Disclaimer: Não possuo direitos sobre Harry Potter. Apenas uso as personagens para minha diversão sádica... Mas não deixem a J.K. saber disso. Ela pode ficar brava.

Acusam-me de ser frio e incompreensível . Não tenho sentimentos e puno as pessoas pelo bel prazer. Ademais, sou também inescrupuloso; dissimulado, entre muitos outros adjetivos que me atribuem na tentativa de me colocar dentro de um padrão de pessoa 'má'.

Em verdade, não me importo com nenhum deles. Gosto do manto frio da crueldade em meus ombros, o ódio alimenta meu ego inflamado. Não me incomodo em ser considerado mau. Acredito que seja muito melhor, pois não preciso ser perfeito aos olhos de Deus.

Mas... Eu não acredito em Deus. Ainda mais depois de que Ele me negou o simples odiar.

A/N: É importante eu frisar que não li sequer uma página de Harry Potter, por falta de tempo e paciência. Desconsidero 'Deathly Hollows' e algumas partes do "the Half-Blood Prince". Voldemort é um merda, então não ligo muito para a presença dele a não ser quando existem algumas ameaças. Não entro no mérito da tal guerra, porque se eu me empolgar até escrevo uma continuação sobre isso. O conteúdo não é muito forte, mas as palavras sim. Então diga a sua mãe que a educação que você aprende foi na escola, não no meu fanfic. Ah sim! Todo o crédito por informações são dos filmes da Warner Bros, minhas maravilhosas betas e todas as fanfics que colhi informações.

Insensibilidade

Por Yuuki Kiryu

Beta-readers: Kikis e Naru-L.

Capítulo 1 – Morte inevitável

(Música tema – Faraway Vol. 2 – Apocalyptica)

Ele não sabia ao certo como acontecera. Um rompante de emoções fluía em suas veias e seu cérebro registrava informações tão rapidamente que o seu sensor interno falhava em captar todas. Uma briga com seus pais.

Não era nada fora do comum, se acostumara com a letargia e ausência em sua própria definição por parte de seus genitores. Um parecia deliberadamente ignorar a existência do outro e estavam muito bem assim, obrigado. Draco passava as férias trancado na enorme mansão que não sabia direito se era seu lar ou não, e deixava a mente simplesmente divagar sem os olhares astuciosos em cima de sua figura.

Um sorriso maléfico cruzou as feições aristocráticas e finas. Uma vez ultrapassada a linha tênue da morte e da vida, não se existe mais fronteiras na alma corrompida. E ele sabia muito bem o que significava. Sentia um profundo desprezo por amenidades. Uma vez, seu pai o levara a Londres para fazer não se lembrava o que, mas odiou o lugar durante todo o trajeto.

Uma vez passou em frente a uma construção com um quê poderoso e arquitetura peculiar. De lá, saiam pessoas trajadas com roupas fechadas, cabelos claros, rebeldes e, em especial, olhos escuros e inteligentes com uma expressão de intenso tédio chamou-lhe atenção. Os olhos se encontraram por milésimos de segundos, porém conseguiu sentir tanta raiva de uma vez que virou o rosto indignado com o atrevimento da garota continuar a fitá-lo. Aqueles olhos o perseguiram por muitos anos até que conseguisse esquecê-los.

Então, lembrou-se de ter questionado que local era aquele e porque as pessoas pareciam tão concentradas. Seu pai lhe disse: 'Esse é o lugar onde os trouxas imundos cultuam sua religião.' E ele, no pouco que restava de sua ingenuidade pueril, perguntou 'Então é aí que Deus mora?'. Lucius esboçou um sorriso malvado e quando o fitou, o garoto desejou não ter aberto a boca naquela tarde 'Deus não existe para os bruxos,' e os olhos se tornaram ainda mais frios quando a mão imperativa apertou com força seu braço 'Deus é para fracos, para trouxas e para imbecis. Para nós, não passa de um mito. Entendeu, Draco Malfoy?'

