Abra os olhos

Capítulo 1

Prazer, Majorie.

Sentou pesaroso no banco de pedras. Pôs sua maleta sobre a mesa. Olhou ao redor.

- Nossa... Que dia bonito... – comentou para si mesmo.

Suspirou profundamente e deitou a cabeça sobre os braços, em cima da pasta. Estava sem um pingo de coragem para começar com aquilo. Andava muito desanimado nos últimos dias. Aliás, nos últimos meses. Ou seria nos últimos tempos?

Mas assim que começava a pensar essas bobagens logo afastava a idéia da cabeça. Por que se sentiria assim? Era um jovem advogado, formou-se há pouco e já tem trabalhos incríveis no escritório com seu pai. O que mais podia querer?

Nem ele próprio sabia a resposta. E sempre que se questionava tentava ocupar sua mente com trabalho. Era o que ele melhor sabia fazer: trabalhar. Muito provavelmente por que sempre foi a única coisa que fez da vida. Além de estudar, claro.

- Ler processos em um banco de praça... Que ótimo dia para faxina no escritório! – exclamou.

Suspirou mais uma vez. Afrouxou a gravata, tirou o paletó e o pôs no encosto do banco. Abriu a pasta e pegou uma porção de documentos. Sem nenhuma vontade começou a passar os olhos pelas letras miúdas.

- 13ª Vara criminal... Ação contra Hattori Kido... Denúncia de homicídio culposo...

- Eeeeeee! – gritava e ria uma voz infantil e feminina ao longe. O advogado tentou não se desconcentrar.

- Hunf... Duas mortes... Dirigia embriagado hmmm... Advogado público o da família dos rapazes...

- Uhuuuuuuullllll! – gritou novamente a voz.

- Quer parar com esse barulho! – berrou o advogado.

A menina se calou imediatamente e abraçou um saquinho que segurava. Todos os pombos com os quais ela brincava voaram assustados com o grito do advogado.

SBLOSH

- Mas hein! Pombas malditas! Vão cagar em cima de outro!

A garota desatou a rir ao longe. O homem tirou um lenço e limpou seu ombro resmungando. Arrumou-se novamente e voltou a ler os documentos.

- Moço...? – disse uma vozinha angelical.

O rapaz baixou o papel e surpreendeu-se com que viu. Não era exatamente uma menina, e sim uma moça. E muito bonita por sinal. Tinha seus 18 ou 19 anos.

A garota riu da cara assustada que fez o rapaz, ela estava brincando com a sua voz. Em seguida sentou-se no banco ao lado e puxou assunto, agora com sua voz normal.

- E aí como que tá, tio?

- Hunf... Estou bem... E tentando trabalhar... – resmungou ele.

- Ahn... Quer farelo de pão? – ela lhe ofereceu o conteúdo do saquinho que segurava.

- Argh... Não, obrigado. – ele fez uma careta de nojo.

- Eu estava dando para as pombas, mas você as espantou... Se o senhor não quer então como eu!

E a menina abriu o saquinho e começou a comer.

- Ei! Não faça isso! – protestou o rapaz.

A menina gargalhou e lhe mostrou o conteúdo.

- São pipocas, bobo! – disse ela, sorrindo.

- Afs! Você não tem vergonha de ficar importunando os outros não? Não devia estar na escola?

- Eu não, já estou de férias! Estamos em Dezembro, tio! E você, não tem vergonha?

- De quê?

- De desperdiçar uma tarde tão linda dessas no meio deste monte de papel chato?

O homem a olhou de soslaio.

- Não estou desperdiçando. Estou trabalhando, estamos em plena quarta-feira!

- Sim, eu sei... E você sabia que as idéias mais geniais e legais que a gente tem aparecem no meio de uma tarde ociosa de quarta-feira?

- Minha quarta-feira não está sendo ociosa... – respondeu ele secamente.

- Por isso você não idéia geniais e nem faz nada divertido!

O homem bufou irritado.

