia perceber que, na verdade, estava um tanto enciumado, mesmo após tanto tempo de separação.

Balançou a cabeça. Ficou em silêncio por alguns segundos. – Você fez e continuará fazendo falta, Voyage. – Murmurou. Deu as costas e, sem olhar para trás, seguiu até sua moto. Teria um longo caminho de volta até sua base. Ajeitou-se cuidadosamente sobre o banco. Colocou o capacete e sem muitas delongas saiu devagar, pois teria de passar pelo meio de pessoas que acompanhavam um féretro.

A cada quilômetro que vencia, Venon fazia questão de deixar as lembranças do ex-amante no lugar de onde nunca deveriam ter saído: em seu passado!

oOoOoOo

Parado à frente da casa, moradia esta escolhida por ele há sete longos anos atrás, Camus apertou fortemente a chave na mão direita. Não sentia medo de nada... Não tendo escolhido aquele tipo de profissão, mas não estava seguro se queria entrar e ter tantas lembranças e recordações de Voyage. Não naquele momento em que tentava controlar-se. Sim, queria controlar-se. Frio... Sempre fora, mas é humano suscetível a erros, acertos e também a demonstrar seus sentimentos. Sentia-se fragilizado como nunca havia sentido. Sozinho, poderia deixar-se levar pelas emoções, mas mesmo estando na segurança de seu lar, lutava contra as fortes emoções que o assolavam.

Ergueu um pouco o queixo e com passos confiantes subiu os três degraus que davam acesso à pequena varanda. Destrancou a porta e entrou. Deixou-a bater com a ajuda de um empurrãozinho e estacou no meio da sala. Retirou os óculos de sol e o deixou na mesa de canto. O perfume cítrico invadiu-lhe as narinas. O perfume dele. Fechou os olhos e poderia jurar que Voyage estava ali... Tão perto... Tão ao seu alcance. Abriu os olhos revelando as íris castanho-avermelhadas. Dirigiu-se para a cozinha, retirou da geladeira uma garrafa de vinho que estava pela metade. Abriu-a e deitou o líquido rubro e perfumado em uma bonita taça de cristal. Fechou a garrafa e voltou-a para a geladeira.

Regressou para a sala e sentou-se no sofá negro de três lugares. Apreciou o teor frutado do vinho. O sol se punha no horizonte fazendo com que a sala onde o ruivo encontrava-se fosse ficando na penumbra. Ao estender a mão para o lado a fim de acender a luminária, Camus esbarrou a mão em um porta-retrato que por ali estava. O objeto foi ao chão, espatifando o vidro. Ágil, ligou a luminária e voltou seus olhos para o chão. Cacos para todos os lados.

Com um suspiro resignado, o ruivo deixou a taça sobre a mesinha e começou a recolher os cacos de vidro. Juntou-os em um canto enquanto ia pegar a vassoura e a pá. Ao terminar de limpar, sentou-se novamente e tocou com a ponta dos dedos a imagem de Voyage na foto. Sentiu o coração falhar uma batida.

- Sentirei sua falta, mon coeur (meu coração). – Sentiu lágrimas rolarem por sua face. Deixou o sentimento explodir. Precisava colocar tudo para fora. Faria somente aquela vez. O namorado entenderia sua conduta. Talvez Mask tivesse razão, ele precisava de um tempo para ajeitar tudo e tomar algumas providências além de esfriar a cabeça.

- Voyage... Por que estava sempre querendo mostrar que era o bom? – Murmurou. Passou as mãos pelo rosto. De nada adiantaria ficar remoendo os fatos e lembrando, de nada... Nada!

Colocou o que restara do porta-retratos no lugar. Precisava de um bom banho gelado para espantar o calor. Talvez fosse até melhor começar as coisas no outro dia. Talvez até Expert aparecesse para conversar e, quem sabe, querer ficar com alguma coisa. Balançou a cabeça. Os pensamentos misturando-se. Não estava pronto para receber o mecânico. O cansaço físico e emocional mexendo com o ruivo.

- Realmente, é de um bom banho que necessito. – Falou para si mesmo. Seguiu para o banheiro, despiu-se e tomou um bom banho.

Conseguiu relaxar um pouco. Com uma toalha enrolada na cintura, seguiu para o quarto, a cama de casal espaçosa. Um amargor subiu-lhe pela garganta. Precisava manter-se são... Não poderia esmorecer feito uma jovem ao perder seu primeiro namorado. Sabia ser forte. Orgulhava-se de ser conhecido como 'Senhor Gelado' e, por isso mesmo, lutava para controlar suas emoções.

Vestiu a boxer e a bermuda do pijama. Prendeu os longos cabelos em um rabo de cavalo frouxo e acomodou-se do seu lado da cama. Voltou os olhos para o lado esquerdo, vazio e frio... Conteve-se e, deitando de bruços, apagou a luz do quarto. Cansado como estava, dormiu tão logo conseguiu relaxar mais o corpo.

o~o~o~o

O aviso de incêndio ribombou por toda a base. O azul do céu ganhava nuances meio avermelhadas quando as labaredas incandescentes ganharam força. O pôr do sol, momento para muitos mágico, era esquecido, pois nuvens negras ocultavam o espetáculo que a natureza proporcionava a cada fim de tarde.

Da torre de comando, Mask observava o horizonte com a ajuda das lentes potentes do binóculo. O movimento das equipes de combatentes terrestres misturava-se com o de pilotos e mecânicos que corriam em polvorosa pelo campo.

Hidroaviões sendo abastecidos com combustível e argila misturada com água. As hélices potentes dos helicópteros ganhando velocidade e impulsionando aos céus as libélulas de metal. Caminhões carregados de bombeiros experientes dirigiam-se a toda para o local não muito longe de onde estavam.