E ele entendeu. E até poucos instantes atrás, acreditaria piamente naquela idéia. E ainda mais com o corpo inerte de sua mãe no tapete caro de seus aposentos, não conseguiu reprimir um suspiro: Se em algum outro momento de sua vida permitiu-se seduzir pela idéia falsa de uma entidade, o momento de terminar com a ilusão era definitivamente aquele. Deus nunca esteve ao seu lado. E naquele instante, sentia-se quase punido pelo seu ceticismo.

Uma briga como qualquer outra não terminaria como aquela. Discutiam novamente a questão de ele ser um Comensal da Morte. O destino era natural, afinal, seus pais tinham uma longa ligação de fidelidade e respeito às artes das trevas, e não seria diferente com ele.

Realmente, estava bastante aliviado em poder finalmente fazer alguma coisa interessante. Mas uma carta macabra, com o papel envelhecido e cheiro pútrido, assim como seu conteúdo, chegou aos seus aposentos e, até o momento em que divagava sobre sua liberdade ilusória, não podia entender o sentido daquela ordem. Clara e indiscutível.

Matará sua mãe antes do amanhecer. Então, receberá a mancha do seu destino e o cumprirá sem questionar ou hesitar. Ou então sofrerá as conseqüências da desobediência antes mesmo de submeter-se às ordens que lhe são devidas.

A caligrafia não lhe era estranha, mas certamente não a via todos os dias. Em princípio, ficou um tanto perplexo com uma ordem tão ousada. Independentemente de quem fosse, devia saber que ele odiava ser manipulado. Tentou imaginar que tipo de conseqüências teria a princípio se simplesmente ignorasse a ordem. Não acreditava que alguém fosse puni-lo no caso de recusar-se a cumprir o que lhe mandaram.

Parecia fácil demais, receber o cargo, uma tarefa aparentemente sem sentido... Então, uma chama de sua consciência brilhou ao lembrar que apesar de tudo, não seria capaz de cometer tal ato. Fraquejaria no último instante... e ignorar uma ordem era muito melhor do que recuar por medo. Por ter peso na consciência? Achou difícil, mas ainda assim era a melhor explicação que achava. Amor maternal era um pouco dramático demais.

Os dias se passaram. A carta ficou esquecida em sua escrivaninha por alguns dias. Andava calmamente pelos locais conhecidos, comia, maltratava algum elfo, voltava e se entregava aos pensamentos até adormecer. Até que então...

Era noite, e chovia. Mas não era comum, ou algo parecido com um presságio? Riu de si mesmo. Slytherins não podiam se dar ao luxo de acreditar em previsões patéticas sobre o tempo, por mais macabra que a tempestade parecesse junto ao clarão dos relâmpagos e ecos dos trovões. A mansão fria não ajudava com o cenário deprimente.

Percorreu a curta distância de uma das salas até seu quarto e foi lá que encontrou sua mãe. Narcissa Malfoy. Bela e fútil como a própria lenda, ouviu alguém dizer um dia. Não tinha interesse por mitologia trouxa, então não soube bem o que a analogia significava, contudo, os adjetivos não poderiam ser mais corretos.

Olhos azuis, profundos e calmos. A aristocracia de seus braços perfeitos e a maneira quase poética que apoiava o cotovelo no batente da janela, revelando uma pele tão branca quanto a sua, em contraste com os trajes negros, um disparate sem dúvida.

Ela virou-se para encará-lo e um sorriso discreto iluminou seus olhos, ainda que os lábios permanecessem sérios e silenciosos. Draco ergueu uma sobrancelha e cruzou os braços na frente do peito, sem entender muito bem o porquê da atitude enigmática de sua mãe. "O que está fazendo?"

"Observando a chuva." A voz melodiosa tinha um quê de impaciência... Ou seria outra coisa que não soube identificar? "Não acha que está estranho?"

"Por que estaria? É só uma maldita chuva." Ele deu de ombros, ignorando o próprio alerta interno que alguma coisa estava errada.

"Tem razão." Ela encerrou o assunto e continuou a observar o filho, parado, um pouco mais próximo. As chamas que crepitavam na lareira ofereciam um pouco mais de calor do que o resto da casa e Draco dirigiu-se em passos largos para a poltrona que ficava a poucos metros de distância de Narcissa. Daquele ângulo, podia fitá-la de perfil.

