Pokémon pertence à Satoshi Tajiri e a Game Freak
Título: Os Dias de Bugsy
Gênero: Romance/Drama
Anime/Mangá/Game: Pokémon
Personagens: Bugsy e Falkner
Classificação: M (18+)
Nota: Essa é uma obra de ficção, elementos da obra original podem ser alterados para melhor compatibilidade com a história.
Nota 2: Essa obra contém yaoi/lemon, caso sinta-se ofendido, aperte o (x) no alto da página para sair.
Nota 3: Os nomes dos personagens seguem o inglês.
Nota 4: A fanfic é inspirada nos jogos "Pokémon Heart Gold e Soul Silver" e o mangá "Pokémon Adventures". Dessa forma, não há nenhuma influência da série animada na história.
Boa leitura!
OS DIAS DE BUGSY
CAPÍTULO 1: DIA DE FESTIVAL
Bugsy encarou seu reflexo no espelho. Não podia negar, ficava muito bem em um yukata[1]. O tecido leve era verde militar, com círculos em baixo relevo, de um verde mais escuro. Não podia negar também que ficava ainda mais parecido com uma garota. Desde pequeno, as pessoas costumavam confundi-lo. Se quando criança se importava, agora já não se ligava mais, na verdade até via graça quando os mesmos treinadores que lhe jogavam um xaveco furado descobriam que ele era o líder de ginásio local. Não tinha mudado nada com o tempo, estava um pouco mais alto, mas ainda mantinha o mesmo corte de cabelo e mesmo olhar inocente e infantil, o que contribuía ainda mais para acharem que era uma garota.
O garoto podia ouvir a música animada que vinha de fora, comemorando o Slowpoke Half-Tail Festival[2]. A ideia surgira de Kurt, para celebrar os Slowpokes que foram feridos pelo ataque da Equipe Rocket. Começou como um festival pequeno, mas atualmente pessoas de toda Johto vinham prestigiar o evento. Olhou para o relógio no alto da parede e viu que estava atrasado. Terminou de se arrumar e saiu.
Mal pôs os pés na rua e encontrou Whitney. A garota trajava um yukata rosa e amarelo e no cabelo várias presilhas em formato de Cleffable.
"Ah, aí está você, já estava ficando preocupada, por que demorou tanto?" Perguntou, ruidosa.
Bugsy apenas se inclinou em um pedido de desculpas e passou a acompanhar a jovem.
"Você ficou muito bem de yukata" ela comentou enquanto desfilavam entre as barraquinhas de guloseimas.
"Obrigado. Você também está muito bem."
O lugar estava tão cheio que era difícil andar sem esbarrar em alguém. Bugsy tinha que correr para alcançar Whitney. A moça tinha muito mais habilidade que ele trajando roupas tradicionais e se movia com agilidade. Gostava da companhia dela, mas não conseguia prestar atenção a nada do que ela dizia. Sua mente estava em outro lugar e seus olhos vasculhavam a multidão. Só percebeu depois de um longo tempo que ela não estava mais ao seu lado. Para sua sorte, a garota era um tanto barulhenta e chamativa e ele pode localizá-la conversando com alguém.
Manobrou a multidão e aproximou-se timidamente, só percebeu com quem a jovem conversava quando estava próximo demais para recuar.
"Oi, Bugsy." Falkner cumprimentou com um aceno de mão. O líder de ginásio de Violet City estava bem diferente da última vez que Bugsy o vira. Estava mais alto e esbelto. O cabelo estava mais longo, preso num desajeitado rabo de cavalo que deixava quase toda a franja caída sobre o rosto.
"Você deveria ter vindo de yukata." Protestou Whitney fazendo beicinho.
"Eu não ficaria bem em roupas tradicionais[3]. Mas você está linda, e você também, Bugsy, ficou muito bom."
"E onde está sua ninja das trevas?" Whitney espiou dos lados para ter certeza que o rapaz estava sozinho.
Só então Bugsy percebeu que Janine não estava junto. Era estranho ver o líder voador sem a garota. Desde que começaram a namorar viviam grudados.
"Ah, nós... demos um tempo", disse timidamente, coçando a cabeça.
"Justo no mês do seu casamento?" Whitney indagou curiosa.
