- Katekyo Hitman Reborn® e seus personagens pertencem a Amano Akira;

- Essa é uma fanfic yaoi, ou seja, contém relacionamento homossexual entre os personagens. Se você não gosta ou sente-se ofendido com esse tipo de conteúdo sugiro que vá ser feliz lendo shoujo;

- A fanfic é centrada em D18/8059 e XS;

- Os capítulos serão nomeados de acordo com o nome do personagem e seguirão o ponto de vista (POV) do personagem naquele capítulo.

- Obrigada novamente, Yuuki, pela ajuda com o italiano :)


Prólogo

"If all else perished, and he remained, I should still continue to be; and if all else remained, and he were annihilated, the universe would turn to a mighty stranger: I should not seem a part of it."- Emily Bronte, Wuthering Heights,

"Se tudo o mais perecesse e ele ficasse, eu continuaria, mesmo assim, a existir; e, se tudo o mais ficasse e ele fosse aniquilado, o universo se tornaria para mim uma vastidão desconhecida, a que eu não teria a sensação de pertencer." – Emily Bronte, O Morro dos Ventos Uivantes.

O gosto doce e suave do vinho desceu por sua garganta com tanta delicadeza que ele até mesmo esqueceu o motivo que o havia levado até ali. Aquele havia sido seu segundo gole, longo o suficiente para que a taça fosse esvaziada. Seus olhos então encararam o restante do vinho dentro da garrafa pousada sobre a cômoda de madeira escura, sabendo que não haveria uma segunda taça, mesmo que a garrafa estivesse parcialmente cheia. Não existia outra pessoa no cômodo que compartilhasse daquele seu gosto por vinhos. Sua companhia bebia somente sake, e isso em ocasiões extremamente especiais. Mas bem, aquela também poderia ser considerada uma dessas ocasiões, não?

Dino pousou a taça sobre a cadeira que sempre ficava daquele lado do quarto e umedeceu os lábios. O sabor do álcool ainda estava vivo naquela região, e certamente o manteria ocupado por alguns segundos. Seus olhos passaram da taça para o homem que estava em pé e recostado à porta. A palidez da pele chegava a brilhar por causa da lua cheia, e seus cabelos extremamente escuros causavam um belo contraste. Havia um longo kimono negro sobre o corpo de Hibari, protegendo sua nudez. Seu rosto estava virado na direção do jardim, e até mesmo o italiano sabia que se estivesse naquela posição também estaria admirando aquela parte da residência. O quarto do Guardião da Nuvem era, sem dúvidas, privilegiado. Daquele cômodo era possível enxergar o jardim e o céu de Namimori, que naquela noite em especial estava lindo... estrelado... único.

Os passos do louro não ecoaram. Seus sapatos haviam ficado do lado de fora, mas o moreno sabia que ele se aproximava. Os lábios do Chefe dos Cavallone depositaram um casto beijo no pescoço do homem que estava parado, enquanto uma de suas mãos desfazia o laço do kimono escuro. O cheiro do sabonete que Hibari usara fez com que Dino pensasse com detalhes vivos como havia sido aquele banho, e a imagem mental do Guardião da Nuvem, nu e totalmente ensaboado, fez com que seu corpo se aproximasse um pouco mais. O kimono foi aberto e a faixa deslizou pelo chão, como se fosse uma cobra, formando uma estranha forma. O moreno virou-se devagar, e os olhos negros ergueram-se para aquele que o envolvia, como se dois pedaços do céu estivessem direcionados somente para o italiano. Ao ver seu reflexo naqueles olhos, o louro sorriu de canto, sentindo o estômago agitar-se. Ele sempre se sentia daquela maneira antes de despir Hibari, desde a primeira noite. Suas mãos tocaram o tecido negro, deslizando-o pelos ombros pálidos. O Guardião da Nuvem não vestia roupa de baixo naquela noite, então toda sua figura e beleza estavam ali... bem diante dos olhos. Ele é perfeito.

