CAPÍTULO 1 – CASQUINHA DE LIMÃO

Era um dia de verão qualquer, em uma cidade qualquer do Japão, em um aleatório recanto arborizado que atraía turistas idosos buscando sossego ou jovens ecoturistas atrás de unir o contato com a natureza a um pouco de adrenalina.

Naquele dia, contudo, havia algo diferente na paisagem: veículos, entre furgões, trailers e ônibus, ocupavam o estacionamento da estalagem e um ir e vir frenético se somava ao tradicional som da natureza.

Uma gravação estava em andamento.

Encerrada a cena do dia, Ren suspirou imperceptivelmente. O dia estava quente, mais quente que o normal, e aquela tomada havia demorado mais do que o necessário graças aos deslizes da atriz com quem ele contracenava, mais preocupada em admira-lo do que em fazer o trabalho para o qual ela estava sendo paga.

Não que Ren estivesse pensando tais coisas. Para ele, era sempre uma questão de "bom profissional" e "mau profissional", e o mau poderia ser ensinado a ser bom. Por algum motivo, ele achava que tinha por obrigação ensinar os maus profissionais como serem bons profissionais, cacoete que ele não lembrava como ou quando havia adquirido, mas que para um seleto grupo de pessoas era óbvio que se devia a uma certa kouhai, que fazia questão de sempre o elogiar como um excelente senpai.

Ou, como Lory gostava de caçoar, Ren era um perfeito "cão de Pavlov", cumprindo inconscientemente o que Kyoko o condicionou a fazer com alguns poucos elogios.

Praticamente engolindo de uma só vez toda a água da garrafa que Yashiro lhe entregou, ele procurou por Kyoko com o olhar. Era estranho que ela não o estivesse observando, já que ela dificilmente perdia a oportunidade de aprender algo com a atuação dele, mas não a encontrou em parte alguma. Yashiro, deduzindo que Ren estivesse intrigado com a ausência de Kyoko, comentou que ela murmurou algo como "imperdoável" e "falta de profissionalismo" antes de partir dali, caminhando em direção à estalagem como se o chão que ela pisava fosse seu inimigo número um.

Sorrindo ao imaginar a cena, Ren verificou com o diretor quando ele seria novamente necessário no set, agradecendo a sua boa sorte por poder contar com um intervalo de uma hora. Sem perder tempo, retornou à estalagem ignorando o irritante agente, afinal, após dois anos aturando os chiliques de Yashiro ele já não se incomodava mais.

Perguntando por Kyoko, ele soube por funcionários que ela atravessou a recepção com uma expressão furiosa, seguiu em direção ao restaurante e, de lá, saiu pela enorme porta que dava acesso à parte posterior do bosque.

Tão típico dela, procurar refúgio às margens de um riacho...

Ren riu consigo mesmo pensando sobre como a surpreenderia. Deveria se inclinar silenciosamente atrás dela e soprar-lhe em um ouvido? Ou deveria permanecer atrás da árvore em que ele estava e falar com ela como se ele fosse um espírito da floresta?

Aproximando-se sorrateiramente usando as árvores como esconderijo e o som do riacho para encobrir o som de seus passos, Ren foi bem-sucedido em se posicionar atrás da árvore na qual ela estava encostada, distraidamente lendo um livro. Inclinou-se, preparado para pregar uma peça como se tivesse novamente dez anos e... congelou.

Engoliu uma, duas vezes. Era um homem adulto, mas descobriu naquele momento, pela primeira vez na vida, que ele queria muito uma casquinha de sorvete.

Não qualquer casquinha de sorvete: uma de limão.

Não qualquer casquinha de sorvete de limão: aquela que Kyoko tão distraidamente lambia.

A ponta rosada da língua se projetava sobre o doce e os olhos de Ren acompanhavam, hipnotizados. De baixo... para cima. De baixo... para cima. De baixo... para cima. Às vezes, gulosa, ela abria mais a boca e quase metade do sorvete desaparecia dentro dela, reaparecendo segundos depois um pouco menor. Então, ela voltava a lamber: de baixo... para cima. De baixo... para cima. De baixo... para cima.

Metodicamente, revezava as abocanhadas, mais efetivas em diminuir o sorvete, com lambidas que evitavam que a parte de baixo do doce escorresse do cone para seus dedos. Às vezes, quando estava em uma parte mais interessante do livro, a língua pairava alguns segundos próxima ao doce antes que ela retomasse as lambidas.

Até que ela encostou a boca no sorvete, os lábios projetados e entreabertos como se o beijasse, paralisados como se ela estivesse em uma passagem especialmente interessante, retomando a ação para sorrir e chupar o sorvete.

O inconfundível som de sucção foi a gota d'água: Ren não precisava de mais material inflamável no invejável estoque de pensamentos impuros que ele estava tendo com Kyoko, especialmente desde que ela celebrou seu décimo oitavo aniversário.

Não, nada disso; melhor partir dali o quanto antes, subir discretamente para o quarto de hotel, tomar a ducha mais gelada da vida e correr de volta para o set antes que Yashiro o fosse buscar e o encontrasse naquele estado.

Décadas mais tarde, um extremamente bem conservado Kuon Hizuri revelaria a uma revista masculina seu inusitado fetiche por casquinhas de limão.

N/A – Eu sei, eu sei: eu deveria estar trabalhando nas minhas duas fics pendentes, e eu prometo que o farei, assim que eu me purificar do capítulo 258 XD

Enquanto isso, eu preciso muito, MUITO escrever algo curto e divertido e até pervertido. Vocês me perdoam? T_T