Estava entrando no refeitório, percorrendo todo o caminho com os olhos procurando por Marlene. Eu não entendia o motivo dela não ter me esperando hoje, como sempre fazíamos. Ela simplesmente saiu correndo da aula assim que o sinal do almoço tocou e falou que dali a pouco nos encontraríamos. Meu celular vibrou em meu bolso e enquanto atendia a chamada, vi James Potter saindo do lugar pela outra porta, com o celular na orelha e andando apressado. Por um momento eu imaginei que fosse ele, me ligando de novo, mas era a Lene.
- Lene, onde você está? – perguntei
- Tive que vir aqui no almoxarifado e fiquei presa! A porta não abre pelo lado de dentro. Vem me tirar daquiiiiiiiiiiii!
- Tá, to indo. Você vai ter que me explicar direitinho o que você estava fazendo ai!
- Cala a boca e vem, Lily! – pediu ela.
Joguei o celular na minha bolsa e caminhei em direção a porta de saída do refeitório. Minha fome ficaria pra depois mesmo. Atravessei o jardim da faculdade e fui em direção ao prédio que ficava o almoxarifado. Realmente não sei o que minha amiga louca estava fazendo lá. Mas ela é minha amiga louca mesmo, não tem explicação, ela sempre se mete em lugares que não devia. Geralmente eu vou junto, mas graças aos céus que dessa vez eu fiquei pra fora pra poder salva-la.
O corredor estava com as luzes apagadas, e a porta do almoxarifado ficava escondida, num lugar que não tinha nenhuma iluminação externa, por isso acendi meu celular e fui me guiando pelo caminho.
- Lene, você se mete em cada lugar nada a ver! – falei enquanto abria a porta do lugar. As luzes também estavam apagadas, mas alguma iluminação vinha de janelas no fim da sala. Muitas prateleiras estavam abarrotando o caminho, e eu não via Lene de lugar nenhum, por isso soltei a porta e fui procura-la entre os corredores de prateleiras. – Lene? Onde você está?
PAM.
- Lene, é sério. Onde você está? Que barulho foi esse? – falei mais alto. Minha voz estava um tom mais aguda que o normal.
- Foi a porta batendo – falou uma voz ao meu lado.
Dei um grito de susto e corri para o outro lado, sem nem sequer ver quem era. Peguei meu celular e liguei para Lene. Sem sinal, droga!
- Quem está ai? – perguntei meio tremula.
- Sou eu Lily, você achou que seria quem? – eu reconheci a voz. James Potter estava aqui, supostamente trancado comigo nesse lugar que fedia coisa guardada e que tinha pouca iluminação.
- Como assim, Potter? – perguntei indo em direção à porta – Minha amiga me ligou dizendo que estava presa aqui dentro. Eu vim para encontra-la, e não encontrar você.
- Não fale da Marlene como se ela fosse só sua amiga, ela também é minha amiga – ele falou rudemente – o fato é que você me ligou a 10 minutos atrás me pedindo pra te encontrar aqui. Eu vim e fiquei preso.
- Potter, eu não te liguei! Você tá louco? – falei rindo – Eu nem sequer tenho seu telefone!
- Pois bem – ele falou tirando o aparelho do bolso – eu tenho o seu. E como você explica isso?
Ele mexeu no celular por alguns instantes e me mostrou a tela de ligações recebidas. Realmente, meu nome estava lá, com uma ligação recebia a pouco mais de 10 minutos, exatamente a hora que eu estava falando com a Lene no meu celular. Tirei o aparelho da mão dele e investiguei a ligação. Acabei encontrando o erro, fácil, fácil.
- Esse não é meu numero. Alguém trocou seus contatos e colocou meu nome nesse numero. Meu numero acaba em 9102 e não em 0192. – falei astutamente
- ã? – ele falou puxando o celular de minha mão. – filho de uma puta! Esse é o numero do Sirius – ele falou – eu bem que notei que sua voz estava diferente, mas não parei pra pensar nisso.
Olhei ceticamente para ele, e senti a raiva fazer meu sangue ferver. Tudo bem que o cara estava afim de mim, mas pelo amor de Deus, isso já estava virando paranoia. Ele envolveu a Lene e o Sirius numa historia que ele tinha que resolver sozinho! Se ele quisesse me conquistar, ele que tentasse por seus próprios meios, e que não envolvesse nenhum dos meus amigos.
Se James Potter ainda quisesse algo de sério comigo, talvez até tentaria uma aproximação para descobrir o que rolaria, mas o grande problema é que, sendo membro da fraternidade ômega, só para homens, não dá pra confiar muito. Já fui em muitas festas da ômega, e, só para constar, vi James Potter se agarrar com um numero considerável de mulheres de todas as formas possíveis, por isso não dou credibilidade às suas palavras.
