Sinopsis: 1927, Howard Carter descobre o túmulo de Tutankhamon. No pico dos anos dourados da Egiptologia, duas pessoas movidas por fins distintos acabam juntas numa viagem por um mundo em plena exploração.
Agradecimentos:
Athenas de Áries, claro, pelo apoio constante estes últimos tempos e pelo facto de me ter colocado os dedos a coçarem para escrever devido ao grande Come back da nossa baby em conjunto. E pela ajuda do nome da fic…um dia ainda fazemos uma "Shaka Jones e os salteadores do Mu perdido".E a Virgo no Áries, a quem dedico este capitulo como uma espécie de 'presente atrasado'. Sei que já o leste, e por enquanto não tenho tempo de escrever uma Mu Shaka, mas por agora dá para desenrascar ^^" Beijo grande.
Cantinho Ariano: Já tenho esta fic começada à um ano precisamente. Só agora a voltei a encontrar e me deu vontade de a continuar. Com a vantagem de ter os capítulos todos planeados, foi a primeira na qual peguei para voltar a escrever.
A ideia da fic veio de uma mistura de 'relida de Once Upon a Time, in London Time' e de uma viagem feita ao Egipto. Uma grande fusão de Ingleses, Egiptologia, Shaka versão London e um ariano aluado e algumas peripécias deu nisso.
Sem mais demoras…
Travel to Strange
- Capitulo 1 -
Cairo, 1927
- Sir Ascott...
A imponente figura loira desceu lentamente pela passadeira até ao cais.
- Seja muito bem vindo ao Cairo Sir. É um enorme prazer tê-lo entre nós.
Os magníficos olhos azuis céu apenas se dirigiram num relance na direcção da insignificante personagem que tentava-se curvar o máximo que conseguia numa reverencia exagerada. Tão exagerada que os passantes se perguntavam quando iria cair de vez estatelado no chão, perdendo o equilíbrio.
No rosto pálido e impassível do recém chegado, nenhuma reacção era perceptível. Apenas um ligeiro murmurar de algo que podia ser considerado uma saudação, apesar da total ausência de movimento nos lábios requintados.
Os longos cabelos loiros caíam pesados sobre o traje escuro, a franja ocultando em parte o olhar penetrante. Com um breve menear de cabeça, deu o sinal que os servos esperavam para que os seus baús fossem retirados da embarcação.
- O meu nome é Rachid Himal – continuo a personagem estranha, sempre evitando olhar para o imponente loiro – Serei o seu guia pela cidade, pelo menos até ao hotel onde encontrará a pessoa que o espera.
Shaka Gregory Sullivan Ascott. Um ser de grande renome e importância na alta sociedade Inglesa, uma personagem única pela sua postura e beleza de aparência, mas igualmente impiedoso e decidido. Farto da monotonia do dia a dia burguês, e sobretudo incitado durante uma tarde num club privado entre 'amigos', Shaka acabava de chegar ao Cairo, local de onde partiria para uma viagem de descanso através do Egipto.
Suspirou enfadado, não só porque praticamente tinha sido obrigado a estar ali, como pelo calor abrasador que sentia. Como se tinha deixado arrastar para aquele fim do mundo sem um pingo de regras de higiene e salubridade?
- Queira seguir-me senhor, ficará no hotel Horus esta noite. Amanha partirá para Luxor.
Mais uma vez, Shaka suspirou.
---oOo---
As noites quentes da cidade eram sufocantes. Shaka ainda não acreditava que estava tão longe de casa, da sua terra Natal, tão longe do clima húmido e chuvoso… da sua Londres, os campos verdes nos quais montava muitas vezes a cavalo.
Remexia-se irrequieto, virando-se insistentemente na cama sem conseguir pregar olho. Apesar de estar apenas tapado por um fino lençol de linho e as janelas estarem completamente abertas, não corria uma aragem para aliviar o calor.
Suspirou longamente resignado, sentando-se na cama, afastando a franja da testa suada. Não valia a pena tentar lutar, quanto mais se remexia para tentar dormir, mais calor tinha e consequentemente menos sono.
Levantou-se lentamente do colchão indo até ao banheiro. Talvez um bom banho gelado ajudaria a finalmente se render ao sono. Teria de estar fresco para a viagem até Luxor onde seguiria depois de barco pelo Nilo.
