— Free! - Iwatobi Swim Club pertence a Kouji Ouji e Kyoto Animation;
— Esta é uma fanfic yaoi, ou seja, contém relacionamento homossexual entre os personagens. Se você não gosta ou sente-se ofendido com esse tipo de conteúdo sugiro que vá ser feliz lendo shoujo;
Prólogo
Havia cinco caixas de papelão lacradas na sala.
Elas continham livros e objetos pessoais, alguns utensílios de cozinha e roupas de cama.
Havia duas malas de viagem ao lado das caixas.
Elas continham suas roupas, ou pelo menos parte delas.
Originalmente, ele planejava levar tudo o que estivesse em seu guarda-roupa e sua cômoda, mas a ausência de brilho nos olhos da mãe ao vê-lo arrumar as malas o fez automaticamente mudar de ideia. Então, metade de tudo seguiria para Tokyo.
A metade das roupas de verão, a metade das roupas de inverno, aquelas que ainda estavam com as etiquetas.
A metade das roupas de baixo, as novas, claro.
A metade de sua vida estava dentro daquelas caixas e malas, fazendo-o questionar se conseguiria sobreviver sem ser uno.
E, talvez, aquele fosse um sinal, um prenúncio de como seria sua vida dali em diante... incompleta.
Makoto levantou-se da cama após permanecer por longos minutos em uma mesma posição. O cômodo estava silencioso com exceção do ventilador ligado, e aquele precioso tempo o fez repassar mentalmente o que deveria ser feito naquele fim de tarde. Do lado de fora da janela o sol começava a se pôr, tingindo o céu com vários tons de laranja, como se alguém o pintasse manualmente com aquarela. Não havia brisa com exceção da gerada artificialmente pelo ventilador e aquele estava sendo um fim de inverno quente e abafado. Mesmo gostando da estação do ano, parte dele sabia que ela teria um novo sabor no próximo ano. Aliás, tudo estava prestes a tornar-se diferente.
Aquela sensação não era decorrente somente da mudança para Tokyo, um novo ambiente, a universidade ou ver-se pela primeira vez sozinho e sem o amparo de sua família. Todos esses detalhes já haviam sido mastigados e digeridos e ele sentia-se em paz com sua consciência, pois sabia que aquela fora sua escolha e certamente ela não seria uma estrada plana. Alguns buracos e elevações estavam fadados a acontecer, obviamente. O que, de fato, corroia-lhe por dentro a ponto de fazê-lo passar noites em claro era o inevitável. Era não conseguir mentir para si mesmo, nem que isso significasse uma infelicidade tão dolorosa que o fazia perder o ar ao imaginar-se dando aquele passo.
Makoto foi criado com muito amor, carinho e dedicação. Seus pais sempre o incentivaram a ser sincero consigo e, principalmente, com os outros. Ele havia crescido e se tornado um jovem homem honesto e justo, incapaz de machucar o próximo intencionalmente ou magoar quem quer que fosse por egoísmo.
Porém, doía.
Fazer a coisa certa doía.
Ele deixou a casa avisando à mãe que retornaria para o jantar. Aquela seria a última refeição com a família e não seria justo privá-los de sua companhia. Amanhã a essa hora eu estarei sozinho... O pensamento o assustava um pouco, especialmente por sempre ter estado rodeado daqueles que amava. Os pais, os irmãos, os amigos, Haru... O pé direito tocou o degrau de pedra batida e Makoto engoliu seco. Os olhos verdes se ergueram e pela primeira vez naquela tarde uma agradável brisa soprou, tocando seus finos cabelos castanhos com uma estranha gentileza. O cheiro do oceano entrou por seu nariz e ele respirou fundo antes de continuar. A distância não era longa, mas, por Deus, pareciam quilômetros.
A mensagem foi enviada assim que Makoto chegou em frente à porta da casa de Haru. A resposta foi imediata, um simples e direto "Entre" sem nenhuma emoção. Aquilo não o surpreendeu e ele pediu licença após arrastar a porta, retirando os tênis e seguindo com passos vagarosos pelo corredor. Eu conheço esta casa como a palma da minha mão. Um terno olhar foi direcionado à sala, lembrando-o das incontáveis vezes que ele e o amigo sentaram-se ao redor da mesinha de centro, fosse para resolver os exercícios do colégio ou comer tangerinas no inverno. Boa parte de sua vida havia sido passada dentro daquelas quatro paredes.