"Tem alguma coisa acontecendo?" Ele captou o brilho azulado surpreso. Draco não se surpreendeu, entretanto. Acreditava que o filho era alheio – e burro – para não perceber as mudanças a sua volta? Subestimá-lo não era algo que apreciava, mas decidiu ignorar a pequena raiva dentro de si.

"Nada realmente."

O silêncio pairou entre os dois. Cinza e Azul-pálido se estranhavam e reconheciam, dançavam silenciosamente pelo espaço que os separavam. Traços de semelhança e gritante diferença se evidenciavam pela análise profunda que os dois tramavam a cada instante.

"Não quero que você seja Comensal." Ela disse subitamente com a voz baixa, temerosa que as paredes pudessem ouvi-la.

'E por acaso sua permissão tem algum valor?' Pensou em retrucar, mas aquilo só chamaria a atenção do seu pai, haveria mais uma briga e...

"Draco Lucius Malfoy!" Ela gritou de repente, fazendo-o pular assustado da cadeira. Ele ergueu as sobrancelhas, irritado, e lançou um olhar fulminante. "Não me olhe desse jeito! Tem que pensar que pode ser perigoso e..."

"Como também pode ser perigoso eu pegar um vento no rosto e morrer com um resfriado."

"Você não tem idéia do que está dizendo!" Ela ergueu as mãos, exasperada, e aproximou-se do rapaz, que já passara sua altura a algum tempo. Pousou as mãos nos seus ombros, aflita, e fitou-o diretamente nos olhos do mesmo modo que fazia quando queria atenção em algumas das crises femininas, como Draco gostava de chamar. "Não tem idéia do que pode acontecer com você, como lidar e..."

"Talvez eu goste de opinar sobre o que quero fazer, mãe." Ele conteve a respiração e a vontade de chutar tudo. Foi nesse momento em que ela abriria a boca que ouviu um som arrastado logo atrás de si, pegou a varinha no bolso de seu casaco e gritou "Impedimenta", jogando a mãe contra a parede próxima, que caiu sem sentidos no chão.

"Petrificus Totalus." Foi o que Draco ouviu antes de seu corpo todo paralisar. Não conseguia mexer sequer um centímetro, e diante da tensão achava difícil até mesmo respirar. Somente via Narcissa inconsciente a sua frente e alguém perigosamente poderoso que ditava feitiços logo atrás de si.

"Imperio"

Era um campo. Não tinha flores irritantes, a grama era verde e aparada, o céu cinzento... Era estranho. Por que todos os lugares que ia tinham sempre um ambiente nublado, tenebroso? Era tão ruim assim?

O corpo se movia como em uma marionete. Ajoelhou-se em frente a Narcissa e deslizou os dedos pelos braços finos até alcançar o pescoço comprido e elegante. As mãos se fecharam com firmeza, lentamente, em volta da carne branca. Os olhos azuis naquele momento decidiram se abrir e viram a névoa que pairava o rosto do filho.

Ouviu vozes lentas sussurrando em seu ouvido. 'Mate.' As mãos estavam mornas, em contraste com todo seu corpo que parecia imerso na neve. Mas não havia um floco sequer manchando o tapete esverdeado onde sentava.

Narcisa voltou a fechar os olhos ao sentir a pressão aumentar ligeiramente. Não tentou lutar ou fugir. De certa forma, sentia que era o certo a acontecer. Respirou fundo e percebeu que a cada inspiração e expiração o ar vinha mais difícil. Um som estalido veio de sua garganta já rouca, mas procurou permanecer o mais silenciosa que conseguia.

Os sons se tornavam difusos e então clareavam, uma ordem explícita do Lorde. Mas estava errado... Ele não era um Comensal da Morte ainda. Não tinha obrigação de acatar suas ordens. O rosto de seu pai apareceu ao longe como em uma suave neblina. Por que suas mãos ardiam? E o que era aquela sensação esquisita no peito?

Draco fitou o rosto bonito sem realmente enxergá-la. 'Pare!' parecia ter ouvido, mas a pressão das mãos masculinas somente aumentou. O corpo começava a formigar em todas as partes. A chuva caía violentamente do lado de fora e os trovões esbravejavam alguma blasfêmia ao acontecimento.

