Paralelo
Duas retas paralelas apenas se encontram no infinito (Mito da matemática).
Disclaimer: Por razões que só o Criador sabe, não fui a escocesa a inventar Harry Potter. Igualmente, enquanto só brinco com os personagens, Rowling é aquela a que Harry Potter, nomes e associados pertencem.
Sumário: Universo Alternativo – Desde os sete anos, Tiago Potter é o melhor amigo de Severo Snape, e isso estava bem até que eles começaram a escola e estão em Casas separadas. Lutando para manter a amizade e desviar o amigo do caminho das Artes das Trevas, Tiago terá que lidar com Black, que o odeia, e sua parceira inseparável, Evans, que confunde Tiago na maior parte do tempo. Talvez tudo fosse mais simples se ele fosse o esquisito e não estivesse se apaixonando pela garota mais popular da escola.
Esclarecimento 1: Vamos explicar a idéia da fic com exemplos: Já assistiu a Smallville ou Merlin, séries inglesas? Bom, no primeiro caso, Lex Luthor e Clark Kent são melhores amigos; no segundo caso, Arthur é um príncipe convencido e irritante, Guinevere é uma criada e Morgana tem medo dos próprios poderes. Não preciso realmente chegar ao final das duas séries para saber que Clark sempre vira o Super-Homem enquanto Lex sempre vira o vilão da história. Arthur será o rei justo de Camelot, Guinevere o amará embora sinta algo por Lancelot e Morgana será a bruxa má. Se o final nunca muda... a jornada pode.
Esclarecimento 2: A fic se passa em um universo alternativo, mas é tão Canon quanto possível, o que se tornará bem claro logo no próximo capítulo. Então, esperem tudo que ocorre com os Marotos, porque provavelmente irá acontecer.
Avisos: Eu não leria se não gostasse muito de Tiago Potter, já que a história é totalmente centrada nele – por outro lado, talvez lendo você comece a gostar? Quem sabe. Eu também não leria se não suportasse Severo Snape, porque ele é parte importante aqui. Sirius Black, a propósito, é quase odiável às vezes – mas sempre terá suas razões, juro. Lily Evans é complexa demais para mim ou Tiago Potter entender. E, sinceramente, ignore as paranóias de Tiago quanto à relação de Black e sua melhor amiga.
Um último aviso: Não tenho a fic pronta, o que, evidências comprovam, costuma ser um problema na minha vida. Mas achei que dessa vez era pertinente, porque preciso (e quero) a opinião das pessoas - reviews são ótimas, para eu saber onde estou errando, o que falta ou só os comentários/dúvidas em geral ;)
Capítulo I – Segunda primeira impressão
---------
"Olhe, Harry, Tiago e Snape se odiaram desde o primeiro em que se viram, foi uma dessas coisas, dá para você entender, não dá?" – Sirius Black, HP e a Ordem da Fênix
---------
- Cara - eu disse, sem nem erguer o olhar do livro de Transfiguração –, você está fazendo aquilo de novo.
- Hum?
- Babando por Lily Evans, como se ela fosse algum dia te olhar de volta – eu respondi, numa voz cheia de tédio, porque era a décima vez desde o começo do semestre que eu o lembrava desse pequeno fato. Eu nem precisava desviar minha atenção para saber que ele estava revirando os olhos e franzindo a testa, o que o deixava ainda mais carrancudo que o normal. O olhar feio dele não me abalava, claro. Eu sabia, e ele também, que não havia jeito de garotas bonitas como Lily Evans saírem com Severo Snape ou Tiago Potter. Nós não éramos exatamente populares, para começo de conversa.
Eu quero dizer, Severo não era exatamente bonito – não que eu tenha sequer pensado no assunto, mas não havia uma fila de garotas correndo atrás dele, como sempre acontecia com Sirius Black, o melhor amigo da Evans, e isso deveria significar algo. E Snape era Sonserino, algo que Evans sempre pareceu abominar; o fato de ele ter aquele olhar permanentemente sério e, bom, o cabelo meio oleoso, não devia ajudar nada. Sério, se eu fosse uma garota, e descobrisse que havia um rapaz sinistro olhando para mim do jeito que ele costumava olhá-la, eu já teria ido ao Departamento de Execução das Leis Mágicas e exigido que ele não pudesse ficar a menos de um quilômetro de distância. Ou, se eu fosse Evans, teria cortado o cabelo – porque aquelas ondas vermelhas refletindo à luz do sol eram realmente perturbadoras – ou usado óculos de lente escura, para que os olhos verdes não pudessem mais hipnotizar algum inocente.