Os primeiros a chegarem ao local davam as coordenadas pelo rádio, informando sobre as proporções que o incêndio estava tomando. As notícias eram alarmantes e todos os pilotos estavam sendo convocados, mesmo os que estavam de folga ou férias.

- Conseguiu falar com Voyage e Roux? – A voz levemente rouca denotava uma preocupação que dificilmente seria notada se não pelo controlador de longas madeixas azuladas.

- Ainda não, Mask. – Boss mirou-o nos olhos. – Sabe que Voyage e Roux estão de folga e creio que não se encontrem em casa. Deixei o telefone da casa deles estourar de tocar.

- Shion... Quando é que vai aprender que Voyage puxa o fio do telefone da tomada? – Afrodite revirou os olhos e riu divertido. Ao reparar no olhar assassino do namorado, apressou-se em comentar. – Como sei? Bem, digamos que estava conversando com Expert e Voyage e o mecânico reclamou por não conseguir entrar em contato. Sabem como Voyage é... – Fez uma pausa. – Quando está em companhia do ruivo, ele esquece um pouco das coisas. É por isso que sei.

Mask grunhiu e bufou ao começar a andar de um lado para o outro. – Tentem o celular de um deles. Talvez um tenha esquecido o celular ligado. Não me importo. Nem que eu vá até lá para trazer-lhes pelos fundilhos... – Foi interrompido pelo rádio. – Prossiga, Chefe!

- A situação por aqui está piorando muito. Onde está a cavalaria alada? Temos muitos focos e, com o vento, o incêndio está ganhando proporções gigantescas.

- Chefe, temos quatro Canadair e três Bombardier nos céus. Isso sem contar nos helicópteros. Passe as coordenadas para Sentry. Estamos chamando o restante dos pilotos. Tentem não bancar os herois sozinhos. – Pediu e deixou o rádio para ele próprio pegar outro aparelho e começar a ligar para outros pilotos além dos dois que estavam incomunicáveis.

o~o~o~o

Fazia pouco tempo que haviam chegado. As compras foram guardadas impecavelmente no armário da cozinha. A garrafa de ouzo fora esquecida a um canto juntamente com a taça de sorvete de damasco. E tudo começara com o sorvete. Não que fosse afrodisíaco, mas do nada, carícias mais ousadas foram trocadas. As roupas sendo lançadas uma após a outra ficando esquecidas no chão do quarto.

Os corpos nus esfregando-se um no outro. Carícias provocantes e mais ousadas sendo trocadas. Palavras desconexas escapando em arfares pelos lábios já inchados pelos muitos beijos trocados.

- Geme para mim, geme Camus. – Pediu o grego. Somente ele conseguia quebrar-lhe o gelo. Fazê-lo ficar mais solto, até mesmo mais falante.

- Hmm... E como não gemer? – A voz rouca escapando entre os gemidos. O ruivo ondulou as costas ao sentir-se invadido aos poucos novamente. A estocada forte, sua próstata sendo atingida. Um delírio de prazer. O céu, mesmo sem estar em um aeroplano. – S-Saga... – Gemeu o nome do loiro muitas vezes.

As carícias e os movimentos mais rápidos. Logo, muito em breve, alcançariam as alturas, o êxtase novamente. E o que era melhor: Juntos!

A mão habilidosa de Saga fechou-se sobre o desejo do ruivo e com maestria movimentou-a no mesmo ritmo de seu corpo... de suas estocadas. Adorava ver seu francês com o rosto afogueado, com os olhos brilhando incontidamente. O desejo estampado naquele rosto bonito.

- Te amo... – Gemeu próximo ao ouvido dele e sentiu-o estremecer.

Camus fechou os olhos, estava entrando em êxtase. Conseguia entender o que Saga lhe dizia, sabia sentir o mesmo por ele, mas quantas vezes expressara ou dissera em voz alta que o amava também? Bem, naquele exato momento não importava. Talvez até sim, mas sua voz parecia ter morrido na garganta. O ar preso em seus pulmões. O clímax sendo violento e arrebatador. O ar escapando todo de uma vez em um arfar misturado com gemidos e palavras sem nexo.

Abraçara-o como se fosse a última vez. Um gemido dolorido subiu-lhe aos lábios ao sentir a mordida na junção do ombro com o pescoço. O corpo trêmulo, a sensação de solidão ao ser deixado. Os olhos procurando pelos tão azuis esverdeados, misteriosos... Sedutores.

Braços longos cingindo-lhe a cintura e o puxando de encontro ao corpo definido. Eram homens, fortes, corajosos, mas que se amavam e buscavam um no outro forças para juntos sobreviverem a todas as desventuras e provações que a vida lhes impingissem.

Apesar de saber-se amado, Camus estava tenso. Estivera evitando tocar em um assunto que o colocava na defensiva e um tanto nervoso o dia todo. Sabia esconder de quem quer que fosse o que sentia, mas não de Saga. Aquele grego era perspicaz, sagaz, irônico e muito observador. O ruivo estava esperando o momento em que ele iria perguntar-lhe o que estava acontecendo, mas estava demorando muito. Inquietou-se um pouco, o que foi como um convite para o loiro.

Saga soltou-o e sentou-se recostado no encosto da cama. – Venha cá. – Convidou-o ao separar as pernas e bater com uma das mãos no colchão.

Arqueando uma sobrancelha, o ruivo virou de lado e apoiou a cabeça em uma das mãos. – Por quê? – Perguntou mais para matar sua curiosidade.

- Ora, Camus, não me faça perguntas se já sabe a resposta. – Saga estreitou os olhos. – Você está tenso e eu quero ajudá-lo. Deixa de ser chato e venha logo aqui. – A voz grossa e sensual parecendo um pedido e não uma ordem.

Camus suspirou e rendeu-se ao apelo do namorado. Estavam juntos há sete anos e conheciam-se bem. Sem importar-se com sua nudez, sentou-se entre as pernas de Saga e tentou relaxar. Soltou um gemido dolorido ao sentir as mãos fortes começarem a massagear os músculos tensos.