Estava chovendo? Ele olhou para cima e sentiu os cabelos úmidos e pegajosos. As mãos também estavam molhadas e seu rosto... Seu rosto estava quente. Suas mãos também ardiam tanto que as extremidades estavam vermelhas. Mas as juntas estavam tão brancas... E o rosto inconfundível de Narcissa veio aos seus olhos. Parecia uma... despedida?

"Nunca se esqueça de sentir, Draco."

somente isso que te impede de ser um deles."

Foi tudo ao mesmo tempo:

Quem são eles?

O som da garganta de Narcissa. Mais forte.

Onde você está?

A voz rouca dizendo "Finite Incantatem".

Silêncio...

O trovão.

Estou de volta!

E Draco abriu os olhos para a própria consciência, observou as mãos na garganta da mãe. A pele ardia em seus dedos. O rosto belo numa expressão de dor e alívio. Os olhos semi-cerrados. E um ligeiro sorriso curvou-os antes da respiração e pulsação sumirem logo abaixo dos dedos pálidos do garoto.

O rapaz nada fez. Estava estático. As juntas brancas, a pressão latente, as palavras ecoavam em sua mente. E outro trovão chicoteou os ares quando, em súbito horror, Draco abriu as mãos e cessou o aperto estrangulador em torno do pescoço de Narcissa. E o grito de dor ecoou por todos os cantos da mansão.

(Fim da cena)

"Cale a boca e seja mais rápida!" A voz ríspida do homem fez a garota se apressar e terminar de distribuir os ingredientes. "Sabe que esse feitiço demora pelo menos três dias para ficar pronto."

"Fico imaginando por quanto tempo vai conseguir enganar seu filho idiota." O veneno nas palavras era evidente e só não continuou a dizê-las porque começou a proferir a maldição Cruciatus. A última vez fora dolorosa demais.

"Não queria que tivessem ido tão longe. E preciso tomar precauções para que fique trancado em alguém totalmente improvável."

"Lucius... Isso é difícil." O tom sério não escondeu a leve ironia e quase preocupação. "Sabe das conseqüências?"

"Você cuidará para que dê certo. Até o elo terminar, não importa o que aconteça."

A garota apenas assentiu. Terminou de despejar as últimas ervas no caldeirão pequeno e antigo, imaginando que tipo de efeitos teria. Então, afastou-se quando a varinha do homem disparou uma faísca e a sala ficou envolvida por uma névoa esverdeada, com cheiro doce e entorpecente. Algumas palavras foram proferidas e somente o nome 'Draco Lucius Malfoy' foi o que ela entendeu.

Então, uma explosão brilhante novamente iluminou a sala e ambos foram jogados contra a parede diante da força.

(Fim da cena)

Draco sentia o peito comprimir várias vezes. Acariciava o rosto de Narcissa e nenhuma lágrima rolou de seu rosto. Era como se por alguns instantes tivesse simplesmente querido parar de sentir dor. Qualquer coisa que fosse. Nem mesmo a culpa conseguia afastá-lo do corpo inerte.

Suas palmas ainda queimavam e levou a mão na altura do peito quando o sentiu abrasar ainda mais do que suas mãos. Não notou que uma luz levemente esverdeada pulsava logo na linha do coração. E que, lentamente, o verde tornava-se negro como a noite que o envolvia.

(Fim da cena)

Estava frio. A noite chuvosa em Londres parecia um presságio de acontecimentos obscuros. Hermione espiou pela fresta da janela de seu quarto e suspirou, desanimada. Aguardava que ela parasse para poder caminhar. Nos últimos dois dias, pegava-se com um estranho sentimento de claustrofobia. Por mais livre que estivesse, o seu peito apertava, primeiro lenta e dolorosamente, até então culminar em uma dor tão insuportável que mal continha as lágrimas. E tão de repente quanto chegava, a sensação se esvaía.

Não contava mesmo com aquele frio em pleno verão. Já lhe haviam lhe dito que era uma negação em adivinhações pela sua natureza cética e quase científica, mas, se a angústia que sentia não fosse tão dilaceradora, não daria crédito que a sua dor se tratava de uma intuição. Sorriu sardônica. Se Harry ou Ron ouvissem pensamentos tão tolos iriam achar que ela tinha enlouquecido.

