Um não tão breve "vamu lá!": Alguém vê Naruto? Se vê, pule esta parte. O título é um ditado clássico dito pelo nosso querido Pakkun no ano do Cachorro. É, aliás, um ditado bem popular no Japão. Pra quem não viu, entretanto, fica complicado. Então, como uma boa menina (tosse), eu explico. "Buta ni shinjyu" significa, em poucas palavras, "Pérolas para o porco". Ok, e qual é o significado disso, escritora cretina? Basicamente, significa que até mesmo as coisas mais preciosas não significam nada à quem não entende seu valor ou que não podemos transformar um porco em pérolas (isso tá na cara o que significa, né?). Especialmente esta segunda resume bem o espírito desta história.
Então, vamos ao que interessa...
Porém, antes do "bem bom": "Saint Seiya" não pertence à mim, porque se me pertencesse, eu certamente não estaria aqui, e sim, estaria indo receber meu Prêmio Nobel. De qualquer forma, ele pertence à Masami Kurumada, (in)felizmente, e aos devidos licenciados, onde, (in)felizmente novamente, não estou incluída.
Agora vamos...
Breve interrupção, mas que continua sendo uma: Dedicatórias! Faz tempo que não dedico fics. Então, vamos por ordem. À todos aqueles que gostam de nosso querido Ikki e nossa querida Esmeralda, e ainda mais quando eles ficam juntos... Não é meigo? Tá, se você diz isso, pode considerar-se incluso nesta parte. Especialmente, preciso dedicar à Fênix e à Erika, porque elas se revelaram (no bom sentido), e eu sempre dedico à leitores que se revelam. XD Depois, também faço a devida dedicação à Akane Kittsune, que brevemente tá de aniversário e esta escritora cretina não fez nada ainda. Aliás... Também às fãs ardorosas de Ikki que eu conheço: Arthemisys e Esmeralda Amamiya. Agora, feito os disclaimers e as dedicatórias, me despeço.
Sem mais interrupções (espero)...
Buta
ni Shinjyu
Petit
Ange
"(...) A dor chamava constantemente sua atenção, não para lhe fazer tomar providência, mas simplesmente para fazer-lhe olhar direto em seu rosto e, sem poder fazer nada, sofrer."
Trecho de 'A Morte de Ivan Ilych', Tolstoi.
Prólogo: Reminiscências.
Esmeralda Dias era a quinta filha de uma família de classe baixa. A mãe trabalhava em casa, e estava quase sempre grávida. Quando não estava, era porquê foi espancada até abortar. A senhora Dias sempre dizia que a garota foi um verdadeiro milagre (mais tarde, Esmeralda iria compreender o verdadeiro sentido desta frase), uma vez que, quando esteve grávida dela, seu corpo sofreu diversos abusos.
A garotinha de quase quatro quilos nasceu saudável e em casa. A senhora Dias quase morrera de esforço, mas destarte o mesmo, sentiu-se parcialmente feliz pela vinda de mais uma filha para complementar sua vida vazia. A irmã mais velha de Esmeralda, que nascera antes dela, havia morrido devido à algumas complicações de sua meningite bacteriana (o médico havia dito-lhe isso na necropsia), e quando seu bebê de louros cabelos nasceu, algo nela disse que a pequena podia substituir sua querida Lúcia.
Porém, nem tudo correu como o desejado para aquela pequena, que mal teve a devida atenção. Logo, vieram outros e outros, e Esmeralda deixou de ser a caçula. Parecia que a vida da senhora Dias era eternamente ser violentada sem pudor algum e fisicamente por seu marido Guilty. El temido Guilty.
Não era apenas sua esposa o alvo. Seus filhos também, a qualquer desagrado. Não foram poucos os filhos que apanharam até urinarem em suas calças, até ficarem com o olho totalmente inchado, ou no caso de seu irmão menor Hector, até quebrar um braço. E o que irritava a pobre senhora Dias era que ela dependia del temido para sobreviver. Não viera de família rica, ela conseguia, aliás, ser ainda mais miserável. Casar com Guilty foi praticamente encontrar uma mina de ouro.
Esmeralda foi crescendo e aprendendo isso com o tempo. Tinha os cabelos loiros da mãe e o queixo do pai. Sua mãe dizia que seus olhos eram da mesma cor dos de sua avó. Aliás, ela dizia que seu temperamento latino também era herança da mãe de sua mãe. As duas, apesar de toda a dor, tentavam rir, e mesmo na maioria das vezes não conseguindo, de vez em quando, arrancavam um riso da outra.