- Viu, eu não te disse? – Comentou bem próximo ao lóbulo esquerdo do ruivo. – Relaxe, Roux... – Gracejou. Era divertido chamá-lo pelo codinome sabendo seu significado. Ruivo... Era seu ruivo!

- Hmm... Auu... Difícil tentar relaxar quando tenho alguém ronronando tão próximo de minha orelha. – Camus voltou sua cabeça um pouco à procura dos olhos de Saga. Gostava de falar-lhe mirando-o nos olhos.

Saga sorriu. – Quando vai dizer-me o que o está preocupando? – Perguntou sem fazer rodeios.

- Hmm... Saga, não estrague o momento. – O ruivo pediu. Sua voz baixa e sem nenhuma convicção.

- Não estou estragando, só estou tentando saber o que te aflige. – Sorriu mais uma vez ao perceber que o namorado retesara as costas um pouco e sabia que não fora por conta da massagem. – Você pode esconder-se de qualquer um, Camus, menos de mim. – Parou a massagem e o puxou para si abraçando-o carinhosamente.

O francês recostou-se no tórax definido e tombou um pouco sua cabeça, deitando-a no ombro do amado. – Quando vai partir? – Perguntou. O coração batendo descompassado no peito.

- E eu vou? – Uma pergunta respondendo a outra.

- Não seja irritante, Saga. – Camus revirou os olhos. – Sei que você esperou longos anos por essa promoção. Sei que o campo da Brigada de Atenas é concorrido e um dos melhores. Então, não recuse a promoção por minha causa. Daremos um jeito. – Desencostou um pouco o corpo e saiu dos braços do grego. Vestiu sua boxer preta que estava caída aos pés da cama e saiu do quarto. Não queria que ele o visse daquele jeito. Ligou a cafeteira. Precisava de um gole de café sem açúcar. De costas, não percebeu que era observado. Deixou um sorriso triste brotar-lhe nos lábios ao sentir-se abraçado pela cintura.

- Sei que fiquei em silêncio todo esse tempo... – Começou o loiro. Ao perceber que o namorado iria retrucar-lhe, deslizou rapidamente a mão direita até os lábios dele. – Não... Por favor, não diga nada e me deixe terminar de falar. – Camus apenas moveu a cabeça concordando. – Eu lhe devo um pedido de desculpas por todos esses dias em que não quis tocar no assunto da minha promoção. Eu tive um motivo, bem... Eu estava tentando levar comigo certo piloto e um mecânico, mas... Pensei bem e apagar incêndios é uma das coisas que mais amo nesta vida.

O ruivo arregalou os olhos, o que fazia muito pouco, e tentou virar-se para mirar-lhe as íris brilhantes, mas não conseguiu, pois Saga segurou-o fortemente.

- Calma, francês! – Pediu rindo divertido. – Adoro quando bufa assim. Sua franja levanta. – Comentou ao deparar-se com a situação.

- Saga, tudo para você é diversão... Até mesmo apagar incêndios se torna divertido, mas não é para mim. – Comentou. Queria lembrá-lo que quando o grego saía para conter e apagar incêndios, este mudava, colocando a vida em perigo e fazendo loucuras. – E agora vai perder essa oportunidade? Seja coerente. Eu não me divirto quando faz suas maluquices, ou quando entra em queda livre com aquele avião tanque pesado. É estressante para mim nunca saber se nos encontraremos novamente na base.

- Camus, você está sendo egoísta. – Saga soltou-o. Tinha plena convicção e certeza que o amava, mas pilotar aviões tanques e apagar incêndios era sua vida.

- Não, eu não estou. Apenas quero ter a certeza que estaremos juntos, ou então eu retornarei à França agora mesmo.

- Você não faria isso... Você não ficaria sem mim. – Saga sorriu maliciosamente. Seu ego poderia ser maior que tudo.

- Egocêntrico e cheio de si como sempre. – Camus revirou os olhos mais uma vez. – Eu seguirei minha vida e encontrarei a felicidade nos braços de outro. – Estava brincando e sabia que Saga levaria na esportiva, mas arregalou os olhos ao vê-lo marchar para si tão decidido.

- Ora, seu francês dramático... – Murmurou ao abraçá-lo fortemente. – Você às vezes me surpreende. Nem me deixou terminar de falar. Mas agora irá me ouvir... Você nunca ficará bem com outra pessoa... por que você me ama apesar de quase nunca dizer-me e, não será fácil, ou melhor, nunca me esquecerá. Será sempre meu namorado e, se deseja saber, eu vou aceitar o convite. Levarei certo ruivo e aquele mecânico que é minha fuça junto comigo. – Riu divertido ao perceber o espanto estampado no rosto bonito do namorado.

- S-Saga... – Camus conseguiu dizer antes de ser calado com um beijo. – Kanon... – Tentou dizer entre os muitos beijos que o loiro lhe dava.

- Deixemos meu irmão para lá... Já basta vê-lo todos os dias no campo. Hoje é nossa folga e vamos esquecer o resto. – Sorriu maliciosamente. – Sabe, nossa cama deve estar sentindo-se sozinha... – O riso cristalino misturando-se ao do ruivo. Largaram-se na cama e novamente engalfinharam-se nos braços um dos outro.

- Sa... Saga! Você tirou o telefone do gancho? – Ronronou baixo próximo ao lóbulo da orelha do loiro. Queria provocá-lo.

- Hmm... Tirei da tomada, por quê? – Perguntou ao mirar-lhe nos olhos.

- Então que barulho é esse? – Camus perguntou. Ao longe, ou abafado em algum lugar, um celular tocava insistentemente.

- É um celular... Apenas não atenda. – Solicitou ao mordiscar-lhe o lóbulo da orelha.