Mas eu não era Lily Evans – na verdade, se houvesse o oposto dela, deveria ser eu. Porque eu não era popular; eu era o estranho da Grifinória cujo melhor amigo era um sonserino. Dava para entender porque eu não era melhor amigo de pessoas como Sirius Black, então – e, se eu interpretasse corretamente os olhares dele, ele me achava um verme por andar com "escórias como Snape". Eu não me importava, de verdade. Exceto pela parte do quadribol, que eu amava, mas nunca teria chance de entrar no time. Isso me incomodava, mesmo que voar sozinho nos domingos à noite fosse reconfortante. Sem pressão, sem ter que agradar a torcida, sem o risco de sofrer contusões com balaços – o que mais eu queria da vida?
Eu só não era um completo desconhecido por causa do meu sobrenome – "Potter". Você sabe, toda aquela história de ser uma das últimas famílias tradicionais, descendente direto de um dos Peverell, melhor aluno em Transfiguração. Nada que me desse muito orgulho, porque o que fiz para ser um Potter? Nasci só. E quanto à habilidade para transformar mesa em cadeira? Minha varinha era boa nisso. E, certo, eu podia ter um condão para essa área da magia, mas não queria dizer nada. Black também tinha, e a única diferença entre nós era que eu não escutava garotas sussurrando para mim se eu não queria fazer uma mágica com elas.
- Você nunca sabe – Severo me disse, e a essa altura eu quase já tinha me esquecido do que ele estava falando, e só tinha certeza de que não era sobre eu e garotas. Mas só podia ser de Lily Evans, claro. Desde o primeiro ano, quando ele a olhou pela primeira vez, ele tinha uma espécie de atração maluca por ela; culpa daqueles olhos verdes cor-de-mar, provavelmente. Ele insistia que era mais verde como esmeralda, e eu só revirava os olhos; ele nunca viu o mar, então não sabia do que eu estava falando. – Talvez eu a convide para o baile de formatura.
- Boa sorte – murmurei, sem querer dizer que o baile de formatura estava a quase três anos de distância. E que Evans provavelmente iria com Sirius Black, que devia ser o seu par ideal no mundo. Os dois eram populares, lindos e gênios. Ao contrário de mim. E de Severo, mas ele era cego demais para notar isso.
Embora, devo confessar, não cego para não notar aquela Evans de 11 anos. Porque tudo que ela tinha com essa idade eram os olhos, já encantadores; claro que quando eu tirava sarro dele por causa disso, eu não sabia que no verão Lily Evans seria capaz de mudar tanto. Em um instante, ela tem 13 anos e está correndo pelos gramados de Hogwarts com Black, Lupin e Pettigrew, provavelmente pensando na sua próxima brincadeira – aquela vez em que fizeram a barba de Dumbledore ficar roxa foi demais -, e então, bum, ela vira uma garota linda. De repente, o cabelo dela começou a crescer e, droga, o vermelho era encantador, e ela usava maquiagem, e tinha todas essas novas curvas, e estava de mãos dadas com alguns garotos, sortudos o suficiente para não serem azarados por Black. Eu quero dizer, ouvi que o processo de seleção para conseguir um encontro com Evans é realmente difícil e doloroso. Por isso que Severo nunca teria uma chance. Ele e Black se odiavam. E, conseqüentemente, Black parecia não me suportar.
Era meio estranho pensar que eu me entendia melhor com os amigos sonserinos de Severo do que com alguém da minha própria Casa. Mas o sobrenome "Potter" era grande o suficiente para fazer com que os sonserinos não se importassem com nossa amizade, mesmo alguém da Grifinória – o que era, Severo zombava, a única coisa imperdoável em mim. Eu não me importava, mas também não começaria a ter altos papos com os amigos dele – porque eles eram ainda mais sinistros do que Snape podia ser às vezes, e as conversas deles eram assustadoras. Mas eu conhecia Severo Snape desde os sete anos, e ele era meu melhor amigo desde então. Se tinha algo de que eu me orgulhava em mim, era minha lealdade aos amigos. E, para quem não era popular, eu imaginava que tinha o suficiente.
Havia os gêmeos Prewett, que iam se formar naquele ano, e eu adorava discutir desde coisas como quadribol – eles insistiam que eu deveria tentar me tornar apanhador no próximo ano – até outros assuntos como o que fazer fora da escola. Eles iam entrar para a Academia de Auror, e eu achava isso o máximo. Severo iria rir, mas eles eram meio que meus heróis.
E tinha Frank Longbottom, que já tinha se formado, e a namorada dele, Alice, do mesmo ano que eu. Eles eram provavelmente o casal mais famoso da escola – até, pelo menos, que Evans e Black resolvessem se casar – e, eram gentis comigo, mesmo que eu fosse "o calado com o amigo-cobra", como Black também dizia. E havia Marlene McKinnon, o que não contava muito, já que éramos primos. Lupin era razoável comigo, mas nós nunca sairíamos do "bom-dia" ou "fez o trabalho de ontem" por causa da relação óbvia dele com Black.
