La Femme
- Merci maman! - exclamava uma doce menina abraçando sua mãe.
Elas bastante parecidas. Tinham olhos verde-claro, eram alvas como o leite, tinham traços extremamente delicados e um certo ar afrancesado. Mas a mãe era loira e baixa e sua filha bem mais alta e com os cabelos negros e escorridos. Ela colocou um lenço neles e os escondeu.
- Espero que consiga, minha filha!
- Eu também, maman. O professeur de Potions de Hogwarts é très bien. Todos falavam dele em Beauxbeaton. Com certeza ele conseguirá me ajudar.
- Espero que sim! Mas se não... - a mulher parou de falar, um homem com uniforme de motorista as observava.
- Eu sei, eu sei. No é tão ruim, mas as outras pessoas ficam caçoando. Se eu puder melhorá-los o farei, senão me resignarei.
- Filha! - a bela mulher abraçou a garota - Sabe que não poderemos nos comunicar durante sua estada lá, mas saiba que eu e... que eu e seu pai sentiremos saudades.
- A senhora eu sei que sentirá, mas papa... - a garota abaixou os olhos e levou a mão ao ombro esquerdo que parecia doer.
- Ele te ama! Só não sabe demonstrar da forma correta. Entenda que ele é trouxa e é contra o que somos. Ele não queria que você estudasse magia, mas eu o convenci. Nós temos que agradecer a ele por isso.
A garota encarou sua mãe tristemente.
- Vous êtes bonne mère.
- Não se esqueça, treine e estude tudo o que seu pai mandou. Aqui neste malão estão as letras, as partituras, as roupas de treino, os livros. Enfim, tudo o que ele quer que aprenda. Ah... e não se esqueça do sotaque.
- Oui, maman!
- Agora vá, tome o bilhete, é só passar pela parede. Não posso entrar, seu pai proi... me pediu. - a mulher beijou sua filha e ela atravessou a passagem para a plataforma 9 ¾, na estação King´s Cross.
- Quanta gente! - exclamou a moça olhando o movimento, em vez dela continuar ficou parada diante da passagem segurando seu carrinho. Até que ouviu o barulho de alguém correndo por detrás de si. Ela se virou e viu um garoto de cabelos negros revoltos avançando sobre ela com seu carrinho todo abarrotado de malas.
- Tapum!!! - e o garoto chocou seu carrinho com o dela. Com impacto ele foi jogado para trás e caiu sentado no chão. Estranhamente a garota não foi atingida, ela estava em pé ao lado dele o olhando assustada. Ele a encarou, ia xingá-la, mas ao encontrar seus olhos com os dela ficou paralisado e se calou.
De repente ouviram um barulho, era outro carrinho que atravessava a passagem, ia atropelar o garoto, mas a garota agilmente estendeu sua mão a ele e o puxou com tudo da frente da passagem.
- Tapum!!! - outro carrinho se chocou com os que já haviam batido e agora era um garoto alto e de cabelos vermelhos que caía ao chão.
- Harry! - exclamou Rony no chão - O que houve? Ficou louco? Como para assim na frente da passagem? - ele se levantou e caminhou até Harry - O peru de Natal foi para seu cérebro ao invés do estômago?
Eles ouviram mais uma vez o barulho dos carrinhos.
- Tapum! Tapum! Tapum! - agora eram três cabeças vermelhas que caíam ao chão, todos os carrinhos caíram e as malas se esparramaram.
- Rony, o que aconteceu aqui? - era Molly Weasley que atravessou a passagem (sem carrinho e sem correr) e viu três de seus filhos estatelados no chão.
- Não fui eu, mãe. Eu também caí e... - Rony olhou para Harry - Caí batendo no carrinho dele. - Harry arregalou os olhos.
- Senhora Weasley, perdoe-me, mas eu também caí. Bati no carrinho... - Harry ficou sem jeito, não conhecia a garota, mas não queria acusá-la.
- Ele bateu em meu carrinho, madama! - disse a garota se adiantando - Eu não queria causar transtornos... nunca estive aqui... fiquei impressionada e... Pardon, pardon, je ne... Je vous demande pardon... Je distraid - ela ficou nervosa e começou a falar em uma língua que eles não conheciam.
- Que belezinha! - exclamou Molly vendo o embaraço dela - É francesa! Não se preocupe querida, entendo, ficou olhando o movimento da estação e se esqueceu de tirar seu carrinho da frente. Tudo bem! Mas cuidado da próxima vez, pode se machucar. - Molly lha falava sorridente, o que fez a garota se acalmar. - Qual o seu nome, mon bijou?
- Sofie... Sofie Ferraù. - respondeu ela com um delicioso sotaque francês. Harry sentiu os pelos de seu corpo se arrepiarem - Plaisir madam...
- Weasley. Molly Weasley. - respondeu a ruiva e baixinha mulher sorrindo - Esses são meus filhos Fred, Jorge e Gina. - apontando para os três no chão - Este é Rony e este é o melhor amigo dele e de toda nossa família, - Molly parecia estar muito orgulhosa - Harry Potter.
- Muito prazer em conhecê-los. Excuse encore, jamais estive em Londres. Aqui é tão différent de Paris, a estação é très beau. Fiquei distraída. "Por sorte papa não está aqui" - pensou ela.
- Tudo bem, mon petit. - Molly apertou as bochechas da garota que lhe sorriu - Não se preocupe.
Fred, Jorge e Gina já haviam se levantado e colocavam as bagagens de qualquer jeito nos carrinhos.
- Mas agora vamos, - ordenou Molly - têm que embarcar, o Expresso não os aguardará.
Todos pegaram seus carrinhos, despacharam suas bagagens e embarcaram.
- Foi ótimo terem vindo para o Natal! - chorava Molly quase gritando - Até as férias de verão! Adeus meus filhos, adeus Harry. Aur revoir mademoiselle Ferraù.
Cinco mãos acostumadas ao entusiasmo da senhora Weasley mexeram-se vigorosamente pelas janelas, enquanto que uma alva e delicada mão acenava gentilmente.
Harry olhava para a garota francesa, ela tinha quase a sua altura, era muito bonita, era tão clara e tinha traços tão delicados que parecia ser feita de porcelana. Sua boca era rosada e muito bem desenhada, o nariz era fino e arrebitado e aqueles olhos eram simplesmente divinos. Pareciam duas esmeraldas faiscantes.
- Com licença! - disse Harry se dirigindo a ela - Gostaria de se sentar conosco?
- Oui, monsieur Potter, será um prazer. - Harry olhou para trás e viu que Rony e seus irmãos já haviam ido para uma cabine. Não sabia qual, então foi procurá-los.
