- Você já se arrumou, moleque?
Tio Válter estava nervoso como sempre, mas era fácil perceber sua felicidade em se livrar do sobrinho. Ia passar mais nove meses longe dele.
Harry Potter desceu correndo as escadas. Apesar de já ter 15 anos, aparentava ser mais novo, devido ao seu porte físico. Sempre fora magricela, o que era muito proveitoso para seu primo Duda, que adorava bater nele. arry sempre apanhava. Isso era perfeitamente compreensível, pois Duda era gordo como um boi, e seu esporte preferido era bater nas pessoas.
Com uma cara vermelha contrastando com os enormes bigodes grisalhos, Tio Válter pegou o malão com as coisas de Harry e levou-o até o carro.
Depois que todos haviam entrado, Duda começou a brigar com Harry no banco de trás. Tio Válter, que já estava enojado por ter que levar Harry em seu carro novo da firma, tomou o partido do filho o tempo todo.
Numa atmosfera tensa, eles percorreram todo o caminho até a estação King´s Cross. Tio Válter estacionou o carro e desceu, enquanto Tia Petúnia ralhava com Duda, que não parava de gritar que queria sorvetes.
- Aqui está sua mala - disse Tio Válter, entregando a mala ao sobrinho, que acabara de sair do carro.
- Pode deixar que daqui eu vou sozinho - disse Harry a Tio Válter, que fechou a cara.
- Melhor pra você - retrucou ele, entrando no carro e fechando a porta. - Boa viagem.
O carro arrancou e sumiu na curva.
- Harry! Ei, Harry!
O garoto olhou para trás, esperando ver um de seus melhores amigos, Rony Weasley e Hermione Granger. Mas não era nenhum dos dois.
Quem estava gritando desesperadamente seu nome era um garoto de cabelos louro-cinza e olhos castanhos, bastante pequeno para sua idade. Seu nome era Colin Creevey, e ele era um grande fã de Harry. No ano anterior, Harry havia conhecido o irmão de Colin, Dennis Creevey, que também havia passado a admirá-lo.
Dennis estava ao lado de Colin, também correndo na direção de Harry. Era extremamente parecido com o irmão; na verdade, os dois seriam idênticos, se Colin não fosse dois anos mais velho que Dennis.
Colin agora estava no quarto ano, e Dennis no segundo. Harry sinceramente desejou que Colin tivesse amadurecido um pouco.
- Ei, Harry! - disse Colin quando finalmente o alcançou. - Como você está, hein? Está tudo bem? Andou enfrentando Você-Sabe-Quem de novo durante as férias?
- Hum... não, Colin, não andei - respondeu Harry, desinteressado.
Dennis, então, começou a falar:
- Deixa eu atravessar a barreira com você, Harry? Deixa, vai?!
- Não, Dennis! - gritou Colin, irritado. - É comigo que ele vai atravessar.
- Por favor, Harry, vai comigo! - insistiu Dennis, e Harry pôde ver uma lágrima nascer no seu olho.
- Está bem, Dennis. Eu vou com você - disse ele, olhando para Colin, que pareceu entender a mensagem. "Pelo menos ficou mais esperto", pensou Harry.
Harry postou-se ao lado de Dennis, enquanto Colin se juntava aos pais, que finalmente os haviam alcançado.
O pequeno garoto respirou fundo e olhou para Harry, que disse:
- Vamos!
Eles correram, empurrando os carrinhos com as malas, até o muro que separava a plataforma nove da dez. Quando estavam chegando perto, aumentaram a velocidade e encostaram na barreira.
Então, o cenário se modificou diante de Harry e Dennis. Onde não deveria haver nada além de concreto, abriu-se uma plataforma ferroviária completa, com um grande trem vermelho rodeado de fumaça, que tinha na locomotiva uma placa onde se lia: "Expresso de Hogwarts". A plataforma seria também comum, se não transitassem por ela pessoas vestidas com longos robes pretos, embaixo de chapéus pontudos. É claro que para elas nada havia ali de anormal, uma vez que todos os transeuntes daquela plataforma pertenciam à mesma sociedade. Eram todos bruxos.