Camus gemeu baixinho. Conhecia a melodia do toque. Remexeu-se abaixo do corpo do namorado.

- Eu não atenderei, não é meu celular. – Comentou, como se fosse um algo ao acaso.

- DROGA! – Saga grunhiu ao levantar e ir pegar o bendito aparelho que estava soterrado em meio às roupas e de ambos.

O ruivo acomodou-se melhor para poder acompanhar os movimentos do namorado. Sentou-se de um pulo ao ouvir o codinome de Shion.

"O que Boss quer conosco?" – Pensou ao ouvir Saga responder que ele, também estava próximo.

- Mas estamos de folga... Sim, eu entendo Boss... Boss! Ei, Shion, quer me ouvir. – Pediu Saga olhando para o namorado. – Mask... – Shion havia transferido a ligação ou o italiano de sangue quente havia tirado das mãos do tibetano o telefone. – Está bem... Sim, estaremos aí em alguns minutos. – O grego loiro bufou ao desligar o telefone. – Precisamos ir. Estão precisando de nossa ajuda. Todos os pilotos estão no ar.

Camus não disse nada. Saiu da cama e rapidamente vestiu seu uniforme vermelho anti-chamas. Voltou seus olhos para Saga, que trajava-se igual a ele. Sem dizer nada, seguiram para o carro e, por fim, para o campo.

Após uma rápida conversa com Mask para colocá-los a par da situação, cada qual seguiu para sua aeronave. Haviam sido escalados para quadrantes próximos. Trabalhavam bem juntos, mas naquele exato momento, precisavam que ambos se separassem.

Saga aproximou-se de seu avião e sorriu para o irmão, o seu eterno mecânico.

- Não faça nenhuma loucura, Saga. Foi difícil consertar os estragos que fez da última vez que realizou o pouso seco. – Kanon merecia o codinome que recebera... Expert. Com aviões, principalmente os tanques, poderia ser considerado um mago.

- Pode deixar, Kanon. Sabe muito bem que tomo muito cuidado com essa belezinha. – Respondeu o gêmeo aviador. Antes de entrar e checar os instrumentos, voltou seus olhos para o lado em que sabia, ia deparar-se com o Canadair do namorado.

O ruivo estava prendendo os longos cabelos em um rabo de cavalo baixo. Sorrateiramente, o loiro aproveitou-se daquele momento de distração e aproximou-se dele. Antes que pudesse segurá-lo em seus braços, Camus entrou na aeronave. Saga arqueou as sobrancelhas e entrou atrás dele. Recostou-se perto da porta da cabine e esperou que este voltasse ao perceber-se não estar mais sozinho.

Percebendo-se observado, Camus voltou-se e, com um olhar surpreso e sem entender nada, acionou os motores antes de aproximar-se um pouco.

- O que foi? – Perguntou falando alto para se fazer ouvir. O barulho das duas hélices dificultando a conversação.

- Nada... Apenas queria te ver antes de ganharmos os céus. – Saga sorriu sedutoramente. – Você vai mesmo comigo para o campo da Brigada em Atenas, não é? – Perguntou. Não estava inseguro, mas era bom saber que não estaria sozinho e longe de seu ruivo.

- Só não irei se você assim quiser. – Respondeu não entendo praticamente nada. – Saga, você não é inseguro... Creio que nossos planos estão mais que certos. – Beijou-o rapidamente.

- Se assim você diz. – Saga fez um muxoxo. Seus olhos brilhavam incontidamente.

- Saga... Temos bombeiros precisando de nós lá. – Camus arqueou a sobrancelha.

- Você tem razão. Vemo-nos depois. Tome cuidado. – O loiro pediu antes de sair. Não era supersticioso, mas alguma coisa em seu ser pedia que fizesse aquele comentário.

- Creio que isso valha para você também. – Murmurou Camus. Sentia que deveria dizer-lhe para não ir, mas já sabia a resposta do outro. Ignorou o que estava sentindo e fechou a porta pressurizada assim que ficou sozinho na aeronave.

Saga aproximou-se do Bombardier. Despediu-se do irmão e, enquanto taxiava para poder decolar, observou o Canadair de Camus ganhar os céus. Liberado para também colocar o hidroavião no ar, partiu.

Minutos depois, já podiam ver ao longe a fumaça negra deixando o céu mais escuro. Não tinham o costume de combater incêndios com as aeronaves à noite, mas naquele caso, se não acionassem os pilotos, muitas vilas, vilarejos e um grande hectare de florestas seriam devastados.

A conversa no rádio era única e exclusivamente para tomadas de ação e controle. A torre, aeronaves e os chefes de terra estavam em comunicação constante.

Os hidroaviões voavam baixo. Seus pilotos arriscavam a vida para deixar o caminho livre para as equipes de terra.

As labaredas mais altas lambiam a fuselagem do Canadair de Camus. Sua última passagem sobrevoando o inferno de fogo quase o fritara. Pelo rádio, avisou que estava indo até o lago reabastecer os tanques com água. Ainda conseguiria dar mais umas duas voltas com o que tinha de combustível.

Tendo uma das aeronaves mais pesadas, Saga conseguia fazer mais voltas com o Bombardier. Quando ele voltou para a base, já quase sem combustível, o hidroavião do namorado já estava sendo reabastecido com argila e água. O ruivo preferira, ao em vez de ir para o lago, reabastecer no campo, onde a manobra seria mais segura por estarem no escuro.

Roux e ele encontram-se na sala de reuniões. Mask queria conversar com ambos, pois os quadrantes deles eram os piores. Outros dois pilotos iriam assumir o quadrante do francês e este iria com Saga. Sem delongas, foram liberados e logo estavam novamente no ar.

- Chefe, aqui é Voyage. Sua equipe de terra deixou alguma labareda para nós? – O loiro perguntou, fazendo um pouco de troça. Não poderiam dizer que ele não gostava do que fazia, pois ele gostava e muito.