- Harry! Estamos aqui! - Rony chamou seu amigo, Harry entrou seguido pela garota - Hermione já estava aqui.
- Qual seu nome mesmo? - indagou Harry corando.
- Sofie Ferraù. - ela respondeu e Harry sentiu seu pelos arrepiarem novamente.
- Sofie Ferraù, está é nossa amiga, Hermione Granger.
- Olá, Ferraù! - cumprimentou Hermione - Você é francesa, não? Rony me contou.
- Oui, Granger, sou.
- É sua primeira vez em Hogwarts?
- Oui. Eu estudava em Beauxbatons, mas mon papa transferiu les affaires para a Inglaterra e viemos morar em Londres. Chegamos avant-hier. Que cidade fantastique, eu sempre quis conhecê-la e a Hogwarts também.
- Você até que fala inglês muito bem para quem mora aqui há dois dias. - admirou-se Fred.
- Sim, mais um pouco e estará parecendo uma perfeita inglesinha. - concluiu Jorge.
- Minha mãe foi professora de inglês e me ensinou. - disse ela totalmente sem sotaque, todos se surpreenderam - Mas meu pai me mandou falar com sotaque aqui na Inglaterra. Ele diz que os ingleses acham charmoso. - Harry concordou intimamente - Então... je parle ansi. - ela riu e ajeitou o lenço.
- É moda em Paris? - perguntou Gina admirando o lenço de Sofie.
- Oui! - ela respondeu sem jeito. - Mas eu acho que vou tentar não falar com muito sotaque... Sabe, adoro o inglês, desde pequena, mas meu pai insiste no francês...
- Bem, com licença, Ferraù. - disse Gina.
- Podem me chamar de Sofie.
- Então, com licença, Sofie, vou para outra cabine, meu namorado me aguarda. - Gina saiu sorrindo e deixou a cabine.
- Sente-se, Sofie. - pediu Hermione dando a mão a Rony - Em que ano vai ingressar?
- No quinto.
- Que bom! Estudará conosco, aliás, estudará comigo, Rony e Harry. Gina está no quarto ano e Fred e Jorge no sétimo, se formam este ano. Espero que vá para nossa casa, somos todos Grifinórios.
- Oui, fiquei sabendo que em Hogwarts há quatro casas e que os alunos são selecionados por um chapéu. N`est-ce pas? - ela arrumava novamente o lenço.
- Exatamente! Ele seleciona os alunos por sua qualidades e aptidões. As casas são Lufa-Lufa, Corvinal, Grifinória e Sonserina - explicou Rony.
Harry estava calado, apenas olhava para Sofie, admirando sua beleza e sua delicadeza. Fred e Jorge cochichavam algo rindo e então falaram.
- Ei, Harry! Feche a boca! Não vai querer babar em frente da moça. Vai? - disse Fred.
- É! Para o que está olhando? Para o lenço ou para as mãos dela? - emendou Jorge.
- Acho que é para os olhos!
- Ou será que é para a boca?
Harry ficou vermelho, os dois perceberam que ele se encantara com Sofie e agora caçoavam dele. Mas a garota lhe sorriu docemente e seus olhos se encontraram novamente.
A viagem seguiu bem tranqüila, se considerarmos que é absolutamente normal, os gêmeos Weasley aprontarem travessuras, caçoarem dos outros e deixarem Harry e Sofie e os outros sem graça.
Sofie lhes contou sobre a França e sobre Beauxbatons. Mas evitou falar de sua família. Sua mãe era bruxa, mas seu pai era trouxa e não admitia em hipótese alguma que ela e sua mãe fizessem magia em casa. Aliás, ele inclusive proibira das as falarem sobre magia. Para Sofie ingressar em Beauxbatons foi preciso muita conversa e persuasão de sua mãe. E para ir para Hogwarts então, foi pior ainda. Seu pai parecia ter ódio do nome da escola.
Ela se limitou a lhes dizer que sua mãe era bruxa e que seu pai era trouxa, dono de um grande laboratório que produzia medicamentos.
O Expresso chegou a estação e os alunos desembarcaram, como sempre Hagrid aguardava os alunos. Ele cumprimentou os amigos com entusiasmo e notou a nova aluna lhe sorrindo. Ele se voltou para ela com uma expressão estranha.
- Qual o seu nome? - indagou amavelmente o gigante.
- Sofie Ferraù.
- Ferraù, hein? Como se chama sua mãe? Quero dizer, o nome de solteira.
- Maman, quando solteira, se chamava Marie Dupont.
- Dupont? Devo ter confundido. Mas venha, vou levá-la a Hogwarts.
Hagrid os conduziu, até o castelo. Todos foram para suas casas, haviam saído de lá apenas para as férias de Natal. Não havia cerimônia de abertura e nem seleção de alunos do primeiro ano. Aliás, haveria a seleção de Sofie, mas seria mais tarde, durante o jantar. Hagrid a levou separada dos outros e Harry ficou curioso para saber aonde ela ia.
- Então posso te chamar de Sofie?
- Oui, Hagrid!
- Dumbledore me disse que você viria e que eu deveria levá-la para as masmorras, para falar com o Snape.
- Oui, preciso falar com professeur "Snape". - Sofie disse "Snape" com tanta ênfase que Hagrid a indagou se ela tinha algum problema com ele.
- Non! Absolument! Mas meu pai me proíbe de falar sobre ou de pronunciar o nome de qualquer bruxo em casa. "Dumbledore", "McGonagall", "Flitwick", "Sprout"... disse Sofie desfilando os nomes de todos os professores de Hogwarts, como se estivesse sentindo um alívio em dizê-los. - Antes de vir para cá recebi o programa de aulas, mas não podia sequer pensar em falar algo sobre eles nem mesmo a minha mãe que é bruxa.
- Que chato! Sinto muito, Sofie.
- Tubo bem, Hagrid. Já me acostumei.
Hagrid a conduziu até a porta das masmorras. Disse que tinha que resolver algo antes do jantar e pediu para ela descesse sozinha até a sala de Snape.
Sofie desceu as escadas entusiasmada e reparou em tudo ao seu redor. Achava o lugar estranho, mas até que gostou de lá. Dava pequenos pinotes nas escadas (se seu pai visse isso...), virava os corredores descuidadamente e então se chocou com um enorme vulto negro.
- Ai! - ela caiu no chão. Com o impacto o vulto deixou um frasco escapar de suas mãos, mas Sofie foi rápida e recolheu-o em suas mãos impedindo-o de se espatifar no chão. O vulto lhe falou com uma voz suave, mas muito séria.
- Desastrada! Não sabe que não deve andar assim, distraída e correndo pelos corredores? Minha poção caiu, vamos ajude-me a procurá-la. Se bem que... agora deve estar toda esparramada no chão.
