Gantz – Brasil (Arco I – The Fighting Dead)

Capítulo 001 – E Eis Que Ele Morre

Fazia um pouco de frio naquela noite de sábado enquanto Manoel caminhava a lentos passos em direção ao ponto de ônibus. Embora estivesse movimentando o corpo, sua mente estava longe dali, entorpecida pela extensa jornada de trabalho: das seis da manhã às vinte e duas horas. À sua direita, do outro lado da espessa mureta de concreto que circundava a rodovia Anchieta, diversos veículos passavam velozes e barulhentos, em um fluxo constante. Apesar de ser um jovem negro com mais de um metro e oitenta de altura e bem destribuídos setenta e oito quilos, sentia-se como um velho alquebrado e morinbundo.

Frustrado com o odioso emprego de faxineiro, onde suportava humilhações por pouco dinheiro e nenhum benefício, suspirou pesadamente ao ajeitar a mochila surrada contendo seu fétido uniforme. Indagava em pensamento o motivo de estar trabalhando a quase dois meses fazendo todas as horas extras que podia, mesmo exausto. O mês de outubro estava no fim.

Com tristeza, lembrou de sua idosa mãe, de quem cuidava desde a morte do pai. Daria-lhe uma máquina de costura Singer para que ela pudesse voltar a exercer o hobby da costura nas horas vagas e assim, com sorte, ignorasse mesmo que momentaneamente os problemas de saúde que lhe causavam dor e sofrimento diários

"Só mais uma semana, mãe...", murmurou conforme sua pele arrepiava-se devido ao vento gélido que passava carregando o cheiro desagradável da fumaça dos carros e a poeira do asfalto. Isso o fez lembrar do entupimento particularmente nojento com o qual lidara por horas no vestiário da empresa, o que revirou-lhe levemente o estômago, fazendo com que parasse no início da passarela por um instante. O fardo de seu fracasso profissional pesava-lhe a alma.

Olhou para frente, respirou fundo, fechou os olhos rapidamente e ao abrí-los voltou a andar, a rampa de acesso à passarela parecendo mais íngreme que o normal devido ao cansaço de suas pernas. Diziam que atravessar qualquer estrutura desse tipo à noite era um convite ao assalto. Todavia, como alguém que desprezava a própria vida por conta de tantos aspectos negativos que nela enxergava, aquele rapaz não se importava com os boatos. Até porque nunca havia lhe acontecido nada ali nas inúmeras vezes em que fizera o caminho de volta para casa.

O pequeno e espaçoso declive terminava em uma curva para a direita, tornando-se um caminho reto que cruzava toda a rodovia. Manoel de longe avistou, no sentido contrário ao que ele estava prosseguindo, um homem maltrapilho e cambaleante segurando algo parecido com uma sacola arredondada na mão direita. Naquela penumbra, parecia uma aparição tenebrosa vinda do nada, de cabeça baixa, balançando as mãos conforme movia-se errático. Tal visão fez um involuntário calafrio subir pela espinha do auxiliar de limpeza.

- Cada louco que aparece nesses horários... – frisou para si mesmo em voz baixa conforme prosseguia seu caminho sem tirar os olhos do estranho, suas pupilas dilatando-se involuntariamente para melhor visualisá-lo. Bastou chegar alguns metros mais perto para notar que a sacola estava gotejando. Seu coração disparou ao perceber que aquilo na mão do sujeito era uma cabeça. Uma cabeça de mulher com toda a boca manchada de sangue cujo olhar morto encarava-o como um aviso macabro de perigo de morte iminente; seu algoz, em silêncio, deixava uma grande faca deslizar de dentro da manga esquerda de seus trapos para a mão imunda e aumentava a velocidade de seus passos.

Erguendo a cabeça de modo acelerado, Manoel constatou que aquele maníaco de feições embrutecidas possuía um focinho canino no lugar do nariz e apenas um olho multi-faceado e reluzente no centro da face . Mordiscado pelos seus lábios finos e anormalmente roxos, havia um grande pedaço de algo que lembrava latex preto com duas pequenas peças redondas e quebradas presas a ele. No pescoço, pendia um colar feito de línguas humanas, algumas claramente recém-arrancadas.

O jovem negro, incrédulo e trêmulo, estacou por alguns segundos, o início do pânico fazendo seu coração disparar e o suor frio escorrer pelo seu rosto cheio de manchas de espinhas. O que diabos era aquilo? Era real? O que fazer? Para onde correr? Morreria ali? E sua mãe? Quem cuidaria dela? Faltava tão pouco para o dia do aniversário dela! Confusão mental intalada, suas pernas iniciaram o movimento de fuga na direção oposta à do monstro adiante, suas energias totalmente renovadas pelo desespero e terror.

Podia ouvir aquela coisa correndo ruidosamente atrás de si. Fechou os punhos, aumentando ainda mais a velocidade da corrida: precisava de espaço, tinha que manter distância e correr como nunca havia feito antes em toda a sua vida. Em um lampejo, lembrou-se da empresa. Voltando para lá, podia conseguir refúgio. O segurança o conhecia a um bom tempo, não tardaria a liberar a entrada vendo-o naquela corrida louca pela sobrevivência. O ar sumia de seus pulmões a cada respiração; não atreveu-se a parar. Podia jurar que ouvira um zunido vindo do alto, um som estranho e crescente que de forma vertiginosa encobriu tudo o mais sem que ele se desse conta.

De súbito, um monomotor fumegante despencou do céu, colidindo com a passarela quase que na área para onde Manoel se locomovera às pressas. A explosão em seguida iluminou a noite, expurgando o frio, despedaçando concreto, retorcendo aço e ceifando violentamente a vida do humilde e tristonho faxineiro cujos pedaços semi-carbonizados salpicaram a famosa rodovia de vermelho em diminutos pontos do trajeto. Seguiu-se então a cacofonia de freios, buzinas, gritos e colisões que fariam daquela madrugada uma das mais trágicas da cidade e do ano nas horas seguintes conforme a notícia fosse relatada pelos telejornais de todo o Brasil.

Para muitos, a história acabaria ali.

Para Manoel, a experiência mais bizarra e inacreditável de sua existência estava só começando pois, de algum lugar em São Paulo, Gantz havia escolhido-o.

Mesmo sem modos de garantir que não roubem os direitos dessa obra, peço encarecidamente que se publicarem em outros sites, façam referência ao autor original, Manoel M.A. do Santos. Tenham ética e maturidade e não se assumam como autores desta fanfiction quando/se publicarem em outros sites, pois o autor teve muito trabalho em criar esta história, e em pensar em todos os detalhes.