Pode Acontecer...

Pode acontecer o seguinte. As revelações sobre o envolvimento de figuras do governo passado em crimes e escândalos chegam a ponto crítico. Civis e militares de graduação inimaginável vêem-se na iminência não de ir para a cadeia, o que contraria os hábitos brasileiros, mas de serem expostos como corruptos, torturadores, etc. O que, sei lá, seria chato. Os protestos contra "revanchismo" não adiantam. É preciso agir para deter a torrente de denúncias que ameaça destruir, na sua fúria persecutória, tudo o que o regime passado deixou de bom. Como, por exemplo, o, a... hm. Bem, é preciso agir.

O golpe é decidido num telefonema no meio da noite. Falam em código.

— Alô, Gigante Brasileiro? Máscara da Morte.

— Fala, Mask.

— Tudo certo para amanhã?

— Tudo.

— Tem certeza?

— Tenho. Houve resistência, mas o argumento de que até o Antônio Carlos está nas mãos dos comunistas foi decisivo. A maioria aderiu.

— Quer dizer que...

— Lá vamos nós outra vez.

— Será que não há mesmo outro jeito?

— Bem, se você quer ver nos jornais a história de como você roubava material do seu gabinete para vender...

— Ssssh!

— Nunca entendi. Você não se contentava com seu salário de...

— Sssshh!

— Tinha que vender os clipes de papel?!

— E você? E você?

— O que que tem eu?

— E o cabaré no porão do minis...

— Ssshhh!

— Bom, agora não adianta ficar lamentando. O importante e que ninguém descubra. Como está o plano?

— Não pode falhar. Cercaremos o Congresso. Os congressistas se renderão. Usando os congressistas como reféns, exigiremos a capitulação do governo e das forças leais a Sarney.

— Uma vez no poder, censuraremos a imprensa. De novo.

— Exato.

— Boa sorte, Gigante!

— Certo, Mask.

No dia seguinte.

— Alô, Gigante Brasileiro?

— Não tem ninguém aqui com esse codinome.

— Já vi que não deu certo...

— É.

— O que houve?

— Atacamos o Congresso. Fomos direto ao cerne da democracia. Cercamos o prédio. Entramos para render os congressistas.

— E?

— E não encontramos ninguém!

— O quê?!

— Bom, para não dizer que não tinha ninguém, tinha uma taquígrafa. Pensamos em usá-la como refém mas acabamos desistindo.

— Assim não dá!

— É. É impossível golpear as instituições se elas não estão onde deviam estar!

— O que vamos fazer agora, Gigante?

— Eu se fosse você dava o fora do país, Mask.

— E de onde você pensa que eu estou falando, Gigante?

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N/A: Mais uma fic postada. Baseada na crônica "Pode Acontecer" do meu querido ídolo Luís Fernando Veríssimo.

E só deixando um aviso para as minhas leitoras. A Amazona de Lince e Uma nova chance foram atualizadas.

Beijos.