VENCIDOS PELA PAIXÃO
ESSA HISTÓRIA NÃO ME PERTENCE, É UMA ADAPTAÇÃO DA OBRA DE ADRIENE BASSO
Londres, 1817.
Despertando fantasias...
Um casamento de conveniência pareceu ser a solução ideal para Kagome e Inuyasha, porém acabou gerando um imenso transtorno! Ao decidir visitar o marido em Londres, sem avisar, Kagome descobre que o homem que a recebe não é o mesmo com quem se casou, embora seja idêntico! A única diferença é que este a faz se sentir derreter com um simples olhar...
Sesshoumaru Barrington se prepara para a festa de seu noivado, quando uma desconhecida invade sua casa, alegando ser sua esposa. Depois da perplexidade inicial e de uma breve reunião familiar, fica claro que foi Inuyasha, gêmeo de Sesshoumaru, quem se casou com Kagome, usando o nome do irmão. Agora, legalmente casado com uma e noivo de outra, Sesshoumaru se defronta com um sério problema a resolver e com o desafio mais difícil de sua vida, pois a sedutora Kagome se revela bem mais do que um simples contratempo ao despertar nele fantasias sensuais e um desejo incontrolável...
Capítulo I
Londres, 1817, Fim da primavera.
Apesar do frio, o movimento era intenso nas ruas de Londres. Kagome Higurashi Barrington, lady Taisho, recostou a cabeça no banco da carruagem e fechou os olhos, indiferente à agitação da cidade grande.
Promessa feita é promessa cumprida. O antigo provérbio martelava em sua mente com tanta freqüência que ela temia, de repente, repeti-lo em voz alta. Começara no instante em que fora forçada a concordar com a viagem, e continuara incessantemente durante os dois longos dias de jornada.
A pessoa responsável por aqueles momentos turbulentos estava ali na carruagem, sentada de frente para Kagome, cochilando tranqüilamente. Com o chapéu preto meio torto sobre a cabeça, e uma mecha de cabelo grisalho caindo na face, a senhora idosa parecia frágil e inofensiva, mas isto era apenas impressão.
Sua tia-avó Kaede sempre possuíra um excessivo senso de dever familiar e uma força que lhe dava o ímpeto necessário para cumprir tais obrigações. Infelizmente para Kagome, a idade não aquietara o temperamento nem amenizara a personalidade autoritária.
Talvez por curiosidade, Kaede houvesse decidido parar em Wiltshire, em seu caminho de volta para Londres. Para visitar a família do sobrinho, foi o que ela dissera, e cumprimentar a sobrinha-neta pelo recente casamento. Obviamente, a verdadeira intenção era avaliar as qualidades do noivo.
Ao descobrir que o marido da sobrinha-neta estava em Londres resolvendo assuntos de família, Kaede não desistiu. E argumentando que uma esposa não devia ficar longe do marido, decidiu levá-la para a cidade.
Kagome sobressaltou-se com a voz da tia.
— Foi um pesadelo na última vez que vim para Londres — disse ela, batendo a bengala no chão da carruagem, num ritmo cadenciado. — As estradas estavam tão esburacadas que quase quebrei meus pobres ossos, apesar dos cuidados do cocheiro. Desta vez, porém, me surpreendi com as boas condições das estradas. Acredito que chegaremos à residência de lorde Taisho antes que escureça completamente.
— Espero que seu cocheiro não encontre dificuldades para localizar o endereço — Kagome mentiu, torcendo para o homem errar o caminho.
— Imagine, querida! Lorde Taisho mora numa das ruas mais aristocráticas de Londres. Meu cocheiro conhece muito bem a cidade e não terá problemas para chegar à residência de seu marido.
— Ainda bem, titia.
— Estou curiosa para conhecer lorde Taisho. — Kaede sorriu com satisfação. — Não era sem tempo.
Kagome desviou o olhar. Teria de ser rápida. Em pensamento, em palavras, e em agilidade, para entrar na casa do marido. Com tia Kaede por perto, isto seria quase impossível.
