Título: The Truth
Classificação: 16 anos (linguagem/ cenas violentas)
Autores: Valery Rood/ Petrus Heligan
Categorias: Supernatural/ Terror/ Suspense/ Ação
Sinopse: AU. Quando o agente do FBI Victor Henricksen de outro jeito descobre a verdade.
Notas: AU pelas personagens originais, exceto o agente Victor Henricksen.
Em ordem cronológica o texto vem após "FreakShow", e antecede "Encontro", ambos dessa que vos escreve.
Espero não ter descaracterizado (muito) Victor. Sempre o achei um pé no saco, e já era hora dele cair na real.
Não, os garotos não participam desta aventura. Prometi a eles um descanso, e merecido. Quem leu "SN: do outro lado da estória" vai entender...
Aqui temos a participação especial de uma personagem criada pelo Petrus Heligan. Suas origens estão nas fics "Cicatrizes" e "Bar dos Lobos Solitários", ambas do mesmo autor. Um beijo especial pra ti e obrigada por tudo, meu querido!
Agradecimentos especiais à Crica pela paciência e carinho.
E juro pela alma de Dean Winchester, que não foi inspirado em 'Jus in Belo'. Estava em fase de criação desde novembro do ano passado, e só agora saiu. Se não quiser acreditar...Alt+F4.
E chega de papo. Boa leitura.
Epílogo - FreakShow
Em algum ponto esquecido por Deus na Interestadual 8, que corta os estados do Arizona e da Califórnia, uma Shadow vermelha estava parada num posto de gasolina, esperando por sua dona que fazia uma rápida parada na loja de conveniência.
A detetive caminhava em direção a sua moto, quando sentiu alguém segui-la e, antes que pudesse fazer alguma coisa, sentiu um cano de arma gelado em suas costas.
- Reconheceria esta Magnum em qualquer lugar do mundo...
- É o que as mulheres sempre dizem, uma vez que provam, nunca esquecem... - A voz sussurrada no ouvido da detetive era firme – Agora continue andando.
- Tudo isso é rancor por ter sido a única do departamento que não saiu com você, Victor?...
- Ande! - O agente Henricksen conduzia a detetive até seu carro, onde mais dois agentes aguardavam.
Um dos agentes a agarrou bruscamente e injetou algo com uma seringa em seu pescoço, fazendo com que ela desmaiasse no ato.
- Vamos, Rood, estamos numa grande desvantagem... E não tenho o dia todo!
Num quarto à meia-luz sabe Deus onde, Valery estava sentada numa cadeira, algemada com as mãos para trás.
Henricksen tinha capturado a agente responsável por toda a confusão que acontecera por causa da quebra da Aliança.
- Não sabia que você tinha este tipo de fetiche, Vickie... – Valery estava zonza por causa do que ele havia injetado nela.
Ele nunca bateria numa mulher como forma de tortura, mas o tal 'soro da verdade' estava liberado...
Ele sabia que por pegá-la teria um prestígio maior entre seus colegas, já que ele estava na pista dos irmãos falsários há tempos e a última tentativa fora um fiasco.
- Vamos, eu sei que você sabe onde eles estão! - Bateu a mão sobre a mesa entre ele e a detetive.
- De quem você está falando... – Valery piscava profundamente, tentando lutar contra os efeitos da droga.
- Você sabe quem! Dos irmãos, Rood!
- O que o faz pensar que eu conheço quem você está procurando...
Ele virou-se para ela num olhar de fúria.
- Só conheço dois ou três agentes que têm poder para apagar toda a ficha criminal de alguém no sistema e, por eliminação, resta apenas você... Além do mais, você foi vista em Austin na companhia de dois rapazes que batem com a descrição dos miseráveis!
Ela sorriu, os olhos semicerrados.
- Vickie, não faço idéia de quem ou o que você está falando...
Henricksen suspirou fundo.
- Ouça, Rood... Eu já tenho você, não me falta nada pra pegar aqueles filhos da mãe... Você falando ou não, eu vou achá-los! – O agente saiu do quarto, deixando Valery sozinha.
"Merda..."
Se sempre foi tão esperta como não se deu conta de que a seguiam e da gravidade da situação?
Agora estava presa num quarto não sabia onde, algemada, desarmada, dopada...
"Rapazes, espero que sejam mais espertos do que eu desta vez..." – Ela fechou os olhos e deixou a cabeça pender, rendendo-se ao efeito do soro.