Na calma do exterior, apenas os passos apressados de uma pessoa quebravam o silêncio da noite. As faces afogueadas pela correria e pelo peso de livros que transportava nos braços, o aro dos óculos finos cintilando ao luar. Estava atrasado.
Finalmente chegou à entrada do hotel, dirigindo-se rapidamente até ao balcão onde o recepcionista dormia roncando demasiado alto. Os curiosos olhos verdes miraram a sua volta tentando arranjar uma solução para o seu problema, esperando não ter de acordar o pobre homem que conseguia por algum milagre dormir com aquele calor infernal.
Não havia outra solução. Se queria a chave do seu quarto, teria mesmo de o arrancar do delicioso mundo dos sonhos... fossem lá quais fossem. Com muita calma, pousou o amontoado de livros sobre o balcão, começando a chamar a atenção num tom de voz baixo.
As suas investidas foram em vão, pois o homem continuava no mais profundo sono, roncando cada vez mais alto e dizendo algumas frases desconexas numa língua estranha.
O jovem suspirou, deixando cair o tronco sobre o balcão. Não era possível que tivesse assim tão pouca sorte! Tinha saído bem cedo para comprar alguns livros no centro da cidade para as pesquisas mas ao voltar para o hotel o seu sentido de orientação tinha falhado... muito. Durante algumas horas tinha ficado perdido pelo meio das estreitas ruas da cidade, tempos a outros esbarrando com becos sem saída. Um horror.
E agora que finalmente tinha encontrado o caminho de volta, era tarde o suficiente para encontrar o recepcionista dormindo que nem um... ogre...
Chamou desta vez um pouco mais alto, tocando com a mão no pequeno sino sobre o balcão. Assustou-se acabando por cair no chão, quando o homem baixo e forte sobressaltava da cadeira, fixando-o intensamente.
- Desculpe... eu não queria acorda-lo mas... – começou reticente apesar da reacção exaltada do homem à sua frente, parecendo visivelmente irritado e dizendo coisas muito pouco agradáveis.
- Quarto! – disse o recepcionista rispidamente coçando a cabeça.
Mu arregalou os olhos atrás dos óculos separando os lábios inconscientemente. Ora essa... não, tudo menos isso... tinha-se esquecido do número o quarto! O homem falava inglês apesar de muito mal, com um pouco de sorte não seria complicado explicar-lhe a situação.
- Quarto! – voltou a falar o homem com cara de poucos amigos.
Mu levantou-se atordoado, afagando os longos cabelos lavanda. – Bem... acho que era o 25... – a sua voz saia demasiado indecisa para enganar quem quer que fosse.
Rapidamente o recepcionista passou os olhos sonolentos pelos chaveiros dispostos atrás de si, vendo que a chave indicada já não estava lá. Revirou os olhos bocejando, pegando rapidamente num livro poeirento e colocando-o à sua frente, abrindo na última página.
- Nome! – falou olhando para a lista das ultimas pessoas que tinham dado entrada no hotel, pedindo a todos os deuses e mais alguns que o homem estranho a sua frente pelo menos ainda soubesse quem era.
- Lawrence. Mu Lawrence!
Mu soprou a sua franja, abanando a mão imitando um leque, tentando fazer correr uma aragem na sua direcção. Aquela correria toda juntamente com o calor da noite estavam a acabar consigo. Só ansiava por um bom banho de agua fria e uma boa noite de sono para estar fresco para a viagem do dia seguinte. Azarado como era, não era de admirar que chegasse atrasado ao comboio e não conseguisse partir para Luxor.
Mais valia prevenir que remediar...
- Quarto 32! – a voz do homem acordou-o num sobressalto, apenas tendo tempo para apanhar a chave que lhe tinha sido lançada – amanhã devolver quarto! Manhã!
Sim, sabia que teria de sair do quarto ainda de manhã. Até porque mesmo assim não quereria ficar nem mais um minuto ali... se todos fossem tão amigáveis quanto ele...
Voltou a pegar no monte de livros assentindo, despedindo-se cordialmente do homem gordo e subindo lentamente as escadas ate ao terceiro andar.