Logo atrás de Harry e Dennis, vieram Colin e sua mãe, seguidos por sua vez, pelo pai de Colin. Harry olhou para os lados, à procura de um sinal de Rony ou Hermione, mas não viu nenhum rosto conhecido. Então, observando melhor, viu um rosto que pensou reconhecer. Porém, antes que Harry pudesse chamar seu nome, Colin puxou-o de lado e disse:
- Ei, Harry, preciso falar com você sobre o meu irmão.
Harry ainda olhou para trás, na tentativa de localizar mais uma vez aquela face em meio à multidão, mas não teve sucesso. Ela havia desaparecido.
- O que é, Colin? - perguntou Harry, frustrado.
- Ouça: o Dennis está com sérias dificuldades nas notas. Ele simplesmente não consegue prestar atenção às aulas do Snape, nem às da McGonagall.
"E não é o único", pensou Harry.
- O problema - continuou Colin. - É que ele não aprende quando eu tento ensiná-lo. Estive pensando que talvez você poderia...
- Hum... podemos conversar depois, Colin? Preciso ir.
Sem esperar resposta, Harry se afastou de Colin. Tinha visto Rony e Hermione logo adiante, prestes a subir no trem.
- Rony! Mione! - chamou Harry, correndo até eles.
Os dois olharam para trás, surpresos.
- Harry! - gritou Hermione.
Harry os alcançou depois de muitos esbarrões.
- Por que você não respondeu às minhas corujas? - perguntou Rony.
- Você sabe muito bem por quê - respondeu Harry, aborrecido. Tio Válter havia trancado a coruja de Harry, Edwiges, numa gaiola durante todo o verão. O quarto onde Harry dormia tinha trancas nas janelas, de forma que Tio Válter teria de aturar os pios tristes da coruja durante a noite, mas pelo menos não haveria possibilidade de Harry se comunicar com "aquela gente" durante as férias.
Harry então contou aos dois como havia tido o azar de cruzar com Colin.
- O quê?! - se espantou Hermione. - Você acha que ele quer que você ajude o Dennis a estudar?
- É - respondeu Harry, amargurado. - Eu nem conheço o Dennis direito. Só sei que é chato que nem o irmão.
- Se você quiser -sugeriu Rony. -, nós podemos ajudar você a ajudar o Dennis!
- É - concordou Hermione. - Aí tudo estaria perfeito!
Harry sacudiu a cabeça, nervoso.
- Não - falou. - Estaria perfeito se eu não tivesse cruzado com eles!
Eles subiram no trem e andaram pelo corredor até encontrar uma cabine vazia. Eles se sentaram e abriram a cortina da janela.
Ao ver a multidão de alunos que transitavam lá fora, Harry se lembrou de algo. Então, contou a Rony e Hermione quem havia visto por uma fração de segundo na plataforma.
- Por que você não foi falar com ele? - perguntou Mione.
- Eu não podia, aquele chato do Colin não queria me largar.
- Não sei o que tem de extraordinário - disse Rony, revistando seus bolsos à procura de alguns sicles. - Ele é aluno também, natural que estivesse lá.
- Eu sei - disse Harry, pensativo. - Mas eu nunca falo com ele, fiquei curioso para saber como estava.
- Bom, se você quiser, depois podemos procurá-lo no trem. Ele deve estar por perto - disse Hermione.

Alguns minutos depois, passou pela cabine deles a bruxa que vendia doces, com seu carrinho cheio de feijõezinhos de todos os sabores, sapos de chocolate e outras delícias. Harry comprou três bolos e vários sapos de chocolate, além de três saquinhos de feijõezinhos. Dividiu tudo com Rony e Hermione. Rony quis pagar.
- Não quero dinheiro - disse Harry. - Sua amizade vale muito mais do que estes doces.