Cap. I – A Caminho da Califórnia
Um raio de sol poente bateu direto nos olhos que abriam languidamente. E aquela luz a incomodava de forma irritante. Sua cabeça doía como o inferno, se é que estar no inferno é doloroso.
Percebeu que estava encostada entre o vidro da janela e o banco traseiro de um carro, numa desconfortável posição pois estava algemada com as mãos para trás.
Via a paisagem passar rapidamente.
- Não me acordaram na hora do café da manhã, quanta indelicadeza com uma dama! – A detetive tentava se ajeitar como podia, um brutamonte vestido de preto ao lado dela nem deu atenção ao seu comentário.
Percebeu que estava no carro com Victor e seus dois agentes, mas não identificava qual a estrada que percorriam.
- Quanto tempo eu dormi?
- Um dia e meio. Um longo dia e meio... – Victor respondeu sem se virar para trás, pois estava na direção.
- É, os brinquedinhos do departamento estão cada vez melhores... – Valery soltou o corpo dolorido no banco, tentando mentalizar como sairia daquela situação - Onde estão minhas coisas?
- Seus pertences pessoais estão no porta-malas, trancados, e sua moto foi rebocada – O agente ao lado de Victor respondeu secamente.
- Ah, que bom, não são de todo grosseiros... E até que eu precisava mesmo dessa pausa – Valery sorria sarcasticamente – Que horas são?
- Está fazendo perguntas demais pra quem está sob custódia, Rood – Victor respondeu num tom de voz agressivo.
Durante estes dois dias, o rastro dos irmãos Winchester havia simplesmente desaparecido, como se eles não existissem. E isso desencadeou uma fúria sem tamanho em Henricksen, pois estava digamos, 'sujo' no departamento por causa de toda a história com eles e, no fim das contas, aquilo já tinha se tornado pessoal há muito tempo.
- Você fez um belo trabalho com os irmãos, eles simplesmente sumiram do mapa... E seu celular possui senha para funcionar, muito engenhoso...
- Se vocês que são do FBI não conseguiram entrar no meu humilde equipamento... – Valery deu de ombros, revirou os olhos e continuou seu sorriso, pois apesar de se sentir debilitada não perdia uma piada.
Victor olhava com desprezo através do retrovisor para a mulher no banco de trás. Ela estava suja, com olheiras, numa situação deplorável. Se conheciam há anos, ambos entraram para a academia quase na mesma época. Nunca trabalharam juntos devido ao mistério da divisão especial a qual ela desde sempre pertencia, mas isso não era justificativa para que não se esbarrassem vez ou outra em algum caso.
- Você nunca acreditou no meu trabalho, não é Victor?... – Valery se mexia desconfortavelmente.
- Você é que nunca deu real valor ao seu trabalho, Rood... Esse papo de caçar fantasmas, pra mim é coisa de filme dos anos 80! – Victor dirigia perigosamente pela estrada estreita.
- Você nunca vai entender... - Valery olhava para a paisagem tentando identificar que raio de estrada era aquela, e o sol já estava se pondo por completo, dificultando o reconhecimento.
Durante os quilômetros que se seguiram o silêncio imperou.
As sirenes da Penitenciária Estadual soaram tarde demais. Henry Rais já estava a quilômetros de distância de onde cumpriria pena perpétua por vários assassinatos e delitos graves em pelo menos três estados.
Henry roubara uma caminhonete no caminho, facilitando sua fuga. Estava guiando pela Interestadual quando a gasolina acabou, bem próximo de um pequeno trecho de floresta intocada. Como era de dia, não viu maiores problemas em se aventurar por entre as árvores e tentar encontrar algum casebre, ou ainda algo mais específico para que prosseguisse seu plano de fuga, aparentemente brilhante. Estava num fim de mundo, o que de pior podia lhe acontecer?
Adentrou por entre os galhos verdes, sempre prestando atenção na direção do Sol para não se perder naquele mato todo. Nem se deu conta de que entrou numa espécie de redoma de plantas, onde não se via mais o brilho do Sol. Os galhos, cada vez mais entrelaçados, não deixavam passar nem luz, nem calor. Estava realmente frio naquele trecho...
Henry caminhou mais alguns metros, e cada vez mais a mata se fechava, escurecia e esfriava. Por um instante sentiu medo, por estar sozinho e vulnerável a ataques de animais selvagens.