- Então você combinou com Sirius e Marlene todo esse plano estúpido para que pudesse me dar alguns beijos, já que não conseguiu fazer isso em campo aberto. – falei rudemente
- Lilian, não é isso. Eu já falei, eu vim porque supostamente você me ligou, falando que estava presa no almoxarifado e que precisava de ajuda pra sair!
- Em nenhum momento passou por sua cabeça que eu teria outras pessoas pra ligar além de você?
- Na verdade, não.
Respirei profundamente e com a voz um tanto aguda, resolvi tomar a única atitude que me tiraria daquele lugar.
- Bem, já que você me quer, vamos lá. Me beije – falei fechando os olhos – Vamos Potter, estou esperando. Me dê um beijo, e assim eu posso sair daqui mais rápido.
Esperei por poucos segundos com os olhos fechados e um biquinho frouxo na boca. Então, quando ele demorou demais, abri os olhos. James Potter estava sentado ao chão mexendo em alguma coisa em seu celular.
- Você não vai me beijar? – perguntei desafiando-o – Não me quer mais? Desistiu depois de todo esse tempo me perseguindo? Nadou, nadou, nadou e morreu na praia.
- Existe uma grande diferença, Lilian, entre forçar alguém a ficar comigo e conquistar alguém. O que você está fazendo não me torna mais viril. Muito pelo contrário, isso me deixa sendo menos homem, por saber que por algum momento, em sua cabeça, passou o fato de que seria preciso que eu te trancasse comigo em algum lugar para que eu pudesse te beijar. – sua voz era baixa, mas decidida. Ele me encarava logo nos olhos e sua firmeza, devo dizer, me assusto um pouco – o meu objetivo, vindo aqui, era que eu pudesse te ajudar a sair desse lugar, que você me agradecesse por algum momento e que pudesse ver que eu posso ser homem, e sim, posso pertencer à uma fraternidade que se orgulha pelo seu machismo, mas em nenhum momento você me viu abusando de alguém. Eu vim aqui hoje pra ser um perfeito cavalheiro, e se você pensa que a única forma de sair daqui é se vendendo, então ficaremos trancados até que Marlene e Sirius desistam dessa ideia ridícula. Se eu pensava que eu realmente me interessava por você, talvez eu estivesse errado. Tenho que confessar que não me atraem as mulheres que se vendem.
Devo dizer que eu realmente fiquei parada feito estátua enquanto olhava para ele. Não sabia o que responder, e por um momento fiquei pensando em tudo que foi dito, mas então continuei
- Então você acha que eu estou me vendendo? Eu não estou me vendendo!
- Claro que está. Você está oferecendo um beijo como moeda de troca para um passe livre do almoxarifado.
Deixei Potter sozinho no lugar em que ele havia sentado e comecei a andar pelo lugar. Parei para pensar em tudo o que ele havia dito, e a forma como ele não teve medo em mostrar a ligação recebida, e como ele realmente acreditava em cada palavra que dizia. Por um momento eu cheguei a imaginar que ele estivesse falando a verdade. Fui até a porta e tentei abri-la. Sem chances. Fui até o fim do lugar, onde estavam as janelas, na verdade, basculantes, que não deixariam passar nem minha cabeça, muito menos meu corpo todo, mesmo sendo pequeno. Enfiei o braço pelo basculante levando meu celular e tentei sinal de lá. Nada. Resignada e com fome, me sentei em cima de uma caixa que havia ali. O que me restava era esperar que Marlene pensasse bem e nos tirasse dali. Fechei os olhos e tentei me concentrar em coisas abstratas.
- Você está com fome? – ouvi ele perguntar de longe
- Não é da sua conta – respondi. Ouvi alguns passos, e então abri os olhos. Ele estava logo à minha frente
- Tenho um sanduiche de pão com queijo – ele falou estendendo um saco de papel – pode ficar com ele.
- Não vou me vender, James, nem por um sanduiche de queijo.
- Bom, já que você não quer... – ele sentou de frente para mim, abriu o pacote e bem na hora em que ele dava uma dentada no sanduiche, meu estomago deu um ronco supersônico.
Ele riu e disse:
- Deixa de ser teimosa, Lily. Aceite.
- Eu não quero, obrigada. Pode comer.
- Ok, tá legal. Se você comer, eu largo do seu pé. Eu paro de te ligar, paro de te chamar pra sair. Só... coma Lilian.
Ele pegou minha mão e colocou o sanduiche nela, com um olhar sincero e um "aceite" baixinho. Dei uma mordida, e o sabor inundou minha boca. Eu adoro queijo.
- Só me responda uma coisa – falei enquanto comia – que tipo de aluno universitário traz lanches para a faculdade?
- Eu não confio na comida servida no refeitório, e nunca como algo preparado na república. Lá você aprende que qualquer pessoa pode batizar sua comida e sua bebida. Então eu preparo meu próprio almoço todos os dias de manhã. Hoje só trouxe sanduiche de queijo porque é o que me sobrava.