- Pare de me encher a paciência! Por que você... – ele então é interrompido pela garota, levando o dedo à boca, como se pedisse silêncio.

- Shiiiiu, shiu! Começamos mal!

- Ahn?

- Vamos tentar de novo... – a garota respira fundo e de súbito exibe um largo sorriso.

- Olá! Meu nome é Marjorie! E o seu?

O rapaz fica sem entender a situação.

- Ahn... Me chamo Shaka... – e timidamente estende a mão para ela.

- Prazer!

O rapaz finalmente repara na garota. Tinha um belo sorriso doce e angelical. A pele avermelhada, de queimado de sol, rosto com traços simples e bonitos. Cabelos pretos e curtinhos, virados para trás, davam a ela um ar de menina.

A aparência do rapaz também chamou atenção de Marjorie. Ela enxergou uma beleza em Shaka que a maioria das pessoas não enxerga. Ele é um rapaz tímido, introvertido, com um belo rosto escondido atrás de cabelos loiros que lhe tapam a face e de óculos de lentes grossas que lhe escondem os olhos azuis.

- Ei! Vamos tomar um sorvete? – sugeriu alegremente a jovem.

- Er... Não posso, tenho que terminar isso... – desculpou-se Shaka

- Nossa, que feio! Recusar o convite de uma moça! Tsc, tsc... Por isso não tem namorada!

- Ei! Você não sabe nada sobre mim... Como pode falar se tenho ou não?

A garota olhou-o de soslaio.

- E você tem?

- Er... Não...

- Então vem logo!

Marjorie enfiou os papéis de Shaka na pasta e fechou-a. Em Seguida saiu correndo com a pasta.

- Eeeeeee! Sorvete!

- Ei! Garota! Volte aqui! Tenho que trabalhar! Devolva minha pasta, droga!

Marjorie corre até o sorveteiro, sendo seguida por Shaka.

- Me vê dois de chocolate! – disse ela ao sorveteiro.

- Ei... ei...Espere pô! Não quero de chocolate! Tem de frutas?

- Ei, peça os seus! Os dois de chocolate são pra mim!

-Afs... Me vê um de morango...

O sorveteiro entrega os sorvetes ao advogado.

- Er... Marjorie? – Indaga-se Shaka. Ele olha ao redor e não vê ninguém.

- São três e cinqüenta, parceiro... – diz o sorveteiro.

- Sim, mas a garota... Ela...

O sorveteiro ficou a encará-lo.

-Ceeeerto...

- Er... Tudo bem, ela sumiu... Acontece, né? Ta aqui a grana! – E Shaka entregou-lhe o dinheiro.

Foi caminhando à procura da menina, mas não a via em parte nenhuma.

- Iuuuhuuuuu! – ouviu chamar – Aqui loirão!

Shaka virou-se e viu Marjorie sentada sob a sombra de uma árvore.

- O que você está fazendo aí?

- Oras, sentada sob a sombra de uma árvore! Não ta vendo?

- Claro que estou vendo... duh...

- Então vem sentar comigo! E traga os sorvetes! Nham nham!

Shaka foi até onde estava Marjorie e lhe entregou os dois sorvetes de chocolate. Coloca a pasta na grama e senta sobre ela.

O advogado recostou no tronco da árvore e se espreguiçou longamente. Respirou fundo e sentiu um gostoso ar campestre inundar seus pulmões. Sentiu-se mais leve, tranqüilo. E então se voltou ao sorvete. Estava delicioso. Saboreou cada pedaço como se fosse a primeira vez que tomava.

- Ei, há quanto tempo você não tomava sorvete? – perguntou Marjorie.

- Humm... Não sei, por quê? – respondeu Shaka.

- Sei lá! Me deu vontade perguntar... Você não parece ser o tipo que toma muito sorvete!

- Ué... Por quê?

- Não sei... Você me parece meio... Hmmm... Não sei!

- Como assim?