" – Henry... Você é um assassino, o pior que pode acontecer é algum bicho cruzar a sua frente e o pobre morrer por sua faca!" – Do macacão laranja ele sacou uma grande faca de cozinha, seu bilhete de saída da prisão.
Logo os barulhos da natureza cessaram e o vento parou de soprar. Era como se estivessem alertando que algo estava completamente errado ali. O bandido trocava passos sem sair do lugar, olhando ao seu redor. Uma gota de suor frio correu-lhe pela têmpora, coisa incomum para ele. Alguma coisa ali o fazia sentir medo, mas não sabia ainda o quê.
Ficou em silêncio durante alguns instantes, tentando entender o que a natureza queria tanto lhe falar.
Logo ouviu um barulho parecido com um caminhar, mas tão pesado que não podia ser algo humano. Seguindo seus instintos, correu para o lado oposto, de onde vinha o barulho, mas paralisou, duvidoso. Se corresse, poderia se engalfinhar nos galhos cheios de espinhos e ficar em situação pior.
Os passos se calaram. Henry não sabia o que iria acontecer.
Sem que desse tempo de esboçar qualquer reação, no chão marrom da floresta pôde ver uma grande sombra que cobriu a sua. Sentiu um peso no seu ombro que, num piscar de olhos, foi rasgado em duas partes pela criatura.
Seus olhos, por instantes, ainda puderam ver o seu próprio corpo, a alguns metros afastado, ser dilacerado por algo entre o humano e o animal. Nem gritou, pois sua garganta havia se separado de seus pulmões.
O carro cruzava velozmente a estrada sob uma garoa fina, trazendo o frio natural da madrugada. Estava bem escuro e os faróis estavam com defeito, dificultando a visão do motorista que, mesmo assim, pisava fundo no acelerador.
- Chefe, a pista não está muito boa, sugiro que o senhor diminua...
Antes que seu companheiro terminasse a frase, foi fuzilado com um olhar de soslaio do motorista. Isso bastou para que se calasse e novamente o carro mergulhasse no silêncio. De fato a pista estava perigosa. A chuva fazia com que desprendesse óleo do asfalto, e quem passasse por ali não e estivesse atento certamente derraparia.
Valery tentava sem sucesso observar qualquer sinal na paisagem que identificasse onde eles estavam. Só sabia que estava indo para o Oeste, conforme a direção do sol.
- Vickie, que tal darmos uma parada pra esticar as pernas, heim ?... – Valery ainda mantinha sua arrogância e deboche mesmo em situações como aquela.
Sabia que se ficasse nervosa ou parecesse desnorteada seria pior. O jeito era manter a calma e pensar numa saída rapidamente.
- Só se for pra te jogar de um penhasco desses, Rood. Mas infelizmente eu não posso, uma pena...
O diálogo foi cortado pelo chiado do rádio comunicador.
- Alerta à todas as unidades próximas à Interestadual 08: temos um fugitivo da penitenciária Estadual nesta rota, guiando uma caminhonete azul marinho, placa...
- Ah, dá um tempo! – Victor bateu no volante em sinal de protesto.
- Chefe, há pelo menos duas horas não cruzamos nenhuma viatura local e, já que estamos na mesma rota...
- Está querendo me dizer como eu devo trabalhar? – O motorista retrucou para Raymond, que estava ao seu lado. A detetive não conteve seu riso por causa da cena, além de já ter descoberto onde estava.
- Não senhor... – O grandalhão personificava os caricatos "leões-de-chácara" dos seriados policiais.
- Então só vamos se eu quiser! – Victor ainda dirigia com o pé atolado no acelerador.
Mais alguns instantes de silêncio. A alguns metros adiante, mesmo no meio da fina garoa e neblina que pairavam, viu as luzes traseiras do que parecia ser um veículo de grande porte. Uma caminhonete, talvez.
- Grande! – Victor confirmava suas suspeitas, infelizmente.
Pararam alguns metros após o carro que estava estacionado no acostamento. Victor e seu carona desceram devidamente preparados caso houvesse alguém lá dentro. O agente que ficou com a detetive tratava de alertar as unidades locais que haviam encontrado o veículo, mas sem saber ainda se seu usurpador havia sido localizado.
Victor deu um sinal para que seu parceiro circundasse o lado do passageiro da camionete, enquanto ele abordaria pelo lado do motorista. Mas pelo silêncio, deduziram que o carro estava vazio.
Abriram as portas, lentamente e, pelo procedimento padrão, revistaram o carro todo. Nenhum sinal do fugitivo.