Mais uma vez, recriminava-se por ter cedido a cada primeiro impulso e comprar aquela enorme quantidade de livros. A única coisa que tinha conseguido era acrescentar mais e mais peso a sua bagagem, que já não era leve.
O único consolo era que no dia seguinte pela mesma hora estaria num barco de cruzeiro, sem ter de se preocupar com bagagem ou peso. Após algumas tentativas frustradas para abrir a porta, sentindo que a maçaneta estava perra, Mu finalmente conseguiu entrar no quarto e trancá-la por dentro, esperando que no dia seguinte não tivesse problema para abri-la.
---oOo---
Um longo suspiro foi ouvido no quarto, o corpo adormecido sobre a cama abraçava o travesseiro possessivamente. Os longos cabelos lavanda presos num rabo de cavalo alto, Mu dormia profundamente apenas de roupa interior, o fino lençol branco caído no chão devido as constantes voltas que o corpo suado na cama se mexeu durante a noite. Mu suspirou com um sorriso nos lábios, sonhando os sonhos de outrem.
Remexeu-se franzindo o cenho, sentindo uma voz chama-lo ao longe. Não! Não queria ser acordado daquele sonho… estava tão bem ali! Não queria ser chamado a realidade! Grunhiu algumas palavras desconexas virando-se na cama continuando a abraçar o travesseiro.
As batidas insistentes na porta assim como a voz grossa tornavam-se cada segundo mais nítidas, fazendo com que o jovem de cabelos lavanda entreabrisse os olhos bem devagar. A luz do sol e o calor da manha entravam pela pequena janela aberta do quarto, o barulho da cidade que tomava vida tornava-se demasiado intenso para que conseguisse voltar a cair no sono.
Era manhã.
Mu bocejou longamente deixando cair o travesseiro no chão, finalmente se sentando na cama. Coçou preguiçosamente os olhos, esperando que a sua massa cinzenta se dignasse a começar finalmente a trabalhar, o que parecia estar complicado devido a moleza causada pelo calor intenso mesmo aquela hora da manha.
As batidas na porta assim como a voz grossa de alguém eram agora nitidamente ouvidas. O que lhe queriam aquela hora? Ainda tinha um tempo para dormir antes de poder partir para o comboio e…
- MERDA! – berrou quando ao olhar para o lado, percebeu no seu relógio as horas que eram. Devia estar acordado à mais de uma hora, preparado as suas coisas e finalmente saindo dali na maior das calmas para se dirigir a estação de comboios.
Mas como sempre algo não batia certo.
Teria sido a diferença de clima que o tinha deixado dormir demasiado tempo? Ou teria sido simplesmente a sua má sorte que o acompanhava desde sempre? Não tinha tempo para pensar agora! Se queria ainda apanhar o maldito comboio para Luxor tinha de correr para arrumar tudo.
Acrescentando a isso um palhaço que não parava de bater na sua porta, provavelmente querendo despejá-lo. Numa correria louca pelo quarto juntando os livros e roupa que ainda estava bagunçado.
- LIBERAR QUARTO! – a voz tornava-se cada vez mais alterada. Como aqueles egípcios eram irritadiços!
- CINCO MINUTOS! – gritou de volta no seu inglês perfeito, mesmo deduzindo que o outro não iria dar tréguas.
Pulando para dentro de uma calça e vestindo uma túnica bem leve sem mangas, abriu finalmente a porta ao seu carrasco. Não era definitivamente o homem que estava na recepção na noite anterior… o homem bem maior que ele parecia bastante chateado pelo seu atraso. Talvez com algumas desculpas sinceras ele se deixasse apaziguar.
- Desculpe eu…
- Liberar quarto! – respondeu simplesmente num tom de voz mais baixo, sem deixar oportunidade para mais conversa.
Mu assentiu preparado para continuar com o sincero pedido de desculpa, quando viu pasmo o homem monstruoso se afastar com a maior das calmas, dirigindo-se ao quarto seguinte. Levantou a mão lentamente a altura do ombro, o punho fechado, começando novamente a sua tarefa de bater nas portas.
- LIBERAR QUARTO!
A voz podia ser ouvida no corredor inteiro… era uma forma bem ilícita de ser acordado.