Bugsy sentiu as mãos ficarem geladas e o estômago dar uma volta completa, sempre se sentia mal quando o assunto era o casamento de Janine e Falkner. Ele gostava da moça, mas achava que ela não era a pessoa certa para o garoto dos cabelos azuis.
"Bem, é só um tempo, acho que as coisas se acertam até lá."
"Ela deve estar com síndrome de noiva" Whitney filosofou. "Vocês sabem..." complementou ao ver as expressões de dúvida dos garotos. "O casamento se aproxima, a noiva começa a entrar em pânico e foge", constatou colocando os dedos nos lábios. "Mas não se preocupe..." deu um soquinho amigável no braço de Falkner. "Elas sempre voltam e se a Janine não voltar, eu me candidato para o posto" sorriu.
"Não acho que você vá trocar a badalada Goldenrod pela bucólica Violet" Falkner sorriu, colocando as mãos nos bolsos.
"Você poderia mudar para Goldenrod, que acha?" Sugeriu sorrateira, e recebeu um sorriso que ela sabia significar 'sem chance'.
=8=
A noite pareceu durar uma eternidade para Bugsy, não fosse ter que parar de cinco em cinco minutos para cumprimentar um conhecido, ele se arrastava dolorosamente com os tamancos de madeira. Tropeçava toda hora ou pisava acidentalmente no pé de alguém. A situação piorou quando, ao descer da calçada para rua, pisou em falso e quase foi parar no chão. Quase, porque Falkner o puxou pelo braço impedindo a queda. Mas puxou com tanta força que Bugsy passou dias com o braço roxo.
"Eu não nasci para usar esse calçado" disse num muxoxo, encostando-se a uma mureta, tentando se equilibrar com os malditos tamancos.
"Eu vou buscar um sapato novo pra você" sugeriu Whitney, e antes que Bugsy pudesse impedi-la, ela já tinha sumido na multidão.
Falkner permaneceu ao seu lado, tentou engrenar uma conversa, mas Bugsy lhe respondeu tão secamente, que o melhor foi distrair-se apreciando a multidão.
Bugsy não sabia o que era mais doloroso, os pés machucados, o braço roxo ou a vergonha que passara diante de Falkner. Sempre se esforçara ao máximo para impressionar o mais velho, mas no final algo sempre dava errado. Até mesmo a roupa daquela noite, fora escolhida para agradar Falkner, mas no final, ao invés de se sentir adulto e refinado, Bugsy sentia-se uma criança usando os sapatos da mãe. Desde pequeno, desde que podia se lembrar, sempre admirara Falkner. Era o garoto sério e determinado. O exemplo a ser seguido, o irmão que ele não teve, o melhor amigo com quem sempre podia contar. Por isso, esforçava tanto diante dele. Para ser elogiado, para vê-lo orgulhoso. Não era só por isso, Bugsy sabia. Muitos desses sentimentos haviam ficado presos na infância e muitos outros surgiram no lugar. Sentimentos que ele não estava certo de sentir ou se permitir sentir, nem que seriam louváveis para serem mostrados ao Falkner.
"Os fogos" as palavras simples acompanhadas da explosão, tiraram Bugsy de seus pensamentos. Era uma explosão bonita e colorida, mas o local onde estavam era péssimo para admirá-los.
"Vem." Bugsy sentiu uma mão envolver a sua e puxá-lo delicadamente. Falkner o encarava com seus grandes olhos azuis. "Vamos procurar um lugar melhor para ver os fogos. Eu te seguro para você não cair."
O garoto inseto acompanhou sem relutar. Sentia frio e calor, e as mãos tremiam tanto que ele precisava se concentrar para parecer o mais normal possível. Permaneceu o tempo todo de cabeça baixa, encarando as mãos entrelaçadas, que mal apreciou o festival de luzes e cores que acontecia no céu.
Quando finalmente Falkner encontrou um bom lugar, a exibição de fogos estava no final. Ao perceber o cansaço do menor, sugeriu que sentassem na grama e aguardassem até Whitney voltar. Era uma desculpa esfarrapa, Bugsy pensou, já que eles tinham mudado de lugar e a garota provavelmente não os encontraria. Mas agradeceu pela preocupação do mais velho.
