Disclaimer: Saint Seiya não me pertence, nem seus personagens. O universo de Darkest Night e dos livros que o sucederam, de autoria de Gena Showalter, também não me pertencem.
Fic criada a partir do desafio do Darkest Ikarus para as autoras das fichas de personagens originais para sua fanfiction "Darkest Night", referente à série de gaidens de cada uma delas.
Aos que acompanham o trabalho do Ikarus-sama, tomara que possam conhecer mais da parceira de Infelicidade, Jordana Hagen Gaarder, a partir de agora. A cena aqui descrita, fora as lembranças, ocorre entre os capítulos 32 e 33, antes que Jordana descobrisse como usar os artefatos, com a ajuda de Maya.
Atenção: possíveis spoilers nas entrelinhas!
Boa leitura!
DARKEST GAIDEN – O CAMINHO DE JORDANA – CAPÍTULO I
Já era mais de meia-noite quando ela resolveu deixar aquele computador; a garota estava exausta, mas não conseguia dormir. O que era irônico, visto que seu corpo estava cansado pelas recentes aulas de combate; levantou-se da escrivaninha e foi até a sacada do quarto que agora dividia com Camus, o guardião do demônio Infelicidade. O céu lá fora era de um azul profundo, visto daquela maneira graças à distância da fortaleza em relação à cidade, e à altura em que a primeira ficava.
A morena sorriu; dirigiu-se ao banheiro, retirou as roupas e os óculos, enfiando-se embaixo da água quente com um suspiro de alívio: não sabia o motivo, mas sentia-se bem em contato com aquele elemento. Para ela, era tão bom relaxar o corpo, depois de horas na frente do computador. Banhou-se sem pressa, curtindo a água caindo sobre si, e por fim, secou o corpo, vestindo a calcinha preta, e em seguida um roupão azul escuro felpudo e limpo; penteou os cabelos, secando-os com a toalha, para então escovar os dentes e passar um hidratante no rosto.
Bufou; esquecera o creme para o corpo lá fora. Sem hesitação, colocou os óculos e foi para o quarto, pegando o frasco de hidratante em mãos e passando a loção cremosa nas pernas, com um pequeno rubor na face. Jordana sabia que a cena era captada por câmeras de segurança, e mesmo tendo conhecimento de que Dite - o guardião de Doença - não a espiaria, ela não podia evitar aquela sensação de desconforto.
Ela estava tão absorta em seus pensamentos, que reparou quando a porta fora aberta somente ao vê-lo fechá-la; o ruivo de cabelos longos trancou a porta em silêncio, seus olhos claros brilhando na meia-luz do quarto. Jordana sorriu ao vê-lo.
- Como foi a reunião com os outros Senhores, Camus? Conseguiram definir qual a próxima estraté- hum...!
Jordana percebeu-se beijada ardentemente e envolvida pelos braços dele, que aproveitando-se da baixa estatura dela, a pegou pelos quadris, levantando-a em seu colo, fazendo com que ela enlaçasse sua cintura; as mãos da norueguesa afundavam nos cabelos de Camus, puxando-os gentilmente, enquanto ele a encostava na parede, intensificando o beijo de ambos.
- C-Camus... eu senti tanto a sua falta... – balbuciou Jordana.
O ruivo, que distribuía pequenos beijos no queixo e colo dela, olhou em seus olhos e concordou com a cabeça; com tantas missões de busca e conflitos constantes com os Caçadores, os dois possuíam pouco tempo ou privacidade, e com Jordana ajudando a decifrar os códigos relacionados aos Artefatos, ela mal saía da frente do computador, o cansaço impedindo que os dois se unissem mais vezes.
Os lábios dos dois se encontraram novamente, e logo Camus abria o roupão, livrando-se dele e exibindo os seios dela à sua frente; Jordana observou o brilho nos olhos verdes com expectativa, e soube o que a aguardava quando ele lambeu os lábios sedutoramente.
-Ah, Camus! – apertou os ombros do rapaz ao sentir a boca dele sobre um de seus seios – N-Não pare!
O guardião de Infelicidade não se fez de rogado, e atacou os seios de sua mulher com gosto; o demônio dentro dele mal se manifestava, mas nesses momentos, Camus podia sentir a curiosidade e certa raiva de Infelicidade, dentro de si; muitas vezes, quando só, perguntara ao demônio o que significava aquilo, mas não havia resposta, apenas silêncio, como nas situações em que ele mesmo tinha que manter-se quieto para não afetar as pessoas em volta, com sua voz triste.