- Voyage, aqui embaixo tem muita chama para vocês. Precisamos de uma passagem rasante. Tomem cuidado, pois as árvores estão explodindo só de olhar para elas. – Informou.

- Ouviu isso, Roux?

- Alto e claro, Voyage. – Camus respondeu. Estabilizou o avião na altitude desejada e rumou para seu alvo. Com precisão de um médico cirúrgico, ou se preferirem, de um piloto de caças, passou entre os vãos de rochas e árvores e liberou sua primeira carga. O suor escorria-lhe pelas têmporas e rosto. – Quente... Sa... Está muito quente... Tome cuidado, pois essas 'velas romanas' querem nos fritar. – Camus fez o avião ganhar altura e saiu um pouco do meio da fumaça e fuligem.

- Voyage, Roux deixou-nos a meio caminho do lago. – Informou o chefe dos bombeiros pelo rádio. – Precisamos que você passe mais baixo agora. Está muito quente e o fogo parece não querer dar indícios de que vá se extinguir.

- Não se preocupe, farei o meu melhor. – Saga respondeu. Com maestria, levou o Bombardier para o local onde deveria lançar a argila misturada com água. A cabine começou a esquentar, mas ele parecia não se importar. Observador, procurava pelo ponto certo e, ao localizá-lo, deixou a carga avermelhada cair sobre as labaredas.

- Mais duas passadas e creio que o caminho estará livre, rapazes. – A informação precisa.

Saga distraiu-se por um milésimo de segundo e uma árvore explodiu lançando fogo e estilhaços incandescentes no hidroavião. O solavanco fez com que o loiro puxasse o manche, fazendo a aeronave ganhar mais altura. Precisava sair do meio daquela fumaça toda.

Mais atrás, Camus vira tudo. – Saga, está tudo bem? – Perguntou ao firmar a vista e reparar nas chamas no motor direito do outro avião. – Seu motor número um está em chamas. Acione o extintor de incêndio. – Na voz, uma nota de preocupação.

- Já fiz isso, ruivo, e não adiantou. – Saga voltou seus olhos para a janela observando o motor. – Droga... E isso por que eu estava de muito bom humor. – Praguejou.

- Acha que consegue voltar para a base? – Camus perguntou. Temia o pior, por isso mesmo estava fazendo seu avião ir mais rápido. Tinha uma ideia que iria colocar em prática.

- Não, creio que não conseguirei. Logo as chamas vão atingir o tanque de combustível.

- Mantenha o curso. – O francês falou calmamente. A voz fria.

Saga conhecia aquele jeito. Ele estava tramando alguma coisa. – Camus, não...

- Mantenha seu curso. Não é um pedido, é uma ordem. – O ruivo grunhiu ao embicar o avião na vertical. Iria iniciar um mergulho.

- Camus, seu francês teimoso, não faça isso. Seu avião ainda está muito pesado e você pode não conseguir sair do mergulho. Vou tentar chegar ao lago. – Saga moveu a alavanca da velocidade rapidamente.

- O que está fazendo, Saga? – Camus protestou, mas no lugar de alguma resposta, veio o clarão e o barulho da explosão.

Não conseguira chegar a tempo. Não conseguira evitar o pior. O grito preso na garganta. Os olhos arregalados. Os lábios movendo-se sem proferir som... O suor frio...

o~o~o~o

A explosão... O barulho ribombando incontáveis vezes na cabeça do ruivo. Um grito. O nome dele que não havia saído por seus lábios. O corpo banhado em suor, os olhos bem abertos.

- Saga! – A voz rouca. Um soluço. Apenas um pesadelo, o primeiro de muitos outros.

oOoOoOo

Base da Brigada de Incêndio de Atenas

Fazia pouco tempo que estava de volta à base. Iria ficar no alojamento aquela noite. Havia preferido assim. Estava fazendo um tempinho. Precisava de um pouco de ar puro. Os cabelos longos e loiros balançando ao sabor da leve brisa.

- Como foi lá, Venon?

A voz baixa alertando-o que não estava mais sozinho. Voltou-se devagar após deixar o capacete equilibrado sobre o espelho retrovisor da moto. Os olhos estreitos, o olhar perigoso. Um alerta. Não queria ser analisado.

- Se quer saber de alguma coisa, por que não foi para lá também, Lionheart? – Perguntou, ficando na defensiva. Arqueou a sobrancelha. Tinha certeza absoluta que o outro piloto de helicópteros gostaria de saber o mesmo que ele havia ficado em dúvida. Via em seus olhos que o interesse era devido ao recém chegado querer a desforra por várias vezes ter sido enxovalhado devido ao temperamento ácido do mais velho ao instruir-lhe nas táticas de combate a incêndios com os helicópteros. Sim, ele sabia. Não era bobo. Observava todos ao seu redor, chegando quase até a parecer um adolescente em uma aula de biologia ao dissecar um sapo para conhecer seu interior. Assim ele é: observador e por vezes até mesmo letal ou ácido. Sabia que um dia viria a vingança, mas não imaginara que seria naquele momento.

Um sorriso irritante surgiu nos lábios do outro grego parado a pouco mais que quatro passos de si. – Calma, Venon! Só queria saber se conseguiu chegar a tempo para prestar homenagens, afinal Voyage lhe era muito querido, não? – A voz falsamente calma, queria irritá-lo um pouco.

- Está bem falante hoje não, Aioria? – Perguntou sem desviar os olhos dos do outro.

- Não, apenas estou querendo saber se é verdade o que escutei. – Mirou-o de soslaio.

- O que quer saber? Pergunte logo. – Estava ficando sem paciência.

