1. Eternamente dezessete anos
Você está convidado para a festa de dezoito anos de Lily Evans no dia 30 de janeiro. Local: Centro de Eventos Hogwarts. Traje formal.
- Traje formal? - James foi despertado de seu transe com o estrondo do armário de Sirius fechando-se. O convite começava a ficar amassado em suas mãos - ele não havia soltado-o nem por um segundo desde que sua mãe havia entregue a ele junto com as outras correspondências na manhã anterior. - Traje formal? - repetiu Sirius. - O que é isso? Uma festa de aniversário ou um enterro?
Remus arregalou os olhos.
- Sirius! - disse, dando um empurrão no namorado. - Pare de ser insensível.
- Outch! Beleza. Foi mal. - resmungou Sirius, olhando mais para James do que qualquer um dos amigos. - Desculpe, cara. Eu sei que você gostava dela. Mas não deixa de ser estranho. Ela morreu e os pais vão fazer uma festa de aniversário para ela. Ela não vai fazer dezoito anos porque ela está mor-Outch! Moony! Quer parar de fazer isso?
- Deixa ele completar, Moony. Ele está certo. - a voz de James não tinha expressão alguma. - Ela não vai fazer dezoito anos. Porque ela está morta.
Os cinco minutos que se seguiram passaram em completo silêncio. Sirius e Remus trocaram alguns olhares á medida que caminhavam pelos corredores da escola. Olhares que claramente diziam: James não está bem porque Lily não está bem. Lily não está bem porque ela está morta. O sentimento de impotência se apoderava dos dois - tanto quanto o luto apoderava-se de James. Eles não podiam fazer nada para ajudá-lo. E a única pessoa que podia, em um piscar de olhos, não podia mais.
- Vocês viram o comercial da Lene ontem? - quando eles se sentaram á mesa do refeitório, Remus quebrou o gelo. - Vocês prometeram que iriam ver.
- Eu vi. - disse Sirius. - É um comercial de iogurte!
- Você fala como se isso fosse uma coisa ruim. - disse Remus. Ele balançou na frente do amigo, zombeteiramente, um iogurte de morango recém tirado da mochila. - Ela estava bem.
- Estava. - concordou James. Monossilábico.
- Era um comercial de iogurte. Garotas que fazem comerciais de iogurte geralmente são... Hum... Magras. Ninguém vai comprar um iogurte se achar que ele vai te engordar. - explicou Sirius.
- Mas a Lene é magra. - argumentou Remus, com a boca cheia. Ele depositou a colher em cima da mesa e após engolir o conteúdo, voltou-se para o namorado. - E o problema não é o padrão dos compradores. O problema é o seu padrão. Porque a Lene é magra.
- A Lene é o que? - Marlene se materializou na frente deles, com Dorcas em seu encalço. As duas puxaram as cadeiras e se sentaram.
Por um momento, o coração de James acelerou. Ele esperou que uma cadeira fosse puxada para o seu lado, que Lily se sentasse e começasse a remexer sua mochila em busca das barras de granola que sempre ficavam perdidas no meio de seus cadernos de Doctor Who. Ele esperou ouvir sua voz praguejar, em um tom nada delicado: Deus! Essa mochila parece a droga de um buraco negro!
- Magra. - disse Sirius.
- Ah. Obrigada, Sirius. - falou Marlene. Sirius fez uma careta para Remus, com superioridade, fazendo a garota olhá-lo também. E consequentemente, o pote de iogurte que estava á sua frente. Ela esboçou uma expressão enjoada. - Ugh. Tire isso de perto de mim. Eu acho que vou vomitar.
Sirius olhou para ela confuso, como quem falava: mas você fez um comercial de iogurte.
- Lily convenceu ela a fazer o comercial. - como se pudesse ler mentes, Dorcas assoou o nariz em um lenço de papel antes de continuar a falar. - Agora, ela não consegue mais comer nem ver iogurtes.
- Espera. - disse Sirius. - Ela não viu o próprio comercial? Quem faz isso? E se fosse um desastre? Como ela concordou em aparecer na tevê e...
- Vocês podem parar de falar de mim como se eu não estivesse aqui? - Marlene pigarreou. Ao contrário de Dorcas - que claramente havia, em vão, tentado esconder suas olheiras com muito corretivo -, ela estava agindo normalmente. Inclusive, se não fosse pelo fato de todos ali terem recebido convites para a festa de dezoito anos de Lily Evans e não tivessem conhecimento de que a mesma não estava mais entre eles, poderiam dizer, com segurança, que Marlene estava perfeitamente bem. Como sempre. Com sua positividade e seu senso de humor.
Exceto pelo fato de que sua positividade, antes espontânea, agora era movida pelo pensamento de que era o que sua melhor amiga iria querer no momento: que ela continuasse com um sorriso no rosto.
- Vocês não acham meio mórbido? - Sirius pegou o convite das mãos suadas de James. - Quer dizer, nós vamos a uma festa em que a convidada de honra vai estar em um caixão. O quão assustador isso parece para vocês?
- Para deixar registrado... - começou Marlene, em tom baixo. - Ela não vai estar em um caixão. Ela nem vai estar lá. O enterro vai ser um dia depois, só para a família. - ela falou, irritada. - E eu não vou á festa. Então divirtam-se.
- Não vai? - Remus virou-se para Marlene.
- Mas você era a melhor amiga dela! - protestou Sirius, uma de suas mãos se chocando em surpresa contra a mesa. - Como assim você não vai? Até o Prongs, aqui, vai. - ele olhou para o amigo, esperando que ele se manifestasse. Mas ele apenas tomou seu convite das mãos de Sirius novamente, voltando a encará-lo. Como se achasse que ficasse encarando por tempo o suficiente. aquela, magicamente, se tornaria a festa de Lily, e não para Lily. A festa com que ela tanto havia sonhado. Uma festa em que ela estivesse presente.
Nunca ocorreu a James - e nem a Lily, em vida - que ela não estaria presente para ver seu sonho se realizar.
- Eu não vou. Só isso. - disse Marlene, dando de ombros. - Não sei porque vocês vão. Eu não quero lembrar da minha melhor amiga como a garota que não compareceu á própria festa de dezoito anos porque morreu;
James também não queria. Não queria ir á uma festa sem Lily. Não queria ir á festa da garota morta sem Lily. Não queria que Lily fosse a garota morta. Ele não queria, acima de tudo, que a festa fosse um sucesso, ou minimamente divertida. Sabia que esse era um pensamento egoísta. Mas ele também sabia que, se aquela loucura toda fosse um sucesso, as pessoas falariam por meses da grande festa de dezoito anos de Lily Evans. E os calouros - os malditos calouros -, novos e desinformados, perguntariam: Quem é Lily Evans? E algum rosto desconhecido na multidão responderia: Era. Ela morreu.
James não queria ser lembrado de que sua melhor amiga estava morta - e teria eternamente dezessete anos