A maior arma de Camus estava em sua voz e no que despertava nas pessoas quando falava; a tristeza que infligia aos outros era tão grande, que muitas vezes, elas se suicidavam ao ouvi-lo. Ele aprendera a viver com isso, tratava-se da sua penitência, mas ao escutar Jordana gemendo e o incentivando a continuar o que fazia com palavras, o ruivo sentia-se mal. Sabia a importância das palavras para ela, e gostaria de demonstrar o prazer e o amor que sentia através delas, mas...
- Camus? Está tudo bem? – Jordana acariciava o rosto dele – Você me parece tão triste... o que houve?
O rapaz simplesmente fez uma negativa com a cabeça, e afastando aqueles pensamentos, jogou a moça na cama, de modo brincalhão. Retirou os sapatos e a camisa com certa pressa, pegando a mesma e a colocando em cima da câmera de segurança do quarto; ao virar-se para Jordana, viu que ela escondia os próprios seios, vermelha.
- E-Eu fiquei tão envolvida que me esqueci dessa maldita câmera, ai, que vergonha!
Mas antes que ela pudesse continuar, Camus aproximou-se, retirando os braços dela da frente de seu tórax, e beijando seu abdômen até encontrar o elástico da calcinha; retirou-a com os dentes, sorrindo, e fazendo com que ela o observasse, boquiaberta e corada. Lambeu os lábios novamente, e posicionando-se entre as pernas de Jordana, o ruivo a lambeu em seu centro, arrancando um gemido sensual dela.
Encorajado pelos sons que sua mulher fazia, Camus enfiava a língua nela com vontade, o dedo estimulando o ponto de prazer da garota enquanto, com a mão livre, ele se estimulava também; aos poucos, aumentava a velocidade, queria ser gentil, mas sentia tanta falta dela. E pelo visto, a recíproca era verdadeira, pois Jordana arfava naquela cama, pouco se importando com quem iria ouvi-la.
- C-Camus! Assim eu vou g- hm! - novamente, ele interrompia o que ela dizia, sua língua quente invadindo a boca dela, fazendo com que sentisse o próprio gosto.
A acadêmica o puxou de encontro a si, abrindo as calças do namorado e retirando as peças de roupa que ainda o cobriam; sentir o corpo nu dele sobre o dela era uma das coisas que Jordana mais gostava, mas ele parou o que ela fazia, segurando-a e rolando com ela de modo que a norueguesa ficasse por cima.
- Ah... entendi... bem, você terá que me guiar... – Jordana sorriu, retirando os óculos e tomando o membro do rapaz nas mãos; começou devagar, para aumentar a pressão dos dedos e a velocidade aos poucos, manuseando toda a extensão dele sem pestanejar.
O imortal contorcia-se na cama; tivera outras mulheres, sim, mas nenhuma tão delicada e sensível quanto Jordana. Ela preocupava-se com ele, enquanto a maioria das mulheres com quem estivera, por ele não poder falar, interpretava isso como uma demonstração de pouco caso, e acabavam sendo um tanto distantes, ou indiferentes.
Como Camus não podia sequer gemer sem arriscar despertar a infelicidade de quem estivesse com ele, acabando com o tesão do momento ou com a vida da outra pessoa, ele mesmo acabava perdendo o sabor de experiências mais plenas. Mas agora, era diferente, e ele teve certeza disso ao observar o deleite na expressão de Jordana ao encaixar os dois corpos, ela montada sobre ele.
Logo, ela o cavalgava, as mãos grandes do ruivo a guiarem os movimentos dela; as mãos de Jordana estavam sobre os ombros dele, para que ela pudesse inclinar-se e beijar a boca dele quando quisesse. Os corpos moviam-se, ritmados, e uma das mãos dele passou a acariciar um dos seios dela.
- Camus... isso é tão bom... tão delicioso... eu o quero tanto... ah! – gemeu Jordana, ao intensificar os movimentos que fazia, sentindo-o grande e rijo dentro de si, cada vez mais fundo – M-Mais, eu quero mais, preciso de mais!