- Se é verdade que Voyage morreu ao tentar não colocar o amor de sua vida em perigo. – Percebeu que o outro não sabia sobre aquilo. Para si fora fácil descobrir. E sabia disso há muito tempo. Tinha amigos em comum no outro campo. Sabia que, na verdade, o que acontecera é que o namorado de Saga não havia conseguido salvá-lo, mas não tinha problemas, desde que conseguisse o que queria: deixar o loiro bravo.

- Não sei. – Milo respondeu ao retesar um pouco os músculos. Sentia vontade de pular na garganta daquele infeliz.

- Pena. Pensei que tinha encontrado alguém que poderia me contar o que aconteceu. – Aioria sorriu de lado. Um sorriso irônico. – E o que é muito triste é que quando ele consegue finalmente apaixonar-se por alguém, vem essa fatalidade. – Comentou, a voz levemente ácida.

- Aioria, por que é que não vai atrás de outro para torrar a paciência? Definitivamente hoje não estou com vontade de trocar meia dúzia de palavras com você. – Fincou-lhe o olhar... Um olhar de aviso. O jovem piloto não deveria brincar com ele, não naquele momento. Não quando estava inquieto e um tanto chateado. Voyage para ele não fora um passatempo como muitos do campo diziam... Pelo menos não para ele. Passou por Lionheart sem dar-lhe chances para responder mais nada. Não entendia o que estava acontecendo ali, para ele Voyage já havia ficado em seu passado e de lá não mais deveria sair.

Com um sorriso irônico, Aioria voltou ao seu caminho. Estava orgulhoso de si mesmo. Milo merecera saber a verdade daquela forma. Sentia-se com a alma lavada.

Venon entrou no alojamento e não dirigiu a palavra a ninguém. Estava trancado dentro de si mesmo. Precisava digerir o que ouvira de Aioria. Apesar de tudo, saber que Saga havia se apaixonado mexia com os brios dele. Balançou a cabeça. Precisava de um tempo para si. Um tempo para colocar as coisas em ordem. Para entender que, no fundo, ele nunca o tivera como queria.

oOoOoOo

Dias depois...

Compenetrado no que fazia, Sentry quase não desgrudava os olhos do radar. Junto com ele, Boss, o operador mais experiente, tomava conta do rádio. A comunicação com as equipes de terra estavam todas ao seu encargo.

- Como está a situação, Boss? – Sentry voltou-se para o outro. O mais novo tinha orgulho de poder trabalhar com um profissional tão experiente.

Devido ao tempo de serviço, Shion já deveria ter deixado de trabalhar, mas continuava na ativa por amar o que fazia.

- As equipes três e quatro estão conseguindo avançar contra as chamas, mas creio que seja melhor enviar alguém para aquele setor. – Boss comentou ao voltar os olhos para o sueco. – Você sabe que um descuido para que eles sejam cercados por chamas e ficarem sem rota de fuga. – Recostou-se um pouco na cadeira e suspirou. Passou a mão direita sobre os cabelos esverdeados. Franziu um pouco a testa enrugando as duas pintinhas no lugar das sobrancelhas, marcas de nascença, que lhe rendera muitas brincadeiras.

- Vou tentar deslocar um dos nossos para lá. – Sentry respondeu. Suspirou. Sem Hunter, Voyage e Roux, estavam com o quadro de pilotos no limite. Muitos não tiravam folgas há bem mais que quarenta e cinco dias. E enquanto a estação do verão não terminasse, aquela situação não estaria solucionada. Os focos de incêndios muitas vezes começavam não pelas altas temperaturas, mas sim pelo descuido das pessoas que não tinham consciência e ainda teimavam em colocar fogo para livrar-se de entulhos e do mato ressecado.

- Roux e Voyage estão fazendo falta não é? – Shion resolveu comentar. – Quando o ruivo voltará? – Aquilo quase todos gostariam de saber e estavam evitando perguntar, ainda mais com o humor terrível que Mask estava.

- Não faço ideia. Soube que Camus está passando pela psicóloga do campo. – Afrodite voltou-se para olhar diretamente nos olhos violáceos do amigo. – Já tentei falar com Mask a esse respeito, mas ele acha que Camus não está preparado para voar, baseado nas informações da psicóloga.

- Entendo. Talvez no lugar dele eu tivesse surtado. – Voltou sua atenção para o rádio ao receber uma mensagem de uma das equipes em terra. – Prossiga equipe dois. – Pediu.

- Estamos presos por barreiras de chamas, Boss. Não temos como avançar e muito menos recuar.

- Chefe, vamos enviar a cavalaria alada. – Enquanto falava, Shion voltou-se para Afrodite e com apenas um olhar entenderam-se. O sueco merecia o codinome escolhido. Ele realmente parecia uma sentinela.

Pelo radar, o controlador buscou pelas naves mais próximas ao local da ocorrência. – Não temos ninguém no setor, Shion. O mais próximo está para voltar para a base e está sem argila e praticamente sem combustível.

- De qualquer forma, temos de enviar alguém para lá. Temos dez homens encurralados entre um paredão e as chamas. – Shion arqueou as sobrancelhas. O mais próximo estava a muitas milhas de distância.

- Pedir reforço para outro campo está fora de questão. – Grunhiu Mask. Seus olhos argutos fincaram nos dois controladores. – Mandem preparar o hidroavião de Roux.

- Mask, faz algum tempo que você não pilota mais... – Afrodite preocupou-se. Sabia que o namorado era muito radical e esquecia de seus limites.

- Sentry... – Mask fincou os olhos nele. – Afrodite, é como andar de bicicleta, não teime comigo. Estou lhe dando uma ordem. – Estreitou os olhos e logo em seguida saiu apressado. Precisava por a roupa anti-chamas.

O sueco trocou um rápido olhar com Shion. Com um suspiro resignado, entrou em contato com a equipe de abastecimento e fez a solicitação. Aquele italiano, quando queria, sabia ser bem convincente, mesmo com ele.