E se havia algo que eu nunca entendera muito bem, era como pessoas como Lupin e Pettigrew tinham se juntado a Evans e Black. Quero dizer, não consigo imaginar um mundo paralelo em que pessoas com Evans e Black não tivessem se atraído; a única coisa que Evans não tinha era uma árvore genealógica tão mágica quanto Black, mas imaginei que os genes de inteligência e brilho – como Slughorn às vezes dizia – podiam compensar o resto. E Lupin era lá um dos mais aplicados, com notas altas, e sabia tudo sobre Defesa Contra as Artes das Trevas; mas ele era monitor esse ano, então eu não entendia como ele podia se unir a Black e Evans, cujo propósito de vida devia ser tentar fazer outras pessoas rirem. Às vezes, como quando as velas do Salão Principal ficaram cantando "Parabéns para você", ele conseguiam. Outras, como quando resolviam enfeitiçar uma única pessoa, não. E Pettigrew, então? Ele obviamente não era o mais brilhante. E o que ele sabia fazer de melhor era ficar idolatrando Black e babar para Evans, o que, sério, metade da população masculina aqui faria melhor no lugar dele.
Eu sabia, por exemplo, que Severo tinha uma caixa inteira de poemas dedicados a Evans. O que eu jamais iria confessar, porque então teria que explicar como havia descoberto isso – o que envolvia minha Capa da Invisibilidade, e meu pai tinha feito eu jurar que eu não contaria a Snape. Às vezes, eu tinha uma impressão engraçada de que meu pai não gostava de Severo Snape. Tudo, talvez, porque Severo tinha sido pego, uma vez, lendo um livro de Arte das Trevas, retirado da biblioteca de casa. Mas ele tinha admitido o erro e jurado que nunca iria repeti-lo, então qual o problema? Meu pai não devia ter mantido o livro para começo de conversa. Todo mundo erra ou faz algo estúpido uma vez na vida.
Tirando, talvez, Black, porque quase tudo que ele fazia eu achava estúpido. Às vezes, não dava para acreditar que ele era afilhado dos meus pais – o que nos tornava praticamente irmãos. Hilário e absurdo.
Severo ainda olhava para Evans, então eu fiz a única coisa que era suficiente para distraí-lo nesses casos. Joguei meu tinteiro nele.
- Ei! – ele reclamou, mas eu não me sentia particularmente arrependido. E ele não pareceu também lamentar, porque o grito dele foi suficiente para que Evans olhasse para ele por dois segundos – o rosto de Severo ficou absurdamente vermelho -, antes que o olhar dela se prendesse ao meu.
Eu não precisava de três segundos sob os olhos cor-de-mar de Lily Evans para saber que eles valiam uma caixa inteira de poemas dedicados a eles.
Então, como era de se esperar, Black falou algo que chamou a atenção dela – sem dúvida, para lhe lembrar que eu era uma pária social – e fui libertado do olhar de Evans. Uma parte de mim fica mais aliviada com isso, porque ela realmente poderia ter algum tipo de poder sobre mim – ou qualquer outro – se quisesse. Outra parte, que estava fixa no modo com o sol se refletia nos cabelos dela, como se tivesse em brasa, ou em como os lábios dela talvez estivessem curvados, e talvez ela tivesse sorrido para mim, não se importava em estar sob o poder dela.
Respirei fundo e meneei a cabeça, tentando me livrar dessas idéias, quando meu olhar encontrou o de Severo. O meu melhor amigo parecia saber exatamente dos meus dilemas internos, pelo modo com que sorria debochado.
- É difícil, não é? – ele perguntou, os olhos brilhando com superioridade. – Resistir ao encanto dela?
A minha resposta original era que, pelo menos, eu ainda não tinha começado os poemas de amor, mas eu me contive.
- Eu nunca disse que não entendia a sua fixação – retruquei, revirando os olhos. – Só que é uma paixão sem esperanças. – Voltei meu olhar para a página 102 do "Manual do Animago", como se nunca tivesse me desviado do livro. – Porque ela está fora de alcance.
- Ela me olhou agora – ele argumentou, como se aquilo resolvesse a questão.
- É, para mim também – lembrei, e aquela parte de mim se sentiu satisfeita com isso. – O que não quer dizer que ela está louca de amor. – Aquela parte murchou, então o meu orgulho resolveu interferir. – O que eu agradeço.
Ele riu, incrédulo.
- Então você não iria gostar de sair com Lily Evans?
