Nota da autora: É a primeira fanfic que publico, depois de um longo tempo sem conseguir escrever com a fluidez que queria. Star Wars tem me ajudado a amansar a ansiedade e me inspirado muito, e a ida ao cinema para assistir a Os Últimos Jedi arrancou as minhas palavras, enfim. Avisos: Contém spoilers.
Há muito tempo, numa galáxia muito, muito distante, o destróier do Supremo Líder da Primeira Ordem se deslocava em meio às estrelas. O silêncio da reclusão abafava o zumbido baixo dos dispositivos de climatização. Kylo Ren acordou de mais um pesadelo em seu quarto, só, suado e arquejante, e se sentou, os lençóis amassados sob as coxas. Como anos antes, a luz verde do sabre de Luke Skywalker pareceu incidir sobre ele e tocou o seu sono, amaldiçoando o repouso. Os olhos hesitaram em se fechar, cansados de pousar sobre a pouca mobília austera, mas sob a ameaça do retorno do Jedi à sua consciência.
— Eu falhei com você — dissera Luke no campo de sal em Crait. Sim, ferveu Kylo. A escolha ainda não havia sido feita.
Então, os demais aprendizes isolaram numa cabana de pedra o sobrinho do Mestre envolto em lendas, que já sentia a Força feroz nele. No coração da madrugada, em ataque, abaixaria o sabre de luz sobre o jovem inocente que jurou ensinar. Desistiu dele assim como tinham feito os pais, a princesa e o contrabandista. Até o terror borrado da manifestação de seus poderes, a infância pertencera ao filho de heróis de guerra.
O fardo do legado continuava a estilhaçá-lo. Mesmo Snoke o seduziu por ser neto do Lorde Sith Darth Vader, faminto pela mácula das trevas e pelo potencial que o sangue dele guardava. Curvado ao seu olhar, Kylo permaneceria para sempre submisso, uma fera assustadiça numa coleira, o pupilo medíocre e sentimental.
Cada um que ousava se dirigir a ele lançava a atenção em apenas uma parte sua, como inclinar uma vela para inspirar luz ou sombra conforme a vontade. O seu foco se bifurcava diante das reflexões que chegaram, e depois muitas, muitas mais. Feito pétala, o hoje murchava perante o passado negado, para o qual as lembranças eram um portal de espinhos. Kylo não conseguia laçar os pensamentos selvagens. Kylo?... Mas...
Ben. O seu nome nos lábios da Rey, um chamado puro.
Ele permitia, sem contradizê-la. Seu corpo ainda respondia à memória daquele som. Não havia desdém ou chacota, nem a carga de esperança que Han depositou enquanto estiveram na ponte da Base Starkiller, naquela longa noite de neve.
O pedido desesperado do pai tinha sido inútil em compensar a ausência constante, a atenção retida em conluios pela galáxia. Para Kylo, contudo, sua morte se tornou cicatriz aberta, uma brecha pela qual um facho de luz entrava, e o lembrava de seu toque no rosto, como que em um carinho tardio. À medida que o atordoamento se dissipava, a convicção desmanchou, pois o ato odioso o enfraquecia em vez de anular o turbilhão que sentia. Sequer satisfez Snoke, embora houvesse sido exigido.
O lamento torturado do Chewbacca no momento seguinte à queda ecoava em seus pensamentos tanto quanto a explosão do cruzador de Leia Organa. Kylo hesitara em disparar o míssil armado e matá-la, apesar da mágoa com a sua dedicação à política e aos sonhos rebeldes. Ele era o seu príncipe caído, sangue Skywalker, o herdeiro da Força.
No entanto, na primeira vez que Rey falou, quis vê-lo sem a máscara, exigindo quem ele de fato era, mesmo subjugada pelas amarras. Fora feita refém ao fim da Batalha de Takodana, e Kylo a trouxe a bordo junto ao peito e a esperou recuperar a consciência. Quando removeu o disfarce e ergueu a cabeça, encontrou o seu olhar à espera do dele, depois se aproximou mais. Não conseguiu tocá-la. Já nem podia ignorar o terror que a fazia estremecer. Estaria amedrontada, enojada por causa dele? Seria a ameaça vã?
Ao segurar a sua mente e penetrá-la, ele pôde vê-la adormecida nos destroços de uma nave, escorregando em uma duna de Jakku, escavando sobras antes de realizar comércio no Posto Avançado de Niima em troca de comida. As barganhas sem fim, o pandemônio da aglomeração de forasteiros, os músculos magros tensionados no treinamento improvisado, a garganta seca, os dias de fome aguda, o deslizar das lágrimas e a aspereza da areia quente. Ben a imaginou em liberdade, longe do remoto planeta ferro-velho, sem um destino para seguir nem o passado a prendê-la.
Quando a Força indomada de Rey o atingiu em bloqueio, Kylo sofreu igual intrusão, estarrecido com a facilidade com que ela deslizou para dentro dele. Desde a tarde em que ela resistira à sua manipulação mental e a revertera, a admiração atônita não o deixou. Só lhe restou se preparar para o despertar que vinha.
