Disclaimer: Não, o The GazettE não me pertence. Eles pertencem a eles mesmos, à Sony e a PSC. O que é descrito na fanfic não aconteceu de verdade e essa história não tem fins lucrativos.

Sinopse: Quando Uruha se recupera e volta à banda após o acidente que quase o matou, é a hora de todos tentarem consertar seus erros, especialmente Aoi que ao descobrir o amor pelo loiro precisa correr contra o tempo se quiser viver essa história.

Notas: Esta é a prometida continuação da fic "Por um Fio". Não que alguém tenha me cobrado algo, mas desde que escrevi o final de "Por um Fio" eu já tinha esse plano em mente.

Notas II: Betado por Samantha Tiger e praticamente escrito à quatro mãos. Valeu dona Coisa!


EQUILÍBRIO

Capítulo 1. A solidão como porto seguro

O jovem loiro estava sentado em frente a TV, sem parecer ter muito interesse naquilo que a programação lhe oferecia. Na prática, estava ali por estar. Não sentia a menor vontade de fazer qualquer coisa e isso era algo recorrente nos últimos tempos.

Talvez fosse efeito dos remédios... Ou quem sabe da própria pancada na cabeça. Era comum que a personalidade de personagens de livros e filmes mudasse depois de um acidente, não? Vontades, desejos, planos, comportamento... Eram grandes as possibilidades, mas não tinha ilusões a respeito. Talvez fosse a depressão, sua velha companheira, querendo se manifestar novamente.

Talvez ela se sentisse traída, afinal estava tentando traí-la. Evitar sua presença. Não que adiantasse muito, mas ainda tentava. Sabia por experiência própria que não dava pra simplesmente ir contra a maré quando tudo parecia de alguma forma predestinado. Todos os acontecimentos de uma vez... Era difícil lidar com isso, mesmo que aparentemente as coisas estivessem mudando.

Aparentemente, porque não queria criar falsas expectativas. As coisas estavam sim ficando mais leves, porém poderia ser apenas uma questão de tempo para que se revelassem novamente. Talvez o acidente lhes tivesse assustado e feito com que apenas abrandassem todas as supostas verdades sobre si até que estivesse plenamente recuperado.

Ainda não era a hora pra isso. Talvez demorasse um pouco afinal ainda era obrigado a tomar remédios. Os médicos diziam que seu organismo ainda estava debilitado pelas infecções e que ainda precisava se cuidar mesmo estando fora do hospital e principalmente do período de repouso absoluto. Pediram cautela antes que retomasse a vida de astro do rock e era isso que estava fazendo.

Astro do rock... Pois sim. Um astro do rock de verdade estaria dirigindo embriagado enquanto assediava sexualmente a pessoa que estivesse sentada no banco do passageiro e teria provocado o próprio acidente no qual teria morrido na hora. Com isso seria elevado à categoria de ídolo máximo, talentoso e revolucionário que deixara a vida cedo demais. Melhor um acidente de carro que a ideia nojenta de morrer sufocado pelo próprio vômito... Porém seria reverenciado do mesmo jeito.

Ou quem sabe dirigindo embriagado, assediando sexualmente fosse lá quem fosse que estivesse no banco dos passageiros, entrado na contramão apenas pela emoção de transgredir as regras, bater de frente em um caminhão e morrer por se sufocar com o próprio vômito, expelido na colisão antes que o veículo explodisse em uma grande bola de fogo do qual nada restasse.

Quantas ideias tolas... Quantos estereótipos fantasiosos, porém seria uma forma de se livrar do inferno.

Ultimamente a vida de Takashima Kouyou era o total oposto do mar de rosas que talvez as pessoas gostassem de imaginar. Não que algum dia já não houvesse sido, mas se agora os fãs soubessem o que estavam passando talvez pensassem bem antes de fazer loucuras por um pouco de fama e se permitissem aceitar o fato de que a normalidade e o anonimato poderiam ser benéficos.

"Nem pra morrer como um verdadeiro astro do rock..."

O loiro riu ao pensar nisso. Era realmente degradante.