Os lábios do Chefe dos Cavallone voltaram a tocar o pescoço do moreno enquanto suas mãos desciam pela cintura, trazendo aquele corpo magro para mais perto. O Guardião da Nuvem moveu levemente a cabeça e a ponta de seu nariz tocou a bochecha de Dino, servindo como lembrete de que eles não tinham muito tempo. O italiano sorriu triste com aquela lembrança, mas achou que era melhor não argumentar. Seu rosto ergueu-se levemente e suas mãos seguraram a bela face do homem que estava à sua frente antes de beijá-lo. Durante aqueles quase quinze anos ambos trocaram diferentes tipos de beijos. Os primeiros tiveram gosto de sangue, pois Hibari não gostava de "coisas em sua boca". Com o tempo o moreno foi entendendo um pouco mais sobre as artes do amor, tornando-se incrivelmente bom naquilo. Entretanto, naquelas últimas semanas, os beijos que ambos trocavam tinham um gosto completamente diferente... uma estranha mistura de saudade e principalmente tristeza. Esta pode ser a última vez que eu toco esses lábios.

Eles não eram mais amantes. O homem que o louro guiava na direção do futon não poderia ser mais chamado e considerado de "seu amor". O próprio Guardião da Nuvem colocou fim a quase quinze anos de relacionamento em uma tarde ensolarada e bonita de maio. As palavras exatas o Chefe dos Cavallone nunca esqueceria. Ele as ouvia novamente antes de dormir, e quando acordava e quando não estava ocupado com trabalho: "Eu não quero mais ser seu amante. Eu estou terminando isso que temos," ditas com uma expressão séria. Dino obviamente tentou argumentar, mas enquanto os pedidos deixavam seus lábios, ele percebeu que não conseguiria convencer seu amante... já, naquele minuto, ex-amante. Os olhos não eram mais cheios de uma ternura muda, quase inexistência. Não houve rosto corado, ou frase engasgada que poderia significar isso ou aquilo. Só havia a verdade. A mais dura e cruel verdade que ele poderia ter ouvido em sua vida. Havia terminado. Seu sonho havia terminado... ali, em uma bela tarde.

Os dois se encontraram em um restaurante duas semanas depois daquela conversa. A comida esfriava em seus respectivos pratos enquanto os dois dividiam um cubículo no banheiro. O sexo naquele dia foi tão intenso que eles repetiram a dose uma semana depois, mas dessa vez no hotel em que o louro estava hospedado. Desde então aquele era o tipo de relação que eles tinham: quando o italiano estava na cidade ambos se encontravam e dividiam algumas horas entre gemidos e suor. Não havia declarações ou conversas sobre futuros encontros. Não havia olhares apaixonados ou toques cuidadosos e gentis.

Só havia uma peculiar intimidade entre estranhos.

O gemido que escapou pelos lábios do moreno trouxe o Chefe dos Cavallone para a realidade. Seus lábios mordiscavam um dos mamilos do Guardião da Nuvem enquanto sua mão o masturbava com força. O clímax chegou rápido, mas Dino não parou e esperou que seu ex-amante se recuperasse. Ele esticou-se e pegou o tubo de lubrificante que estava ao lado do futon, despejando uma generosa quantia em suas mãos. Os olhos cor de mel se abaixaram quando um de seus dedos penetrou a apertada entrada de Hibari, evitando encarar diretamente o homem que estava por baixo. Seu dedo moveu-se com força e pressa, procurando preparar aquela área o mais rápido possível. Em outra época ele teria pacientemente preparado o moreno, mas aquele tempo não voltaria, e por mais preocupado que ele estivesse aqueles sentimentos eram irrelevantes para alguém como o Guardião da Nuvem. Ele não quer meu coração. A única coisa que eu posso oferecer é isso.

Quando o segundo dedo conseguiu se mover com facilidade, o louro os substitui por seu membro. A primeira estocada já fez Hibari arquear as costas e gemer mais alto, apertando o lençol com força. O ritmo foi imposto após alguns segundos, e o italiano não mediu esforços na obtenção de prazer. Com a mente parcialmente livre de seu excesso de zelo, o Chefe dos Cavallone poderia se focar mais em como ele queria ser agradado. Após alguns minutos naquela posição Dino sentou-se sobre o futon e trouxe o moreno para frente, fazendo-o sentar-se em seu colo. Os lábios do Guardião da Nuvem gemeram ao sentir-se completamente preenchido, e suas mãos seguraram o belo rosto do louro, beijando-o com fúria. O gesto pegou o italiano de surpresa, e ele envolveu o pálido corpo de Hibari com tanta força que achou que o havia machucado. Os olhos negros se entreabriram e por uma fração de segundo o coração do Chefe dos Cavallone bateu mais rápido. Ele pensou ter visto ali o rapaz pelo qual havia se apaixonado, mas aquilo foi provavelmente algo que ele queria acreditar, e não a realidade.