Em pouco tempo, Mask estava ao lado do Canadair. Fazia a checagem com o mecânico de Camus. Quando tudo já estava pronto e preparava-se para entrar no avião, sentiu uma mão tocar-lhe firmemente o ombro. Voltou seus olhos inquisidores na direção de quem o segurava. Iria falar poucas, mas controlou-se. A surpresa tomando conta de seus olhos azuis.

- Creio que esse avião seja meu. Precisam de você no campo para dar as coordenadas e eu estou pronto para assumir meu posto. – A voz baixa e fria. O olhar determinado.

- Você tem condições para levar em frente essa missão, Camus? A doutora Kyriakos liberou-o? – Perguntou o italiano. Não havia recebido nenhum comunicado.

- Eu estou bem. Mask, eu não preciso de uma psicóloga para me dizer se estou ou não apto a voltar ao meu serviço. Tenho condições! Eu vou aguentar a pressão, tudo. – Camus tinha passado pela doutora, mas desistira de ir. Não estava resolvendo nada e a cada dia que passava, ela parecia querer saber mais sobre ele do que estava disposto a falar. Não gostava de ser analisado. Não gostava de ter que falar de si mesmo.

- Está bem, mas se acontecer alguma coisa, qualquer coisa, você fica novamente sem pilotar até que seja liberado. – Mask grunhiu.

O ruivo concordou com o comandante da base e logo após receber as instruções, taxiou o Canadair e ganhou os céus. Sentia-se bem. Ele achara que nunca mais conseguiria pilotar um hidroavião, mas ali estava: senhor de si e de seus temores.

oOoOoOo

- Mask, mas é loucura! – Afrodite protestou pela terceira vez desde que o namorado voltara para a torre de comando.

- Não, não é. – Mask mirou-o seriamente. Fez o mesmo com Shion. Não iria aceitar ser contrariado. E Camus precisava daquele voto de confiança. – Ele precisa voltar à ativa. Se está sentindo-se bem, deixe-o. Sabemos que ele é bom.

- Mas a psicóloga...

- O que ela entende de pilotar aviões? Veja o que aconteceu com o pobre Hunter... Nunca mais voltou por ela achar que ele não tem o emocional controlado. Ora, todos nós sabemos que ele é esquentadinho, mas isso nunca o atrapalhou. Eu não vou deixar que ela faça o mesmo para Camus. – Mask grunhiu mais algumas palavras em italiano e saiu de perto dos dois. Se dependesse dele, a conversa estava encerrada.

- Afrodite... – A voz de Shion, profunda e calma, revelava o quanto ele estava pensativo. Seus olhos pareciam perdidos em um único ponto... uma das janelas. – Acho melhor, por via das dúvidas, mandar outro avião para lá. – Fez uma pausa e voltou seus olhos violáceos para o amigo. – Não que esteja duvidando do potencial de Camus, mas melhor prevenir. A área é grande e creio que só com algumas passadas não suavizará em nada para a equipe.

- Não sei o que Mask vai dizer, mas concordo com você. – Afrodite respondeu. Bom no que fazia, localizou uma aeronave mais próxima que havia decolado há pouco tempo e a enviou para lá. Suspirou. A sorte estava lançada e esperava que tudo desse certo.

oOoOoOo

- Chefe, aqui é o Roux, qual a situação? – Perguntou Camus, em seu primeiro contato com a equipe de terra. Ao avistar a fumaça negra tingindo o azul do céu, sentira seu coração disparar, mas controlara as emoções. Precisava ser frio como sempre fora.

- Roux, a situação está difícil aqui. Estamos cercados. Toda a equipe dois está entre o fogo. Estamos lutando bravamente, mas o calor está de matar. Temos muitas árvores em chamas, você terá de voar muito baixo, ou o calor fará com que a carga de argila e água não refresque nada. – A voz preocupada lembrava a um sinal de alerta.

- Já estou quase chegando. – Camus informou. Com calma, foi nivelando e estabilizando a aeronave. Sentiu-se agoniado. Era frio, não poderia deixar-se abater, mas era humano, com sentimentos como todos os outros.

O avião desequilibrou um pouco e no momento de liberar a carga, muito pouco do incêndio foi contido.

- Roux, você terá que baixar mais e manter o curso. – O chefe da equipe pediu.

- Ok! Vou fazer o contorno e tentar novamente. – O francês estava decidido. Precisava exorcizar seus fantasmas. Não podia deixar-se levar. Era experiente, sabia muito bem como agir, mas nunca tinha passado por nada parecido. Nunca havia perdido ninguém...

- Chefe, aqui é o Big, qual a situação? Estou a uns dez minutos atrás de Roux. – A voz grossa e divertida do piloto brasileiro fez-se ouvir.

- Está muito quente aqui, Big, e temos muitas chamas para serem apagadas. – O chefe informou ao recém chegado. – Roux irá passar dando um rasante, creio que você precisará fazer o mesmo. – Fez uma pausa. Uma das oliveiras explodira feito uma bomba. – Tomem cuidado, as árvores estão estourando feito granadas e bombas.

- Bom ter você por aqui, Big. – Camus comentou pelo rádio.

- Roux, vamos apagar esse fogo. Isso está parecendo fogueira de festa junina lá na minha terra. – Riu gostosamente. – E, chefe, fique tranquilo, não vou fazer nenhuma maluquice.

- Aldebaran, por favor... – Pediu Camus. Ele sabia que o brasileiro sempre estava de bom humor e que apesar do que pensavam muitos, ele sempre foi muito bom em sua profissão.

- Camus, você precisa rir mais. Soltar-se mais. – Aldebaran comentou. – Minha nossa Senhora Aparecida! Isso está um verdadeiro inferno! – Comentou, ao arregalar os olhos. As labaredas estavam altas demais. Ao longe, ele pode ver a aeronave do ruivo aproximando-se do local novamente. – Nivele, Camus. – Pediu ao perceber o avião um tanto desestabilizado.

