Lágrimas ao céu



Às vezes me pergunto se choverá quando for a minha vez. Se os céus se cobrirão de nuvens negras, e lentamente desabará sobre todos. Se aqueles que ali estiverem, no mesmo lugar que me encontro agora, às lágrimas em volta de um túmulo vazio, sentirão o frio consumir-lhes até os ossos.

Um trovão ecoa por todo o cemitério, mas não há ninguém além de mim para ouvir a sua dor. Eu soluço, já incapaz de segurar as lágrimas, incapaz de conter toda a tristeza que eu julgava não existir mais em mim. A chuva cai sem piedade alguma, flagelando a nova sepultura.

"Adeus, Sirius."

Minha voz sai fraca. Minhas mãos tremem quando deposito uma flor sobre o túmulo. Ah, céus! Eu preferia estar morto a ter de te enterrar. Do que voltar à solidão. Minhas pernas fraquejam, e eu caio de joelhos sobre o túmulo.

"Como você pôde fazer isso comigo? Me abandonar assim?" – as palavras explodem pela minha boca, sem o menor controle. A dor toma conta de tudo, não há nada que continue a fazer qualquer sentido. Só o vazio dentro do peito a me assombrar. – "Como todos vocês puderam me deixar?"

Fato: Desespero atrai desespero. Uma vez que a angústia toma a frente e domina alguém, tudo tende ao sofrimento. A mente humana é capaz de fazer as mais impressionantes conexões nestes momentos, só para realçar ainda mais o quão infeliz e perdido estamos.

O que me leva de volta à chuva.

Sempre a chuva.

Quando os meus pais morreram, choveu por quase três dias inteiros. Sirius, James e Peter me deram todo o apoio de que eu precisei. Eu soube, naquele instante, que conquanto eles estivessem ao meu lado, eu nunca me sentiria abandonado.

Foi quando a guerra piorou. Mortes cada vez mais freqüentes, cada vez mais amigos sendo sepultados, a cada dia mais a sombra da dor assomava sobre nós. Cada vez menos éramos capazes de ver uma luz de esperança.

Então ele veio, Harry nasceu. Todos nós ficamos deslumbrados com ele. James e Sirius mal cabiam em si. Lily era a perfeita imagem da felicidade, e por algum tempo, nós fomos felizes.

Mas o destino é cruel. Gosta de ferir a todos, sem deixar um único coração intacto. James e Lily morreram. Todos acreditamos que Peter também. Sirius foi preso, e eu, abandonado.

O cheiro da terra molhada invariavelmente me lembra do enterro dos Potter. Grande parte da Ordem da Fênix compareceu ao enterro, mas no fim, apenas eu continuei quando a tempestade caiu. Eu me lembro dos relâmpagos cortando os céus, me lembro de pessoas me aconselhando a partir.

Ah, e o desespero. A dor de saber que estava enterrando dois amigos que tinham uma vida saudável com seu filho para sempre, e que eu, o maldito lobisomem sem futuro algum, continuava vivo.

Eu me culpei por isso. Desde este dia eu não pude deixar de me sentir sujo por estar vivo. Eu procurei a solidão, pois eu não podia me dar o luxo de ser feliz. Por treze anos eu vivi em solidão constante, lutando contra meus medos e anseios.

Então você voltou para a minha maldita vida. Você me mostrou a felicidade de novo, Sirius. E para quê? Pra depois me jogar de novo no abismo do sofrimento.

Para insistir em ir junto ao ministério salvar Harry, e cair eternamente nos braços da escuridão. Ah, Almofadinhas. O que eu farei agora sem você? Como eu posso resistir ao sofrimento que é perdê-lo novamente?

Mas a resposta não é óbvia?

Sim.

Entregar-me à solidão novamente. E lutar até o meu último suspiro para vingá-lo, esta é a minha razão de continuar. Esperar pela chuva ao seu lado.


Fic inspirada na citação: "Grossas gotas de chuva caem do céu sobre a terra. Cor de cinza, solidão." (Maria José Dupre, Éramos Seis)