A Honra e o Poder

Alma Torturada – Coração Partido

Em capítulos

Fanfic de ShiryuForever94

Gênero: Drama

Personagens: Saga (em POV), Shura, Camus, Shion, MDM, Afrodite, espectros.

Não contém yaoi, mas devido ao tema um tanto dramático, sugere-se a classificação para maiores de dezesseis anos.

Esta fanfic se passa quando Saga e outros cavaleiros foram ressuscitados por Hades para irem atentar contra Atena.

Disclaimer: Saint Seiya não me pertence. Todos os direitos pertencem à Toei, Shueisha, Long Jump, Bandai e, ao seu autor, Masami Kurumada. Fanfic sem fins lucrativos.

Capítulo 1

Saga POV

Minha redenção.

É o que busco.

Por que me chamaram?

Já estava pronto, a aguardar minha pena por meus atos de insubordinação e traição à Deusa. Mas não foi o que eu obtive. Fui despertado e convocado, pensei que minha deusa Athena trouxera-me novamente à vida, mas não, ledo e dolorido erro.

Meu corpo não é mais meu.

Minha missão não mais me inspira

Mas, talvez...

Shion nos convoca, o mesmo honrado cavaleiro que eu tão friamente assassinara. Seus olhos firmes demonstram que não, ele não me julgará, apenas contará comigo e sinto vontade de prostrar-me a seus pés e implorar seu perdão.

Meu orgulho, minha honra

Implorar não combina comigo

Seria desprovido de coerência

Com toda minha história.

Ainda tenho honra. Pode ter ficado meio escondida algum tempo, mas ainda está aqui.

Mas, o que é esse traje que me cobre? Parece-se com minha armadura de gêmeos, mas sua aura, sua energia, não me aquece, não me conforta.

Frio, é tão frio aqui dentro.

Escuro e sem vida

Meu coração sangra

Por que não me deixaram no ostracismo?

O ariano fala-nos por enigmas, mas todos nós, a fina linhagem dos cavaleiros de ouro, os ex-protetores de várias casas do Santuário, deciframos o que na verdade ele nos quer dizer.

Hades.

Foi o Senhor dos Infernos quem nos trouxe para uma nova existência. Quanto tempo? Qual o período dessa nova jornada? Não me importo. Não é a expectativa de viver que me importa, é a oportunidade de mostrar que possuo honra, que me arrependi, que quero sobretudo merecer redenção.

Destino caprichoso.

Meu rosto paralisa ao entender qual, na realidade, seria nossa missão. Olho petrificado para a tristeza muda de Camus e o olhar determinado e circunspecto de Shura. Eles serão meus parceiros na dolorosa tarefa que nos foi dada.

Meneio minha cabeça em aceitação. Meu desespero crescente como mais uma emoção que me trará forças.

De orgulhoso guerreiro em defesa da paz e da justiça, tornei-me... O que? O que sou agora? Quem sou agora? Um espectro. Um títere a serviços dos desejos de um imperador de outro mundo.

Hora de irmos.

Shion nos olha e sua força me domina. O olhar profundo e determinado que me traz algum consolo. Eu, nós, seríamos tidos por traidores, a pior espécie, poderes imensos a serviço do mal.

Não consigo mais sorrir. Há muito tempo não consigo mais sorrir. Olho para o aquariano dourado. Está tão estranho em vestes roxas enegrecidas. Um cosmo doente que nos força a ir adiante. Onde está minha luz dourada e pura? Aquela que surgiu em meus últimos momentos como defensor da Deusa e me impediu de a tocar com desonra?

O báculo dourado que me acertou a carne e privou-me de cometer uma atrocidade. Tão irônico. Agora a atrocidade será cometida.

De novo meus olhos caem sobre Camus. O homem mais controlado de todos nós. Quase quero abraçá-lo. Logo ele. O frio e controlado e mortal Senhor do Gelo, num único piscar de olhos muito azuis me transmite tanto sofrimento.

Que dizer de Capricórnio? O mais leal à deusa. Aquele que foi escolhido para carregar a Excalibur e toda a responsabilidade que vem junto. Imagino que suas convicções devem estar a enlouquecê-lo. Um homem tão dedicado à causa, tão forte e que foi... Ele foi...

Meu tormento.

Como direi a ele? Será que direi a ele o quanto eu sinto? Por havê-lo enganado, por ele ter assassinado Aiolos, por ele ter sido marionete em minhas mãos?

Toco-lhe os ombros num gesto inseguro. Ridículo. Eu não sou inseguro. Perto dele posso estar na defensiva, mas positivamente não sou inseguro. Shura toca minha mão e se vira para mim. Balança sua cabeça com o olhar mais cheio de decisão que eu jamais vira. Um gesto afirmativo, leve e sincero. Como ele poderia saber? Dizia-me que sim, que me perdoava.

Inspiro profundamente. Menos um peso em meu coração cravejado de danos pelos atos que cometi. A hora avança, precisamos continuar. À nossa frente, Afrodite, Shion e Máscara da Morte. Já vão longe.

O Santuário estende sua força logo ali, ao nosso alcance. Shion se volta, um olhar sério. É o suficiente. Entendemos. Esperamos um pouco mais atrás.

De guarda na primeira casa, Mu de Áries pressente o risco e posta-se imponente, impávido.