Com a respiração entrecortada e boca aberta, o rapaz ajudou-a a ir mais fundo, mais forte, mais rápido; Camus impulsionava os quadris para cima, fazendo com que sua pélvis encontrasse a dela, com vigor. Uma mão deslizou do quadril, pela coxa da mulher, e logo um dedo a estimulava, bem onde os corpos se juntavam.
- Camus! – gritou a norueguesa, fitando os olhos claros dele com os seus, cor de violeta – Eu... eu o amo!
A declaração veio juntamente com o orgasmo dela, forte, poderoso, sua alma regozijando-se em felicidade pelo momento; a cama ainda rangia alto com os movimentos ainda mais frenéticos de ambos, os dois fora de controle, até que Camus apertou bem os lábios, assim como as coxas de Jordana, para evitar que qualquer som deixasse sua boca, quando ele alcançou o clímax, derramando-se dentro dela com intensidade.
Os dois respiravam fortemente, o corpo da mulher tremendo pelo segundo orgasmo que a atingira quando ele chegara lá; com a visão turva, Jordana desabou em cima dele, beijando os lábios de Camus com carinho, abraçando-o enquanto ele deixava o interior de seu corpo.
- Você é perfeito... eu me sinto tão feliz ao seu lado... – confessou a garota, olhando para a figura cansada, mas satisfeita, do imortal.
Em resposta, Camus sorriu, segurando a mão dela com carinho, e depositando um beijo em seus lábios; ambos estavam suados e cansados, e ela não pôde deixar de pensar no fato de que nenhum dos dois estava se protegendo...
"Nossa, seria isso biologicamente possível? Isso eu não sei, mas se os Deuses são reais e puderam ter tantos filhos com mortais, de acordo com a mitologia, então... os demônios também poderiam, não é?" – pensou Jordana, séria, enquanto apertava um pouco mais a mão de Camus. Olhou para o imortal, e constatou que esse agora repousava ao seu lado, tranqüilo, com uma expressão feliz e serena no rosto bonito.
Ela olhou para o próprio corpo, e com a mão livre, alisou sua barriga, sorrindo; mas rapidamente, retirou a mão dali. Mesmo que a possibilidade de ter um filho com Camus existisse, não sabia se era o melhor a acontecer. Não conhecera a própria mãe, portanto, não sabia se ela mesma seria uma boa genitora.
"Papai, por que o mar é tão importante?" – sua própria voz, de quando era menina, invadia sua mente.
"Porque ele é a ligação entre você e sua mãe, Jordana! Nunca, nunca se esqueça disso, minha filha!"- a voz de Ibsen Gaarder a respondia.
- Papai... – suspirou a mulher, um nó se formando em sua garganta – O que você pensaria de mim agora, colaborando com o maior objeto de suas pesquisas, os Senhores do Submundo, e ainda entregando meu amor e meu corpo a um deles?
Jordana fitou o teto, e logo as lembranças começaram a aparecer, uma a uma, reconstruindo seu caminho até ali.
- Oslo, Noruega, 20 anos atrás –
A menina morena corria na orla do fiorde, os pés tocando o mar. Ela sorria, feliz, pois sentia-se bem ali, junto ao mar, e em ambientes aquáticos em geral. Um pouco atrás, seu pai, um homem de cabelos escuros, a observava com atenção; sabia que deveria proteger a filha o máximo que pudesse, pois ela herdaria todos os seus conhecimentos.
Ele sentou-se em uma mureta próxima, retirando um caderno do bolso, revisando algumas de suas anotações, sempre espiando a menina de tempos em tempos. Aos poucos, a pesquisa de Ibsen Gaarder tomava mais corpo, atingindo um status de grande importância no campo da paranormalidade; no entanto, ele sabia que o mundo não estava preparado para tamanha revelação.
"Os Senhores do Submundo... guerreiros imortais que assassinaram Pandora e abriram a caixa, recebendo os demônios contidos nela em seus próprios corpos. Não é apenas uma lenda, mas... quem acreditaria nisso?"
O homem estava absorto em seus pensamentos, reparando na pequena que andava à beira d'água; súbito, lembrou –se da mãe da menina, que não via há muito tempo.
"Há dois anos, para ser mais exato... quando ela trouxe Jordana até mim, e virou meu mundo de cabeça para baixo, pela segunda vez!"