"Foi um espetáculo muito bonito." Falkner ainda encarava o céu.
"Sim, foi mesmo." Bugsy concordou, encarando o gramado. Na verdade, ele não tinha visto quase nada. "Você poderia vir mais vezes..."
"A Janine não gosta de locais muito cheios" interrompeu. A verdade é que Bugsy convidara Falkner todos os anos, desde o primeiro ano do festival, mas o rapaz nunca aparecia. Essa era a primeira vez. Bugsy não pode deixar de pensar quantas coisas Falkner deixara de fazer por causa da namorada, e que ele estava muito melhor sem ela.
O silêncio desceu sobre eles. Falkner encarava o céu e Bugsy distraia-se com as mangas do yukata.
"Você tem me evitado, não é?" Bugsy sentiu o rosto corar violentamente diante da pergunta e encarou o mais velho que ainda admirava o céu.
"Eu, claro... claro que não" gaguejou, sentindo o coração sair pela boca.
"Você tem" confirmou, ignorando a resposta do menor. "Se é por causa do que aconteceu. Isso faz muito tempo." A voz era suave e tranquila, quase melodiosa.
"Não... não... não tem nada a ver com aquilo" respondeu inseguro. Bugsy estava tão vermelho que sentia até as orelhas queimarem.
"Bugsy." E Falkner virou-se para o jovem, encarando-o com aqueles olhos escuros e profundos. "Foi um acidente..."
Mas o garoto não o deixou terminar. Arrancou os sapatos, levantou apressado e com os tamancos nas mãos deu as costas ao mais velho.
"Boa noite, Falkner" e saiu andando pesado, deixando o líder de ginásio sozinho.
=8=
Bugsy jogou os tamancos em qualquer lugar e se atirou na cama. Sua mente estava um rebuliço, seu coração batia acelerado, sentia raiva, vergonha, culpa. Falkner estava certo, ele estava o evitando, mas não precisava dizer isso com a naturalidade de quem comenta sobre o tempo.
Aquele maldito nunca aparecera uma única vez no festival, e quando apareceu era para constrangê-lo? Justo ele que sempre se dedicava para impressioná-lo. Que sempre escolhia as roupas só para agradar Falkner, mesmo sabendo que ele nunca ia à cidade. Que o procurava na multidão mesmo sabendo que ele não estaria lá.
Tudo começou aproximadamente há um ano. Todos os líderes de ginásio de Kanto e Johto estavam reunidos no Congresso Anual dos Líderes de Ginásio. Era um daqueles eventos importantes, onde não acontece nada e o pessoal aparece só para comer. No último dia, uma líder de ginásio vinda de Sinnoh sugeriu uma brincadeira para encerrar as atividades. Uma espécie de pega-pega onde todos eram pegadores e podiam ser pegos. A ideia era melhorar as táticas de ataque e defesa.
O garoto inseto estava correndo, tentando fugir de Misty que estava em seu encalço. Estava tão preocupado em não ser pego, que não viu Falkner cruzar seu caminho. No impacto, os garotos caíram no chão, embolados um sobre o outro.
Quando Bugsy abriu os olhos, viu que estava em cima do líder de Violet. Os lábios colados nos seus. Sentiu o rosto ficar vermelho e rapidamente levantou, mas não rápido o suficiente para impedir que os outros líderes vissem a cena. Falkner se levantou, encarou o menor e sorriu, começou murmurar um "está tudo bem", mas não conseguiu terminar. Bugsy lhe deu as costas e saiu correndo.
Mal sabia como chegara ao banheiro. Suas pernas estavam moles, seu rosto em chamas, sentia os lábios pulsando e uma corrente elétrica percorrer seu corpo. Nada podia ser mais vergonhoso que aquilo. Beijara Falkner na frente de todos, diante até mesmo da namorada. Seria motivo de chacota por um longo tempo, mas isso não o incomodava. O que incomodava era como um contato tão pequeno, que mal poderia ser considerado um beijo provocara tantas reações e sentimentos nele. Bugsy nunca tinha beijado ninguém, mas suspeitava que nada seria igual aquela sensação.