— Não há necessidade de atrasar ainda mais sua volta por minha causa — Kagome disse apreensivamente. — A carruagem me deixará na porta de lorde Taisho.
— Que absurdo! Uma moça de família não sai à rua sozinha, mesmo que seja uma senhora casada.
— Mas eu vou à casa do meu marido! Kaede apertou os olhos.
— Mais uma boa razão para estar acompanhada. Podemos não ter título de nobreza, mas nossa família se orgulha das gerações de aristocratas e dos honrados serviços prestados à Coroa. E é importante mostrar todas as suas qualidades, querida, especialmente em se tratando da família do visconde de Taisho.
Os lábios de Kagome tremeram. Precisava de qualquer maneira esquivar-se da tia.
— Naturalmente a senhora poderá me acompanhar, titia. Mas imaginei que preferiria se refrescar e descansar da longa viagem antes de conhecer meu marido.
Kagome lançou um olhar crítico à roupa que a tia usara durante a viagem. Depois torceu o nariz, como se estivesse sentindo um cheiro horrível. Kaede corou exatamente como Kagome imaginara. Sentiu remorso por constranger injustamente a tia-avó, ferindo sua vaidade, que era o ponto fraco da boa senhora. Mas a mentira surtiu o efeito desejado.
— Bem, imagino que poderemos abrir uma exceção, apenas desta vez — Kaede afirmou, ajeitando as pregas minúsculas de sua saia. — Vamos deixar para amanhã. Assim, passaremos a tarde juntos. Nós três. Você, Taisho e eu.
Já que seria impossível contestar a decisão da tia, Kagome simplesmente concordou com um gesto de cabeça.
A carruagem dobrou uma esquina e começou a diminuir a velocidade. Kagome estremeceu. Tinham chegado ao destino.
Sentou-se ereta no banco e cruzou as mãos no colo, esperando o veículo parar. Seu coração e sua mente estavam descontrolados pela angústia. Por um insano e impulsivo instante, quis gritar a verdade à tia-avó, explicar por que ela não poderia entrar naquela casa. Mas conteve o impulso.
Sentindo os pés pesados como chumbo, Kagome desceu os degraus da carruagem. Anoitecera, e pontos de luz brilhavam em algumas das janelas da enorme mansão de pedra. Temendo perder o controle, despediu-se rapidamente da tia e correu em direção à porta. O criado responsável pela bagagem apressou-se em tirar seus pertences do bagageiro. Ofegando, ele parou ao lado de Kagome diante da imponente porta de entrada.
— Obrigada pela ajuda, Doddson. — Kagome tirou a mala da mão do homem. — Pode voltar para a carruagem.
Não trouxera muitas roupas, mas a mala estava pesada. O criado olhou-a com expressão intrigada e não se moveu, mas Kagome foi firme.
— Obrigada — repetiu.
Em seguida, com um movimento de cabeça, indicou que ele voltasse para a carruagem. Se fosse impedida de entrar na casa, preferia que ninguém testemunhasse seu constrangimento.
O lacaio ainda hesitou, mas acabou acatando a ordem. Assim que se viu sozinha, Kagome segurou a aldrava de bronze e bateu-a na porta. O som ecoou no silêncio da noite, mexendo ainda mais com seus nervos.
Alguém entreabriu a porta, e um facho suave de luz escapou pela fresta. De repente, ela desejou que tia Kaede estivesse ali, a seu lado, para garantir que ela fosse admitida a entrar na mansão.
Um mordomo com ar petulante mediu-a dos pés à cabeça.
— A família não está recebendo visitas a esta hora. Se quiser, deixe seu cartão.
Kagome ergueu o queixo e encarou-o com expressão determinada.
— Não estou aqui para visitar a família. Vim conversar com lorde Taisho.
Antes que o mordomo tivesse tempo de reagir, Kagome empurrou a porta com a ponta da bota e entrou.
— Senhorita! — As sobrancelhas do criado se ergueram em sinal de alarme.
Já no hall, ela se voltou e olhou para ele com expressão séria.
— Por mais confuso e inconveniente que possa parecer, eu lhe asseguro que lorde Taisho concordará em me receber. Agora mesmo, e com discrição. E o mais importante, sozinho.