"Quando você deixou de me amar, Kyouya?" Foi a primeira coisa que Dino perguntou ao moreno quando as palavras duras e insensíveis chegaram aos seus ouvidos, naquela bela tarde de maio. A resposta foi novamente o silêncio, e quando o Guardião da Nuvem finalmente falou, sua voz soou aborrecida e arrastada: "Você já sabe a resposta, não é?" O louro sabia. Ele sempre soube. Então, após aquelas palavras, não havia mais o que ser conversado ou discutido. Hibari nunca o havia amado. Tal pensamento não era uma novidade para o louro. No fundo ele sempre desconfiou que estivesse dançando aquela música sozinho, e que eventualmente seria deixado de lado quando o momento chegasse.

O orgasmo do italiano preencheu o corpo do moreno, mas o gosto que aquele prazer teve em sua boca foi extremamente amargo. O Chefe dos Cavallone deitou o Guardião da Nuvem no futon após alguns segundos, retirando-se de dentro dele e descendo o rosto até a ereção de Hibari. Seus lábios a tocaram mecanicamente, e ele precisou apenas ficar ali alguns segundos até notar que o homem que estava por baixo chegaria ao clímax. Porém, o louro afastou o rosto antes, utilizando apenas sua mão para aliviar o moreno. Seu corpo ficou em pé praticamente no instante seguinte e Dino recolocou suas roupas.

O que o Guardião da Nuvem fez durante aquele tempo. Que expressão ele tinha em seu rosto ou a maneira como ele olhava para a cena nunca seriam de conhecimento do louro. Ele se vestiu sem pressa, caminhando na direção da saída e parando apenas para recolocar os sapatos. Seu coração batia rápido e ele sentia uma incrível vontade de virar o rosto e dar uma última olhada no Guardião da Nuvem antes de ir embora, mas sabia que aquilo só tornaria seu sofrimento maior. Porém, antes que o italiano pudesse se afastar, partiu de Hibari a iniciativa da conversa.

"Esta foi a última vez que fizemos isso, Dino." A voz saiu baixa e rouca. O moreno ainda sentia os efeitos do orgasmo.

O Chefe dos Cavallone não respondeu. Seus olhos estavam no jardim. O belo jardim e a lindíssima lua cheia. Havia uma profunda tristeza em seu peito, mas também havia alívio. Durante aquelas semanas ele esteve se enganando, e toda vez que dormia com o moreno ele se perguntava quando aqueles sentimentos iriam desaparecer. Não houve continuação para aquela frase, então Dino simplesmente seguiu pelo corredor sem olhar para trás.

Ele amava aquele homem. Seu amor não havia diminuído com os anos ou se transformado em outra coisa. O que o louro sentia ainda estava vivo em seu peito, mas até mesmo alguém como ele sabia quando deveria simplesmente desistir. Era impossível forçar outra pessoa a retribuir seu amor. Dinheiro e poder poderiam lhe trazer tudo, menos a pessoa que ele tanto queria. Os passos ecoaram pelo caminho de madeira, e o italiano deixava para trás todos aqueles anos de genuína felicidade que ele achou que durariam para sempre. Adeus, Kyouya.

x

Lembrando-se daquele fatídico dia, foi em uma tarde ensolarada que Dino chegou ao templo Namimori e encontrou seu amante (ainda amante) sentado na sacada e admirando o jardim. O italiano se aproximou devagar, apoiou as mãos na grade de madeira e virou-se na direção do moreno. O incomodo que ele vinha sentindo há algum tempo o levou até ali. As frases mal ditas, os olhares evitados, a falta de interesse, a total negativa para convites... E ele estava ali, diante da pessoa que havia roubado seu coração e conquistado cada centímetro de seu corpo. O Chefe dos Cavallone queria uma resposta, uma dica, qualquer coisa. Ele queria afastar aquelas dúvidas, ouvir uma resposta atravessada ou parcialmente verdadeira. Todo aquele turbilhão de sentimentos o fez perguntar a inevitável questão: "O que está acontecendo, Kyouya?"
A resposta, como ele bem sabia, mudou tudo.