Shaka estranhou as palavras de Marjorie. Não que as outras coisas que ela falou fizeram muito sentido, mas desta vez tinha se superado.

- Ah Shaka, não sei explicar... Quando eu achar as palavras eu te conto!

Shaka ficou olhando-a sutilmente, enquanto ela devorava avidamente os sorvetes de forma angelical.

- Marjorie... Quantos anos você tem?

- Dixoituh...

- Ahn?

GLUMP

Marjorie terminou de engolir os sorvetes, limpou a boca nas mãos e então respondeu novamente.

- Dezoito!

- Ah sim... E você costuma vir sempre aqui? Digo, correr atrás de pombos e tomar sorvetes com estranhos?

- Mas você não é estranho... É bem normalzinho... Hmmm... Diria que normal até demais...

Shaka não compreendera muito bem

- Normal demais? E isso é ruim?

- Às vezes... Quantos anos você tem Shaka?

- Er... 23.

A garota se espanta.

- Cruzes! Sério!

- Por quê?

- Me pareceu bem mais velho...

- Posso saber por quê?

- Ah não sei... Acho que é isso que eu tava querendo dizer aquela hora. Você me parece muito velho. Tipo, é só um pouco mais velho que eu e já está aí todo atolado em trabalho... Acho que você precisa de um trato!

- Trato? – Shaka achou graça dessa vez – Pra quê?

- Para ficar mais divertido, sei lá!

- Se ser divertido é sair que nem louco atrás de pombos, não muito obrigado! – respondeu ele secamente.

Marjorie ficou sem jeito.

- Mas, er... Não tem nada de errado brincar na praça com pombos...

- Parece-me coisa de doido. Além de ser nojento...!

Marjorie muda bruscamente seu semblante, olhando Shaka de soslaio.

- Tudo bem que me chame de doida. Prefiro ser doida do que chata... Mas nojenta não!

- Afs! Você fica o dia todo sentando no chão, correndo nessa praça atrás de pombos. Esses bichos são nojentos!

- Melhor eles do que os ácaros!

- Ahn... Que ácaros? – indagou Shaka confuso.

- Esses que vivem no seu paletó, no seu pulmão, entrando e saindo do seu nariz, montando cidades no seu cabelo... É muito mais saudável sentar aqui no chão, respirar esse ar puro e correr atrás de pombos do que ficar trancafiado o dia inteiro em um escritório, respirando um ar viciado de ar-condicionado com filtro sujo, mexendo com papéis e mais papéis. Argh...

- Mas... er... ahn...

Shaka ficara sem jeito pra valer dessa vez. Mas logo recuperou sua pose quando o seu celular tocou.

- Alô... Pronto? Ótimo, estarei aí em um minuto... – e desligou. – Está muito bom o papo garotinha, mas vou ter que ir. Já terminaram a faxina e tenho muito que fazer.

- Hmmm... Que pena! Eu também gostei de conversar com você!

Shaka estranhou a doçura com que ainda foi tratado. Ou Marjorie ignorou sua ironia ou não a percebeu.

- Er... bem... Então, tchau!

O advogado levantou-se, pegou sua maleta e saiu.

Marjorie ficou a acenar sorridente para ele.

"Muito gente boa, só que ta precisando de um trato!" – pensou consigo mesma Marjorie.

"Cruzes, que garota louca!" – Pensou Shaka consigo mesmo.

Depois que o advogado sumiu no horizonte a garota se espreguiçou longamente. Depois olhou pelo caminho feito por Shaka e sorriu misteriosamente.

- Até amanhã, loirão...

Continua...


Palavras do Autor

" Ae pessoal essa fic eh bem light, comédiazinha com lição de moral e talz. Prometo alguns mistérios e um final supreendente. Quem gosta do Shaka vai adorar... Espero uheueheuheue! Esse é meu presente pra minha amiga secretaAkane Kittsunedo Pan Box! Feliz natal pra você e tudo de bom nesse próximo ano! Beijão do Pinguim!"