Nunca foi uma, nem duas. Raras eram as vezes em que a garota não presenciava o pai voltar tarde e podre de bêbado. Às vezes, ele até trazia outras mulheres com ele, e era como se sua esposa sequer existisse. A senhora Dias chorava baixinho em algum canto esquecido, e Esmeralda tencionava socar el temido até não ter mais forças. Mas era sempre o contrário, e seus hematomas lembravam-na sempre disto.
Parecia que sua vida seria fadada a ver irmãos morrerem ou sua mãe sendo espancada. Entretanto, as coisas viraram do avesso.
Numa abafada tarde de Novembro, o pai chegou em casa de repente. Junto dele, havia outro homem, tão mal encarado quanto o parente. Os dois cheiravam à bebida e suor (dois cheiros que Esmeralda simplesmente repudiava com toda a força de sua existência) e falavam coisas estranhas com sorrisos tortos.
Ela teve medo daquilo. Não soube porquê, mas teve medo daquilo. A maioria dos seus irmãos estava na rua, e ela sempre era escalada para a limpeza da casa. Os mais velhos sumiam de casa cedo, e muitos dos primogênitos já não moravam mais ali. Viravam qualquer coisa, tudo para não permanecerem ali.
-"Mas e então? Quanto é?"
-"O preço é bom, e se for carne nueva, o preço fica ainda melhor." – o homem estranho e moreno parecia ainda mais assustador que seu pai quando disse aquilo.
-"Não tenho dúvidas que é. A putinha é boa." – seu pai bebericou no gargalo mais do líquido que descansava naquela garrafa que segurava na sua mão.
-"E antes que tente, nem adianta tentar barganhar comigo, Guilty." – ele bebeu um pouco mais. –"O Rivera só dá esse valor fixo e pronto. Se for carne nueva, até dá um bônus, mas não é muita coisa."
-"No te preocupes." – a voz de Guilty era entrecortada por longas tragadas e o som da bebida descendo por sua garganta. –"Quando precisar, tem mais de onde veio."
-"Se é assim... A venda tá feita?"
-"Desde o começo."
Os dois homens começaram a rir escandalosamente, como se tivessem ganhado na loteria. Esmeralda suspirou, e no íntimo de seu ser, chegou a sentir inveja. Eles riam animadamente, e ela estava ali, silenciosa, umedecendo o pano que colocara sobre o inchado na cabeça de sua mãe.
Ainda lembrava-se que, na noite anterior, houvera uma discussão ferrenha entre ambos, que culminou em violência pura. Foi necessário muito empenho dela e dos pequenos. Imploraram tão fervorosamente quanto os pais brigavam para que Guilty parasse com aquilo. E quando ela foi chutada no estômago, e ele por fim deixou a casa, mesmo com dor, a alegria foi bem maior.
Eram estas pequenas vitórias que a alegravam. Não a ponto de fazer brotar um sorriso em seu rosto, mas eram, ainda sim, alegrias.
-"Ô, Esmeralda! Vem cá, chica imprestável!"
A garota estremeceu quando seu pai gritou-lhe aquilo. Chegou a quase deixar cair o pano, indevidamente, no travesseiro, mas agilmente colocou-o na testa arroxeada da progenitora e deixou o recinto com pressa. Tudo o que menos queria era mais complicação com seu pai por não atender seu chamado.
-"Pois não, pai?" – perguntou docilmente, forçando um sorrisinho para o visitante, quando chegou perto da mesa.
-"Esse aqui é o Jango." – ele indicou o companheiro de cheiro de cachaça com a garrafa da mesma, e seu rosto era amargo. –"Cumprimenta."
-"Boa tarde, señor Jango."
-"Oi, niña. Como se chama?" – o visitante, a despeito de sua aparência horrível, tinha um sorriso cordial.
-"Esmeralda, señor."
-"Bonito nome o seu, sabia?"
-"Obrigada."
Toda aquela situação, em sua cabeça de criança, parecia surreal demais. Ela sabia que aquela pessoa oferecia-lhe risco total e que, de alguma forma, iria fazer-lhe algum tipo de mal. Não sabia o que, mas sabia que seria ele. Não ia ser seu pai. Apesar dos olhos cheios de malícia e ódio, Esmeralda sentia que seu pai só ia impulsionar. Não ia mais tocar nela.