Um mês havia se passado desde que o italiano deixara Namimori. Após ter ouvido que aquela seria a última vez que eles se encontrariam, Dino retornou a sua vida. Seu trabalho continuou o mesmo, e embora se sentisse menos motivado do que o normal, o louro não deixou suas obrigações de lado. As semanas que antecederam o término oficial do relacionamento serviram para amaciá-lo sobre a decisão final, e ele mentiria se dissesse que não esperava que aquilo acontecesse algum dia. Eu estive apenas mentindo para mim mesmo. O homem que me recebia e permitia que eu o envolvesse não é o mesmo garoto que aceitou meu beijo no terraço do Colégio. Para onde foi aquele menino? Eu gostaria de revê-lo. Eu gostaria de me desculpar e prometer que faria tudo diferente.

Hibari nunca foi uma pessoa comunicativa, mas saber que não teria nenhuma comunicação com o Guardião da Nuvem tirou o sono do italiano por várias noites. O começo, sem dúvidas, foi a pior fase. Tudo o fazia lembrar-se de seu ex-amante, e isso incluía literalmente... tudo. Roupa de cama, lugares, conversas, cheiros, músicas e até mesmo pratos favoritos. Ele perdeu a conta de quantas vezes os dois não levaram sorvete para o quarto, por exemplo, e degustaram a sobremesa sobre a cama. O que começava como um inocente gesto sempre terminava em horas de sexo. Dino nunca foi muito fã daquela sobremesa, mas havia uma grande diferença entre provar o sorvete em uma taça e diretamente do corpo de seu amante.

Essas lembranças, porém, faziam parte do passado. Não havia espaço para nostalgia nos dias atarefados do louro, e ele soube disso quando encarou o convite que havia recebido para prestigiar um baile que seria sediado por uma Família aliada aos Cavallone. Toda correspondência era primeiro vista por Romário, então, se aquele convite havia chegado à suas mãos, significava que ele deveria ir.

"Confirme minha presença." O Chefe dos Cavallone mencionou assim que deixou o escritório. Seu Braço Direito o esperava do lado de fora, mas sua expressão era séria. "Alguma coisa errada?" Kyouya está bem?

"Eu não sei, Chefe..." Havia uma preocupada expressão no rosto de Romário. "Eu tenho a sensação de que talvez você devesse ficar em casa."

"Você viu o convite e conhece o Chefe da Família, não?"

"Sim, mas continuo com uma sensação ruim." O homem retirou os óculos e os limpou com o lenço que carregava no bolso de seu terno.

"É apenas mais uma reunião, nada mais." Dino sorriu com a preocupação de seu amigo. "Eu subirei e tomarei um banho. Peça para arrumarem a mesa para o jantar, por favor."

"Sem planos para a próxima semana?" A voz do Braço Direito soou displicente, mas o louro sabia do que ele falava. "Há algum tempo que não vai a Namimori. O que acha de cancelar a ida ao baile e fazer uma visita ao Japão?"

"Minhas visitas ao Japão acabaram, Romário." O italiano abaixou os olhos. Não era doloroso pensar no Guardião da Nuvem. Ele apenas não queria que sua vida fosse uma sucessão de lembranças. Eu preciso decidir o que farei agora. Eu preciso aprender a viver sem ele.

Não houve comentário por parte do Braço Direito e o Chefe dos Cavallone se pôs a subir, querendo o mais rápido possível afastar aqueles pensamentos. Seu quarto estava levemente abafado, e ele precisou abrir um pouco mais as cortinas, seguindo na direção do banheiro que ficava do lado direito. O tempo estava muito quente nos últimos dias, o que pedia por um longo e morno banho de banheira. Dino abriu as torneiras e enquanto a banheira se enchia com água ele se pôs a tirar as roupas. O cheiro dos sais de banho era tão convidativo quanto a água, e assim que sentiu seu corpo submerso, o louro fechou os olhos e suspirou, apoiando a nuca em uma das bordas.