Aquela parte de mim teve uma visão agradável, em que eu estava de mãos dadas com Evans, e ela ria, totalmente feliz, e seu rosto estava próximo do meu... Só que nós não estávamos exatamente sozinhos. Isso seria impossível com Evans, porque ela meio que fazia parte de um pacote.
- Claro – respondi, cheio de ironia. – Vou fazer isso depois que me tornar melhor amigo de Black, e nós tomarmos chá todos os dias na casa um do outro.
Às vezes, eu achava que era por isso que Severo odiava tanto Black – ele invejava a sua proximidade com Evans, invejava a popularidade dele, que vinha do quadribol e da aparência.
Severo tornou a rir.
- E não se esqueça, depois que for bajulado por Pettigrew e levar Lupin para passear.
Eu fechei o meu livro, olhando para ele de um jeito mais sério. Ele deu de ombros.
- O quê? – Severo perguntou, na defensiva. – Você sabe que ele é um lobi...
- Eu sei o que você acha do assunto – lembrei, cortando-o antes que alguém pudesse ouvir as suas opiniões. Aquele devia ser o último final-de-semana bonito de outubro, e todo mundo estava nos gramados de Hogwarts. – E você não tem nenhuma prova.
Ele revirou os olhos.
- Então é normal um aluno sumir uma vez por mês, sempre na Lua Cheia? E aparecer mal no dia seguinte? E aqueles uivos e boatos em Hogsmeade?
Eu odiava admitir, mas os argumentos dele eram verdadeiros; Remo Lupin ser um lobisomem era algo que eu não me espantaria se realmente fosse verdade, mas eu nunca incentivara essa idéia de Severo por uma única razão: ele iria querer que Lupin fosse expulso da escola. Eu o conhecia o suficiente para saber disso – ele odiava Black e odiava os seus amigos, mesmo que Lupin o tratasse tão educado quanto me tratasse. E não era justo que Lupin fosse condenado por algo que provavelmente nem era culpa dele: quem iria querer ser um lobisomem?
- Talvez ele só tenha uma família problemática – eu comentei, só me sentindo um pouco culpado por usar essa desculpa. – Você deveria entender isso.
Isso fez Severo franzir a testa novamente, e se voltar para sua tarefa de Poções. Ele não iria mais falar comigo por alguns minutos, o que sempre acontecia quando eu trazia o assunto da sua família à tona. Não era como se o seu pai fosse um tema recorrente em nossas conversas, mas às vezes não precisava ser gênio para saber por que ele só saía da minha casa ao anoitecer durante as férias. Eu não sabia como seriam as coisas para ele se meus pais não tivessem resolvido se mudar para o subúrbio de Londres no meu sétimo aniversário.
Ele provavelmente nunca teria tido um amigo até chegar em Hogwarts. Suspirei, e talvez o barulho do meu suspiro tenha sido realmente alto, porque Evans olhou na minha direção novamente.
Eu desviei rapidamente, antes que começasse a querer fazer poemas, ou que, como ouvi ter acontecido com um dos irmãos Prewett, Black resolvesse interferir. Eu nunca estive realmente a fim de saber qual de nós venceria em um duelo, e agora não me parecia uma boa hora para começar.
---------
Qualquer um acharia que o fato dela ser amiga dos meus pais – eles freqüentaram Hogwarts na mesma época, pelo que sei -, Minnie McGonagall poderia ser mais gentil comigo. Mas, não, ela realmente me prendeu na sala dela em uma tarde de domingo, para falar que eu deveria me esforçar mais se quisesse que meu pedido para iniciar o curso de animagia fosse aprovado no Ministério da Magia. Eu quero dizer, o que mais eu precisava fazer além de ser sempre o primeiro a conseguir as transformações na aula dela?
Eu sabia que devia ter seguido o conselho de Severo e ter me tornado um animago em segredo. Seria muito mais fácil – e eu não estaria em cima da hora para o jantar.
- Você precisa da recomendação de nove professores. Para isso, é realmente aconselhável que passe em nove N.O.M's – ela me dizia, ignorando os barulhos cada vez mais altos do meu estômago. – E o Ministério requere Excelente em Transfiguração, naturalmente, Feitiços e Poções.
Poções? O folheto do Ministério da Magia não dizia nada sobre isso... Se eu apenas queria mudar meu corpo, sem poção, para que eu deveria saber a matéria? Além disso, eu não era um dos favoritinhos de Slughorn.
- Eu vou tentar, professora – garanti, mas o olhar dela continuou severo. Como se ela tivesse algum outro tipo de olhar. – Ok. Eu vou conseguir.
- Muito bem, Potter – ela declarou, com a voz um pouco mais leve. – Não se esqueça que eu, o Prof. Flitwick e o Prof. Slughorn estaremos a sua disposição para quaisquer dúvidas.
