Disclaimer: Final Fantasy XII pertence a Square-Enix, junto com todos seus personagens. Criatividade e breguisse cabem unicamente a mim.
Inverno
Estava
nevando. Não que a vista para a cidade de Archades deixasse de
ser bela, só era diferente naquela época do ano.
O ar parecia pesado naqueles dias, a respiração tomava
forma de fumaça perto dos lábios e em todo canto haviam
pessoas com mais roupas do que o necessário. Apesar de tudo,
Larsa gostava de neve, gostava de sentir o frio chegar e se enfiar
debaixo dos grossos cobertores de sua cama, acender a lareira que
ficava apagada nos dias de verão e primavera. Quando estava
exausto demais no fim do dia, seu guardião, Gabranth, lhe
trazia uma xícara de chá quente e insistia para ele ir
para a cama. Ele sempre recusava, dizendo que tinha muita coisa para
fazer, mas Gabranth sempre ganhava o round o pegando no colo e
o colocando gentilmente na cama, todo protetor e cuidadoso como
sempre era, claro, protegido pelas paredes do quarto do pequeno lord.
Fora delas, a não ser que estivessem sozinhos, uma barreira
muito mais grossa que a camada de metal do capacete que usava os
separava, uma subjugação e polidez enorme vinda do
Judge que afastava Larsa indiretamente. Mas ele não conseguia
se esconder para sempre atrás da armadura.
O príncipe não conseguia dormir naquela noite, nem
depois de três xícaras de chá que seu leal
guardião havia lhe dado. Era verdade que o frio tinha grande
parte da culpa, mas o garoto sentia algo a mais no ar. Gabranth, como
sempre, estava ao lado da porta, de pé, já sem o
capacete, como Larsa insistia quando ficavam sozinhos por muito
tempo, o observando tentar ler um ofício pela quarta vez
naquela meia hora. Finalmente o moreno soltou um suspiro de
frustração e se levantou, indo até a cama
enorme, se sentando.
- Gabranth, você se
importa de me acompanhar até os jardins? Eu sei que está
um frio intenso e já passa da meia noite, mas tenho medo de
que, se não tomar um ar fresco, vou ter um colapso.
- Não me importo, Lord Larsa, é sempre agradável
te acompanhar... - o loiro disse pegando o capacete da armadura,
quando o príncipe o parou antes, a pequena mão enluvada
em seu pulso, o olhando com um sorriso cansado.
- Não, por favor, deixe este pedaço horrível de
metal aqui. Eu lhe peço. Ademais, provável que não
tenha ninguém acordado no palácio a esta hora. - ao
sentir o braço do loiro relaxar, o pequeno lord o puxou para
fora do quarto, pegando um manto no caminho.
Os
dois caminhavam sorrateira e silenciosamente pelas sombras altas e
maciças do palácio adormecido. De vez em quando ouviam
vozes e era a vez de se esconderem numa pilastra próxima, só
para descobrirem servos comuns que ainda estavam acordados. Chegando
ao jardins sem grandes complicações, sem Larsa perceber
que todo este tempo estava segurando firmemente na mão do
guardião que, apesar do silêncio e cortesia, ficou
embaraçado com tal aproximação. Ao pisarem no
caminho de pedras que levava a um grande labirinto, Larsa apertou o
manto contra si, o vento gelado lhe arrepiando, mas, mesmo assim, não
soltava a mão do loiro. O guiou facilmente pelo labirinto, que
conhecia desde os três anos, era seu lugar favorito em todo o
palácio, indo em direção a uma pequena praça,
com direito a banquinhos de madeira belamente esculpidos e uma fonte,
congelada a esta altura da estação.
O príncipe finalmente largou a mão do loiro, que
sentou-se em um dos bancos, deixando que o pequeno fosse até a
cascata de cristal projetada pela fonte, não conseguindo
conter um sorriso ao observar o quanto ele ficava ainda admirado com
o prisma de cores noturnas que se mostravam no gelo, puro e
cristalino como os adoráveis olhos azuis que o fitavam.
Adoráveis? Ultimamente Gabranth tinha pensamentos muitoestranhos direcionados ao seu protegée. Por
exemplo, o quanto, apesar de considerar isso proximidade demais
e, conseqüentemente, desrespeito, apreciava os toques suaves de
Larsa, mesmo que ocasionais e raros. Ou que ainda se pegava admirando
a beleza andrógina do principezinho, o contraste da pele
pálida com os cabelos escuros, o azul intenso e cativante de
seus olhos, até que se repreendia internamente por deixar o
olhar ponderar sobre o quão bonito era o corpo do jovem
lord.
Foi tirado de seus pensamentos pelo
simples toque das mãos de Larsa em seus joelhos, a visão
do pequeno lord trêmulo a sua frente o impelindo a abraçá-lo,
mas o guardião reuniu todas suas forças para não
o fazer e somente sorrir.