Um guerreiro, um cavaleiro. Ele fica pasmo, reage prontamente e vemos Afrodite e MDM voltarem rapidamente ao reino dos mortos. Sinto-me triste. Eles eram bons homens. Bem, talvez nem totalmente bons. Quem de nós é totalmente bom? Não é hora para filosofia.

Lamentos ficarão para depois, o tempo passa e temos uma missão a cumprir.

Mu nos percebe. Camus, Shura e eu. Disfarçados no exterior, mas no nosso íntimo... Como poderíamos disfarçar nossa essência?

Uma breve batalha se segue e o ariano não cede de maneira alguma. Por Atena, teria eu que matar outra vez? A inquietude triste de quem sabe o que precisa fazer, mas também sabe o que não quer fazer.

Nós três, espectros, torturados nos trajes tão pesados de angústia, observamos o bravo protetor da primeira casa prostrado sob nossos ataques sucessivos. Mu de Áries nos observa, eu sinto, eu sei. Ele pode ver por trás de nossos disfarces.

Choramos a tortura de saber que talvez jamais sejamos compreendidos. Nosso amor por Atena é tão desmedido e sincero e puro. Entregamos a única chance de nos redimirmos. Não. Eu não consigo encontrar redenção.

Shion intervém, temos que seguir. Não estamos sós, sentimos os outros espectros nos seguindo. Deveríamos ser apenas nós. Por que os outros nos seguem? Não teremos nem mesmo um segundo de sossego. Sossego? Nunca mais...

Nada podemos fazer por Aldebaran. Sequer temos tempo de lembrar de quando estávamos vivos. Sim, esta chama que brilha em nós agora não é vida. Não pode ser.

Terceira Casa. Dor, tormento. Lamúrias? Sou Saga, esta era minha casa. Meu passado. Eu já fui... Sim, eu fui... Feliz. Confusão, dualidade, ambivalência. Um embate? Quem? Quem se atreve? Minha armadura surge. Minha? Não, há muito deixei de ser o responsável por ela. Eu não fiz jus ao peso e à honra intensos que acomete quem usa tal traje.

Dor, mais dor. Apenas um poderia exercer este poder que sinto e que me inebria e adoece ao mesmo tempo. Apenas um poderia ter a ousadia, a coragem, a competência.

Kanon.

Pois então meu gêmeo tivera mais sorte que eu. Ele obtivera perdão? Ele alcançara alguma paz? A paz que se esvai a cada momento por entre meus dedos. A paz que sonho perpassando meu peito, que foge do meu semblante, do meu respirar. Não tenho tempo, não temos mais tempo. Uma luta, um golpe, desequilíbrio. Venço, mas será mesmo que o vencedor sou eu?

Agonia, lágrimas pingando, escorrendo, molhando meu rosto contrito. Lágrimas que correm não apenas no meu rosto, corroem meu âmago. Quem fui? Quem sou? Quem serei? No que me tornei?

Escondo tanta oscilação de meus companheiros. Sigo correndo o mais que posso, o que não é pouco para um Cavaleiro. Sigo correndo para encontrar um destino que temo e que busco com ânsia. Será que obterei descanso?

Mais lágrimas. Queria tanto que elas lavassem minha dor e vergonha. Ah, Kanon, tenha piedade do que me tornei. Se nós dois somos forjados na mesma vida separada por corpos iguais e tão diferentes, tenha piedade de mim. Você está do lado certo e eu do errado. Ou será que não tão errado? Eu compreendi, eu sei de tudo. Ao mesmo tempo, eu nada sei. Que os deuses tenham piedade.

A casa de Câncer. Podemos sentir que algo está errado. Atrasos, atrasos, atrasos. Lutamos sem parar contra corpos mutilados e sombras. Contra gritos que parecem saídos de nossas próprias entranhas. Lutamos mais e mais e não avançamos nada. Isso não pode continuar. Um golpe potente e lanço meu desafio. A estratégia precisa mudar. Precisamos continuar.

Shaka.

Foi ele, tenho certeza. Depois. Como nos ocultaremos?

Mais sangue em minhas mãos, em nossas mãos, nós três nos apossamos de sapuris que não são as nossas, precisamos de disfarces. O que digo? EU NÃO TENHO UMA SAPURIS! Eu sou um cavaleiro de Atena!

Ou fui um.

Oras, que irônico. Eu que fingia, que me passei por Shion, que menti e enganei e por tal, tanto me orgulhava quanto me envergonhava, vejo-me obrigado a tornar-me outro, novamente. Eu riria, se não fosse tão triste. Cada vez mais distante da paz.

À procura de Atena. E com tanto temor de chegar até ela, pois nós sabemos o que temos a fazer.

Uma rápida passagem por Leão. Laimi de Verme assume o combate e temo por Aioria, mas cada um de nós tem suas próprias perdas e ganhos, suas próprias batalhas.

Ah, por Zeus! Quanto mais suportarei desse suplício infame? Quanto mais enganarei, falsearei e lutarei? Por que não posso ter algum descanso?

Uma vozinha íntima responde-me, sarcástica, numa ladainha dolorosa.

Sua pena, sua provação

Seus pecados e mentiras

A paz negada até o fim

Seu inferno e maldição

Casa de Virgem.

Shaka.