Eu acenei e parti, tentando ignorar o buraco no estômago que agora não tinha nada a ver com a fome. Porque eu odiava Poções e era horrível na matéria. Cinco caldeirões explodidos desde que eu entrei em Hogwarts – era-se de esperar que as pessoas entendessem que eu não queria nunca mais ver a matéria. Mas, ao invés disso, eu iria ter que continuar com ela. Adeus plano de desistir de Poções no sexto ano. Severo iria rir de mim...
Lancei um olhar a ele, do outro lado do Salão Principal, conversando com Mulciber e Avery. Arrepio. Não era como se eles tivesse sido estúpidos ou tivessem me tratado mal, mas eu não gostava deles – havia algo errado naqueles dois, e eu já tivera provas disso; mas quando eu mencionava como eles eram sinistros, Severo só ria e dizia que eu estava sendo bobo. Ainda assim...
Poções. O meu problema atual era sobre aquela aula chata. Eu quero dizer, se eu fosse uma gênia nata como Evans ou soubesse inventar como Severo fazia, talvez eu gostasse das aulas. Ou se talvez Slughorn não passasse metade do tempo elogiando Evans, enquanto ela só ria, dizendo que ela deveria estar na Sonserina – e as respostas dela até valiam a pena, porque eram divertidas. Talvez a única parte que valesse pena em Poções, porque era difícil prestar atenção com o aroma das poções fervendo, ou o fato de que Black ficava jogando rabos de rato ou olhos de sapo em mim. Sem querer, claro.
E eu só via três soluções à frente, sendo nenhuma delas me animava. Pedir ajuda a Severo? Isso seria... humilhante. Não devia ser, porque éramos amigos, mas eu não conseguia me imaginar passando horas de sábado estudando com ele sobre o uso correto de asfódelo ou qualquer coisa assim. Pedir aulas extras a Slughorn? Claro, Black ia ter um ataque de risos quando descobrisse. E a terceira opção... era ainda mais engraçada, porque em nenhum mundo Evans iria desperdiçar seu tempo livre comigo. Isso iria fazer Black rir ainda mais...
- Potter? Tiago?
Eu pisquei, acordando, e me virei. Remo Lupin estava olhando na minha direção, sorrindo. Sorri de volta, e desejei não pela primeira vez que Lupin fosse tão irritante quanto Black, porque aí eu não sentiria essa vontade de ser educado com ele.
E desejei que Minnie não tivesse me segurado por tanto tempo na sala dela, porque aí eu teria chegado cedo para o jantar e teria escolhido meu lugar, ao invés de estar do lado do quarteto majestoso da escola – ou, como eles referem a si mesmo, "Os Marotos". "E a marota", Evans sempre acrescentava quando algum deles mencionava o seu estranho nome, o que me fazia revirar os olhos, entediado.
- Eu estava te chamando há uns dois minutos – Lupin comentou, achando graça, e ainda assim de um modo decente.
- Ah, desculpa, Lupin – eu disse, lutando para prestar atenção. Era muito fácil minha mente se desviar. - O que foi?
E me obrigando a manter o foco mais próximo do presente, voltei a comer as batatas fritas.
- Encontrei o Prof. Dumbledore no corredor e ele pediu para te entregar isso – ele me deu um envelope. – Eu sei que não é a melhor hora, mas eu não vou poder entregar mais tarde...
- Sem problemas – eu disse, distraído. – Obrigado, claro. Tem reunião depois?
- Reunião?
- É, dos monitores.
- Não exatamente. Eu vou ter que ir à enfermaria, por causa da minha... saúde – Lupin respondeu, e sua voz tremeu um pouco. Olhei para ele, curioso, e então olhei para o teto, onde a lua, quase cheia, reinava sozinha.
- Ah – murmurei, sem olhar para ninguém, porque de repente eu me sentia sem graça. Uma coisa era comentar o assunto com Severo, quando era especulação e não na mesa da Grifinória.
- Não é exatamente da sua conta, Potter – ouvi uma voz fria me dizer; Sirius Black me encarava, de um jeito nem um pouco simpático.
De repente, a mesa havia ficado um pouco mais quieta e tensa. Fiz o que eu sempre fazia quando ele me dirigia a palavra – o que era muito raro e nunca agradável.
- Eu não quis te ofender – eu declarei, olhando só para Lupin. Não era como se eu fosse me importar com Black. Meu meio-irmão – que idéia estranha.
- Eu sei que...
- Talvez você devesse então repensar suas palavras da próxima vez, antes de falá-las.
Respirei fundo e coloquei algumas batatas fritas na boca, para não responder.