Fazia tempo que o garoto suspeitava que seus sentimentos por Falkner fossem além da admiração e amizade. Sentira ciúmes quando o jovem anunciou o namoro com Janine, sentira-se irritado quando o mais velho o chamou de "irmãozinho". Bugsy não achava seus sentimentos sujos, nem errados. Mas Falkner não o via além de uma criança (e perto dos outros líderes, ele ainda era) que sempre precisava de um agrado. Além disso, ele já tinha uma namorada e obviamente gostava de garotas.
Então era isso, Bugsy respirou fundo tentando ajeitar seus pensamentos. Ele gostava do Falkner, romanticamente falando e não teria a menor chance. Ele só precisava de uns dias para por seus pensamentos em ordem e tudo voltar a ser exatamente como antes.
O problema é o garoto nunca conseguiu organizar seus pensamentos, e com medo que Falkner percebesse algo, passou a evitá-lo, no final se convenceu que era mais fácil assim.
Rolou na cama, cobrindo a cabeça com o travesseiro. "Merda" precisava dar um jeito naquela situação.
=8=
Nunca o caminho de casa pareceu tão longo, mesmo as duas cidades sendo tão próximas. Falkner voava de volta a Violet City em seu Skarmory, mas mal prestava atenção a vista. Seu último ano tinha sido realmente ruim. Bugsy passara a evitá-lo, Janine pedira um tempo às vésperas do casamento, seu pai enviara uma carta anunciando sua volta, e provavelmente retomaria sua posição de líder de ginásio e agora que finalmente achara uma brecha para tentar se acertar com líder inseto, ele simplesmente lhe virara as costas.
Sentia falta do garoto, não podia negar. Era seu irmãozinho, seu melhor amigo, aquele que sempre tinha um sorriso caloroso para animar o dia. Tinha vezes que chegava a sentir mais falta do menino do que da namorada. Era algo estranho, mas Falkner acreditava que era porque ele e Bugsy estavam a mais tempo afastados.
O líder de Violet ainda se lembrava da primeira vez que o tinha visto, assim como todos, achou se tratar de uma linda menininha. Achou que nunca conseguiria interagir com um líder de ginásio tão jovem, mas se surpreendeu com a maturidade e interesse do rapaz. Não podia negar que seu jeito ingênuo e infantil encantava todo mundo, e ele não tinha sido imune. Sempre sorria quando o outro lhe falava de um Pokémon novo, de uma acirrada batalha no ginásio ou dos sonolentos Slowpokes que dominavam a cidade. Havia sempre aquele brilho nos olhos e aquela empolgação que só as crianças parecem ter.
Sentia-se tão intimo do garoto, que constantemente lhe bagunçava os cabelos em sinal de afeto ou aparecia em Azalea Town sem avisar. Quando começou namorar Janine, foi a primeira pessoa a quem quis contar. Mas o jovem não recebeu a notícia tão bem quanto esperava. Bugsy limitou-se a parabenizá-lo de forma fria e sorrir mecanicamente. A partir de então, se irritava quando Falkner lhe bagunçava os cabelos ou o chamava de irmão.
Então aconteceu o episódio do "beijo" e eles se afastaram. Viam-se esporadicamente e Bugsy evitava o máximo de contato possível, tratando-o como um estranho a quem ele deveria apenas ser educado. Não culpava o garoto pelo que acontecera, nem a si mesmo. Era nítido que fora um acidente. Mas quanto mais tentava convencer o adolescente disso, mais retraído e irritado o jovem ficava. Não entendia porque ficar incomodado com algo tão sem importância. Ou talvez tivesse importância. Pelo menos para Bugsy.
Falkner sentiu as bochechas se aquecerem, em contraste com o ar noturno. E varreu o pensamento para o local mais fundo da sua mente. Não o pensamento de que talvez Bugsy fosse apaixonado por ele, mas sim o pensamento de que ele não se importaria, se isso fosse verdade.
N/T: [1] Yukata é um kimono de verão, geralmente utilizado em festivais.
[2] O festival é criação minha em homenagem aos Slowpokes que tiveram suas caudas cortadas pela Equipe Rocket.
[3] Curiosamente, Falkner é o único que usa roupas tradicionais japonesas, mas eu quis mudar um pouco o estilo dele.
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