Não que enquanto estivesse naquele carro houvesse pensado em suicídio. Embora naqueles últimos tempos realmente houvesse acalentado um pouco tal ideia, não se via com coragem o bastante para tal. Porém, não imaginava que um caminhão desgovernado fosse aparecer do nada no seu caminho. Talvez um bom simbolismo para representar como se sentia quanto àqueles últimos tempos que colocara tudo de pernas pro ar.

Quantas vezes não havia pensado em algo diferente, em como seria sua vida se pudesse voltar no tempo... Não que estivesse arrependido por seu sonho de estar em uma banda e vencer na música. Seu erro era bem mais próximo do que isso...

O que estava pensando afinal quando beijara Aoi em pleno live?

Tudo bem, não fora lá grande coisa, mas também não era um fan service mais ousado, o que certamente lhe daria uma justificativa válida. De fato algo irresistível lhe atraíra para aquela loucura, uma atração que guardava há muito tempo, e agora o preço que estava pagando por poucos segundos de um gesto afetivo roubado era muito maior do que poderia supor.

Estava vivendo um inferno.

Não sabia exatamente quando aquilo tinha começado, em quando começara a prestar mais atenção em Yuu, no seu jeito de falar, no tom de sua voz ou em seus lábios cheios. Em quando aquela parceria se transformara a ponto de enxerga-lo de outra forma, mas foi algo tão insistente que não parecia passageiro. Não sabia se seria certo classificar aquilo como amor, pois as coisas pareciam confusas nesse ponto. Atração seria pouco lisonjeiro de qualquer forma. Sabia apenas que tinha passado a lhe querer.

Não importava que até aquela época poucos homens tivessem lhe despertado alguma espécie de desejo e todos lhe tivessem como heterossexual. Era apenas discreto quanto a si mesmo e seus relacionamentos, era tranquilo no que dizia a sua sexualidade. Seu único motivo de preocupação era saber que aquele sentimento era por alguém que deveria ser intocável. Saber que talvez a proximidade com ele, acabaria minando a própria resistência. Afastou-se ao perceber o que poderia acontecer, mas não houve como manter aquela distância e sua fraqueza culminara naquele desastre.

Estava certo. Agira como um tolo.

Se pudesse voltar no tempo não sabia se poderia ter mudado as coisas e não ter sentimentos maiores que os estritamente comuns por Aoi, porém tentaria se conter e evitar aquele beijo rápido do qual mal sentira o sabor. Patético porque mal tirara algum proveito.

Como não podia consertar as coisas, lhe restou esperar que a raiva passasse, que seus amigos pudessem entender sem levar tanto a mal, se é que havia realmente um motivo para tanto. O problema foi que isso não aconteceu e parecia impossível que acontecesse um dia. Era como se aquele beijo fosse uma ofensa pessoal a cada um deles, como se tivesse traído todos eles.

Agora, o rejeitavam. Evitavam-no descaradamente, como se fosse portador de alguma doença contagiosa ou agiam simplesmente como se fosse alguém incômodo a quem se suporta por necessidade.

Uruha havia se disposto a passar por tudo aquilo em silêncio, a superar enquanto esperava que as coisas voltassem a ser como era antes. Esquecera-se de si, acostumou-se a ouvir as más palavras sem reagir.

Elas não paravam. Simplesmente não paravam.

Kouyou até poderia ser lento, porém as ofensas ficaram em sua mente de tal forma que não poderiam ser esquecidas tão facilmente. De tanto que as ouvia era capaz de lembrar-se delas como se fosse um mantra, que tinha até mesmo alguma musicalidade quando tais palavras eram recitadas em uma ordem específica... Era duro recitar um mantra contra si mesmo e fazia isso todos os dias.

Era o que estava fazendo quando o caminhão batera em seu carro. Foi o que fez durante o tempo em que esteve internado e até mesmo naquele momento, deitado de qualquer jeito no sofá sem se importar que o móvel mal comportasse sua altura.

Seus pensamentos de degradação lhe exigiam tempo integral. O loiro se dedicava a isso, pois realmente não havia grandes opções. A verdade nunca era perda de tempo, mesmo sendo algo tão cruel de remoer.