Fitou de relance o meio-kneazle adormecido confortavelmente entre suas mantas e então voltou os olhos para as gotas de água que caíam incessantemente. O cheiro e a paz da melodia eram um bálsamo para seu espírito atormentado. Tentou se colocar no lugar do amigo famoso, imaginar se era esse o sentimento que ele se via dominado em suas crises de destruir Você-Sabe-Quem. Então, fazia muito mais sentido as atitudes incoerentes que tomava.

Era insuportável.

(Fim da cena)

Draco estava agora em seu quarto. O corpo já fora removido de seus aposentos e não queria nem saber onde fora parar. Enfrentaria o Ministério pelo assassinato? Era bem provável que não. Primeiro, porque estava sob influência de uma maldição imperdoável. Segundo, porque seu pai garantiria que não ficasse em apuros. E terceiro porque não deixar-se-ia expor a uma situação tão ultrajante.

As horas lentas passavam-se diante de seus olhos sem que realmente percebesse. O sorriso congelado perseguia sua mente e os olhos azul-pálidos observavam-no em uma silenciosa reprovação. Ainda lembrava de palavras difusas, algo como ser diferente deles. Não sabia quem eram ou porque deveria não parecer com eles, mas de qualquer modo, lutaria para realizar o último desejo da mãe.

Sorriu de lado ao refletir sobre sua vida e ter percebido que nunca realmente demonstrou o afeto que sentia por ela. Não como se isso fosse relevante, agora que estava morta por suas próprias mãos. Ainda gostaria de saber quem foi o desgraçado responsável. Tinha vontade de xingá-lo de muitos nomes, mas simplesmente via-se compelido a parar. Alguma silenciosa advertência de que não deveria pensar que as coisas eram como pareciam.

Draco viu um bilhete dobrado em sua mesa e reconheceu a caligrafia perfeita de seu pai. Ele o chamava para ir a seu escritório particular. Nunca entrara lá em sua vida. Imaginava o motivo da relevância do que iria ouvir, já que ele sumira há dias e nem sequer no velório de sua mãe compareceu para prestar qualquer condolência, apenas ouviu dizer que mandou que desaparecessem com o corpo e que então lidariam com o que tinha acontecido mais tarde.

Três dias.

Três dias que ela morrera.

E Draco parecia se importar cada vez menos.

Isso não era estranho?

(Fim da cena)

"Mandou me chamar, pai?" Bateu e entrou logo em seguida. Não tinha paciência para cerimônias, mas estranhamente não estava irritadiço como sempre. Sentia uma serenidade quase displicente.

Franziu o cenho de leve ao observar a poltrona vazia. Uma porta entreaberta com a luz esverdeada chamou sua atenção. Segurou a varinha na frente do corpo, diante do rosto e, em passos cautelosos, aproximou-se do local. Ouviu o pai proferir algumas palavras.

A cada passo se tornava mais difícil andar. O peito ardia de uma forma insuportável e a mente girava com as cenas dos últimos dias. Pequenos discos negros dançaram na frente de seus olhos e por um momento, sentiu vontade de gritar diante de tamanho tormento. Era como se o Cruciatus dilacerasse seu coração. Olhou para baixo e espantou-se ao ver que a mesma luz sinistra que irradiava da sala circulava seu tórax.

Correu mesmo que seu corpo estivesse contra sua vontade e encontrou Lucius, mais pálido que o habitual, suado e encurvado diante de um caldeirão, segurando firmemente sua varinha. Quando iria se aproximar de seu pai, ele gritou uma palavra que não conseguiu registrar. Então, o corpo perdeu peso lentamente, como se a morte o envolvesse.

"Só assim poderá seguir seu destino sem que a culpa te enlouqueça, Draco."

A liberdade que sentia era quase maléfica. E apenas olhos castanhos ficaram no seu foco, antes de perder completamente os sentidos.

(Fim da cena)

Hermione sentiu a dor fulminante apertar seu peito, junto à sensação de culpa e pesar. Os sentimentos foram demais para conseguir lidar.

