Quanto tempo aquilo iria durar?
Duas figuras encapuzadas estavam inertes, rentes à janela. Uma terceira postava-se a frente de um corpo, ainda vivo. Os cabelos castanhos voavam lentamente. Seria uma cena bonita, se não fosse trágica. Algum feitiço a mantinha flutuando a centímetros do chão. O rosto estava cortado. A ferida mais recente, em seu lábio inferior, ainda sangrava. Não havia mais o que Emmeline Vance pudesse fazer, a não ser esperar a sua morte.
O fato é que ela nunca pensara sobre como iria morrer. Quando se é jovem, o futuro é incerto, mas sempre parece que tudo vai dar certo. Hoje ela sabia que tinha sido consagrada com o infeliz azar de jamais saber como seria o tal futuro. Por que não acabam com isso de uma vez? Era a única coisa em que conseguia pensar. Seus cortes ardiam. A dor era incessante. O cérebro já mergulhava num estágio pré-insanidade. Alguma parte sã trouxe-lhe à memória as imagens de Frank e Alice Longbottom na ala hospitalar do St. Mungus. Loucura.
James e Lily Potter. Sirius Black e Remus Lupin. Os McKinnon. Dorcas Meadowes. Todos os seus amigos. Todos mortos, surgindo em sua mente com pequenas lembranças. Risos numa manhã clara de domingo. Os jogos de quadribol. A formatura. E por fim, todos eles de novo. Nada além de espectros luminosos. Mas parece tudo tão real. As mesmas vozes que ela escutou durante quase toda a sua vida. As vozes conhecidas, que ela daria qualquer coisa para ouvi-las mais uma vez. Talvez seu último desejo estivesse sendo realizado.
Diga-nos o que queremos, Vance, e pouparemos você. Não. Ela não iria dizer. Mais lembranças de épocas boas, em que tudo parecia tão fácil. Por que não podia ser sempre assim? Emmeline sempre se apegou ao que ela gostava. Mudanças não eram de seu feitio. Crucio. O que ele estava dizendo mesmo? Podia ver uma fresta do sorriso dele pelos olhos semicerrados. Seu torturante retirara a máscara, mas ela não saberia dizer de quem se tratava. Tudo era confuso demais. Crucio.
O feitiço não lhe fazia mais efeito. Não podia. Todo o seu corpo doía, tinha a ligeira impressão de que seu crânio poderia rachar ao mínimo toque. Emmeline era forte. Não de força muscular. Ela sabia controlar suas emoções. Tentou manter-se sã o quanto pode, mas algo tornava aquilo quase impossível. Venha, Emme. Não era a voz do comensal. Parecia a voz de Lily. Autoritária, mas calma. Então, a imagem de um gramado verde mostrou-lhe que estava certa. Lily estendia a mão para ela. Ao seu lado, James e todos os outros sorriam. Parecia que queriam dizer o mesmo. Venha, Emme.
Emmeline não tinha medos. Só medo de morrer. De perder seus amigos, sua família. E então, lembrou-se que todos já tinham ido, só esperavam por ela. Ela realmente nunca pensou em como iria morrer, muito menos se seria morta por alguém. Assumiu o risco e pagou o preço. Se valeu a pena? Ela podia dizer que sim. Morreu defendendo o que mais prezava. Todos aqueles a quem ela prometera lealdade. Cumpriu sua promessa até o fim. De repente, viu o comensal. Algo lhe dizia que sua hora finalmente chegara.
Tinha medo de morrer porque se apegara demais a vida. Eu não vou morrer, eu vou viver pra sempre, como eu sempre quis. Sorriu. Aquele sorriso à lá Emmeline Vance, que a fazia fechar por completo os olhos. Uma ventania mais forte. Um lampejo verde. Um estrondo de algo pesado caindo no chão, ao lado da lareira do que, em vida, fora sua casa. Ela esticou sua mão para Lily, e quase que automaticamente, o resto veio abraçá-la. E, de repente, tudo sumiu. Ela foi viver para sempre, em outro lugar melhor.