- Ou talvez você devesse se mudar logo para a Mesa das cobrinhas, onde não iria incomodar ninguém.
Algumas pessoas riram. Eu me virei para olhar para ele. Eu não ia dizer nada, porque nunca dizia, mas era bom encará-lo diretamente nos olhos, sem piscar, esperando que ele desistisse.
- Sirius.
Era Lily Evans. Ela estava ao lado dele, quase de frente a mim, mas não ergueu o olhar do seu suco de abóbora. A voz dela não tinha um tom de aviso ou raiva ou alegria ou qualquer outra emoção. Era como se ela só tivesse lido o nome em algum lugar, numa voz absurdamente neutra, e ainda assim, Black agiu como se tivesse levado uma bronca, porque ele desviou o olhar e voltou a comer, voltou a me ignorar, o que eu queria que ele tivesse feito durante todo o jantar.
Só que não depois que Lily Evans o tinha dito para fazer. Eu não queria ser defendido por ninguém, porque nunca pedi por isso e porque eu não precisava.
Eu não queria ser defendido pela namorada de Black.
Então fiz algo que eu nunca tinha feito antes.
- Eu não incomodo ninguém, Black. Só a você. Talvez isso queira dizer que você deva se mudar.
Ele olhou para mim, surpreso.
- Como?
- A afinidade com as "cobrinhas" está no seu sangue, não no meu – lembrei, bebendo tranquilamente meu suco, enquanto ignorava o zumbido na cabeça. – Olhe, acho que eles têm um lugar ainda reservado para você.
Black se levantou.
- Eu não sou da Sonserina – ele retrucou, sua voz subitamente calorosa. – Porque escolhi não me associar com puros sangues preconceituosos e amantes de artes das trevas. Ao contrário de você, Potter. Então quem aqui é mais sonserino?
- Eles são preconceituosos? E você, com toda essa história de Casas?
- Eu não saio matando pessoas por causa disso! – ele respondeu, quase gritando, e isso causou um silêncio maior; não era como se ninguém soubesse do que ele estava falando, mas esse Lord Voldemort nunca chegara a entrar em uma das conversas em Hogwarts. Aqui nós éramos protegidos, e ele não passava de um conto de terror.
Porque os desaparecimentos podiam ser só pessoas que resolviam mudar de vida. E as mortes podiam ser bandidos comuns. E as inferis podiam ser crianças que acordavam assustadas e inventavam. Claro.
- Sirius – Evans tornou, e agora ela parecia aborrecida. Era melhor conseguir reconhecer uma emoção na Rainha de Gelo. - Você deveria...
- Sr. Black! – a Prof. McGonagall chamou, soando irritada. – Termine o seu jantar em silêncio ou terá uma semana de detenções. – Ela me pegou olhando-a. – O mesmo vale para você, Potter.
Eu poderia dizer que não tinha começado, mas isso seria infantil demais.
- Eu não estou mais com fome, professora – Black declarou, dando-lhe as costas e saindo do Salão Principal, o que eu não lamentava nem um pouco.
Lupin olhou para mim, como se pedisse desculpas, e eu acenei para ele enquanto Pettigrew saía correndo atrás de Black, parecendo um cachorro desesperado.
Respirei fundo, tentando me controlar, e descobri que, para variar, metade da mesa ainda estava me olhando.
- Algum problema? – perguntei, em uma voz cansada, e os olhares cessaram. Exceto o de Lily Evans, que, para meu espanto, não saíra correndo atrás do namorado.
- Lily? – Lupin chamou, parecendo confuso. Ela acenou.
- Eu já estou indo – ela respondeu, e ele deve ter reconhecido algo no tom dela, porque se foi sem mais perguntas. Talvez desvendar os tons da voz de Evans fosse um segredo de "Maroto".
- O que foi? – perguntei, enfim, quando o olhar dela começou a me cansar. Imaginei se eu deveria recomendar a Severo que explodisse com Black, para que, então, Evans pudesse olhá-lo de volta.
- Você não deveria ter dito aquilo a Sirius, sobre a família dele – ela só disse, e não era como se fosse uma bronca, porque a voz dela era suave.
Como se explicasse algo difícil a uma criança de seis anos. E fez com que eu me sentisse uma criança de seis anos.
Qual era o problema de Lily Evans? Como se não bastasse enfeitiçar meu melhor amigo e o resto da escola, incluindo os professores, ou ser a garota mais popular, ou ser uma aluna perfeita, ela ainda tinha que fazer eu me sentir minúsculo?
Tudo porque, pela primeira vez em cinco anos, eu tinha resolvido responder a Sirius Black? Por que ela não podia fazer ele se sentir infantil quando ele estava jogando coisas em mim? Ou quando ele dizia que eu não merecia ser da Grifinória? Ou quando ele sumia com as toalhas do banheiro e eu tinha que conjurar uma?