Desmaiou.

(Fim da cena)

Então, Draco voltou seus pensamentos para onde estava. Sentado, em frente à janela de seu quarto, na poltrona que outrora observara Narcissa. A chuva caía fina naquele dia, sem trovões ou clarões. Como se fossem lágrimas silenciosas, pois nem mesmo fazia barulho sobre as telhas ou sobre o chão, de tão suaves que as gotículas caíam.

Seu pai morrera tão logo as palavras foram gritadas em sua direção. Quando recobrou a consciência, algumas pessoas estavam a sua volta cuidando de um leve corte na altura da sobrancelha – e nem lembrava de tê-lo – e cobriam o corpo do pai com um pano negro. Mantiveram a sala da mesma maneira, de modo que, quando voltou viu mais tarde um livro em cima da mesa, com uma página marcada. E logo Draco entendeu as sensações estranhas da última hora, o comportamento estranho de seu pai e os acontecimentos que antecederam sua morte. Lucius havia feito um feitiço para trancar os sentimentos de Draco. O procedimento era complicado, arriscava a vida do bruxo que se propusesse a fazê-lo.

Além disso, necessitava de uma espécie de hospedeiro que conseguisse manter os sentimentos a salvo. Caso ele morresse, não poderia recuperá-los. E não havia nem uma referência de como desfazê-lo.

De repente, a maldição Imperio, sua mãe morta e o sumiço de seu pai fez muito sentido. Tudo tramado por parte dele, desde a carta até mesmo aquela dor incessante no peito. Imaginava se ele tinha escolhido quem iria guardar seus sentimentos. Em verdade, parecia tão fácil lidar com as coisas daquela maneira que por alguns dias pensou que seria bom não precisar sentir. Poderia ser um Comensal da Morte e...

Não.

Prometera para sua mãe ser algo melhor do que eles. Provavelmente era isso que ela não queria. E que diferença fazia agora que não podia sentir? Merda. Se seu pai queria que fosse um Comensal, ele seria e pronto. Não havia necessidade de manipular as coisas daquela maneira, ou de matar sua mãe. Com que propósito, por mil demônios? Sentiu ódio. Ou melhor, tentou, tentou, tentou... Mas, por que até mesmo o ódio sumira?

Passadas as suas indignações, percebeu que não estava tão imune ainda. Demoraria algum tempo até que se acostumasse com tanto vazio. Não sentia irritação aos erros dos elfos. Não sentia ansiedade em ver Hogwarts, importunar os três idiotas de Gryffindor. Nem mesmo de jogar sentia falta. Não sentia culpa por ser mal. Por planejar coisas ruins. Por desejar a morte.

Entretanto, havia sensações que demoraram a passar...

Ainda sentia a dor nas juntas brancas, dos dedos alongados, física e pura, simplesmente. Ouvia os últimos suspiros da beldade loira massacrada pelo poder de suas mãos. E os olhos secos. E o peito vazio. E a boca amarga. E a indiferença latente. E a morte. E a imagem da garotinha entediada em frente à igreja. E a semelhança com aquela mestiça. E a vontade de sentir raiva. E a ausência. E a indiferença.

Sentia que iria enlouquecer. E logo.

Mas essa foi uma das últimas sensações que pôde experimentar. Hogwarts começaria em pouco tempo. E esperava que não estivesse sol, para tentar aquecer alguma coisa na sua alma. A chuva, tão odiada por estragar seus jogos, passara a ser sua favorita. Nela, podia refugiar-se. E experimentar a racionalização dos sentimentos que poderia ter em determinados momentos.

Levantou-se da poltrona e observou as mãos com a expressão sombria que agora reinava seu semblante.

Olhos castanhos o perseguiam agora em seus devaneios daquela noite em que seu pai se revelou muito mais traidor do que podia imaginar. E imaginava se seria capaz de sentir todas as emoções que aqueles orbes demonstravam. Se ao menos pudesse sentir algo outra vez.

Por isso não acredito em Deus.

(Fim da cena)

A ser continuado...

A você, caro leitor, cabe o papel de julgar se essa fanfic é digna ou não de um review.