- Hey, que tal você me livrar destas algemas, heim ?... Estou toda dolorida por causa desta posição! – Valery, já cansada, tentava negociar com o terceiro agente.
O agente, após passar a mensagem para a polícia local, só olhou de lado para a detetive, que entendeu a resposta.
- Está sem gasolina. Ele provavelmente foi naquela direção – Victor apontou para dentro daquela floresta densa, principalmente para quem sabia que certamente havia algo aterrorizante lá.
- Chefe, vamos entrar... ali? – O agente, através do carro roubado, não se sentia bem ao olhar para aquelas árvores enormes e escuras.
- Não, não vamos entrar ali.
- Ah, que bom, então vamos esperar os guardas locais para...
- VOCÊS vão entrar ali!
Raymond olhou para seu superior com cara de espanto. Felizmente estava escuro o suficiente para que Victor não visse a expressão do subordinado e caísse na risada.
- Mas, chefe...
- Nada de "mas"... Você mesmo que sugeriu este contratempo! Agora você e seu parceiro farão a busca do sujeito dentro desse matagal! Ande, vamos voltar para o carro e peguem seus comunicadores. Eu vou ficar com a detetive, ela é esperta demais pra ficar sozinha.
Cap. II – A Floresta Sombria
Valentin e Raymond não conseguiam enxergar um palmo diante de seu nariz. Os pequenos feixes de luz ajudavam, mas eles tinham que apurar mais seus outros sentidos, pois estavam num breu total. Eram treinados, obviamente, mas sentiam que naquele lugar havia algo incomum para as florestas que já enfrentaram.
- Hey, encontrei alguns galhos quebrados por aqui...Um rastro.
- Mas também há outros aqui... – Toda a conversa era quase cochichada.
- Mas são em direções opostas, impossível... – Raymond tentava observar com o máximo de cuidado aqueles rastros. Os sinais indicavam que não fazia muito tempo que aquelas folhagens e os galhos haviam sido pisados, o que fazia com que ele pensasse que realmente o bandido passara por lá, e estava bem perto. Mas o outro rastro, do lado oposto, não fazia nenhum sentido...
Avançando mais alguns metros, sentiram um cheiro forte de carne podre.
- Algum animal morto...
- Nossa, numa floresta, como você deduziu, gênio?!
- Cuidado onde pisa!
Nesse momento Raymond encontrou um pedaço de tecido laranja, parcialmente encharcado de sangue.
- Eu estou com um pressentimento ruim... – Desde o começo Valentin não gostou daquele lugar. Aquele cheiro que entrava pelas suas narinas era nauseante. Os sons noturnos o confundiam e o faziam sentir um medo quase primitivo.
- Cala a boca, idiota! – Raymond apanhou com cuidado a peça e viu que aquela quantidade de sangue não era de um arranhão comum.
- Se está ferido como parece, ele não está muito longe... – Iluminava o tecido e sua cabeça fervilhava... Como o bandido conseguiu perder uma parte de sua roupa daquele tamanho e, principalmente, toda aquela quantidade de sangue? Mais um arrepio, de tantos outros que sentiu, lhe correu pela espinha.
- Victor, mandar seus agentes no meio desse breu foi um erro grave.
- Você está com medo de algumas folhas secas, Rood?
- Essa floresta me parece sombria demais para abrigar apenas folhas secas.
- E o que você está sugerindo? Que há algum espírito zombeteiro lá dentro? – Victor deu uma risada forçada sob o olhar sério da mulher.
- Eu estou falando sério. Se houver alguma coisa lá dentro, eles não vão sair vivos e você é quem vai ter que prestar contas à agência... – Valery largou o corpo no encosto do banco, suspirando, realmente preocupada com o que poderia haver lá. Seu instinto nunca falhava e estava gritando que era realmente perigoso alguém despreparado enfrentar o que houvesse dentro da floresta.
- Olha, Rood, eu já cansei dessa sua conversa de Divisão Especial. O dia em que eu me encontrar com um fantasma e ele me disser "Olha, eu sou um fantasma e você deve acreditar em mim" ainda assim, talvez, eu custe a acreditar.
- Victor, espero sinceramente que o fantasma que você encontrar não esteja procurando vingança, senão não dará tempo de você acreditar ou não...
- Fala a verdade, Rood... Você fica numa boa, viajando pelo país às custas da agência por herança do seu pai, que tinha a mesma boa-vida! – Ele respondeu, incrédulo.
