Aleatoriamente

Era o último dia antes do feriado de Natal, vários alunos faziam as malas para voltar para casa durante esse período e alguns outros ficariam na escola por motivos diversos. Para a monitora do sexto ano de Slytherin, que já estava com as malas prontas, era mais um dia comum. A garota entrou no banheiro, mais para verificar os cabelos e retocar o batom, quando ouviu alguém soluçando de dentro de uma das cabines. Como não estava no banheiro do segundo andar, habitat de uma fantasma chorona, ela foi verificar e encontrou uma garotinha que parecia ser do primeiro ou segundo ano com o rosto escondido nas mãos.

- Ei. – A monitora bateu na porta aberta para chamar a atenção da menina. – Está tudo bem?

A menina levantou o rosto e enxugou as lágrimas. A mais velha não a reconheceu, não fazia ideia de qual casa ela seria.

- S-Sim. Não é nada, está tudo bem.

- É por isso que você está chorando? Por que não aconteceu nada? Escuta, se tem alguém te importunando, é melhor me falar. Sou monitora, posso dar um jeito.

A mais nova fungou e enxugou os olhos mais uma vez.

- Eu... Eu briguei com a minha irmã e ela não me quer em casa para o Natal.

A monitora ajeitou uma mecha dos cabelos loiros atrás da orelha e passou a prestar atenção na garotinha.

- Problemas com a família, então. Não se preocupe tanto, essas coisas acontecem.

- Mas... Mas nós éramos tão amigas...

- Isso não significa muita coisa.

- E somos irmãs...

- Também não significa muita coisa.

A menina olhou indignada para a outra.

- Como assim não significa nada? É a minha família, é claro que significa!

A mais velha suspirou.

- Eu também acreditava nisso quando eu tinha a sua idade.

A mais nova olhou com curiosidade, aguardando.

- Olha. – A outra continuou. – Supera isso enquanto ainda é cedo. Você não é a única com esse tipo de problema aqui.

- Você...

- É. – Ela revirou os olhos. – Imagine que você é muito amiga da sua irmã, o que não é tão difícil, porque parece que você era mesmo.

A menina apenas confirmou com a cabeça, esperando a continuação.

- Vocês são da mesma casa na escola, passam muito tempo juntas. Você já tinha até pensado em chamá-la para ser sua madrinha de casamento. De repente, ela te abandona. Sai de casa, vai embora para nunca mais voltar.

A garotinha cobriu a boca com as mãos.

- Ela foi embora?

- Sim. Deixou a família para trás, incluindo as irmãs. Incluindo eu mesma.

A mais velha continuava séria, mas disfarçou a voz um pouco embargada no final da frase.

- E vocês nunca mais se viram?

- Não. A última vez que vi minha irmã foi no início das férias de verão, logo depois que ela se formou.

As duas ficaram em silêncio. A mais nova olhava com interesse para a monitora, que tinha o olhar perdido em algum ponto da parede. Mil coisas passavam pela cabeça da menina.

- Mas... Não tem chance dela se arrepender e voltar?

- Não. – A loira deu um sorriso triste. – Você ainda é muito jovem, mas vai descobrir que algumas coisas não tem volta. E também, eu não acho que ela vá se arrepender.

Mais um momento de silêncio, quebrado pouco depois pela menor.

- Então... O que eu deveria fazer?

- Você segue a sua vida, oras. Não seja uma dessas que vira as costas para a família, para o seu nome. – Ela suspirou. – Maçãs podres podem aparecer em qualquer família.

- Não sei se seria o caso. – A garotinha entrelaçou os dedos, sem graça. – Parece que ela não gosta mais de mim.

A monitora levantou uma sobrancelha, curiosa.

- Por que não?

- Porque eu sou...

Nesse momento, a mais nova foi bruscamente interrompida por um grupo de garotas mais velhas que abriu a porta do banheiro e foi na direção da garota loira, todas tentando falar ao mesmo tempo.

- Black, você não vai acreditar no que o seu primo fez!

- Corre para ver, acho que dessa vez você consegue deixá-lo de detenção até o ano que vem!

- É, ele e aquele amigo dele, de novo!

A monitora riu, ajeitando o cabelo.

- Então, o que estão esperando para me levar até lá? – Ela deu uma última olhada na garotinha. – Tenho que ir, serviços de monitora. Se cuida, ok?

A menina fez um aceno afirmativo com a cabeça antes do grupo de sextanistas sair do banheiro.

- Quem é aquela? – Uma das garotas perguntou. – É de qual casa?

- Não sei. Estava chorando no banheiro, problemas de família. Dei uma assistência.

- É, de problemas de família você entende, né?

- Cale a boca e me leve logo para onde meu primo está fazendo baderna.

No banheiro, a garotinha que antes chorava se olhou no espelho e ajeitou os cabelos acaju, pensando no que aquela monitora havia dito. Ela parecia ainda estar ressentida com o que acontecera. O que será que teria levado a irmã dela a ir embora? Imaginou se ela mesma teria que ir embora um dia, uma vez que, no seu caso, ela parecia ser a maçã podre no cesto. Ela era a diferente. Única bruxa na família. Ela balançou a cabeça, pensando que talvez a monitora estivesse certa. Essas coisas acontecem, o que se pode fazer é superar e seguir em frente com a vida.

A menina de cabelos acaju não se encontrou novamente com aquela monitora, apenas a viu de longe algumas vezes. Não se falaram mais. Eram de casas diferentes e a mais velha não parecia notar muito os alunos mais jovens, exceto quando faziam algo que merecia algum castigo. A mais jovem seguiu o conselho, de tentar superar e seguir em frente, mas alguma marca fica para trás. E ela tinha certeza de que aquela monitora também ficara marcada, ainda que não mostrasse. Bom, a menina pensou, essas coisas a gente não costuma mostrar mesmo.

N/A: Escrevi essa fic para o JP Prado de presente de amigo oculto de Natal. Espero que tenha dado pra reparar que as meninas são a Lily e a Narcissa.