Estava cansado, mas por enquanto estava de mãos atadas, pois ainda havia um longo tempo de contrato a cumprir e não sentia vontade de agir de forma intempestiva. Embora não se importasse em pagar uma bela multa contratual para finalmente ter direito à paz, não queria sair do The GazettE como se fosse um fugitivo. Se cumprisse o seu contrato até o fim, bastava não renová-lo mais, e assim todos ficariam felizes.

Fácil assim.

Para sua sorte, sentia-se um pouco mais forte para suportar o que viesse. O tempo que ficara na casa de seus pais para se recuperar havia lhe feito bem. O mimo e o cuidado com que fora tratado lhe fizeram, ainda que de forma fugaz, ter vontade de agradecer ao tal Kami-Sama por ter colocado aquele motorista bêbado em seu caminho e ter lhe dado tempo de estar junto de gente que o queria de verdade. Claro que deveria ignorar o fato de ter passado semanas em coma e um longo tempo internado e em repouso, além ainda da fisioterapia, mas lhe parecia pouco diante do tempo que tivera para si.

Porém, o sossego estava próximo de terminar e tudo que o guitarrista esperava era ter condições de suportar até que seus planos pudessem ser concretizados. Porque poderia pensar que nem tudo fora um fracasso assim tão grande.

O som do celular quebrou a suposta monotonia das vozes da TV e tirou o loiro do mundo onde estava imerso. Conferindo pelo visor, viu que se tratava de Reita. Não queria atender, mas sabia que seria pior.

— Moshi Moshi.

Kou? Está em casa?

Hai, estou.

— O que está fazendo?

— Assistindo TV, algum programa que não sei dizer qual.

Você não quer vir ao meu apartamento dividir uma pizza comigo e com os outros? Você mesmo disse que nem sabe o que está passando na TV...

— Acabei de tomar o remédio, vou acabar dormindo cedo. Lamento, mas vai ter que ficar para uma próxima.

Ah, ok... Tudo bem, Kou-chan. Fica pra uma próxima então.

— Bom apetite pra vocês. Tchau.

Encerrou a ligação e jogou o pequeno aparelho sobre a mesinha de centro. Estava sem paciência para inventar uma desculpa melhor, mas a do remédio sempre colava. Sempre que o tomava acabava ficando sonolento e o fato já havia sido comprovado por eles. Só esperava que não tivessem memorizado os horários em que deveria toma-los ou inventar algo novo seria bem mais trabalhoso.

Suspirou, entediado. Em outras circunstâncias, em um momento como aquele estaria tentando compor, brincando com a guitarra sem grandes pretensões, porém lhe faltava essa vontade. De qualquer modo, enquanto estivesse tomando medicamentos teria de ficar longe da bebida, e o loiro costumava beber enquanto compunha. Nada que lhe fizesse cair de bêbado, porém álcool teria de ficar longe de seu sangue se quisesse se recuperar.

A sobriedade era realmente incômoda. Os pensamentos de autodepreciação não cediam. Eram insistentes, na medida em que estar sóbrio lhe garantia memória o bastante para se lembrar de todos os mantras recentes, mesmo que sua fama fosse de ter o raciocínio lento. E não estava disposto a isso no momento.

Desligou a TV e levantou-se, indo para o quarto. Pegou a cartela de comprimidos e a garrafa d'água que costumava deixar ao lado da cama: precisava mesmo tomar o remédio e talvez fosse bom fazê-lo logo. Assim não estaria acordado para um próximo telefonema que partisse de seus ex-amigos e para garantir isso, foi direto se deitar sentindo o corpo quase agradecer por ter o conforto do colchão macio em vez do sofá. Sabia que o sono não demoraria a fisgá-lo... Mas até lá seus pensamentos continuavam a todo vapor.

Kouyou só queria entender: o que eles estavam fazendo? Tudo bem que sua fama de ser lerdo era perfeitamente justificável, mas nem a sobriedade forçada lhe fazia compreender o que eles queriam com todos aqueles convites e cuidados estranhos. Tudo bem se viessem de Kai, seria absolutamente natural afinal ele lhe dera apoio quando as coisas aconteceram. Era possível, considerando que tinham se aproximado bastante além do fato dele ser o líder da banda, porém não conseguia entender a atitude dos outros, nem mesmo de Reita.