Sofie se levantou e estendeu o frasco para o vulto, eles estavam próximos, mas estava tão escuro lá que não podiam ver seus rostos.
- Voilà! Não quebrou. - disse ela. O vulto pegou o frasco da mão dela.
- Qual o seu nome?
- Sofie Ferraù. - respondeu ela e pensou - "Nossa! Ele fala igualzinho a meu pai."
- Então, é a senhorita Ferraù. Estava a aguardando senhorita. Queria me falar?
Os olhos de Sofie brilharam e até no escuro podiam ser vistos.
- Alors et o professeur Severo Snape? - ela parecia contente.
- Sim! Sou eu mesmo, mas agora venha, vamos até minha sala.
Snape a conduziu na escuridão até suas sala. Ela entrou e achou tudo muito interessante, só vira tantos frascos, líquidos, pós e ingredientes juntos nos laboratórios de seu pai. Mas eram ingredientes trouxas, lá não, era tudo mágico e ali naquela sala parecia haver muito mais coisas que no laboratório de Beauxbatons.
Sofie caminhou até a parte mais iluminada da sala e contemplou a vasta coleção de livros que havia ali. Snape, sem olhar para ela, se sentou nas sombras. Mas quando a viu levou um grande susto.
- Por Merlim! Você... Você é igualzinha a... - ele se conteve, se levantou, mas continuou na escuridão.
- Quem é sua mãe? Qual o nome dela?
- Maman? - Sofie achou estranho, era a segunda pessoa que perguntava sobre sua mãe desde que chegara a Hogwarts - Marie Dupont Ferraù.
- Dupont? Marie Dupont? - Snape repetiu - Não pode ser... É apenas uma coincidência. - disse ele resignado.
- Coïncidence, monsieur professeur? O quê?
Snape estava pensativo, se lembrara de alguém. Alguém que fora importante para ele no passado. Na época ele não sabia disso, mas agora reconhecia o quão importante ela fora para ele.
- Nada, senhorita! - Snape se aproximou de Sofie, indo para a claridade - Mas o que deseja? O que quer de mim?
Sofie pode vê-lo finalmente, ele era um homem alto, bem claro, com olhos negros e uma voz forte. Lembrava o tipo físico de seu pai, tinha também cabelos como os dele. Cabelos negros, mas...
- Impossible! - exclamou Sofie atordoada, ela olhou bem para ele, se aproximou um pouco mais e constatou que era verdade. Começou a rir, descontroladamente.
Snape estranhou, imaginou que a garota troçava dele. Mas ela ria demais, parecia uma louca. Queria chamar-lhe a atenção, mas a risada dela lembrava, assim como seu rosto, a risada de outra pessoa. Ele viu esta pessoa em sua frente após tantos anos, não teve coragem de lhe ralhar, apenas lhe falou seriamente.
- Aconteceu alguma coisa, senhorita?
- Excuse moi professeur! Non queria manquer de respect.
- Então por que ri?
Sofie retirou o negro lenço que cobria seus cabelos, soltou o coque que os prendia e exibiu-os ao professor.
- Vim procurá-lo na esperança que pudesse me ajudar com eles. Sua reputação como Maître en Potions é tão grande que achei que soubesse de algo que os fizesse ficar ... normais.
Snape viu a garota mostrando os cabelos a ele. Seus cabelos eram negros, como os dele, exatamente como os dele. Negros, escorridos e...
- Oleosos! - exclamou Snape, ele não pode conter um sorriso - Então, encontrei alguém com o mesmo problema. É bom dividir o martírio.
Sofie sorria para ele.
- Se eu tivesse podido abrir os livros sobre Hogwarts, teria visto sua foto e saberia. - ambos riam, era realmente cômico.
Sofie tinha os cabelos oleosos como os de Snape e foi procurá-lo em busca de ajuda com eles. Pobrezinha, se o professor soubesse de algo, já teria feito. Irritava-lhe os comentários dos outros sobre seus cabelos, ele os lavava todos os dias, mas não adiantava, continuavam oleosos.
- É estranho, nunca encontrei ninguém fora de minha família que tivesse os cabelos assim.
- Maman disse que puxei isso do lado de mon papa, acho que mon grand-père era assim.
- A qual família pertence seu pai?
- Oh, professeur, mon papa não vem de família bruxa. Ele é totalmente trouxa.
Snape ouviu aquilo com um certo ar de decepção. Se o pai dela era trouxa, ela era mestiça, ou como diria os preconceituosos, sangue-ruim. Ela não iria para Sonserina. Desde Tom Riddle, nenhum outro mestiço fora para Sonserina. Tom Riddle era mestiço, mas ele era Voldemort, tinha o sangue de Salazar Slytherin. Mas aquela garota era só uma mestiça. Snape se simpatizou com ela, mas...
- Sua mãe é bruxa. Não é?
- Oui, ela é.
- Senhorita Ferraù, devo informá-la que pode lavá-los, esfregá-los, cortá- los, embrulhá-los, besuntá-los, encapá-los, engessá-los, enfim, fazer qualquer coisa com eles, que não vai adiantar.
Começaram a rir novamente. Eles detestavam que lhes provocassem e zombassem de seus cabelos, mas estavam sozinhos, eram parceiros no sofrimento e então riam. De si mesmos, de seus cabelos e riam um do outro.
- Mon papa é fármaco. Ele já passou ácido de frutas, sumo de limão, álcool, sal marinho, extrato de pitanga, até fogo ele já colocou. E nént! Não adiantou!
Snape se surpreendeu e parou de rir. Fogo?
- Seu pai ateou fogo em seus cabelos?
- Non! Em alguns fios apenas, foi surprenant. Nós achamos que ia se incendiar mais facilmente por causa do óleo, mas non. Eles ficaram intactos.
- O quê? Ficaram intactos após se incendiarem? - Snape já havia tentado de tudo, tudo mesmo, mas nunca tentara lhes atear fogo.
Ele olhou para a mesa cheia de ingredientes de poções e sorriu para Sofie. Ela compreendeu o que ele pensava. Ambos se dirigiram à mesa. Snape pegou uma tesoura, cortou um tufo de seu cabelo e colocou-o no fogo.
- Realmente senhorita, não queimam. Eu nunca soube disso. É incrível! - ela sorriu para ele - Já os colocou imersos em saliva de sapo? - diante da resposta negativa da garota ele colocou um pouco de cabelo em um pequeno vidro, acrescentou a espessa saliva, tampou o frasco, sacudiu-o um pouco e retirou o cabelo com uma pinça - Toque-os, mas com cuidado. - ela obedeceu.
- Ai! - exclamou ela retirando a mão - Donne choc!
