Preto e branco.

É assim que eu encaro o mundo.

Ou, pelo menos, é como ele se apresenta para mim.

EIS UMA PEQUENA CONSTATAÇÃO

Você vai conhecer o breu.

Para ser franco, isso não é algo que devesse ser temido, embora a maioria dos seres – não necessariamente humanos – adquire um ar gélido e frívolo ao pensar em mim, no que eu personifico. E de nada adiantam meus protestos e queixas, é irrevogável. Por favor, eu insisto, não tenha medo do desespero. Com absoluta sinceridade, sabe ser bom, afável, cômodo. Muitas vezes nos completa. Só não se acostume com ele. A não ser que se queira perder a si mesmo.

CONSEQÜÊNCIA DO FATO ANTES MENCIONADO

Isto te assusta?

Novamente – Não tema

Após o desespero, sempre vem a luz.

Você acordará um dia e os raios do sol baterão contra sua janela, tocando-lhe a pele, como quem consola. É o mesmo sol para quinhentas mil outras pessoas. Mas ele é mais frio para você. Despirás a si mesmo e entrará debaixo de um chuveiro como quinhentas mil outras pessoas. Mas a água lhe sujará a alma. Vasculhará todas as suas gavetas e encontrará algo para vestir como quinhentas mil outras pessoas. Mas tuas vestes lhe sufocarão. Sentará em sua cadeira e fará o desjejum como quinhentas mil outras pessoas. Mas tua fome é insaciável. É assim que terá início o seu declínio.

As trevas multiplicar-se vão e se agarrarão a ti, e nada poderás fazer para que o deixem em paz. Roubaram teu ímpeto, tua beleza. Esvair-se irá conforme os ponteiros do relógio moverem-se com o tempo desconforme das pulsações do teu sangue. Envenenará tuas veias. Beberá do teu vinho. Roubará tua vida. O apogeu da sofreguidão.

Toda a sinfonia melancólica de tua vida lhe perturbará sem intervalo ou hesitação. Até que você se acostuma. Acalma-lhe o ritmo e você volta a ver o sol. Sorri pra ele. Ele lhe sorri de volta e queima-te a pele. Você se nota sentado no meio fio, abraçando os joelhos. Afagando o desespero. Ele dá o último suspiro, seus olhos lampejam e se apagam. Você busca por ele e percebe o quanto se apegou àquela situação. As lágrimas escorrem por teu rosto, aliviando a tua dor que antes agarrava-se a seu peito como uma criança de colo. A criança cresce. Amadurece. E sai de casa.

O preto e branco lhe observa.

Estuda-te em silêncio.

Aprova-te com um murmurinho e teu mundo ganha cor.

Porém, não pensem que é fácil. Subestimar o sofrimento é um erro irreparável. Superestimar o desespero também. É por isso que eu não os faço. Apenas os estimo. É mais simples assim. Pelo menos para mim.

Dispensaria apresentações.

Mas não faria juz aos meus bons modos.

Não haveria problemas em me introduzir de forma apropriada, mas isso envolveria cordialidade e cordialidade exige respeito. Você me conhecerá o suficiente em pouco tempo e talvez seja merecedor de meu zelo também. Isso dependerá de uma extensa lista de momentos oportunos. Desejo-lhe sorte nessa jornada.

Segure em minha mão.

Aguce os sentidos.

Venha ver o que tenho para lhe mostrar.

Vou lhe contar uma história.

São simples palavras, na verdade, sobre, entre outras coisas, personagens notáveis, tais como:

* Uma menina especial.

* Alguns sentimentos.

* Uma bailarina.

* Um sofredor silencioso.

* E uma porção de desespero.

Vi cinco vezes a menina dos olhos de prata antes do fim.