- Isso não é coisa de nojentinho? – perguntei – quero dizer, a comida do refeitório e como qualquer outra.
- Sou vegetariano. – respondeu ele – e as cozinheiras insistem em fazer arroz com salsicha, batata com carne, macarrão com frango, lasanha bolonhesa. Não consigo passar um dia de estudos só com salada na barriga, então faço meu próprio lanche.
- Vegetariano? Qual o motivo?
- Não pense que sou moralista, mas moro num rancho desde que nasci. Fui educado em meio a animais, tive tarefas quanto a eles. Desde gatos à cavalos, passando por cachorros, peixes e galinhas. Quando você passa a ser respeitado pelos animais, você quer que eles se sintam respeitados por você.
- A quanto tempo não come carne? – perguntei
- Desde os onze anos.
- Legal – falei dando mais uma mordida no sanduiche – não esperava isso de você.
Comi o resto em silêncio, sentindo os olhos dele em mim. Não ergui o olhar em nenhum momento, tentando me concentrar no sanduiche e na coragem de dizer o que eu sentia que precisava dizer.
- Desculpe-me – falei – eu devia ter desconfiado que era uma armação. Marlene vem tendo segredinhos com Sirius há muito tempo.
- Não precisa se desculpar, sei que meu comportamento à sua frente não ajuda muito. Te perseguindo onde quer que esteja, com a má fama que eu tenho.
- Você considera má fama? – perguntei
- Devo dizer que sim. Meninas como as que já me encontrei, não fazem lá o meu tipo. Me sinto vazio depois, quando estou sozinho. No inicio atribuí a solidão à saudade dos meus pais, mas então entendi que o que eu fazia era um tanto quanto imoral. Desde então eu parei.
- O que você quer dizer com 'parei'?
- Você não frequenta mais as festas da ômega, não é? Eu simplesmente não fico com nenhuma garota a exatos quatro meses. Não sinto vontade nem necessidade. Estou bem como estou, e devo dizer que me sinto aliviado por não ter que fugir de meninas desesperadas por um namorado que se sentiam no direito de tentar governar minha vida.
- Se você não quer ter sua vida governada, porque vem atrás de mim? – perguntei olhando diretamente em seus olhos – quero dizer, você deve saber que eu gosto de compromisso sério, não sou dessas que você está acostumado.
- Honestamente? – respondeu ele – No inicio eu não fazia muita ideia da razão, mas depois compreendi. Você me oferece um desafio mental.
- O que você quer dizer com isso?
- As garotas que eu já fiquei, todas, sem exceção nenhuma, faziam exatamente o que eu esperava que elas fizessem. Elas deixavam seu telefone escrito em algum lugar pelo meu quarto, e quando eu não ligava, elas vinham atrás, querendo saber o que tinha acontecido. Quando elas me viam com outra, tinham logo um acesso de fúria. Não comigo, que era o errado da historia, mas com a outra menina. Essas garotas, sim, garotas! Mulheres não se dignam a isso. Essas garotas me cansavam. Você me mostrou o que eu nunca tive com mais ninguém, mesmo que eu tenha trocado apenas algumas palavras soltas e conversas sérias, quando eu não estava te perseguindo. Eu nunca sei qual vai ser sua reação. Naquela hora em que você se ofereceu pra me beijar, por mais que eu quisesse, a surpresa foi tanta, e foi uma coisa tão descabida que me tirou dos eixos. Eu não imaginava que você pudesse fazer algo como aquilo. A cada passo que você dá, me surpreende. Eu gosto de ser surpreendido, gosto da sensação de ter que tentar te conquistar todos os dias.
- Você está entendendo o que você está falando, certo?
- VOCÊ entende o que EU estou falando? Estou confessando aqui Lily, você me encantou como nenhuma outra menina poderia fazer. Você não é uma menina, você é uma mulher, e por mais que eu possa desconhecer todos os seus gostos, suas preferencias e desejos, eu sei que gosto de você pelo que você é, e não pelo que finge ser. Você não finge, você é uma mulher de verdade.
Esse discurso me deixou um tanto quanto surpresa. Olhei fundo em seus olhos, e não consegui decifrar o que se passava em sua mente, nem na minha. Em alguns minutos eu pensava em como ele era um idiota por me trancar aqui dentro, e no outro eu olhava para sua boca e imaginava que gosto teria. Lentamente ele saiu de seu lugar à minha frente e se sentou ao meu lado. Não tirávamos os olhos um do outro, e quando ele chegou próximo o suficiente para que eu sentisse seu hálito fresco, ouvi um clique e a porta sendo aberta.
- Acho que está bom por hoje – Marlene gritou ao longe – vocês podem sair agora.
- Você aceita sair comigo, uma outra noite? Só conversar, sem compromisso nenhum – ele falou – se você quiser desistir no primeiro minuto, eu vou respeitar.
- Sábado, as oito.
CONTINUO OU NÃO GENTE? REPLY PLEASE.