- Passei muita saliva de sapo nos cabelos quando era estudante, os colegas ficavam puxando-os e então...
Sofie começou a rir. Também puxavam os dela no colégio de onde viera.
- Merveilleux! Queria ter sabido disso antes. Já passou limo se sanguessuga?
- Não! - respondeu Snape.
Sofie pegou a tesoura e tirou um longo tufo de sua nuca. O cabelo dela era realmente grande, ia além da cintura. Ela amarrou a ponta do tufo e cortou uma porção de cabelo. Snape lhe deu o limo de sanguessuga e ela passou no cabelo cortado.
- Incrível! - exclamou Snape, os cabelos ouriçaram, realmente pareciam ter espinhos, armaram-se e ficaram parecendo um ouriço negro.. Ele os tocou e percebeu que continuavam macios.
- Um colega de Beauxbatons deixou cair um vidro de limo em cima de minha cabeça. Foi um desastre, além do galo, fiquei parecendo um pom-pom gigante. Quase não passava pelas portas. Levou uma semana inteira para voltar ao normal. Dei-lhe mais de vinte lavadas.
Eles tornaram a rir. Um ficou mostrando para o outro o que acontecia ao misturarem substâncias aos cabelos. Ficaram lá por um bom tempo, riram, conversaram e experimentaram. Até que Snape viu que já era tarde, o jantar seria servido em instantes e a senhorita Ferraù deveria ser apresentada.
- Senhorita Ferraù, nossos experimentos estão muito agradáveis, mas receio que devamos ir. Já é tarde e em breve será apresentada a escola e selecionada para sua casa.
Sofie concordou e Snape a escoltou até o refeitório.
- Alors monsieur être directeur de Sonserina? E ainda ministra duas aulas?
- Sim, senhorita. Sou diretor de Sonserina e ministro as aulas de Poções e desde o início deste ano Defesa Contra as Artes das Trevas.
- Intéressant! Espero ser selecionada para Sonserina então.
Snape lhe deu um meio sorriso. Sabia que ela não iria para Sonserina, somente os puros-sangue iam para lá. Ficou realmente decepcionado, gostara da garota.
- Monsieur deve ser um excelentt professeur, é tant sympathi et gentil.
Snape deu outro meio sorriso. Nenhum outro aluno o achava simpático, menos ainda gentil e ele sabia que realmente não era nada disso. Jamais confraternizara com um aluno daquela maneira, mas ela era tão simpática, doce e familiar. A semelhança dela com outra moça que Snape conhecera no passado o deixou perturbado e suscetível.
- Senhorita Ferraù, então está aí! - era Minerva McGonagall, a vice- diretora de Hogwarts, diretora da casa de Grifinória e professora de Transfigurações. - Procurei-a por toda parte. - ela se aproximou de Sofie e a olhou com ar de espanto.
- Algum problema, professeur? - perguntou Sofie. Ela percebeu que os professores trocaram olhares.
- Não, senhorita. Venha! Será selecionada agora. - McGonagall lhe indicou a passagem - Obrigada, Severo, por trazê-la até aqui. - cumprimentaram-se com a cabeça e entraram no Salão Principal.
Os alunos e os professores viram McGonagall entrar com a garota, geralmente entrariam pela frente do Salão, mas entraram pela passagem dos professores seguidas por Snape que se sentou em seu lugar e aguardou ansioso a seleção de Sofie.
A professora McGonagall pegou o chapéu seletor e pediu a Sofie que se sentasse na cadeira, ela aproximou o chapéu da cabeça da garota e ele começou a falar.
- Como sempre digo, tal pai, tal filha. Não há o que mudar, o sangue fala mais alto e a linhagem é mantida. Et pardroit de conquête et pardroit de naissence... Sonserina.
A garota se levantou sorrindo, olhou para Snape, que estava surpreso e foi para a mesa de Sonserina. Todos murmuraram, imaginaram-na em qualquer casa, menos Sonserina. Fred e Jorge já haviam falado dela por toda a escola. Bonita, mestiça, encantara Harry Potter e fora para Sonserina, inacreditável.
Sofie se sentou e sorriu para todos, mas percebeu que seus colegas de classe não lhe retribuíram o sorriso e estavam a fitando seriamente.
Ela se intimidou, pensou que fizera algo de errado, bem na sua frente havia um garoto louro, com olhos cinzas e ares de superior que lhe fazia uma cara de nojo. Ela levou as mãos aos cabelos, mas não podia ser, já deveriam estar acostumados, os cabelos do professor Snape também eram daquele jeito.
Sofie pode perceber que além da cabeça daquele garoto que se mostrava contrariado, uma mão lhe acenava. Ela esticou o pescoço e constatou que era Harry Potter. Ela enrubesceu e lhe acenou sorrindo de volta. O garoto louro olhou para trás e viu Harry, voltou-se para Sofie.
- Olha aqui, sua sangue-ruim, aquele chapéu velho deve ter enlouquecido por ter te selecionado para cá. Mas já que está aqui aprenda algo, não fazemos amizades com alunos de outras casas e muito menos com Grifinórios.
Sofie recebeu aquilo como se fosse atropelada por um bando de centauros em disparada, queria lhe responder a altura, mas a educação esmeradíssima que seu pai havia lhe aplicado e o constante treinamento lhe deram disciplina e autocontrole. Falou polidamente ao garoto.
- Excuse moi monsieur...
- Malfoy. Draco Malfoy.
- "Malfoy? - pensou Sofie - Acho que já ouvi meus pais falarem de um Malfoy".
- Excuse moi monsieur Malfoy. Não tive intenção de aborrecê-lo, mas com certeza houve um terrible mal entendido que sûrement será esclarecido.
Malfoy bufou. Quando ele ofendia alguém lhe retribuíam com insultos e ameaças ou então abaixavam as cabeças e saíam correndo. Mas aquela garota não, ela o olhou bem no fundo dos olhos e lhe falou educadamente, não conseguia dizer-lhe mais nenhuma grosseria. Enfim, resignou-se a olhá-la, medindo-a.
Sofie resolveu que não ia se aborrecer e jantou. A comida estava deliciosa, não comera nada desde a manhã, nem no Expresso, seu pai lhe proibira de comer qualquer coisa que saísse fora de sua dieta. Mas aquele suco de abóbora estava divino e a torta também, não estavam na lista do que poderia comer, mas também não estavam na lista do que não poderia.
Ela se refestelou, para seus padrões, é claro. Sofie comeu menos do que o menor e mais magro aluno de Hogwarts. Mas sentiu-se saciada e completamente satisfeita. Percebeu que na mesa de Grifinória, Harry ainda a olhava e ela lhe retribuía com um belo sorriso.