Após se recompor do choque, Mu voltou sobressaltado para dentro do quarto pegando na mala e dando uma rápida olhada a sua volta, esperando que não se tivesse esquecido de nada.
Parecia tudo em ordem… voou rapidamente para fora do quarto, correndo da direcção das escadas que o levariam a recepção.
Um comboio esperava-o.
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- Sir Ascott, espero que tenha feito uma boa viagem…
Shaka desceu calmamente da carruagem, sempre mantendo as costas muito direitas, acenando cordialmente. O que podia responder? Que aquela viagem até Luxor tinha sido extremamente maçante? Oh céus… nada disso! Desde cedo tinha aprendido a mentir para seu próprio bem-estar, ali estava uma excelente oportunidade para o fazer.
- O dahabeeyah espera-o senhor. Foi-me encarregue a tarefa de o acompanhar até ao porto, de onde partirá para a sua viagem.
- Agradeço a sua preocupação – a sua voz era calma, podendo transmitir uma certa paz e serenidade. Mas ao mesmo tempo tinha a firmeza de alguém que não se deixava manipular facilmente.
Shaka acompanhou o homem narigudo pela plataforma, os camareiros ocupados com as suas bagagens seguindo-os a uma certa distancia. O egípcio não parava de falar com um sotaque carregadíssimo, historias por vezes interessantes sobre o seu país.
Cultura extremamente interessante para o loiro, que apesar de os achar um tanto atrasados em relação à cultura inglesa, tinha o seu charme e envolto numa aura mística muito curiosa.
- Assim Hapi, o deus que os nossos antepassados associavam não exactamente ao rio Nilo mas sim ao fenómeno das cheias, era uma divindade da qual a população dependia. Todos os anos ocorria uma cheia, o que simbolizava um ano de boas colheitas; caso contrario seria um ano de grande fome.
Shaka assentiu, absorto nas imagens que a sua mente criava a volta da história que lhe era contada. Um deus que controlava as cheias de um rio, um ano que correria mal no caso de não haver a cheia anual… mentalidade estranha.
Conseguia perceber que a população actual não tinha nada a ver com os seus antepassados.
- Chegámos sir Ascott – Shaka acordou dos seus devaneios, olhando finalmente para a embarcação à sua frente – o dahabeeyah Ramsés será a sua casa na próxima semana.
Hummm… não era mau de todo. O barco parecia ter boas condições, era bastante grande. A sala comum acolhedora, uma sala de jantar não menos boa, o camarote espaçoso. Claro, tinha pedido um dos quatro camarotes presidenciais no convés superior. Se era para ter ferias, que fossem o mais luxuosas possíveis. Apesar de não saber bem como poderiam ser luxuosas naquele lugar…
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A cama era deliciosamente macia. Os longos cabelos lavanda espalhavam-se soltos pelos lençóis brancos, o peito subindo e descendo com a respiração ainda acelerada pela correria de momentos antes.
Felizmente tinha conseguido chegar a tempo e estava no seu camarote no interior do Ramsés. Nunca pensou um dia vir a correr tanto na sua vida. Como a sua bagagem tinha sido levado por outra pessoa à descida do comboio? Pensar que todos os seus livros, toda a sua pesquisa podia ter ido por água abaixo… e porquê? Por causa de uma cabeça dura carrancudo e muito moreno que teimava que aquela bagagem era sua!
Depois de recuperada, tinha muito pouco tempo para entrar no barco. Tinha sempre pouca sorte em tudo… mas felizmente acabava por correr tudo bem no final.
Retirou os óculos finos colocando-os sobre o criado-mudo, deixando escapar um longo bocejo. O dia tinha sido extremamente cansativo… alem de ter acordado tarde ao ponto de quase ser expulso do hotel, correr para chegar a tempo de pegar o comboio, ter adormecido na carruagem atafulhada de pessoas estranhas… sim, porque o dinheiro era pouco e aquele camarote era o único que podia pagar. Mas não era pessoa de grandes exageros… Mu era feliz como vivia e o tipo de pessoa a quem 'um monte de livros e uma cabana' era perfeito.
A bagagem jogada num canto do camarote, Mu não pensava em mais nada alem do estado de sonolência no qual se encontrava e da quantidade de descobertas que ia fazer ao longo daquela viagem.
Continua…