Ah, porque ela era amiga e futura esposa dele, não de mim. Isso fazia muito sentido.
- Eu esperava mais de você – ela acrescentou, e antes que eu pudesse reagir, Evans deu as costas e se foi.
E então eu me sentia mais confuso que nunca.
---------
Era mais de onze da noite quando eu voltei à Sala Comunal, seguro com a minha Capa da Invisibilidade e muito mais feliz após ter voado. Talvez eu fosse me arrepender das poucas horas de sono no dia seguinte, quando as primeiras aulas eram Poções – quem decidiu que haveria aula dupla de Poções na segunda-feira certamente me odiava –, mas eu precisava de umas horas de distração. Não havia nada, eu considerei enquanto dobrava minha capa e a guardava no bolso, tão bom quanto a sensação de estar nos ares, onde nenhum problema poderia me alcançar.
- Tiago Potter?
O som do meu nome fez meu estômago dar uma cambalhota, algo que eu não havia sentido nem enquanto realmente fazia loops com a vassoura. Meu olhar rodou pela Sala Comunal e se fixou em Lily Evans. Ela estava a frente da lareira, o que a fazia ficar assustadoramente bonita, e seu olhar estava fixo na minha face – isto é, até ela notar a vassoura que eu ainda segurava na mão.
E então ela só parecia surpresa, do mesmo jeito que eu me sentia por ela, afinal, saber o meu primeiro nome.
- Você estava voando?
O tom dela não era de incredulidade ou deboche, e uma parte de mim sabia disso, mas a mini-conversa do jantar estava fresca na minha mente.
- É. Vamos adivinhar, você não esperava isso de mim?
Ela ergueu as sobrancelhas, deixando a pena descansar no tinteiro.
- Claro que não. Por que eu iria esperar? – a voz dela era até educada, mas tudo que eu pensava é que Evans não deveria esperar nada de mim. Ela não me conhecia. Ela mal falara comigo nos últimos anos.
E eu era o oposto dela em termos de popularidade.
- Você não iria. Então, sim, eu gosto de voar à noite. Sim, eu sei voar. Não, eu nunca pensei em entrar para o time, porque é óbvio que ninguém ia querer que eu entrasse; provavelmente iam achar, igual ao seu namorado, que eu iria entregar o jogo para a Sonserina. Sim, pode ir contar para o seu namorado, pode ir fazer piada de mim. Não é como se fosse novidade.
Mais tarde, eu iria achar ridículo o meu discurso, mas na hora eu gostei. Era a maior quantidade de palavras que eu já tinha dito a Evans, e estava cheio de superioridade, como se eu tentasse mostrá-la que ela não tinha o poder de fazer eu me sentir minúsculo.
Só que o olhar dela não mudou, então comecei a me sentir menor que o normal.
- Eu não vou contar para ninguém, Potter, porque não é da minha conta – ela declarou, acabando de assinar a sua carta. – Você obviamente tem suas razões para não querer se juntar ao time.
Eu me senti um completo idiota, então fiz a única coisa que fazia sentido. Sentei na outra poltrona, do outro lado da mesa, e murmurei:
- Desculpa.
Ela me olhou, sem entender.
- Por eu ter explodido com você. É só que... Eu sempre acho que as pessoas vão me julgar.
- Elas provavelmente irão – Evans respondeu, em uma voz meio melancólica. Como se alguém tivesse julgado Evans negativamente em algum momento da vida. – Mas você não pode se deixar levar por isso.
- É difícil – comentei, no mesmo tom. Ela me lançou um olhar engraçado.
- Você sempre ignorou Sirius. Até hoje, claro.
- Ah. Então você está me julgando, porque só parece que eu o ignoro.
Lentamente, ela sorriu.
- É, acho que estou. Desculpa.
Eu ri, e uma parte de mim notou como era absurdo eu estar rindo, à meia-noite, com Lily Evans. Outra parte achou que podia ser normal.
- Então talvez eu também estivesse te julgando quando dizia que esperava mais de você – ela acrescentou, se levantando e começando a arrumar suas coisas. – Mas era um julgamento bom. – Ela parou o que estava fazendo para me olhar e os olhos dele eram hipnotizadores com o fogo se refletindo neles.
Eu jurei que jamais iria zombar de Snape ou Pettigrew ou qualquer outro por estarem apaixonados por ela. Quem não estaria?
- Você devia ignorar Sirius da próxima vez, Potter. Ele não consegue pensar direito às vezes... E realmente odeia seu amigo.
Ela revirou os olhos, como se isso não fosse importante; mas Evans tinha ganhado pontos comigo por ao menos admitir que Black fosse irracional. Exceto que, para mim, aquilo era uma constante.