- Merci maman! - exclamava uma doce menina abraçando sua mãe.
Elas bastante parecidas. Tinham olhos verde-claro, eram alvas como o leite, tinham traços extremamente delicados e um certo ar afrancesado. Mas a mãe era loira e baixa e sua filha bem mais alta e com os cabelos negros e escorridos. Ela colocou um lenço neles e os escondeu.
- Espero que consiga, minha filha!
- Eu também, maman. O professeur de Potions de Hogwarts é très bien. Todos falavam dele em Beauxbeaton. Com certeza ele conseguirá me ajudar.
- Espero que sim! Mas se não... - a mulher parou de falar, um homem com uniforme de motorista as observava.
- Eu sei, eu sei. No é tão ruim, mas as outras pessoas ficam caçoando. Se eu puder melhorá-los o farei, senão me resignarei.
- Filha! - a bela mulher abraçou a garota - Sabe que não poderemos nos comunicar durante sua estada lá, mas saiba que eu e... que eu e seu pai sentiremos saudades.
- A senhora eu sei que sentirá, mas papa... - a garota abaixou os olhos e levou a mão ao ombro esquerdo que parecia doer.
- Ele te ama! Só não sabe demonstrar da forma correta. Entenda que ele é trouxa e é contra o que somos. Ele não queria que você estudasse magia, mas eu o convenci. Nós temos que agradecer a ele por isso.
A garota encarou sua mãe tristemente.
- Vous êtes bonne mère.
- Não se esqueça, treine e estude tudo o que seu pai mandou. Aqui neste malão estão as letras, as partituras, as roupas de treino, os livros. Enfim, tudo o que ele quer que aprenda. Ah... e não se esqueça do sotaque.
- Oui, maman!
- Agora vá, tome o bilhete, é só passar pela parede. Não posso entrar, seu pai proi... me pediu. - a mulher beijou sua filha e ela atravessou a passagem para a plataforma 9 ¾, na estação King´s Cross.
- Quanta gente! - exclamou a moça olhando o movimento, em vez dela continuar ficou parada diante da passagem segurando seu carrinho. Até que ouviu o barulho de alguém correndo por detrás de si. Ela se virou e viu um garoto de cabelos negros revoltos avançando sobre ela com seu carrinho todo abarrotado de malas.
- Tapum!!! - e o garoto chocou seu carrinho com o dela. Com impacto ele foi jogado para trás e caiu sentado no chão. Estranhamente a garota não foi atingida, ela estava em pé ao lado dele o olhando assustada. Ele a encarou, ia xingá-la, mas ao encontrar seus olhos com os dela ficou paralisado e se calou.
De repente ouviram um barulho, era outro carrinho que atravessava a passagem, ia atropelar o garoto, mas a garota agilmente estendeu sua mão a ele e o puxou com tudo da frente da passagem.
- Tapum!!! - outro carrinho se chocou com os que já haviam batido e agora era um garoto alto e de cabelos vermelhos que caía ao chão.
- Harry! - exclamou Rony no chão - O que houve? Ficou louco? Como para assim na frente da passagem? - ele se levantou e caminhou até Harry - O peru de Natal foi para seu cérebro ao invés do estômago?
Eles ouviram mais uma vez o barulho dos carrinhos.
- Tapum! Tapum! Tapum! - agora eram três cabeças vermelhas que caíam ao chão, todos os carrinhos caíram e as malas se esparramaram.
- Rony, o que aconteceu aqui? - era Molly Weasley que atravessou a passagem (sem carrinho e sem correr) e viu três de seus filhos estatelados no chão.
- Não fui eu, mãe. Eu também caí e... - Rony olhou para Harry - Caí batendo no carrinho dele. - Harry arregalou os olhos.
- Senhora Weasley, perdoe-me, mas eu também caí. Bati no carrinho... - Harry ficou sem jeito, não conhecia a garota, mas não queria acusá-la.
- Ele bateu em meu carrinho, madama! - disse a garota se adiantando - Eu não queria causar transtornos... nunca estive aqui... fiquei impressionada e... Pardon, pardon, je ne... Je vous demande pardon... Je distraid - ela ficou nervosa e começou a falar em uma língua que eles não conheciam.
- Que belezinha! - exclamou Molly vendo o embaraço dela - É francesa! Não se preocupe querida, entendo, ficou olhando o movimento da estação e se esqueceu de tirar seu carrinho da frente. Tudo bem! Mas cuidado da próxima vez, pode se machucar. - Molly lha falava sorridente, o que fez a garota se acalmar. - Qual o seu nome, mon bijou?
- Sofie... Sofie Ferraù. - respondeu ela com um delicioso sotaque francês. Harry sentiu os pelos de seu corpo se arrepiarem - Plaisir madam...
- Weasley. Molly Weasley. - respondeu a ruiva e baixinha mulher sorrindo - Esses são meus filhos Fred, Jorge e Gina. - apontando para os três no chão - Este é Rony e este é o melhor amigo dele e de toda nossa família, - Molly parecia estar muito orgulhosa - Harry Potter.
- Muito prazer em conhecê-los. Excuse encore, jamais estive em Londres. Aqui é tão différent de Paris, a estação é très beau. Fiquei distraída. "Por sorte papa não está aqui" - pensou ela.
- Tudo bem, mon petit. - Molly apertou as bochechas da garota que lhe sorriu - Não se preocupe.
Fred, Jorge e Gina já haviam se levantado e colocavam as bagagens de qualquer jeito nos carrinhos.
- Mas agora vamos, - ordenou Molly - têm que embarcar, o Expresso não os aguardará.
Todos pegaram seus carrinhos, despacharam suas bagagens e embarcaram.
- Foi ótimo terem vindo para o Natal! - chorava Molly quase gritando - Até as férias de verão! Adeus meus filhos, adeus Harry. Aur revoir mademoiselle Ferraù.
Cinco mãos acostumadas ao entusiasmo da senhora Weasley mexeram-se vigorosamente pelas janelas, enquanto que uma alva e delicada mão acenava gentilmente.
Harry olhava para a garota francesa, ela tinha quase a sua altura, era muito bonita, era tão clara e tinha traços tão delicados que parecia ser feita de porcelana. Sua boca era rosada e muito bem desenhada, o nariz era fino e arrebitado e aqueles olhos eram simplesmente divinos. Pareciam duas esmeraldas faiscantes.
- Com licença! - disse Harry se dirigindo a ela - Gostaria de se sentar conosco?
- Oui, monsieur Potter, será um prazer. - Harry olhou para trás e viu que Rony e seus irmãos já haviam ido para uma cabine. Não sabia qual, então foi procurá-los.