Rony ficou vermelho e sorriu. Hermione lançou um olhar de aprovação a Harry, satisfeita com sua atitude.
Harry havia agido de forma gentil: o que mais falava na vida dos Weasley era dinheiro. Era uma família muito bondosa e simpática, e mereciam mais que ninguém a felicidade. Porém, o ouro deles mal dava para os livros da escola. Rony, no entanto, não gostava de se lembrar que era pobre, por isso Harry sempre tinha que inventar pretextos para pagar as coisas para o amigo.
Depois que o trem já havia se afastado o suficiente da cidade, Harry, Rony e Hermione resolveram colocar as roupas de bruxo. Já trocados, ficaram conversando, até que Hermione se lembrou:
- E o Simas, Harry? Você não vai falar com ele?
Harry havia se esquecido completamente de que vira Simas Finnigan na plataforma nove e meia, e achava que de certa forma Rony tinha razão: o que havia de extraordinário?
- Falar o quê, Hermione? "Oi, Simas, eu te vi na plataforma e fiquei curioso para saber se você estava vivo"? Ridículo.
- Bem, Harry, foi você quem o viu e teria falado com ele se não fosse por Colin. Alguma coisa você ia dizer, não?
- É normal - retrucou Harry. - encontrar uma pessoa por coincidência e perguntar como ela está. Mas não é normal procurá-la no trem só para perguntar isso! Além disso, ele deve estar com o Dino.
- E daí? - indagou Rony, pondo na boca um sapinho de chocolate que sobrara.
Harry não soube responder. Se alguém pudesse ler os seus pensamentos, o veria concluir que simpatizava mais com Simas do que com seus outros dois companheiros de dormitório além de Rony, Dino Thomas e Neville Longbottom. Mas não sabia o motivo.
- Eu não vou falar com ele - decidiu. - Mas se encontra-lo novamente vou perguntar como ele está.
O resto da viagem transcorreu sem problemas até a estação de Hogsmeade, onde os alunos desembarcaram. Rúbeo Hagrid, guarda-caça de Hogwarts e amigo de Harry, Rony e Hermione, começou a guiar os alunos do primeiro ano, enquanto os alunos veteranos foram levados até carruagens puxadas por algum animal invisível. Harry, Rony e Hermione acomodara,-se em uma delas e, como havia um lugar desocupado, ficaram esperando que entrasse mais alguém.
E entrou. Inesperadamente, um homem grisalho, de nariz aquilino e rosto levemente severo embarcou na carruagem. Quando levantou os olhos, pareceu surpreso ao ver que havia mais gente lá.
- Boa tarde - disse, embora já fosse quase noite. - Vocês são do quarto ano?
- Quinto - disse Hermione interessada. - O senhor é professor?
- Sou - respondeu o homem. - Meu nome é Keith Roberts. Leciono Defesa Contra as Artes das Trevas.
Houve um silêncio constrangedor, e não foi sem motivo. O cargo de professor de Defesa Contra as Artes das Trevas era freqüentemente abandonado e preocupado em Hogwarts, e não havia nenhum professor que ficasse mais de um ano no emprego.
- Hum... - Rony ia dizer algo, mas se calou.
Como se adivinhasse o que havia passado pelas mentes dos garotos, Roberts disse:
- Não se preocupem, pretendo ficar mais de um ano em Hogwarts.
Os três ficaram sem graça. Não queriam que o professor tivesse percebido seu constrangimento.
Ficaram naquele silêncio desagradável até a carruagem se aproximar de Hogwarts. Mais bonito e pomposo do que nunca, o castelo parecia estar dando as boas-vindas aos alunos.
As carruagens pararam. Hagrid, que ia na carruagem da frente, desceu e andou até uma grande e pesada porta de madeira, que estava a uns quatro metros à frente. Ao chegar, bateu.
A porta começou a se abrir, e Harry pôde ver a professora de Transfiguração, Minerva McGonagall, dar algumas instruções ao guarda-caça. Ele foi até as carruagens e disse:
- Podem descer!