O dono provisório da casa estava sentado na soleira do jardim e apenas o olhou ao vê-lo aproximar-se.
"Você está adiantado para o jantar, Makoto." Haru vestia uma camiseta listrada, cujo azul combinava com seus olhos.
"Eu jantarei em casa esta noite." Ele coçou a bochecha, encarando o outro lado do curto jardim. Havia uma cerca de madeira que separava a propriedade da do vizinho.
"Entendo."
A brisa soprou mais uma vez, fazendo o furin soar agradavelmente. Makoto lembrava-se dos cochilos naquele mesmo lugar, ouvindo as cigarras cantarem e a respiração nivelada de Haru ao seu lado. Aquela era sua ideia perfeita de verão, mas infelizmente ele estava ali por um motivo diferente. Nenhum de nós terá esse verão perfeito. Eu irei para Tokyo amanhã e semana que vem Haru irá para a Austrália. Tudo o que teremos serão lembranças. O verão chegará e cada um de nós estará em um canto do planeta.
"Você está nervoso?"
A pergunta chamou sua atenção, porém, não o surpreendeu.
"Um pouco. Eu nunca me ausentei de casa por muito tempo e também nunca viajei para tão longe."
"Você já fez as malas? Precisa de ajuda?"
"Não, eu arrumei tudo no decorrer da semana, obrigado." Ele sentiu-se sorrir. Haru nunca foi a pessoa mais espontânea do mundo, no entanto, aquela era a maneira que ele encontrava de demonstrar que se importava. Uma pena que essa gentileza seja tão dolorosa.
"E você? Está nervoso?"
"Não." A resposta demorou alguns segundos para ser dada. "A escolha foi minha. Não faria sentido se eu estivesse nervoso ou ansioso."
Os dois se encararam e o rapaz de cabelos castanhos sentiu o coração bater mais rápido. Ele umedeceu os lábios e inclinou-se devagar, próximo o suficiente para que as respirações se misturassem. Haru tinha os lábios entreabertos e fechou os olhos em determinado momento. Todo o seu ser desejava aquele beijo e o que poderia acontecer em seguida. Talvez, se a situação fosse outra, ele teria se deixado levar pelo agradável clima, negligenciando propositalmente a voz em sua cabeça que dizia que aquilo era errado. Eu venho fazendo isso há algumas semanas, não seria diferente.
Entretanto, por um breve instante seus olhos se desviaram dos tentadores lábios rosados e ele viu que a mão esquerda de Haru, aquela sobre a soleira de madeira, estava fechada. O terno olhar se tornou baixo e sem vida e Makoto levantou-se, pisando no jardim e caminhando alguns passos.
"Nagisa me ligou esta manhã, ele estava chorando e fungando e me fez prometer que jamais o esqueceria." Ele fitou o céu, cujo laranja dava lugar a um azul escuro. "Ele disse que tentará entrar na mesma universidade ano que vem."
"Eu não duvido." A voz continha o mesmo tom. "Sobre amanhã, eu posso acompanhá-lo até a estação."
Makoto fechou os olhos e deixou que suas emoções se acalmassem.
Aquele era o momento que ele temeu viver. Desde que percebeu que aquele dia chegaria a ideia de vivenciá-lo o assombrou por noites, enchendo de lágrimas seu travesseiro e transformando-se em uma tristeza mórbida. A melancolia, contudo, havia evoluído e não passava de aceitação. Eu estou fazendo o que é certo, para mim e para ele, principalmente para ele.
"Haru," ele virou-se devagar e se não fosse pelos quase cinco passos estariam um de frente para o outro, "obrigado por tudo."
Haru o olhou com curiosidade, mas manteve-se imóvel.
"Eu sei que nos últimos meses você precisou lidar com coisas que jamais achou que viveria. Eu tenho minha parcela de culpa nessa história e queria, primeiramente, agradecer por ter aceitado o inaceitável." Sua voz não soou hesitante ou as palavras saíram gaguejadas. Quando ensaiou aquele discurso previamente, Makoto perdeu as contas de quantas vezes foi interrompido pelas próprias lágrimas. "E peço também perdão por ter imposto essa situação. Porém, é hora de termos uma conversa definitiva."