- Harry! Estamos aqui! - Rony chamou seu amigo, Harry entrou seguido pela garota - Hermione já estava aqui.
- Qual seu nome mesmo? - indagou Harry corando.
- Sofie Ferraù. - ela respondeu e Harry sentiu seu pelos arrepiarem novamente.
- Sofie Ferraù, está é nossa amiga, Hermione Granger.
- Olá, Ferraù! - cumprimentou Hermione - Você é francesa, não? Rony me contou.
- Oui, Granger, sou.
- É sua primeira vez em Hogwarts?
- Oui. Eu estudava em Beauxbatons, mas mon papa transferiu les affaires para a Inglaterra e viemos morar em Londres. Chegamos avant-hier. Que cidade fantastique, eu sempre quis conhecê-la e a Hogwarts também.
- Você até que fala inglês muito bem para quem mora aqui há dois dias. - admirou-se Fred.
- Sim, mais um pouco e estará parecendo uma perfeita inglesinha. - concluiu Jorge.
- Minha mãe foi professora de inglês e me ensinou. - disse ela totalmente sem sotaque, todos se surpreenderam - Mas meu pai me mandou falar com sotaque aqui na Inglaterra. Ele diz que os ingleses acham charmoso. - Harry concordou intimamente - Então... je parle ansi. - ela riu e ajeitou o lenço.
- É moda em Paris? - perguntou Gina admirando o lenço de Sofie.
- Oui! - ela respondeu sem jeito. - Mas eu acho que vou tentar não falar com muito sotaque... Sabe, adoro o inglês, desde pequena, mas meu pai insiste no francês...
- Bem, com licença, Ferraù. - disse Gina.
- Podem me chamar de Sofie.
- Então, com licença, Sofie, vou para outra cabine, meu namorado me aguarda. - Gina saiu sorrindo e deixou a cabine.
- Sente-se, Sofie. - pediu Hermione dando a mão a Rony - Em que ano vai ingressar?
- No quinto.
- Que bom! Estudará conosco, aliás, estudará comigo, Rony e Harry. Gina está no quarto ano e Fred e Jorge no sétimo, se formam este ano. Espero que vá para nossa casa, somos todos Grifinórios.
- Oui, fiquei sabendo que em Hogwarts há quatro casas e que os alunos são selecionados por um chapéu. N`est-ce pas? - ela arrumava novamente o lenço.
- Exatamente! Ele seleciona os alunos por sua qualidades e aptidões. As casas são Lufa-Lufa, Corvinal, Grifinória e Sonserina - explicou Rony.
Harry estava calado, apenas olhava para Sofie, admirando sua beleza e sua delicadeza. Fred e Jorge cochichavam algo rindo e então falaram.
- Ei, Harry! Feche a boca! Não vai querer babar em frente da moça. Vai? - disse Fred.
- É! Para o que está olhando? Para o lenço ou para as mãos dela? - emendou Jorge.
- Acho que é para os olhos!
- Ou será que é para a boca?
Harry ficou vermelho, os dois perceberam que ele se encantara com Sofie e agora caçoavam dele. Mas a garota lhe sorriu docemente e seus olhos se encontraram novamente.
A viagem seguiu bem tranqüila, se considerarmos que é absolutamente normal, os gêmeos Weasley aprontarem travessuras, caçoarem dos outros e deixarem Harry e Sofie e os outros sem graça.
Sofie lhes contou sobre a França e sobre Beauxbatons. Mas evitou falar de sua família. Sua mãe era bruxa, mas seu pai era trouxa e não admitia em hipótese alguma que ela e sua mãe fizessem magia em casa. Aliás, ele inclusive proibira das as falarem sobre magia. Para Sofie ingressar em Beauxbatons foi preciso muita conversa e persuasão de sua mãe. E para ir para Hogwarts então, foi pior ainda. Seu pai parecia ter ódio do nome da escola.
Ela se limitou a lhes dizer que sua mãe era bruxa e que seu pai era trouxa, dono de um grande laboratório que produzia medicamentos.
O Expresso chegou a estação e os alunos desembarcaram, como sempre Hagrid aguardava os alunos. Ele cumprimentou os amigos com entusiasmo e notou a nova aluna lhe sorrindo. Ele se voltou para ela com uma expressão estranha.
- Qual o seu nome? - indagou amavelmente o gigante.
- Sofie Ferraù.
- Ferraù, hein? Como se chama sua mãe? Quero dizer, o nome de solteira.
- Maman, quando solteira, se chamava Marie Dupont.
- Dupont? Devo ter confundido. Mas venha, vou levá-la a Hogwarts.
Hagrid os conduziu, até o castelo. Todos foram para suas casas, haviam saído de lá apenas para as férias de Natal. Não havia cerimônia de abertura e nem seleção de alunos do primeiro ano. Aliás, haveria a seleção de Sofie, mas seria mais tarde, durante o jantar. Hagrid a levou separada dos outros e Harry ficou curioso para saber aonde ela ia.
- Então posso te chamar de Sofie?
- Oui, Hagrid!
- Dumbledore me disse que você viria e que eu deveria levá-la para as masmorras, para falar com o Snape.
- Oui, preciso falar com professeur "Snape". - Sofie disse "Snape" com tanta ênfase que Hagrid a indagou se ela tinha algum problema com ele.
- Non! Absolument! Mas meu pai me proíbe de falar sobre ou de pronunciar o nome de qualquer bruxo em casa. "Dumbledore", "McGonagall", "Flitwick", "Sprout"... disse Sofie desfilando os nomes de todos os professores de Hogwarts, como se estivesse sentindo um alívio em dizê-los. - Antes de vir para cá recebi o programa de aulas, mas não podia sequer pensar em falar algo sobre eles nem mesmo a minha mãe que é bruxa.
- Que chato! Sinto muito, Sofie.
- Tubo bem, Hagrid. Já me acostumei.
Hagrid a conduziu até a porta das masmorras. Disse que tinha que resolver algo antes do jantar e pediu para ela descesse sozinha até a sala de Snape.
Sofie desceu as escadas entusiasmada e reparou em tudo ao seu redor. Achava o lugar estranho, mas até que gostou de lá. Dava pequenos pinotes nas escadas (se seu pai visse isso...), virava os corredores descuidadamente e então se chocou com um enorme vulto negro.
- Ai! - ela caiu no chão. Com o impacto o vulto deixou um frasco escapar de suas mãos, mas Sofie foi rápida e recolheu-o em suas mãos impedindo-o de se espatifar no chão. O vulto lhe falou com uma voz suave, mas muito séria.
- Desastrada! Não sabe que não deve andar assim, distraída e correndo pelos corredores? Minha poção caiu, vamos ajude-me a procurá-la. Se bem que... agora deve estar toda esparramada no chão.