- Boa noite – ela desejou, e sorriu agora para mim, como se eu não fosse o esquisito da Grifinória com um número limitado de amigos.
- Boa noite – eu disse, meio atrasado, mas ela não pareceu notar.
- Ah, Potter... – Evans hesitou, sua testa franzida como se estivesse confusa. – Sirius não é meu namorado. – E, sem me olhar, ela subiu as escadas, com as coisas todas juntas de qualquer jeito em seus braços. E enquanto ela subia, eu pensei que, afinal, Lily Evans era normal; popular, claro, e amiga do cara mais idiota que eu conhecia, mas ainda assim tão normal quanto eu podia ser.
E linda, além disso.
Eu sorri, sem saber direito a razão. Talvez fosse porque Evans era legal comigo, e era bom conhecer mais pessoas, ou talvez porque uma parte do meu cérebro estava concentrada no fato de que ela não estava namorando Black e parecia ter querido deixar aquilo bem claro.
Eu ri e me levantei, irracionalmente mais alegre do que estivera em muito tempo.
Foi quando eu reparei no pergaminho caído. Peguei-o e, no mesmo instante, eu soube que era de Evans, por causa da letra miúda e florida, que eu já tinha visto nos trabalhos. Fiquei parado, dividido entre deixar ali ou guardar para ela, e então, sem que eu realmente entendesse o que estava fazendo, meus olhos começaram a varrer a carta.
Era para a mãe dela. Falava sobre não poder comparecer a algum lugar. E a justificativa, que foi o único parágrafo que realmente li.
"Preciso realmente ficar aqui nesse Natal, porque preciso estudar para Poções e Transfiguração, ou não irei conseguir as notas necessárias. Sei que Petúnia, que sempre se preocupou com minha educação, entenderá, mãe".
E não fazia sentido, porque Evans era brilhante em Poções e boa em Transfiguração. Mas só o que eu podia imaginar era que... Ela não queria ir para casa no Natal? Mas estávamos em Outubro, era tão cedo para fazer qualquer plano...
O som de passos apressados na escada me alertou, mas eu não conseguia fazer nada. O pergaminho estava na minha mão, aberto e brilhando contra o fogo, e tudo que eu pude fazer foi encarar o rosto afobado de Lily Evans.
- Ah, Potter, eu esqueci a minha... – E ela reparou na carta que eu segurava. O rosto dela ficou branco. Por dois segundos, Evans pareceu totalmente perdida, e procurei, desesperado, algo para falar. Então, ela ficou furiosa, de um jeito que eu nunca tinha visto. – Isso NÃO é da sua conta! – ela gritou, tomando o pergaminho e amassando-o.
- Eu... eu sei que não, eu...
- Você leu?
- O quê? – Eu queria dizer que não, que tinha acabado de pegar, mas a verdade devia estar óbvia na minha face, porque ela só ficou mais vermelha. Então eu disse a única coisa que pensei para resolver a situação: - Eu não vou contar a ninguém.
- Não, não vai – ela sacou a varinha, e não pensei em fazer o mesmo. – Se você disser...
- Evans – chamei, aborrecido. – Eu já disse que não vou. Juro.
- Como se a sua palavra valesse algo, Potter! Como se você não fosse contar para aquele seu amigo sonserino na primeira chance que...
- É, talvez eu devesse! – finalmente explodi. Evans só me fitou, respirando fundo. – Não é como se você esperasse que eu fosse fazer algo diferente. Ou, ainda, é como se você esperasse ser tão importante que eu não terei nada melhor para fazer do que ficar comentando sobre a sua vida.
- O que você não irá fazer!
- Não, Evans, eu não vou! – gritei. – E isso é porque eu não quero falar, porque eu sei que não é da minha conta, e não porque você exige.
E, tentando reforçar minhas palavras, passei por ela direto, sem olhar para trás, o que talvez não tenha sido uma idéia inteligente já que ela ainda estava com a varinha erguida. Mas eu não conseguia me importar, porque tudo que eu queria era mostrar para Evans que ela não ia me afetar. Eu não a deixaria saber como eu estava decepcionado comigo mesmo por ter me deixado acreditar, por poucos instantes, que ela era igual a mim, e não tão parecida com Black.
Brinquei de jurar a mim mesmo que eu não iria, nunca mais na vida, sequer pensar em Lily Evans.
No próximo capítulo: Evans declara guerra contra Tiago Potter, Tiago desconfia que a ruiva possa ser mais ardilosa do que ele imaginava e Sirius Black comete um erro letal. (Espera-se postagem em duas semanas – mas evidências comprovam que sou horrível com datas).