Ela chutou com toda a força o banco do motorista, fazendo com que Victor se chocasse contra o volante.
- Nunca mais mencione meu pai, Victor... – O tom de voz baixo era intimidador.
- Rood, não me faça algemar teus pés também!
O silêncio foi a resposta de protesto que ele recebeu.
- É possível que ele já esteja longe daqui.
- Não com o ferimento que ele tem.
Os dois agentes, um atrás do outro, especulavam sobre o destino do fugitivo. E a cada passo que davam floresta adentro, mais escuro ficava e as lanternas já não davam conta do recado. Tentavam identificar os rastros deixados, que não lembravam nem pegadas humanas, tampouco de algum animal. Uma grande touceira de mato amassado, galhos quebrados e um cheiro de carniça horrível.
- Pode ser uma vaca ou algo grande...
- O que diabos uma vaca estaria fazendo numa floresta?
- Ah, sei lá... Talvez queria mudar de ares... – Valentin, que estava atrás respondeu inocente.
- Se continuar falando besteira, você é que vai mudar de ares e não será nada agradável – Raymond abaixou-se para melhor analisar aquele rastro tão incomum.
Ao abaixar-se ouviu um barulho atrás dele, supondo que era seu parceiro. Levantou-se, olhando para trás, e não havia sinal do colega. De repente o mesmo silêncio de horas antes apareceu. O homem sentiu que algo estava errado, já que até os grilos se calaram. Empunhou a arma, atento ao redor.
Hey, isso não é hora para brincadeiras! – Voltou alguns metros, ouvindo barulhos como se fossem passos, mas acima de sua cabeça.
A floresta abrigava os mais diversos tipos de vegetação, incluindo grandes carvalhos antigos com copas a perder de vista.
Raymond sentiu algo úmido em seu nariz. "Deve ser orvalho das folhas", pensou. Mas o cheiro era bem diferente de água que, aliás, não deve ter cheiro. Passou o dorso da mão que segurava a arma e, quando iluminou, realmente sentiu medo do lugar. Era sangue que vinha de algum lugar lá em cima.
Jogou o feixe de luz nas copas das árvores e encontrou entre os galhos, pendurado sem as pernas, seu colega de trabalho.
Aterrorizado, saiu cambaleando com os passos trocados, escorregando nas folhas úmidas pelo sangue fresco que gotejava das pernas de Valentin. Caiu de costas na pequena poça que se formou, levantou-se como pôde e correu sem direção. Sabia desde o começo da noite que alguma coisa ruim aconteceria com eles...
- Chefe, precisamos de ajuda! – Raymond gritava, apertando o botão do comunicador. Não largara nem a lanterna nem sua arma, mas havia se esquecido de tudo o que sabia sobre controle de pânico em situações de perigo. Afinal, aquele medo era sobrenatural.
- Droga, será que você não sabe fazer seu trabalho? – A voz de Victor misturada à estática respondia do outro lado.
- Chefe, Valentin está morto!
- O quê?
E todo esse terror o impediu de esclarecer o fato ao seu chefe, e identificar a alguns passos o que o esperava.
- Não estou te ouvindo, repita, seu imbecil!
E a resposta que ouviu foi um estrondo, seguido de estática.
- Victor, me solte, me deixe ajudá-los, eles correm perigo! – Após ouvir o pedido de socorro de Raymond a detetive confirmou o que seu instinto já lhe mostrara.
- Ah, Rood, deixe de ser dramática. No máximo ele achou o rastro do bandido e quer reforço! - Victor pegou uma pequena lanterna e mais alguns objetos no porta-luvas, disposto a atender o chamado de ajuda do colega. Porém nunca daria o braço a torcer na frente da detetive, pois teve também um mau pressentimento ao ouvir a voz de pânico de seu subordinado, que não atendeu aos outros chamados do comunicador.
- Hey, vai me deixar aqui sozinha neste ermo de mundo?
- Ah, vai me dizer que está com medo, logo você?! Vou sim, e espero que se comporte bem! – Victor travava as portas que não podiam ser abertas por dentro, deixando Valery presa no carro blindado e rapidamente caminhou floresta adentro.
- Maravilha!... – A detetive soltou um suspiro. Estava sozinha no escuro, algemada e ainda um pouco tonta.
Porém o fato de estar sozinha dava mais liberdade de fazer o que pretendia há algumas horas.