Sofie se levantou e estendeu o frasco para o vulto, eles estavam próximos, mas estava tão escuro lá que não podiam ver seus rostos.
- Voilà! Não quebrou. - disse ela. O vulto pegou o frasco da mão dela.
- Qual o seu nome?
- Sofie Ferraù. - respondeu ela e pensou - "Nossa! Ele fala igualzinho a meu pai."
- Então, é a senhorita Ferraù. Estava a aguardando senhorita. Queria me falar?
Os olhos de Sofie brilharam e até no escuro podiam ser vistos.
- Alors et o professeur Severo Snape? - ela parecia contente.
- Sim! Sou eu mesmo, mas agora venha, vamos até minha sala.
Snape a conduziu na escuridão até suas sala. Ela entrou e achou tudo muito interessante, só vira tantos frascos, líquidos, pós e ingredientes juntos nos laboratórios de seu pai. Mas eram ingredientes trouxas, lá não, era tudo mágico e ali naquela sala parecia haver muito mais coisas que no laboratório de Beauxbatons.
Sofie caminhou até a parte mais iluminada da sala e contemplou a vasta coleção de livros que havia ali. Snape, sem olhar para ela, se sentou nas sombras. Mas quando a viu levou um grande susto.
- Por Merlim! Você... Você é igualzinha a... - ele se conteve, se levantou, mas continuou na escuridão.
- Quem é sua mãe? Qual o nome dela?
- Maman? - Sofie achou estranho, era a segunda pessoa que perguntava sobre sua mãe desde que chegara a Hogwarts - Marie Dupont Ferraù.
- Dupont? Marie Dupont? - Snape repetiu - Não pode ser... É apenas uma coincidência. - disse ele resignado.
- Coïncidence, monsieur professeur? O quê?
Snape estava pensativo, se lembrara de alguém. Alguém que fora importante para ele no passado. Na época ele não sabia disso, mas agora reconhecia o quão importante ela fora para ele.
- Nada, senhorita! - Snape se aproximou de Sofie, indo para a claridade - Mas o que deseja? O que quer de mim?
Sofie pode vê-lo finalmente, ele era um homem alto, bem claro, com olhos negros e uma voz forte. Lembrava o tipo físico de seu pai, tinha também cabelos como os dele. Cabelos negros, mas...
- Impossible! - exclamou Sofie atordoada, ela olhou bem para ele, se aproximou um pouco mais e constatou que era verdade. Começou a rir, descontroladamente.
Snape estranhou, imaginou que a garota troçava dele. Mas ela ria demais, parecia uma louca. Queria chamar-lhe a atenção, mas a risada dela lembrava, assim como seu rosto, a risada de outra pessoa. Ele viu esta pessoa em sua frente após tantos anos, não teve coragem de lhe ralhar, apenas lhe falou seriamente.
- Aconteceu alguma coisa, senhorita?
- Excuse moi professeur! Non queria manquer de respect.
- Então por que ri?
Sofie retirou o negro lenço que cobria seus cabelos, soltou o coque que os prendia e exibiu-os ao professor.
- Vim procurá-lo na esperança que pudesse me ajudar com eles. Sua reputação como Maître en Potions é tão grande que achei que soubesse de algo que os fizesse ficar ... normais.
Snape viu a garota mostrando os cabelos a ele. Seus cabelos eram negros, como os dele, exatamente como os dele. Negros, escorridos e...
- Oleosos! - exclamou Snape, ele não pode conter um sorriso - Então, encontrei alguém com o mesmo problema. É bom dividir o martírio.
Sofie sorria para ele.
- Se eu tivesse podido abrir os livros sobre Hogwarts, teria visto sua foto e saberia. - ambos riam, era realmente cômico.
Sofie tinha os cabelos oleosos como os de Snape e foi procurá-lo em busca de ajuda com eles. Pobrezinha, se o professor soubesse de algo, já teria feito. Irritava-lhe os comentários dos outros sobre seus cabelos, ele os lavava todos os dias, mas não adiantava, continuavam oleosos.
- É estranho, nunca encontrei ninguém fora de minha família que tivesse os cabelos assim.
- Maman disse que puxei isso do lado de mon papa, acho que mon grand-père era assim.
- A qual família pertence seu pai?
- Oh, professeur, mon papa não vem de família bruxa. Ele é totalmente trouxa.
Snape ouviu aquilo com um certo ar de decepção. Se o pai dela era trouxa, ela era mestiça, ou como diria os preconceituosos, sangue-ruim. Ela não iria para Sonserina. Desde Tom Riddle, nenhum outro mestiço fora para Sonserina. Tom Riddle era mestiço, mas ele era Voldemort, tinha o sangue de Salazar Slytherin. Mas aquela garota era só uma mestiça. Snape se simpatizou com ela, mas...
- Sua mãe é bruxa. Não é?
- Oui, ela é.
- Senhorita Ferraù, devo informá-la que pode lavá-los, esfregá-los, cortá- los, embrulhá-los, besuntá-los, encapá-los, engessá-los, enfim, fazer qualquer coisa com eles, que não vai adiantar.
Começaram a rir novamente. Eles detestavam que lhes provocassem e zombassem de seus cabelos, mas estavam sozinhos, eram parceiros no sofrimento e então riam. De si mesmos, de seus cabelos e riam um do outro.
- Mon papa é fármaco. Ele já passou ácido de frutas, sumo de limão, álcool, sal marinho, extrato de pitanga, até fogo ele já colocou. E nént! Não adiantou!
Snape se surpreendeu e parou de rir. Fogo?
- Seu pai ateou fogo em seus cabelos?
- Non! Em alguns fios apenas, foi surprenant. Nós achamos que ia se incendiar mais facilmente por causa do óleo, mas non. Eles ficaram intactos.
- O quê? Ficaram intactos após se incendiarem? - Snape já havia tentado de tudo, tudo mesmo, mas nunca tentara lhes atear fogo.
Ele olhou para a mesa cheia de ingredientes de poções e sorriu para Sofie. Ela compreendeu o que ele pensava. Ambos se dirigiram à mesa. Snape pegou uma tesoura, cortou um tufo de seu cabelo e colocou-o no fogo.
- Realmente senhorita, não queimam. Eu nunca soube disso. É incrível! - ela sorriu para ele - Já os colocou imersos em saliva de sapo? - diante da resposta negativa da garota ele colocou um pouco de cabelo em um pequeno vidro, acrescentou a espessa saliva, tampou o frasco, sacudiu-o um pouco e retirou o cabelo com uma pinça - Toque-os, mas com cuidado. - ela obedeceu.
- Ai! - exclamou ela retirando a mão - Donne choc!