- FLASHBACK -
- Você! Depois de tanto tempo, como se atreve a aparecer assim, do nada? Não devem saber de sua existência! – o homem de cabelos escuros encarava a loira, com expressão sofrida.
- Ibsen Gaarder! Não fique assim, sei que sentiu minha falta... mas precisei voltar para meu lugar de origem, caríssimo. – a bonita mulher sorria, segurando uma grande cesta em suas mãos.
- Aquilo foi... um deslize! Ainda bem não descobriram minha fraqueza, senão... – um som de choro veio da cesta – O que tem aí dentro?
A loira de olhos cor de violeta abriu a cesta, mostrando o bebê que ali estava. O homem arregalou seus próprios olhos:
- Que significa isso, não me diga que... – o monge afastou-se um passo, aturdido.
- Sim, ela é nossa filha, Ibsen. Nasceu há algumas semanas. Fruto de um amor proibido entre um monge e uma...
- Impossível, como eu explicarei isso aos meus superiores? Por que a trouxe até mim? Você sabe que eu não posso ficar com ela!
- Mas você irá, não há outro jeito. Ouça-me! – o tom de voz da mulher misteriosa era imperioso, e uma aura poderosa surgiu em torno dela – Sei que eles estão atrás de mim, sinto que logo algo perigoso acontecerá, devo me preparar para o que vier! Ela correrá perigo se continuar comigo, só você pode protegê-la!
- Do que você está falando? Ah, coisas que não pode me contar, hum? – o homem irritou-se.
- Logo você saberá, Ibsen. Continue seus estudos e logo saberá... passe seus conhecimentos a ela. Ame-a. E quem sabe um dia, se tudo der certo, eu não volte a vê-los, querido. – a loira sorria.
- Eu serei expulso da ordem se souberem que tenho uma filha... – ele suspirou, derrotado – Eu deveria manter um voto de castidade, sabia? Qual o nome dela?
- Jordana. Gostaria que você mantivesse esse nome, para que ela levasse alguma coisa de mim. – o olhar da mulher sobre sua filha era terno, e ao mesmo tempo triste – Sinto tanto por deixá-la, mas não é seguro, entende?
Ibsen entendia; ele sabia quem era aquela linda loira que um dia fora sua amante, sua mulher, e se ela dizia que algo estava prestes a acontecer, era porque realmente não havia outro jeito.
- Eu compreendo, mulher dos mares. – ele sorriu ao chamá-la assim – Cuidarei bem da nossa filha, mesmo que isso custe a minha reputação. – ele apertou a cruz de metal em torno de seu pescoço com força.
- Sei que sua fé é diferente, mas isso não impediu que nos aproximássemos; eu confio em você. Cuide bem dela.
Com isso, a bela mulher beijou a criança, agora nos braços do monge, e em seguida, o beijou também, abraçando a ambos por um instante.
"Faça com que ela ame o mar, para que nossa filha sempre me sinta por perto..."
Súbito, ela não estava mais ali, e o monge voltou para a abadia, com sua filha nos braços, já esperando pelo que lhe aconteceria.
- FIM DO FLASHBACK –
O ex-monge deu um sorriso; de fato, fora expulso da ordem religiosa da qual fazia parte, sendo humilhado pelo fato de romper seu voto de castidade com uma mulher que mal conhecia, e que ainda por cima, deixara sua filha sob seus cuidados, colocando-o na posição de pai solteiro. Ele penara e sofrera, levando a pequena Jordana consigo nos braços, conseguindo um emprego em uma grande casa de família, onde seria o tutor das crianças do lugar.
E assim Ibsen ainda trabalhava, tinha uma casa para si e a filha no terreno da grande mansão, e logo se tornou o assistente e braço direito do dono do local – um historiador, professor na universidade mais antiga da cidade, a Universidade de Oslo. Viúvo, pai de dois meninos, o senhor Aubert compreendera a situação toda, e gostava de mimar Jordana, deixando que ela freqüentasse sua biblioteca e, mesmo com dois anos, assistisse às aulas que Gaarder dava aos meninos que herdariam aquela mansão.
De repente, o homem de cabelos escuros sentiu-se vigiado; sabia que algum perigo rondava sua filha apenas por ela possuir a mãe que tinha, e também temia que alguém soubesse do real teor de suas pesquisas ocultas. Ele costumava freqüentar várias bibliotecas e centros paranormais com discrição, e era figura constante no prédio de Teologia da Universidade de Oslo, sendo mesmo convidado para participar de alguns debates informais por ali.