Por longos minutos o italiano não fez nada além de relaxar. Aquelas semanas foram tão difíceis que ele não acreditava que havia conseguido realmente sobreviver sem Hibari. Por diversas vezes, no passado, aquele pensamento cruzou sua mente e o Chefe dos Cavallone se pegou afirmando que simplesmente não conseguiria viver sem o moreno. Entretanto, ali estava ele, vivendo exatamente como vivera antes daquele fatídico primeiro encontro. Não da mesma maneira, Dino abriu os olhos cor de mel. Eles estavam levemente úmidos e vermelhos. Aqueles foram quinze anos e não quinze dias. Os dois tiveram seus problemas durante aquele tempo, claro. A última briga acontecera há dois anos e eles ficaram quase quatro meses sem comunicação, mas dessa vez era diferente. Eu não sou mais aquele homem e Hibari também não é mais um adolescente, o louro passou as costas da mão direita sobre os olhos, satisfeito pela água da banheira omitir suas lágrimas, e eu estou agindo como uma garota apaixonada, quando já tenho 37 anos. Patético. Porém, eu não posso simplesmente esquecê-lo, como se nunca tivéssemos nos conhecido.

Não era como se o italiano pudesse simplesmente apagar os momentos que tiveram juntos, tanto os bons quanto os ruins. Os sorrisos, os olhares, os momentos únicos e especiais que tornaram aqueles quase quinze anos um tempo que ele jamais poderia esquecer. Então, como aconteceu? Em que momento Hibari decidiu que não era mais suficiente? Foi uma atitude? Uma palavra? O louro não sabia. Ele não fazia ideia de que algo daquela magnitude poderia acontecer algum dia. O pensamento, claro, já havia cruzado sua mente, mas existia uma grande diferença entre imaginar uma situação e vivê-la. As perguntas e dúvidas que ele tinha provavelmente nunca seriam respondidas, e cada dia o afastava ainda mais do homem que ele amava. E o dia estava quente... exatamente como aquela tarde.

x

Não havia limites quando o assunto era um baile sediado por uma rica Família. A extravagância começava com os empregados, que iam receber pessoalmente os convidados que desciam dos carros, guiando-os até a entrada da mansão. No interior, o anfitrião falaria pessoalmente com as pessoas mais importantes, enquanto os outros membros da Família cuidariam dos demais convidados. Naquela noite o italiano recebeu um caloroso aperto de mão de Lorenzo Moretti, o responsável pelo baile. Contra todos os protestos de Romário, o Chefe dos Cavallone insistiu em ir, alegando que estava cansado de permanecer na mansão. Eu preciso pensar em outra coisa. Eu preciso parar de pensar nele. Um mês de distância não foi suficiente para fazer Dino esquecer o moreno, e o que ele precisava era uma boa dose de diversão, ou pelo menos estar fora daquele quarto e longe daquelas lembranças.

A mansão em que acontecia o baile não era a residência oficial dos Moretti. A Família era natural de Nápoles, mas estava na cidade a negócios. O lugar era gigantesco, muito maior do que a mansão em que o louro morava. Ela possuía três andares, dezenas de quartos, corredores e o hall era incrivelmente espaçoso. O jardim, que naquela noite também fazia parte da festa, acomodava metade dos convidados. A outra metade estava dentro da mansão, sorrindo, dançando e vivendo. O italiano havia trazido Romário e mais cinco subordinados. Todos permaneciam fielmente ao lado de seu Chefe, como uma parede humana. Em poucos minutos o Chefe dos Cavallone encontrou vários conhecidos e não demorou a que sua noite se tornasse um pouco mais agradável.

Era realmente satisfatório poder conversar com pessoas que o admiravam. Enquanto ouvia os elogios de uma antiga aliada da Família, Dino não pôde ignorar o sentimento de que talvez precisasse se dar um pouco mais de valor e crédito. Eu sempre me coloquei em uma posição inferior quando estava com Kyouya. Sempre achei que seria dele a última palavra, exatamente como aconteceu. Eu apenas acertei o resultado. O louro balançou levemente a cabeça, tentando a todo custo afastar aqueles pensamentos. Aquela noite não era sobre o Guardião da Nuvem. Um dos senhores que conversava com o italiano mencionou Tsuna, e então o humor do Chefe dos Cavallone mudou completamente. Falar de seu irmãozinho sempre o fazia sentir coruja, ainda mais quando ouvia outras pessoas elogiarem o Décimo Vongola. Graças a Tsuna, a Família havia reconquistado as amizades antigas, desfeitos alianças negativas e voltara a ser considerada uma excelente mudança naquele ramo de negócios. O Décimo ainda morava em Namimori, visitando a Itália vez ou outra, apenas a trabalho ou férias. Ele não pode se ausentar como antes. Tsuna é um homem de família agora. O homem de cabelos castanhos havia se tornado pai de sua primeira filha no ano anterior, e os rumores eram que os Vongola teriam uma mulher no comando da Família em alguns anos. Mas eu duvido que Tsuna vá permitir tal coisa...