- Passei muita saliva de sapo nos cabelos quando era estudante, os colegas ficavam puxando-os e então...
Sofie começou a rir. Também puxavam os dela no colégio de onde viera.
- Merveilleux! Queria ter sabido disso antes. Já passou limo se sanguessuga?
- Não! - respondeu Snape.
Sofie pegou a tesoura e tirou um longo tufo de sua nuca. O cabelo dela era realmente grande, ia além da cintura. Ela amarrou a ponta do tufo e cortou uma porção de cabelo. Snape lhe deu o limo de sanguessuga e ela passou no cabelo cortado.
- Incrível! - exclamou Snape, os cabelos ouriçaram, realmente pareciam ter espinhos, armaram-se e ficaram parecendo um ouriço negro.. Ele os tocou e percebeu que continuavam macios.
- Um colega de Beauxbatons deixou cair um vidro de limo em cima de minha cabeça. Foi um desastre, além do galo, fiquei parecendo um pom-pom gigante. Quase não passava pelas portas. Levou uma semana inteira para voltar ao normal. Dei-lhe mais de vinte lavadas.
Eles tornaram a rir. Um ficou mostrando para o outro o que acontecia ao misturarem substâncias aos cabelos. Ficaram lá por um bom tempo, riram, conversaram e experimentaram. Até que Snape viu que já era tarde, o jantar seria servido em instantes e a senhorita Ferraù deveria ser apresentada.
- Senhorita Ferraù, nossos experimentos estão muito agradáveis, mas receio que devamos ir. Já é tarde e em breve será apresentada a escola e selecionada para sua casa.
Sofie concordou e Snape a escoltou até o refeitório.
- Alors monsieur être directeur de Sonserina? E ainda ministra duas aulas?
- Sim, senhorita. Sou diretor de Sonserina e ministro as aulas de Poções e desde o início deste ano Defesa Contra as Artes das Trevas.
- Intéressant! Espero ser selecionada para Sonserina então.
Snape lhe deu um meio sorriso. Sabia que ela não iria para Sonserina, somente os puros-sangue iam para lá. Ficou realmente decepcionado, gostara da garota.
- Monsieur deve ser um excelentt professeur, é tant sympathi et gentil.
Snape deu outro meio sorriso. Nenhum outro aluno o achava simpático, menos ainda gentil e ele sabia que realmente não era nada disso. Jamais confraternizara com um aluno daquela maneira, mas ela era tão simpática, doce e familiar. A semelhança dela com outra moça que Snape conhecera no passado o deixou perturbado e suscetível.
- Senhorita Ferraù, então está aí! - era Minerva McGonagall, a vice- diretora de Hogwarts, diretora da casa de Grifinória e professora de Transfigurações. - Procurei-a por toda parte. - ela se aproximou de Sofie e a olhou com ar de espanto.
- Algum problema, professeur? - perguntou Sofie. Ela percebeu que os professores trocaram olhares.
- Não, senhorita. Venha! Será selecionada agora. - McGonagall lhe indicou a passagem - Obrigada, Severo, por trazê-la até aqui. - cumprimentaram-se com a cabeça e entraram no Salão Principal.
Os alunos e os professores viram McGonagall entrar com a garota, geralmente entrariam pela frente do Salão, mas entraram pela passagem dos professores seguidas por Snape que se sentou em seu lugar e aguardou ansioso a seleção de Sofie.
A professora McGonagall pegou o chapéu seletor e pediu a Sofie que se sentasse na cadeira, ela aproximou o chapéu da cabeça da garota e ele começou a falar.
- Como sempre digo, tal pai, tal filha. Não há o que mudar, o sangue fala mais alto e a linhagem é mantida. Et pardroit de conquête et pardroit de naissence... Sonserina.
A garota se levantou sorrindo, olhou para Snape, que estava surpreso e foi para a mesa de Sonserina. Todos murmuraram, imaginaram-na em qualquer casa, menos Sonserina. Fred e Jorge já haviam falado dela por toda a escola. Bonita, mestiça, encantara Harry Potter e fora para Sonserina, inacreditável.
Sofie se sentou e sorriu para todos, mas percebeu que seus colegas de classe não lhe retribuíram o sorriso e estavam a fitando seriamente.
Ela se intimidou, pensou que fizera algo de errado, bem na sua frente havia um garoto louro, com olhos cinzas e ares de superior que lhe fazia uma cara de nojo. Ela levou as mãos aos cabelos, mas não podia ser, já deveriam estar acostumados, os cabelos do professor Snape também eram daquele jeito.
Sofie pode perceber que além da cabeça daquele garoto que se mostrava contrariado, uma mão lhe acenava. Ela esticou o pescoço e constatou que era Harry Potter. Ela enrubesceu e lhe acenou sorrindo de volta. O garoto louro olhou para trás e viu Harry, voltou-se para Sofie.
- Olha aqui, sua sangue-ruim, aquele chapéu velho deve ter enlouquecido por ter te selecionado para cá. Mas já que está aqui aprenda algo, não fazemos amizades com alunos de outras casas e muito menos com Grifinórios.
Sofie recebeu aquilo como se fosse atropelada por um bando de centauros em disparada, queria lhe responder a altura, mas a educação esmeradíssima que seu pai havia lhe aplicado e o constante treinamento lhe deram disciplina e autocontrole. Falou polidamente ao garoto.
- Excuse moi monsieur...
- Malfoy. Draco Malfoy.
- "Malfoy? - pensou Sofie - Acho que já ouvi meus pais falarem de um Malfoy".
- Excuse moi monsieur Malfoy. Não tive intenção de aborrecê-lo, mas com certeza houve um terrible mal entendido que sûrement será esclarecido.
Malfoy bufou. Quando ele ofendia alguém lhe retribuíam com insultos e ameaças ou então abaixavam as cabeças e saíam correndo. Mas aquela garota não, ela o olhou bem no fundo dos olhos e lhe falou educadamente, não conseguia dizer-lhe mais nenhuma grosseria. Enfim, resignou-se a olhá-la, medindo-a.
Sofie resolveu que não ia se aborrecer e jantou. A comida estava deliciosa, não comera nada desde a manhã, nem no Expresso, seu pai lhe proibira de comer qualquer coisa que saísse fora de sua dieta. Mas aquele suco de abóbora estava divino e a torta também, não estavam na lista do que poderia comer, mas também não estavam na lista do que não poderia.
Ela se refestelou, para seus padrões, é claro. Sofie comeu menos do que o menor e mais magro aluno de Hogwarts. Mas sentiu-se saciada e completamente satisfeita. Percebeu que na mesa de Grifinória, Harry ainda a olhava e ela lhe retribuía com um belo sorriso.