Apesar da aparência calma e confiante, Kagome esperava a decisão do mordomo com as pernas trêmulas. Ele a avaliou com olhar crítico e, depois do que pareceu uma eternidade, fez um gesto afirmativo com a cabeça.
— Muito bem, senhorita. Vou verificar se milorde está em casa. Seu nome, por favor?
Por um momento, Kagome vacilou. Não poderia dizer ao mordomo que era lady Taisho! Ele a poria dali para fora no mesmo instante.
— O assunto que vim tratar com lorde Taisho é de natureza pessoal e delicada. Será melhor para todos se não me anunciar.
O mordomo franziu o cenho, evidentemente considerando aquele pedido incomum. Após um breve silêncio, ele por fim se decidiu.
— Por aqui, senhorita.
Kagome soltou lentamente a respiração, colocou sua mala atrás de um pilar de mármore e seguiu o criado até o andar superior, por uma escadaria de corrimão dourado e depois ao longo de metade de um amplo corredor, até ele parar abruptamente diante de uma porta dupla de mogno.
— O salão verde, senhorita.
O mordomo girou a maçaneta de bronze, mas Kagome segurou o braço dele, impedindo-o de abrir a porta.
— O lorde está sozinho?
O mordomo olhou para a mão em seu braço, e Kagome percebeu a reprovação no semblante austero, porém não o soltou.
— Ele está sozinho? — repetiu.
— Sim, senhorita.
— Muito bem. — Respirando fundo, largou o braço dele. — Não é necessário me anunciar.
— Nem poderia fazê-lo, senhorita, já que não sei seu nome. Kagome percebeu o tom de sarcasmo, mas não comentou nada.
Endireitou os ombros e esperou.
Assim que o mordomo abriu a porta, ela respirou fundo e entrou. Com o coração aos saltos e as pernas trêmulas, ouviu o clique da porta sendo fechada.
O homem sentado numa poltrona perto da lareira levantou os olhos do livro que lia. Ao vê-la, levantou-se e, como um autêntico cavalheiro, inclinou levemente a cabeça, exibindo os modos refinados que Kagome sempre apreciara.
Ela relanceou os olhos pela sala e constatou que o mordomo não mentira. Lorde Taisho estava sozinho.
— Boa noite, Sesshy.
Taisho não a cumprimentou com um sorriso largo, um abraço caloroso e olhos brilhantes de alegria, como sempre fazia. Simplesmente fitou-a com uma sobrancelha erguida e expressão irônica. Kagome tentou sorrir e tossiu baixinho, para disfarçar o embaraço.
— Por favor, me perdoe, mas a situação fugiu completamente ao meu controle. — Ela mordiscou o lábio antes de continuar: — Eu prometi que... Eu jurei que jamais viria a Londres, a menos que você me convidasse. Bem, estou profundamente constrangida por ter quebrado minha promessa. Por favor, Sesshy, entenda que não tive como evitar esta inconveniência.
Em vez de responder, Taisho pegou o monóculo de aro dourado, colocou-o na frente do olho direito e avaliou Kagome com expressão cínica.
Surpresa, ela conseguiu não estremecer diante do olhar perscrutador. Umedeceu os lábios e, temendo ter confundido mais do que explicado, tentou novamente.
— Tudo começou com a chegada inesperada de tia Kaede. Ela vinha para Londres e resolveu parar em Wiltshire para visitar a família. Na verdade, a intenção dela era mesmo conhecer você. Expliquei que você estava na cidade, e antes que eu pudesse manifestar minha opinião, tia Kaede já tinha decidido me trazer para Londres para ficarmos juntos.
— Ficarmos juntos? — Taisho afastou o monóculo. — Além de você, quem mais está incluído nesse "ficarmos juntos?".
— Você, claro. Afinal, somos casados, não?
— Casados? Ora, milady, que brincadeira é essa?
— Sesshy, não estou entendendo...
Ele ergueu a mão num gesto autoritário e Kagome se calou imediatamente.