Não importava que o baixista fosse seu amigo de infância: as coisas tinham mudado. Lembrava-se bem da forma como passou a ser tratado e não podia evitar a sensação de que fora traído. Tudo bem que ele tivesse outra opinião, mas não esperava uma discriminação tão aberta. Sentiu-se tão mal, tão sujo quando aquilo começou a partir de Reita... Aquilo fora pior que tudo. Não achava que conseguiria esquecer tão cedo, mesmo que não falasse ou tentasse materializar sua decepção. Guardava isso para si, do mesmo modo como todas as outras decepções desde aquele live. E não faltavam lembranças ruins de palavras, gestos e omissões. Com o tempo ficava mais fácil de digerir, mas seu silêncio não significava encarar como uma brincadeira. Importava-se sim, mas não tinha grande força para rebater.

Apesar de tudo, o que acontecera não fora de todo ruim. Agora sabia com quem poderia contar e sabia definitivamente que não poderia contar com ninguém. Mesmo que Kai tivesse ficado ao seu lado, era mais seguro para si mesmo lembrar que não poderia contar com outra pessoa. Estava sozinho.

Não que fosse uma mudança lá muito grande. O loiro não tinha problemas em estar só, em não estar acompanhado o tempo todo e nunca vira a solidão como algo exatamente negativo. Porém descobrir que não havia ninguém para si... Isso sim doía.

ooOOoo

Em algum ponto da estrada.

Suspirou.

Estava cansado. Exausto.

Não queria mais. Não dava mais pra suportar.

Era tudo no qual conseguia pensar enquanto estava ao volante. A verdade era que seus pensamentos estavam longe demais enquanto mantinha seus olhos vigilantes ao trânsito.

A estrada fazia sentir-se tão livre... Era como finalmente ter um caminho para percorrer. Puro simbolismo que beirava o óbvio, mas não era como se realmente estivesse se importando com isso. A simples ideia de estar em uma estrada e que a escolha era sua lhe fazia sentir-se muito bem, principalmente pelas promessas daquela viagem.

Precisava muito daqueles dias de sossego. Queria ficar longe o máximo que pudesse. Só queria pensar no trabalho e na banda quando fosse estritamente necessário. E faria dar certo.

Kouyou simplesmente precisava que desse certo ou acabaria enlouquecendo. Precisava limpar sua mente antes de ser obrigado a escutar tudo aquilo de novo, toda a ladainha...

Toda a maldita ladainha...

Não suportava mais aquela merda. Estava a ponto de estourar.

Quem conseguiria se manter são, enquanto todos eles lhe rejeitavam e o feriam com todas as palavras possíveis?

Quem suportava ser taxado como doente, louco... Sujo?

Takashima Kouyou era a escória.

Riu sem vontade. Amizade tornara-se algo muito distante e agora sentia falta de apoio. Qualquer espécie de afeto ainda que mínima.

Mas de qualquer modo quem era ele para se julgar merecedor de alguma coisa?

Takashima Kouyou simplesmente não merecia nada nem ninguém...

O loiro respirou fundo, apertando seus dedos no volante com força. Não podia pensar nisso. Não podia deixar que acontecesse de novo. Não era neles que tinha de pensar. Não era no que eles diziam, no que esperavam de si, das maiores loucuras, das maiores merdas...

Não mesmo. Não queria nem precisava disso. Precisava de paz, afinal não era por isso que estava viajando?

Seria bom aproveitar tudo que pudesse antes que os dias terminassem. Não teria outra oportunidade nem tão cedo. Era só relaxar.

Era só relaxar. Só isso.

O que aquele caminhão estava fazendo na contramão?

"Merda"

Foi tudo que pôde pensar no ínfimo tempo de um ou dois segundos. Um esgar que mal se materializou em sua voz e foi abafado pelo impacto, os sons frios e combinados de vidro e metal.

Tudo

E nada.