"M-Makoto..." Haru juntou as sobrancelhas e levantou-se devagar. Ele provavelmente não sabia o que estava acontecendo e ergueu-se por instinto.
"Há quase dois meses eu me confessei a você neste mesmo lugar certo de que seria rejeitado. Entretanto, você foi gentil o bastante para me dar uma chance, independente dos seus verdadeiros sentimentos."
"Eu não fui obrigado a nada."
"Eu sei, mas eu também sei que você sentiu-se pressionado a me aceitar." O silêncio por parte do amigo apenas confirmou o que ele já sabia. "Não mais, Haru. Nenhum de nós precisa continuar com essa mentira. Nós vamos embora e seria injusto que eu te prendesse a um compromisso que desde o começo lhe foi imposto."
"Makoto, do que você está falando?"
"Eu estou terminando com você, Haru." O rapaz de cabelos castanhos surpreendeu-se pela calma que sentiu ao proferir aquelas palavras. Pronto, está feito. "Eu estou te deixando livre para viver sua escolha sem precisar olhar para trás."
Haru conservou-se imóvel, olhando-o diretamente e em silêncio durante segundos que pareceram horas. Naquele espaço de tempo Makoto odiou-se por manter a chama da esperança queimando, mesmo sabendo que aquilo só serviria para machucá-lo. Otimismo é uma arma perigosa.
"Eu... entendo." Haru murmurou antes de tomar a voz. "Se está tudo bem para você, eu aceito sua decisão."
Ele sentiu as lágrimas, entretanto, jamais permitiria que a outra parte as visse.
Makoto retornou à soleira com dois passos largos, tocando o ombro de Haru com a mão esquerda e sussurrando um baixo "Obrigado", que teve gosto salgado. Ele não se lembrava de ter recolocado os tênis ou descido os degraus até sua casa. O caminho estava embaçado e por sorte ninguém o recebeu ao entrar em casa e Makoto pôde ir direto para o próprio quarto, fechando a porta e deixando-se escorregar até sentar-se ao chão. Então, as lágrimas caíram livres e pesadas, cheias de sentimentos que jamais se tornariam reais. Ele aceitou tão facilmente. Eu sabia que Haru não me amava dessa forma, mas foi tão simples.
O rapaz de cabelos castanhos lembrava-se vivamente do dia que se confessou ao amigo, após anos amando-o às escondidas. Quando Haru anunciou que tinha data certa para ir à Austrália, ele achou que seria menos doloroso colocar um fim em seu primeiro amor, expondo seus sentimentos e sendo rejeitado. Todavia, ele não foi. Haru não o enxotou de sua casa ou zombou de suas emoções, ao contrário. Ele aceitou a confissão e os dois começaram a "namorar" com o intuito de que um dia o moreno pudesse sentir o mesmo.
O problema é que ele não sentiu e o que começou como um prólogo de final feliz transformou-se em dor e desapontamento. Makoto sentia a relutância a cada beijo trocado e a cada toque um pouco mais íntimo. A certeza de que vivia uma farsa aconteceu quando ele propôs que fizessem sexo. O amigo recuou e negou-se terminantemente, sem nenhuma oportunidade para ponderação. Ele foi gentil. Haru foi amável comigo até o final e eu só tenho que agradecer. Desde o começo esses eram somente meus sentimentos, meu amor.
Não havia espaço para mentiras naquela nova fase. Cada um deveria seguir seu caminho, sem arrependimentos ou qualquer amarra que pudesse retardá-los ou afastá-los de seus objetivos. Aquilo era o mínimo que ele devia a Haru, e por mais que a decisão o devastasse no final não havia nada que pudesse ser feito.
Deixá-lo ir foi sem dúvidas uma das escolhas mais difíceis que Makoto fizera na vida, e durante o tempo que passou com o rosto escondido entre os joelhos, chorando baixo para ninguém ouvi-lo, ele repetiu mentalmente várias e várias vezes que futuramente entenderia o que havia acabado de acontecer. Que, um dia, o amor que sentia por Haru se transformaria em apenas uma bela lembrança.
E ele estava certo.
Continua...