— Basta! Você entrou aqui sem ser convidada e sem se anunciar. Eu deveria tê-la expulsado de minha casa, mas ouvi polidamente seu discurso sobre Wiltshire, tia Kaede, Londres, marido... Pois bem, agora é a sua vez de escutar.
— Claro. Perdão...
A reação dele era surpreendente. Estava agindo como se não a conhecesse, o que era, no mínimo, estranho.
— Você sabe quem eu sou?
— Sesshoumaru Barrington, lorde Taisho.
— Por que me chamou de Sesshy? Kagome baixou a cabeça e corou.
— É um apelido carinhoso.
— Se somos casados, como você afirmou, por que não moramos juntos?
— Desde o princípio concordamos que não seria necessário.
— Ah, trata-se de um casamento de conveniência, então? Não é uma união por amor?
Kagome encolheu os ombros. Não era só o comportamento de Sesshoumaru que era estranho. As perguntas também. Como era possível que ele não se lembrasse de nada?
Um silêncio opressivo os envolveu. O momento era extremamente desconfortável.
Kagome arriscou um breve olhar para o lorde. A expressão dele era de incredulidade, como se nunca tivesse ouvido falar dela, do casamento, do acordo.
— Mais alguma pergunta? — Kagome indagou quando o silêncio se tornou insuportável.
Ele a fitou por alguns segundos antes de responder:
— Não. O que ouvi já foi suficiente.
Kagome não sabia mais o que dizer. Sentia o corpo pesado. Foi até a cadeira mais próxima e apoiou-se firmemente no espaldar para não cair.
— Confesso que seu desempenho foi perfeito, milady. Declarar-se como minha esposa foi um pouco exagerado, mas desconfio que alguém a tenha contratado.
— Contratado? O que quer dizer?
— Aliás, você se traiu ao dizer meu nome. Somente meus familiares e amigos mais próximos se referem a mim como lorde Taisho. A sociedade me conhece como visconde de Taisho.
— Eu não... — A voz de Kagome falhou. — Eu não entendo...
— Sim, sim. Já ouvi isso antes. A noivinha ingênua, doce, inocente, confusa. Representou muito bem, milady. Mas a brincadeira acabou e você vai embora. Prometo elogiá-la para quem a contratou e, quem sabe, até lhe paguem uma gratificação pelo bom desempenho.
Kagome perscrutou-o com olhar crítico. O cabelo estava mais curto, e penteado num estilo mais conservador; o rosto parecia um pouco mais cheio, mas a covinha do queixo ainda era visível. As roupas eram elegantes e caras, como sempre, embora mais formais e de cores mais sóbrias.
Kagome sempre admirara a boa aparência de Sesshoumaru. Ele era alto, másculo, com cabelos castanho-claros, olhos dourados e feições marcantes. No entanto, apesar de considerá-lo um homem fascinante, ela nunca se sentira fisicamente atraída. Nunca... Até aquele momento.
Com o Sesshy que conhecia, Kagome se sentia segura e protegida. Por isso concordara em se casar com ele. E agora ali estava ela, naquele ambiente de opulência e requinte, com o coração batendo mais forte e um estranho calor aquecendo-a por dentro.
Seria possível?
— Não adianta ficar aí parada, olhando para mim com ar desolado, milady. É melhor ir embora. Minha paciência está se esgotando. — Ele foi até a porta e abriu-a. — Espero convidados para jantar, e preciso trocar de roupa.
O som daquela voz grave, rica, familiar, desconcertou-a. Kagome se voltou devagar, tomada por uma sensação de medo. Sabia que viera ao endereço certo, que estava na casa certa. E não havia dúvida de que aquele homem era lorde Taisho.
Mas, embora os modos, a voz e a aparência fossem semelhantes aos do homem com quem ela havia se casado na igreja de Wiltshire, aquele cavalheiro charmoso e arrogante decididamente não era seu marido.
Sesshoumaru Taisho assustou-se com a palidez da desconhecida. Até os lábios estavam sem cor, e era possível notar sua respiração alterada. As mãos apertavam o espaldar da cadeira com tanta força que os nós dos dedos estavam esbranquiçados.