E sendo assim, ela não sabia se chorava ou ria. Se abraçava ou temia o tal señor Jango por ele livrá-la da incômoda sensação de ser constantemente perseguida pelo medo de uma nova agressão daquele homem corpulento e moreno, com seus tão assustadores olhos castanhos.
-"Essa aí é a putinha. Dê uma olhada e vê se é do seu agrado."
O homem de tez morena parou de olhar para Guilty ou para a janela do pequeno casebre, e concentrou-se na menina. Uma corrente elétrica serpenteou seu corpinho pálido, e a pequena nunca soube dizer se o que veio a seguir foi um frio na barriga ou uma ânsia de vômito.
Seus olhos perscrutavam cada pedaço do corpo dela. De cima a baixo. Pés, joelhos, coxas, ventre, barriga, peito, braços, ombros, pescoço e por fim, seu rosto. Nada passou despercebido diante daqueles olhos rápidos e tão acostumados. Ele esboçou um brilho no olhar e um pequeno e quase imperceptível risinho que beirava o irônico e o satisfeito. Um riso que, mais uma vez, despertou alerta nela.
-"Mira, que guapa! Guilty, é uma linda filha a sua!" – ele riu, bebendo como seu anfitrião de sua própria garrafa de bebida.
-"Um pouco velha demais para a idade geral, mas acho que pode ser de valia."
-"E vai... Uma menininha bonitinha assim a gente perdoa. O Rivera vai adorar ver isso, pode apostar!" – comemorava Jango.
-"Eu disse que não ia se arrepender. Pelo menos nisso, a desgraçada da minha esposa dá uma dentro, né?" – riu. E Jango acompanhou-o no riso. E aquilo irritou profundamente a pequena, mas nada pôde fazer, senão permanecer com aquele rosto alerta e seus pés trêmulos.
-"Não podia esperar melhor! Eu aceito."
Dizendo isso, ele ergue-se da cadeira e olha diretamente aquele homem. Ri tortamente outra vez, e remexe em seus bolsos da calça jeans surrada e cheirando a terra e suor. De um dos bolsos da frente, tira um maço de coisas que Esmeralda identificou prontamente como dinheiro.
Seus olhos verdes baixaram ao chão, e ela engoliu em seco. Ouviu o som de mãos tocando aquele maço, e sua mente formulou a certa teoria de que seu pai quem havia pego-o agora. Quando teve coragem de erguer o olhar, viu-se certa: Guilty contava animadamente quanto havia ganho, enquanto Jango ajeitava suas roupas.
-"É isso? Sem mais nenhuma burocracia?"
-"Absolutamente nada. Seja feliz com seu dinheiro, Guilty el temido."
-"Vou sentir falta de você. Apareça outro dia por aqui, como eu disse, sempre há um oásis em tempos de seca." – riu com sarcasmo.
-"Você e suas piadas..." – o outro permitiu-se rir também.
Esmeralda continuava olhando-os, um pouco apreensiva. Queria murmurar uma pergunta acerca seu destino, o destino daquele dinheiro ou o que os olhares incessantes em sua direção tinham a ver com o mesmo. Mas também temia a resposta. Sentia, no fundo de seu coração, que se ouvisse a resposta para aquelas perguntas, ia decepcionar-se, chorar muito, ou quem sabe coisa pior. Respirou fundo e procurou acalmar-se.
-"O que tá olhando, chica cretina?!" – Guilty fuzilou-a com seus olhos ferozes.
-"N... Nada, pai... Nada..." – imediatamente ela baixou-os outra vez.
-"Esmeralda, minha niña. Erga seus olhos, quero olhá-la mais uma vez." – a voz de Jango ecoou em seus ouvidos, preenchendo-os, fazendo-a esquecer do assustador silêncio que sempre criava-se quando seu pai mandava-a calar-se ou dignava-lhe alguma palavra (que sempre eram duras).
A garota ergueu-os e o que viu nos olhos escuros do homem não foi reconfortante. Ela diria até que foi perturbador. Não viu mais a gentileza e nem o sorriso. Viu apenas um rosto indiferente, analisador, que parecia fazer aquilo milhares de vezes. Não parecia mais vê-la como uma pessoa.
-"Señor...?" – perguntou-se, assustada.
-"Guilty, eu vou indo. A garotinha dos olhos verdes vem comigo."