- Sim, Lord Larsa? -
por mais que tentasse, não conseguiu se segurar e colocou uma
das próprias mãos sobre a do garoto, que sorriu de
volta, se sentando a seu lado, olhando para cima.
- Não é nada. É só que você parecia
pensativo demais, não que eu quisesse interomper seu
raciocínio, mas é que... eu fico com ciúmes dos
seus pensamentos que lhe ocupam mais da sua atenção que
eu. - ele riu baixinho, ainda com uma das mãos em seu joelho,
o olhar fixado na fonte congelada.
- Lord
Larsa, posso garanto-lhe que o senhor vem em primeiro lugar em meus
pensamentos. - o guardião não acreditou no que havia
dito, mas se aliviou em perceber que o sorriso do jovem lord só
aumentou. Entretanto, se incomodou polidamente quando ele se encostou
em seu braço, semi-cerrando as órbitas azul-opala.
Gabranth pôde sentir as batidas cardíacas aumentarem o
ritmo, o garoto virou a mão e entrelaçou os dedos nos
dele. Isto lhe pareceu [btão[/b errado, mas, ao mesmo tempo,
tão confortante. Porque, na vida como Judge, ele conhecia
pouco ou nenhum carinho, e agora, ao tê-lo tão perto,
com suas barreiras totalmente em xeque e sem ao menos o metal para
encobrir seu rosto, fazia com que todo seu corpo experimentasse uma
sensação de inquietante conforto. Sem mencionar que
podia dar a desculpa do frio para as bochechas coradas, o simples ato
de se envergonhar perdido há muito tempo para Gabranth. Em seu
caminho para se tornar um Judge, ele havia posto de lado sentimentos
e sensações que estavam voltando gradualmente conforme
convivia mais com o príncipe.
Ah, mas,
ao mesmo tempo que errado lhe pareceu o garoto ficar de joelhos no
banco e enlaçar timidamente seu pescoço, sem dizer
nada, a visão do rosto igualmente corado dele fez Gabranth
finalmente colocar de lado suas barreiras e o abraçar de
volta. A respiração quente e pausada do menino em seu
pescoço lhe deu arrepios impossíveis de conter tanto
quanto eram proibidos.
- Lord Larsa, eu não
acho que... - "que seja adequado."; "que seja
apropriado", pensou, quando foi interrompido.
- Gabranth, por favor, deixe-me ficar só um pouco assim. - ele
sussurrou, apertando os braços em seu pescoço, se
aproximando mais. O loiro podia sentir o calor do corpo do pequeno,
não resistindo em correr uma das mãos por suas costas,
se surpreendendo por agir com tanta ousadia assim. Como se não
bastasse isso, Larsa encostou o rosto com o dele, sentindo-o tão
quente quanto si próprio. A esta altura, os batimentos
cardíacos de Gabranth eram tão rápidos e fundos
que ele tinha medo que o jovenzinho os ouvisse ecoando pela armadura.
Por mais correto, por mais que soubesse seu devido lugar, o guardião
não conseguiu resistir mais, levou uma das mãos até
o rosto pequeno do garoto, afagando com carinho, até o virar
para si mesmo, tão perto que a respiração dos
dois se confundiam e o vermelho quase vinho que tomava conta de ambos
parecia o mesmo.
- G-Gabranth... - foi a última
coisa que Larsa sussurrou, antes de perder a voz para os lábios
do guardião. Um beijo inesperado, sensível e tímido,
sem nenhuma malícia a mais, já que este foi um ato
extremamente corajoso da parte do loiro. Afinal, ele tinha o triplo
da idade de seu jovem lord, sem mencionar que era apenas um Judge
Magister e ele, um príncipe. Mesmo assim, foi um beijo em que
pôde colocar toda sua admiração pelo pequeno,
todo seu carinho e dedicação. Depois do que pareceram
aos dois uma eternidade, se separaram, ambos envergonhados demais
para dizer qualquer coisa. Larsa se sentou de volta no banco, com os
dedos enluvados na frente dos lábios, enquanto Gabranth fixou
o olhar na fonte, extremamente embaraçado com o que acabara de
fazer.
- Eu... eu acho que é melhor
voltarmos para meu quarto. Preciso... dormir. Já é
tarde. - o príncipe se levantou e o olhou. Sorriu, quase um
sorriso culpado, e estendeu a mão para o Judge. - Vamos?
- Lord Larsa, eu...
- Sssh. Não vamos
querer estragar a cumplicidade das estrelas ao falar sobre isso bem
embaixo delas. Não hoje. - e o guardião suspirou,
aceitando a mão de Larsa e se levantando, caminhou junto com
ele até o quarto. Quando foi para o seu próprio
finalmente descansar, tinha fresco na memória o beijo e isso o
ajudou a carregar seus próprios pecados, limpando a mente
antes de deixar que o sono o tomasse.