Ele pensou em pedir à moça que se sentasse, mas mudou de idéia. Não queria encorajá-la a permanecer na casa. Aquela visita inesperada era um contratempo no decurso do dia cuidadosamente planejado. E Sesshoumaru não gostava de contratempos, principalmente numa noite importante como aquela.
— Meu mordomo providenciará um coche — declarou, refletindo que essa seria a melhor maneira de se livrar da visitante. — Em reconhecimento à sua atuação perfeita, faço questão de que o transporte fique por minha conta.
Sesshoumaru fez menção de chamar o mordomo, mas recuou ao ver a moça sentar-se lentamente na cadeira que lhe servira de suporte. Mantinha os olhos baixos, fixos no tapete, e seu rosto ainda estava lívido, transtornado pela expressão de incredulidade.
Ele hesitou, tentando não ser surpreendido por mais um desempenho teatral. Porém, a angústia da desconhecida parecia autêntica. Sesshoumaru suspirou audivelmente e, um tanto contrafeito, fechou a porta e se aproximou da visitante.
Ela ergueu a cabeça devagar, até os olhares de ambos se encontrarem.
— Não tenho para onde ir — confessou em voz baixa. — A única pessoa que conheço em Londres é minha tia-avó. Dispensei a carruagem dela, depois que me deixaram aqui. A esta altura ela já deve estar em casa.
— Isso não é problema, milady. O cocheiro a deixará na porta da casa de sua tia.
— Eu não sei o endereço dela.
Sesshoumaru se irritou. Aquela brincadeira não teria fim? Sua paciência chegara ao limite.
— Nesse caso, darei ordens ao cocheiro para levá-la a uma hospedaria. — Erguendo uma sobrancelha, não resistiu à tentação de acrescentar: — Ou prefere ir diretamente ao Drury Lane?
— Eu não sou atriz! — protestou Kagome, indignada.
A reação exaltada surpreendeu Sesshoumaru e, apesar do transtorno que aquela jovem causara, pela primeira vez ele prestou atenção nela com olhos masculinos. Ela era alta e magra demais para o padrão que ele apreciava; o rosto era fino, e tinha péssimo gosto para se vestir, tanto na escolha da cor quanto na qualidade das roupas. Se bem que isto poderia ser proposital, se a intenção era representar o papel de moça simples.
Por outro lado, sua coloração era linda e harmoniosa, com pele alva, cabelos acobreados e olhos azuis. Sesshoumaru reparou nos lábios carnudos, que pareciam prontos para serem beijados. A pesada capa de viagem não disfarçava a silhueta curvilínea e os seios fartos. Era uma moça dotada de muitos encantos, mas que parecia não ter consciência da própria feminilidade.
Ele se repreendeu intimamente. Não deveria ficar olhando para o corpo da mulher. Parecia-lhe falta de respeito e grosseria, não só por aquela pobre criatura, mas principalmente pela doce Kikyou, a jovem adorável que em breve seria sua noiva.
Tal comportamento era uma reminiscência do antigo Sesshoumaru, o jovem rebelde que trilhara um infausto caminho pelos salões da sociedade, casas de jogos e prostíbulos de Londres. Um rapaz obstinado e irresponsável que sempre escarnecera da opinião pública e das convenções. Quanto mais ultrajante e escandalosa a façanha, maior sua determinação para executá-la.
Ele vivera uma juventude apaixonada e perigosa. Esse tipo de comportamento desregrado era quase esperado de um Barrington. Não raro, Sesshoumaru imaginava que a sociedade ficaria desapontada se ele não tivesse sido um jovem inconseqüente, se não tivesse proporcionado aos bisbilhoteiros e às matronas moralistas assunto para comentários maledicentes.
Durante anos, não soubera o que era entrar num salão de baile sem ouvir murmurinhos abafados das línguas reprovadoras ou exclamações ultrajadas. O tom de vozes aumentava consideravelmente à medida que as cabeças se voltavam para observá-lo, cada um esperando presenciar o mais recente episódio escandaloso no qual ele se envolveria.