Levantou-se de chofre, sentando-se na cama. Estava assustado, com a respiração ofegante. Sentia o suor em seu rosto. Com as mãos trêmulas, tateou até alcançar a luminária e acender a luz. Não queria ficar no escuro.

O clima estava ameno, mas Kouyou sentia frio. Seu corpo tremia, e nervoso com aquilo se enrolou no edredom, tentando se aquecer enquanto tratava de se acalmar e normalizar a respiração. Por alguns minutos desejou que aquele edredom fosse o corpo de outra pessoa lhe aquecendo.

Esse alguém tinha um nome... Pena que tivesse um nome. Queria esquecer e pensar que os braços que lhe aqueciam poderiam ser de qualquer um. Não um desconhecido de sexo casual, nada que fosse indício de promiscuidade. Queria apenas pensar que esse alguém desconhecido poderia ser alguém que amasse e o amasse também. Alguém a quem pudesse dar e receber carinho. Só pra variar.

Não era a primeira vez que tinha pesadelos com o acidente. Talvez desde que acordou naquela UTI... Mas antes eram apenas flashes afinal mal se lembrava do que tinha acontecido. Só que agora tinha sonhos cada dia mais reais a ponto de não saber mais se eram lembranças ou fantasias de sua mente fértil.

Ele não havia acordado logo após o impacto, havia?

Por que então se sentira paralisado? Preso em meio às ferragens... Tão fraco que sequer conseguia se mover, mal conseguindo respirar e sentindo que, se houvesse socorro ele demoraria horas?

Apertou o edredom em torno de si, tendo em mente a plena consciência de que sua solidão – por livre vontade ou não – também tinha suas desvantagens. Respirou fundo: não era mais uma opção e sim uma necessidade. E não tinha mais volta, por mais que desejasse.

ooOOoo

Com passos lentos o rapaz loiro atravessava os corredores da gravadora, sem pressa alguma de chegar ao seu destino. Ao contrário de outros dias, não estava atrasado. Aliás, se olhasse para o relógio diria que estava realmente adiantado, talvez empolgado para trabalhar.

Não era isso, de forma alguma. Queria apenas fazer algo, e se perdera tudo ainda tinha seu trabalho. Queria apenas tocar e fazer com que, pelo menos por algumas horas, todo aquele turbilhão que estava sua vida se perdesse em meio às notas musicais. Uma anestesia. Um paliativo já que sua fuga costumeira estava proibida.

Não precisava desobedecer as regras e se prejudicar, por mais que sua vontade fosse manda-las à merda e tomar uma garrafa inteira de qualquer bebida forte. Tinha de se manter firme, pois além de cuidar da própria saúde também desejava contrariar a imagem que pintavam de si mesmo, de irresponsável e imaturo... Embora sua outra vontade fosse de tomar uma atitude dessas apenas para que eles tivessem o real direito de se referir a ele desse modo.

Riu sozinho da ideia. Seria bom variar um pouco, mas ainda não estava em condições de suportar um novo massacre. Pelo menos por hora, as transgressões teriam de esperar.

Alguns andares percorridos com elevador e logo estava atravessando a porta para aquele seu outro mundo, onde inferno e paraíso se encontravam irremediavelmente. Fechou a porta, disposto a ter o seu tempo de conforto antes que a provação realmente começasse. Sua noite fora péssima e precisava de alguma compensação.

Apenas ligou sua guitarra, afinando algumas cordas que pudessem estar fora do tom, logo as dedilhando para constatar que o som era satisfatório. Feito isso, começou a brincar. Era divertido que notas soltas pudessem se unir de uma forma a serem capazes de liberar a mente, despertar lembranças e exorcizar velhos fantasmas.

Pena que eram sensações que duravam muito pouco para si, mas ainda assim não era capaz de abrir mão disso. Talvez aquela guitarra e seus sons fossem seus únicos refúgios. Então simplesmente deixou-as fluírem enquanto se dava ao luxo de desfrutar da sensação fugaz de liberdade. Talvez tivesse esse direito.

E deixou-se absorver tão completamente naquele mundo particular que sequer notou que olhos alheios seguiam cada movimento seu.


Continua...