O calor estava de matar. As correntes de ar quente deixavam o pilotar mais trabalhoso. Camus estava lutando para manter o avião estabilizado, mas mesmo para ele estava sendo complicado. O calor parecia puxar o avião para baixo. Ele tinha de segurar fortemente o manche para que não entrasse em um parafuso. Se estivessem próximos ao campo, ele tinha certeza que a biruta estaria rodando feito uma maluca. Trincou os dentes, a aproximação estava tornando-se difícil. O suor escorria-lhe pelo rosto bonito.

- Roux, baixe mais um pouco ou não irá surtir o efeito desejado. – Pelo rádio, o chefe pediu.

Sem nada dizer, Camus baixou mais o Canadair, o fogo lambia a fuselagem. Um descuido e poderia explodir feito uma bomba atômica. Tentou livrar a mente de qualquer pensamento desse tipo, mas ao piscar os olhos fortemente, uma imagem formou-se à sua frente. Balançou a cabeça, não poderia deixar aquilo acontecer. Muitos bombeiros precisavam de sua ajuda. Uma explosão do lado direito, uma única explosão e tudo pareceu voltar à sua mente. O avião desestabilizou.

- Camus, você está muito inclinado não vai conseguir fazer esse avião subir novamente. – O chefe informou. Na voz, a preocupação de quem já vira muitos pilotos experientes e novatos cometerem o mesmo erro, culminando em fatalidades.

Sem resposta. O francês parecia estar em transe. Uma nova explosão, agora muito próxima à asa esquerda. Uma voz em sua mente alertando-o do perigo. Puxou o manche com todas as suas forças e arremeteu para o lado livre. Como pudera pensar que estava livre de seus fantasmas?

- Roux... – Aldebaran chamou-o pelo rádio. – Camus, está tudo bem?

- Continue, temos uma equipe que precisa de sua ajuda. Algo foi danificado em minha aeronave. O compartimento não quer abrir para lançar a carga de argila e água. – Camus sabia que aquilo era mentira. Ele havia literalmente congelado. Não conseguira agir como sempre. O acidente de Saga ainda estava muito vivo em sua memória. – Vou para base.

- Mas Camus...

- Aldebaran, não tenho como ajudar. – Foi a última coisa que proferiu. Já não tinha mais tanta certeza se era capaz de executar aquele serviço. Começava a desconfiar de si mesmo. Não pudera salvar Saga e não iria ser diferente agora. Não iria conseguir salvar ninguém...

Continua...

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Curiosidades e Explicações Extras:

Mar Adriático*: A Grécia é banhada pelos mares: Egeus, Jônico e Mediterrâneo. Contudo, como você deve ter percebido, se passarmos uma linha reta entre as cidades de Paris e Atenas, passa-se pelo mar Adriático, cruzando-o praticamente de ponta a ponta. Não sei se a rota usada pelos aviões é essa, não sou piloto e muito menos entendo de navegação. Se estiver errado, desculpem, fiz o meu melhor.

Codinomes: Confesso que procurei muitas coisas, algo que casasse com cada dourado e até mesmo com o prateado infiltrado. XD Mas confesso que parece que a cada momento em que eu pensava que não conseguiria, uma luzinha no fim do túnel surgia e as coisas melhoravam. Alguns ficar óbvios demais, não foi minha intenção, mas verdade seja dita: Eu gostei muito do produto final. ^^'

Roux – Camus

Venon – Milo

Voyage – Saga

Expert – Kanon

[b]Blond – Misty

Sentry – Afrodite

Boss – Shion

Big – Aldebaran

Lionheart – Aioria

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Momento Aquariana no divã:

Sentada entre muitas folhas de pesquisa tendo pensamentos obscuros e tentando terminar uma fic sem que ela seja uma monstruosidade "enorme de grande". XD

- Esse não! – Joga uma folha para trás e acerta no pobre miau que saiu correndo miando feito um maluco. – Xi acertei o pobre Salém. – Coçando a cabeça. Dando de ombros. Esparrama mais folhas pela cama e algumas caem no chão. Várias anotações perdidas entre as impressões com mais pesquisas. – Yoru não pisa ai! – Gritando com a cachorrinha maluca que acabou levando nas patinhas várias folhas com rascunhos. – Eu mereço! – Batendo algumas folhas na cabeça. – Eu... – Olhando no relógio. – Puxa que azar esqueci a consulta. – Pegando o celular e discando um número já conhecido. – Doutor...

- Ma che! Poverella esqueceu novamente a consulta? – Uma voz com acentuado sotaque italiano responde do outro lado da linha.

- É... sabe o que é doutor...

- Io no quero saber de nada, capisce? Pelo visto esqueceu novamente a consulta com seu psicólogo por conta de uma nova porcaria de fic. Que mundo você está?

- Ora doutor, é uma fic importante e... Opa... Pera... Mas que diacho... Mask, o que você está fazendo do outro lado da linha? Eu liguei para o doutor e...

Risos do outro lado, na verdade gargalhadas.

- Você ligou errado...

- Ora, mas que mico. – Desligando o telefone. – Droga... Que gafe! – Coçando a cabeça. Suspirando. – Bem mais uma fic e mais uma consulta com o psi... psi... Ah! Vocês já entenderam né? Então, aí está! O primeiro capítulo no ar. Prometo não surtar antes de conseguir escrever o final.

Mask: Mas o final já está pronto! Ficou louca, vou chamar o hospício!

Caramba, Mask! Agora tu vai aparecer assim do nada?

Mask: Io posso! Io sou o phodastico! Io sou o gostosão.

*Ficwriter injuriada.*

Afrodite: Sim, você tudo pode, mas não para cima dela. *puxando-o pelas orelhas e levando-o embora*

*suspiro*

Bem, é isso aí. Deixando as maluquices de lado... XD

Espero que gostem.