Sesshoumaru era fruto de um casal rotulado de estranho e excêntrico por uma sociedade tacanha e rígida. Sua família, de linhagem nobre e dona de uma vasta fortuna, sempre o protegera e, sabendo disso, ele se tornara ainda mais cínico e perigoso.
Sua irmã mais velha, Sango, fora praticamente ignorada pela sociedade até se casar inesperadamente com o marquês de Dardington. Com o apoio do sogro, o duque de Warwick, aos poucos, Sango foi cativando e amansando as matronas mais puritanas e intransigentes de Londres.
Foi o casamento de Sango que abriu os olhos de Sesshoumaru para a possibilidade de mudança. Ele ostentava o título de visconde e, como herdeiro do pai, um dia seria o conde de Stafford.
Levando a sério tal responsabilidade, decidiu que sua missão era restaurar a integridade do nome da família. Mostraria aos críticos cruéis que conhecia as regras que governavam a sociedade e que estava disposto a segui-las à risca.
Fora bem-sucedido em seu propósito. Ao longo dos anos, conseguira apagar as lembranças do passado, substituindo-as por atitudes e comportamentos corretos e adequados. O auge dos seus planos estava prestes a ser alcançado: o casamento com uma moça recatada, do tipo que ele sempre desdenhara no passado.
Imaginava que este fosse o motivo da brincadeira por parte dos amigos. A mulher que se apresentava como sua esposa não era apenas incompatível com sua posição social. Era um verdadeiro desastre. Sob a máscara de moça simples do interior, era tudo o que Sesshoumaru queria evitar.
Ele verificou as horas no relógio sobre a lareira. Já deveria estar se banhando. No entanto, ainda estava às voltas com aquela atriz, dona de um magnífico par de seios.
— Parece que estamos diante de um impasse, milady. Ambos sabemos que não é minha mulher. Se me contar como chegou até aqui, talvez possamos encerrar esta visita de um modo amigável.
A jovem ergueu a cabeça e mordiscou o lábio inferior, antes de se defender:
— Não sou atriz — repetiu com firmeza. O talento dela era admirável.
— Está bem. Você não é atriz profissional, mas sim, uma mulher disposta a ganhar honestamente alguns trocados. Não a estou julgando, milady, mas já estou perdendo a paciência. Se não sair de minha casa de boa vontade, terei de tirá-la à força.
— Milorde não ousaria.
Ela o fitou com um brilho desafiador nos olhos, reação que surpreendeu Sesshoumaru, pois esperava uma cena mais dramática.
— Está é a minha casa. E ouso fazer o que bem entender.
— Não fiz nada de errado. Nada. Não entendo o que aconteceu.
Irritado com a situação absurda, Sesshoumaru começou a andar pela sala. Deveria simplesmente expulsá-la de sua casa, mas alguma coisa na atitude dela o impedia de fazer isso.
De costas para a porta, ouviu um suave farfalhar de saias. Alguém mais entrara na sala. Outra mulher reivindicando ser sua esposa, talvez? Ou, quem sabe, a autora da brincadeira. Ótimo se fosse, aquilo estava se prolongando demais. Mas ao se voltar, Sesshoumaru viu que a recém-chegada era Sango, que olhava com expressão surpresa para a desconhecida.
— Desculpe minha intrusão, Sesshoumaru. O cozinheiro quer consultá-lo sobre uma mudança no cardápio. Como mamãe está ocupada, ofereci-me para resolver o assunto com você, mas vejo que tem companhia.
Sango sempre fora à figura forte e constante da família, com sua voz sempre calma e seu bom senso, até ele assumir esse papel. Na juventude, ela o livrara de mais dificuldades do que Sesshoumaru conseguia se lembrar. E incomodava-o sobremaneira a sensação de que ainda se metia inadvertidamente em situações embaraçosas.
— Não é um bom momento, Sango. Por favor, diga ao cozinheiro que conversaremos sobre o cardápio mais tarde.
Seria demais esperar que a irmã saísse discretamente da sala. Contrariado, viu-a sentar-se na poltrona de brocado.