Habilmente deitou-se de costas no banco, tentando se esticar ao máximo. Aquilo faria seus músculos relaxarem o suficiente para que pudesse se encolher e passar suas pernas por entre os braços, unidos pelas algemas. Respirando lentamente, concentrou-se e virou-se de lado para realizar a manobra.
"- E viva as aulas de ioga!" – Pensou. Em segundos ela conseguiu passar as pernas, agora ficando com as mãos à sua frente.
Só um problema: realmente aqueles carros não podiam ser abertos por dentro, além de blindados. Quebrar o vidro, fora de cogitação.
" - Maravilha, Rood... Agora vê se sai dessa! Livrar seu traseiro e os dos seus colegas de agência!" – A detetive ainda pensava com dificuldade.
Mesmo com a lanterna Victor não conseguia enxergar muito bem. Esbarrava e se arranhava entre os galhos das árvores, ofegante, sem saber que direção tomar. Seus agentes eram treinados, mas não tanto quanto ele a ponto de saber deixar pistas de onde estiveram.
Caminhou rumo ao oeste, a mesma direção que a estrada os levariam à Califórnia. O amontoado de árvores visto de fora não parecia ser tão grande quanto era por dentro...
Ele também pôde experimentar o cheiro forte de carne podre que dominava o ambiente. Isso dificultava um pouco seu poder de raciocínio para encontrar seus homens e o fugitivo.
- Onde vocês estão, seus idiotas?! – Victor falava como se eles pudessem ouvi-lo.
De repente tropeçou em algo grande, macio e molhado. Só percebeu o que era quando jogou o feixe de luz em cima. Era um corpo sem um dos braços e cabeça, vestido com um tecido na cor laranja.
-Quem ou o quê pode ter feito um negócio desses?! – Victor abaixava-se para ver melhor o estrago. Nunca viu nada parecido. Poderia ser um urso, mas nunca ouviu nenhum relato de ursos naquela região.
Enquanto conjecturava, novamente os sons da floresta silenciaram.
Durante os minutos que se passaram como horas, a detetive só pensava nos perigos que aquela floresta escura poderia oferecer aos agentes. Dada a sua experiência, nunca entraria despreparada num local daqueles, ainda mais desconhecendo o que poderia existir lá dentro. Pensamentos contraditórios a tentavam: dar no pé e salvar a própria pele ou aventurar-se na floresta em socorro aos federais?
Bem, sua honra de caçadora falaria mais alto, certamente.
Enquanto sua mente viajava, nem percebeu que a alguns metros atrás de onde estavam uma Pick-Up preta parou, e alguém desceu dela e se aproximou de onde estava.
O homem com cabelos longos, de rifle em punho, se aproximou um pouco mais, sorrateiramente, para ver quem estava dentro daquele carro. Percebeu que uma mulher estava lá dentro, aparentemente precisando de ajuda.
- Cara, me tira daqui!
- Se meteu em encrencas, moça? - Usando uma pequena lanterna o homem iluminou por dentro do carro, certificando-se de que só a tal moça estaria lá dentro, aparentemente não oferecendo grande perigo.
- Cara, por favor, abre essa porta! – A detetive, impaciente, batia na janela.
- Bom, pra estar aí presa num carro oficial algemada, deve ter feito por merecer...
- E quem você pensa que é pra me julgar? Deus? – Valery tentava ver quem era seu salvador, ou na pior das hipóteses, seu algoz.
- Moça, definitivamente você não está em posição de reclamar sobre nada...
- É, já ouvi isso hoje... Espere um momento... – Tentou ao máximo se aproveitar da pouca luminosidade – Brooke? Brooke McCarter?
O homem franziu a testa, abaixando sutilmente a sua arma. Por um segundo mudou de idéia, estranhando que aquela moça o reconhecesse.
- Quem é você e como sabe meu nome?
- Brooke, sou eu! – A detetive espalmou suas mãos no vidro, já com um sorriso de alívio.
- Você, quem? Como me conhece?! – Desta vez era Brooke quem estava desconfiado e impaciente.
- Brooke, é Valery! Valery Rood, sobrinha de Jack Rood, de Austin...
Em instantes a feição do caçador de meia-idade pareceu mais tranqüila.
- Da última vez que eu te vi você era uma pirralha pentelha metida a ser caçadora como seu pai e seu tio – Já mais calmo, circundava o veículo pensando em como a livraria dali.
- Como pode ver, cresci e progredi... – Ela levantou os pulsos algemados, sorrindo em tom de deboche.