Todos desembarcaram, e então Hermione notou que Roberts era o único professor que tinha vindo com os alunos. Todos os outros provavelmente já estavam no castelo, preparando-se para a Cerimônia da Seleção.
- Por que o senhor não está lá dentro? - perguntou ela.
- Eu estava cuidando de um assunto - respondeu o professor. - Não se preocupe, Dumbledore explicará tudo na hora da Seleção.
Os alunos foram entrando em fila, guiados por Hagrid, até chegarem ao Salão Principal, onde já estavam postas as quatro mesas das casas: Grifinória, Lufa-Lufa, Sonserina e Corvinal. Harry, Rony e Hermione pertenciam à Grifinória. Eles se sentaram, e Harry correu disfarçadamente os olhos pela mesa à procura de Simas. Não queria dar o braço a torcer para Hermione.
Por fim o encontrou, lá no fim da fila que vinha em direção à mesa da Grifinória. Ele se sentou na ponta da mesa.
Pensando em algo que tomou toda a sua atenção, Harry sentiu a Cerimônia da Seleção e o banquete que se seguiu passarem em segundos. Hermione e Rony, entretidos numa conversa sobre o professor Snape, não notaram a distração do amigo.
Harry só saiu do se estado de torpor mental quando o diretor de Hogwarts, Alvo Dumbledore, se levantou e disse:
- Eu gostaria agora de dizer algumas palavras de sorte para este começo de ano.
Harry ficou bem atento ao que ele diria a seguir. Estava curioso para saber qual era o assunto que havia feito com que o professor Roberts, que agora estava sentado à mesa dos professores, viesse com eles na carruagem dos alunos.
- Este ano - começou Dumbledore. - será um ano diferente. Receberemos em nossa escola, provavelmente no mês de Outubro ou Novembro, uma visita muito ilustre.
Um burburinho fez-se ouvir, como acontecia sempre que Dumbledore falava alguma novidade.
- Quem será, hein?
- Eu acho que é Você-Sabe-Quem!
- Não seja idiota!
- Talvez seja uma fada...
- Essa visita - continuou o diretor num tom levemente mais alto, para que pudesse ser ouvido em meio ao que agora já era uma avalanche de comentários e suposições. - é uma pessoa muito especial, com um detalhe peculiar: ela é trouxa.
A fala foi geral. Assobios de espanto e muitos comentários. Dumbledore, já irritado, disse:
- Acontece que, mesmo sendo trouxa, ela sabe sobre nós bruxos. Eu quero que essa pessoa venha a Hogwarts porque estou tentando transforma-la em bruxa também. Não se preocupem, ela não revelará nada sobre nós. Eu e ela laçamos um pacto mágico. Eu sou o fiel do segredo dela, um segredo jamais revelado, então ela não se atreverá a comentar sobre o mundo mágico lá fora.
Repentinamente, Dumbledore indicou Keith Roberts com o dedo e disse:
- Esse é Keith Roberts, nosso novo professor de Defesa Contra as Artes das Trevas. É ele quem está cuidando dos ajustes com nossa visita especial. Afinal, tudo tem que ser perfeito para que ela seja transportada a Hogwarts. Teremos inclusive de usar uma poção especial nela, para que ela possa ver o castelo.
- Como assim? - perguntou Harry para si mesmo.
- Bem se vê que você não leu Hogwarts, uma História. O castelo é protegido por certos feitiços que fazem com que, aos olhos dos trouxas, ele seja apenas uma construção abandonada.
Harry fingiu não ter ouvido Hermione. Detestava quando ela se intrometia em seus pensamentos e começava a falar de Hogwarts, uma História.
Dumbledore ainda estava falando da visita, quando Simas fez a pergunta que estava entalada na garganta de todos os alunos.
- E quem é essa visita?
Dumbledore olhou para ele com seus óculos de aros dourados em forma de meia-lua, respirou fundo e disse:
- É uma atriz muito famosa de Hollywood. Seu nome é Lucky Star.