A conversa cujo assunto era o Décimo Vongola foi interrompida pelo celular de Dino, que vibrou no bolso de seu terno. O louro pediu licença e se afastou, seguindo para uma área menos barulhenta, próxima ao jardim. O nome de um velho amigo apareceu no visor, e o italiano sorriu com a ideia de falar com aquela pessoa depois de tanto tempo.

"Não acredito que esteja vivo!"

"VOOOI! Isso é jeito de falar com alguém que não entra em contato há meses?" A voz do outro lado da linha soava animada.

"Você sabe onde eu moro, eu estive em casa por todo esse tempo."

"Eu estive ocupado com outros assuntos. Onde você está? Estou na frente da sua casa e seus empregados não querem dizer nada. NADA. Eu sei que não está no Japão, maldito."

A menção daquele lugar levou um arrepio na espinha do Chefe dos Cavallone. Não lembre... apenas não lembre.

"Estou em um baile, mas irei para casa em poucas horas. Pedirei que liberem seu acesso, entre e sinta-se a vontade. Conversaremos em breve."

Squalo reclamou um pouco, mas desligou o telefone avisando que esperaria. Aquele seria um raro evento, Dino sabia. Seu amigo de infância aparecia vez ou outra em sua casa, e os dois passavam boa parte da noite lembrando-se de situações bobas, enquanto dividiam algumas taças de vinho. Desde que deixou a Varia, o homem de longos cabelos prateados fazia serviços externos que o louro realmente não gostaria de saber. Tudo o que era de seu conhecimento era que envolvia extermínios, assassinatos e coisas do tipo.

"Aproveitando a festa?"

A voz veio de seu lado e o italiano sorriu ao ver o anfitrião da festa. O homem era baixo e gorducho, mas por trás de suas feições ainda era possível ver um pouco da beleza que um dia iluminou aquela face. Suas bochechas estavam rosadas, tanto pela bebida quanto pelo calor que fazia na mansão. Em suas mãos havia duas taças e uma delas foi oferecida ao Chefe dos Cavallone, que aceitou com um largo sorriso. Ele adorava vinhos.

A conversa seguiu trivial, com Dino agradecendo o convite e elogiando a decoração, a comida e a excelente bebida. O homem ria e corava, dizendo que não era necessário aquele nível de formalidade entre amigos. Após alguns minutos o Chefe dos Moretti se afastou e o louro pediu uma segunda taça de vinho, sendo servido por um belo jovem de cabelos longos e louros. "Aproveite a festa, senhor."

Muito pouco poderia ser feito em um baile se você não estivesse inclinado a dançar, e naquela noite o italiano estava nesse grupo. Normalmente ele teria convidado alguma bela mocinha ou aceitado convites, mas seu humor não estava para valsas e conversas triviais. Algumas mulheres o convidaram diretamente, outras lançaram olhares cheios de significados, mas as respostas foram sempre as mesmas: Não. O Chefe dos Cavallone estava em sua quarta taça de vinho quando rejeitou a décima segunda mulher da noite. Um longo suspiro deixou seus lábios e ele passou a mão na testa. Ela estava úmida com suor.

"Acho que vou ao banheiro". Dino comentou baixo com Romário. Sua garganta estava seca mesmo após a taça de vinho, e ele não se sentia muito bem. É o calor. Eu sempre fico assim em lugares abafados.

"Eu o acompanharei até o corredor, Chefe."

"Não é necessário, Romário." O louro sorriu e pousou a mão sobre o ombro de seu braço direito. "Me espere no topo da escada."