Sango era uma mulher linda. A maturidade e três filhos não tinham diminuído sua beleza e seus encantos. Usava um vestido simples de seda verde-claro que combinava com seus olhos e com os cabelos loiros.
A visitante olhava para Sango com indisfarçável espanto, sem dúvida, admirada por sua beleza e sofisticação. Sango lançou um olhar interrogador ao irmão, olhou de volta para a desconhecida, e novamente para ele. Por fim, tossiu baixinho.
— Você está sendo indelicado querido irmão. Por favor, apresente-me à sua convidada.
Sesshoumaru contraiu os lábios. Não tinha como evitar o inevitável, mas nem ao menos sabia o nome da estranha. Respirou fundo e anunciou:
— Milady, minha irmã, Sango Morely, marquesa de Dardington, manifesta o desejo de lhe ser apresentada. — Sesshoumaru voltou-se para a irmã. — Infelizmente não tenho como completar as apresentações, pois a jovem aqui presente não me informou seu nome, nem seu sobrenome.
Sango franziu o cenho.
— Ela é parente de algum conhecido nosso?
— Não — Sesshoumaru respondeu. Refletiu por alguns segundos antes de acrescentar: — Aparentemente, é minha esposa.
Seguiu-se um momento de desconfortável silêncio.
— Que interessante! — Sango exclamou num tom calmo. — Devo perguntar, foi uma ocorrência repentina ou você tem mantido o casamento em segredo há muito tempo?
Sesshoumaru fitou a estranha, esperando que, com isso, ela admitisse a verdade. Mas a jovem continuou em silêncio, ficando com o semblante imperturbável.
— Isto só pode ser uma brincadeira, Sanfo. De extremo mau gosto, convenhamos. Summers é meu maior suspeito, mas também deve ter a mão de Monteguy.
— Que belos amigos você tem meu irmão.
Sesshoumaru encolheu os ombros. Ao longo dos anos, ele também modificara seu círculo de amizades, mas muitos de seus companheiros de juventude eram também homens privilegiados e poderosos. Era impossível evitá-los, bem como evitar a noção de humor por vezes ridícula que eles tinham.
— O que pretende fazer? — Sango perguntou.
— Espero que minha esposa vá embora para que eu possa resolver assuntos pendentes sobre o jantar desta noite. — Ele olhou para Kagome. — Se bem que será uma tarefa quase impossível convencê-la a sair desta casa.
Aproximando-se, Sesshoumaru pegou-lhe a mão, para ajudá-la a se levantar.
O toque tirou Kagome do torpor em que mergulhara. Afastou a mão dele e levantou-se depressa.
— Não irei embora enquanto não esclarecer este mistério, milorde — avisou em voz alta. — Meu nome é Kagome Higurashi Barrington, lady Taisho. Ou melhor, viscondessa de Taisho. E o senhor é meu marido. Nos casamos há três meses, e o reverendo Clarkson realizou o casamento na igreja de Wiltshire.
— Senhora...
Kagome ergueu a mão com autoridade e Sesshoumaru se calou.
— Seu aniversário é em dez de junho — continuou ela no mesmo tom firme. — Sua cor favorita é verde. Seu prato preferido é galinha-de-angola assada, detesta ervilhas e não dispensa um doce depois das refeições, inclusive no desjejum. Tem uma cicatriz no pulso esquerdo, em forma de lua crescente. Quando tinha oito anos, insistiu em dirigir um coche e acabou caindo sobre uma pedra, cortando seriamente o pulso.
Sesshoumaru ficou rígido. Kagome continuou falando, mas ele não mais a ouvia. Alguma coisa muito estranha estava acontecendo. Ela acertara a data de seu aniversário e, mesmo não sendo seu prato predileto, ele gostava de galinha-de-angola assada.
Não era louco por doces e nem possuía uma cicatriz no pulso esquerdo. Mas conhecia muito bem uma pessoa que se encaixava perfeitamente naquela descrição: Inuyasha, seu irmão gêmeo.
Obrigada sayurichaan e kagome Unmei pela review do ultimo capitulo, e sim mais uma adaptaçao do sesshoumaru e kagome, espero que gostem beijos.