-"Pode ir. Te pago eu uma bebida na próxima." – o pai dela estava ocupado demais e compenetrado demais contando o dinheiro que recebera, com um indisfarçável sorriso de alívio no rosto.
-"Pa... Pai... O que você..."
-"Vamos, niña, não se debata." – Jango pedia com calma, puxando-a pelo braço.
A força do puxão daquele homem fez Esmeralda ser arremessada para frente, numa caminhada sem tréguas. As pernas dele eram compridas, e ela não era tão alta assim, apesar da idade, e precisava dar passadas largas para acompanhá-lo. Sentia que ele ia partir seu braço em dois, o apertão era forte demais.
-"Pa... Pai...! Pai, o que está fazendo...?" – ela implorava, e lágrimas começavam a pular-lhes dos olhos. –"Mãe...! Mamãe!"
Toda a impressão que ela teve antes, daquele sorriso cordial, foi-se embora. Ficou só a imagem do riso impessoal e daqueles passos que dava sem parar, caminhando para fora, deixando a casa, ignorando os protestos e lágrimas dela. Todo e qualquer esforço que ela empreendia em livrar-se daquelas mãos era facilmente anulado pela força calma que ele aplicava.
-"Mujer! Veja isso!" – ouvia a voz do pai ao longe. –"Esmeralda finalmente foi útil em alguma coisa!"
Os dois caminharam por menos de cinco minutos, e chegaram na frente de uma casa velha e caindo aos pedaços. Quase todas as casas daquela região eram assim, refletindo o caráter de seus moradores, totalmente acabadas e jogadas ao que lhes vier, seja isto bom o u ruim, mas aquela, ela conhecia, era abandonada, e assim, ainda mais largada às traças ou ao destino que a levasse.
Havia um furgão na frente daquela casa. Tinha janelas escuras, ela não conseguia ver o que havia dentro dele. Mas ele estava ligado, e havia um cotovelo masculino no lugar do motorista. Isto a fez ver que havia alguém esperando Jango lá dentro. E, pela aparência daquele braço, parecia ser um homem repulsivo.
-"Esmeralda, minha niña, vamos conhecer o señor Rivera?"
-"Não... Por favor, deixe-me voltar...!" – implorava a pequena, com as lágrimas maculando-lhe o frágil rosto. –"Quero minha mãe... Me deixe voltar, señor..."
-"Não me desagrade, niña. Entre no carro e não discuta comigo." – a voz dele era indubitavelmente calma. –"Agora, entre no carro."
Dizendo isso, ele abriu a traseira do furgão, e deixou seu conteúdo ser mostrado. O que preenchia aquilo eram várias e várias meninas, e até alguns meninos. Todos pareciam até mais novos que ela, e alguns eram muito baixinhos. Todos tinham estampados em seus rostinhos sujos e redondos o medo, o receio, e até uma certa raiva. Assim como ela.
Será que Jango também negociou com seus pais? Será que segurou-lhes o braço como fez com ela, e calmamente arrastou-lhes até ali? Aquelas crianças choravam baixinho, assim como ela, e quando Esmeralda viu-as, sua alma soube então que não tinha mais jeito. Estava perdida, como eles.
-"Date prisa, menina! Entre!"
-"Sim..." – foi tudo que seu ânimo permitiu que ela dissesse.
Esmeralda entrou no furgão e, atrás de si, ouviu a porta ser rudemente fechada. Alguns passos, e em seguida, viu o homem de pele morena entrar pela porta da frente e sentar-se no banco do lado do motorista. Eles trocaram algumas palavras e riram, e ao término da risada, o motorista (que tinha a face nojenta que Esmeralda imaginou que tivesse) lhe ofereceu um cigarro, prontamente aceitado pelo companheiro.
-"Senta, menina." – uma vozinha murmurou-lhe, acordando-lhe daqueles pensamentos e conjeturas tão desagradáveis.
-"É mesmo. Senta, ou eles vão se zangar." – outra voz, desta vez de um menininho, reforçou aquele aviso.
-"Sim. Desculpa..."
Com o olhar baixo, puxando o vestido rosado e velho da terra batida de seu antigo lar nervosamente o quanto conseguisse, ela mordeu o lábio inferior enquanto sentava-se, espremendo-se no meio daqueles pequeninos.
Aos seus treze, quase quatorze anos, a vida de Esmeralda pareceu-lhe mais negra do que nunca.
Continua...