O Chefe dos Cavallone perguntou a um dos empregados da Família que sediava o baile onde ficavam os banheiros, e um deles o guiou até o segundo andar. O corredor era muito largo e ele caminhou enquanto sentia os olhos pesados de Romário em suas costas. A porta que lhe foi indicada era reservada para uma suíte, e assim que entrou o italiano soltou o nó da gravata e caminhou até a janela. Ele passou vagamente os olhos pela decoração, notando apenas as quatro poltronas, a larga cama, o tapete creme e um quadro de alguma passagem da Ilíada em uma das paredes. A brisa noturna entrou por seus pulmões, mas não amenizou a sensação de calor. Sua cabeça estava pesada, e ele notou que suava mais do que antes, a ponto de sua franja estar grudada a sua testa. O Chefe dos Cavallone retirou o lenço do bolso, mas aquele pequeno gesto o fez sentir tontura, precisando se apoiar na parede. Eu não me sinto bem.

Dino deu dois passos para trás e foi então que percebeu que alguma coisa estava realmente errada. Seus movimentos estavam lentos e seus reflexos ainda mais vagarosos. Suas mãos apoiaram-se em uma das poltronas e ele sentiu que o ar começava a faltar. O barulho de uma porta sendo aberta o fez virar o rosto, esperando encontrar Romário, que provavelmente o teria seguido até ali. Ele pediria para ser dirigido a um médico, pois tinha certeza de que o que quer que fossem aquelas sensações era sério o suficiente para uma visita ao Hospital.

"Difícil respirar, não?"

A voz veio de um belo rosto. O rapaz não deveria ter mais de vinte anos. Seus olhos eram verdes, sua pele branca e seus cabelos louros e levemente longos. Em sua mão havia uma taça de vinho e em seus lábios um largo meio sorriso. O louro nunca o havia visto... espere, ele havia visto aquela pessoa, mas não conseguia se lembrar quando e nem onde.

"Você não vai melhorar, Dino Cavallone." O rapaz ergueu a taça e derrubou o conteúdo no tapete. O italiano fez menção de levar a mão até seu terno, em busca de seu telefone, mas não conseguiu. Seus braços não tinham movimento.

"V-Você... Quem é v-você?" O Chefe dos Cavallone não tinha voz. O que deixou seus lábios era apenas um fio daquilo que um dia havia sido sua voz.

"Eu? Eu sou você amanhã."

O rapaz derrubou a taça sobre o tapete e levou a mão até o bolso, retirando um revólver. Dino não ouviu o disparo e nem sentiu a primeira bala que atingiu seu peito. Seus olhos cor de mel se abaixaram e viram o vermelho manchar sua camisa branca. Mais três disparos foram feitos e mais três novas manchas surgiram, todas próximas a primeira. Sua mente estava branca, completamente sem pensamentos e tudo o que ele fez foi erguer os olhos e encarar a pessoa que havia acabado de feri-lo. Suas pernas perderam as forças e cederam, derrubando-o de joelhos sobre o fofo tapete cor creme que havia sido pintado com gotas vermelhas.

"Você morreria de qualquer maneira. Você não consegue respirar porque foi envenenado. O vinho... eu o servi especialmente para você. Veja como um favor isso que eu acabei de fazer. Você não quer morrer envenenado, acredite, é um jeito horrível de morrer."

Foi naquele momento que a dor se espalhou por todo seu corpo, como se o acordasse. Cada centímetro sentia os disparos e ele teria gritado por ajuda se não fosse tarde demais. Dino sabia o que estava acontecendo. Ele havia se preparado por todos aqueles anos para aquele momento, mas nunca achou que seria desse modo e completamente sozinho. Eu queria agradecer a Romário por todos os anos de amizade e proteção. Kyouya... Eu queria poder vê-lo novamente. Eu queria perguntar o que fiz de errado e o que eu poderia mudar para que voltássemos a ficar juntos... Eu te amo tanto, Kyouya. Eu nunca deixei de amá-lo. Nunca... Nunca. Eu sinto muito. Eu sinto muito se não fui o suficiente, se não fui o que você queria. Eu sinto muito...

O louro sentiu quando seu corpo caiu sobre o tapete. Sua consciência foi tornando-se cada vez mais embaralhada, enquanto seus olhos se fechavam lentamente. A última imagem que passou por sua mente foi o primeiro beijo que ele trocou com Hibari, no terraço do Colégio Namimori. Foi doce. Aquele foi provavelmente o momento mais doce que ele viveu em todos aqueles 37 anos. Pura felicidade. Ele nunca esteve tão feliz quando naquele dia.
E naquela noite, o Décimo Chefe da Família Cavallone morreu.

Continua...