"Será que estou ficando paranóico? Não, não tem como alguém saber que estudo os Senhores do Submundo... quase ninguém tem acesso às lendas, aos símbolos! Eu mesmo me esforço tanto para reunir e processar informações tão raras e difíceis de interpretar..." – pensava ele.
- Jordana, vamos embora! – Ibsen andava até a filha com passos rápidos, pegando-a no colo para sair dali o mais rápido possível. A menina reclamou, mas ao abraçar o pai, olhando por cima de seus ombros, logo percebeu algo errado, instintivamente.
Não muito longe, um homem vestido de preto os vigiava, encostado displicentemente ao parapeito de um mirante; ele fumava, mas ao perceber a menina e seu pai se distanciando, jogou o cigarro fora e colocou as mãos nos bolsos, observando-os. Em seu pulso, destacava-se uma tatuagem do símbolo do infinito.
- Seis anos depois –
- Parem, parem com isso agora! – a garota reclamava, seus olhos cor de violeta marejados.
- Mas é verdade! Não adianta se fazer de boba, nós sabemos que você é uma bastarda! – dizia o garoto mais velho, Henrik, ao rir da cara dela.
- Isso mesmo, se não fosse nosso pai ter pena do seu, você nem teria o que comer! – o mais novo, Francis, a alfinetava – Afinal, nem mãe você tem, Jordana!
- Por favor, não falem assim da minha mãe! Vocês também não têm a de vocês por perto! – argumentava Jordana, segurando o choro.
- Ah, mas nós conhecemos a nossa mãe, se ela não está aqui, foi porque Deus a levou, mas ela esteve conosco! E você, que nem sabe como é o rosto da sua? – Henrik a provocava.
- E ainda por cima, tem um pai que mal cuida de você direito! – dizia Francis, rindo – Também, quem iria querer uma filha como você, que até rejeitada pela mãe foi?
- Não é verdade... – a primeira lágrima escorreu pelo rosto da menina – Meu pai sempre me amou muito... muito!
- Então ele é muito burro! Como pode amar aquela que foi a culpada por ele deixar de ser monge? Hein? – Henrik desafiava Jordana.
- O... O quê? Que história é essa...? – balbuciou ela, surpresa.
- Eu ouvi tudo quando seu pai contava o que aconteceu para o meu! E me lembro até hoje! Seu pai era monge, mas sua mãe largou você com ele, fazendo com que ele deixasse o serviço religioso. – a expressão do menino era cruel – Tudo sua culpa, ele precisar mendigar um emprego para poder cuidar de você!
- Por isso mesmo, você deve nos obedecer em tudo! Se não fosse nosso pai, você não teria nada! – Francis a empurrou.
- Não, não pode ser... tudo isso é porque eu tiro notas melhores que vocês, mesmo sendo mais nova? Porque o senhor Aubert disse que vocês deveriam estudar como eu? – Jordana chorava.
- Mas é muito sonsa mesmo! Francis! Pegue o livro da mão dela! – ordenou Henrik ao irmão mais novo, no que este prontamente o obedeceu, indo até a garota e tentando pegar o pequeno livro que ela carregava à força.
- N-Não! Esse livro não, eu ganhei de aniversário! Por favor, não! – ela desviava dos meninos, tentando preservar seu pequeno tesouro, mas seu esforço foi em vão.
Henrik deu uma rasteira em Jordana, enquanto Francis a segurava pelos braços, imobilizando-os; o mais velho ria ao pegar o pequeno livro, e ler o título na capa, debochado:
- Oh, Contos de Fadas de Andersen! Patético. – com isso, o menino abriu o livro e passou a rasgar as páginas uma a uma, diante da garota que chorava.
- Não! – gritava Jordana, debatendo-se para se ver livre do jugo de Francis – Vocês não podem fazer isso, é meu!
Lágrimas brotavam do rosto da pequena; não era a primeira vez que eles a atormentavam por tirar notas melhores que as deles, atraindo o orgulho de seu próprio pai e a atenção do dono da casa. Jordana não queria conflitos com os garotos, mas dessa vez, eles vieram dispostos a humilhá-la.
- Ei, vocês, parem com isso agora! – a governanta da casa chegava, e os rapazotes saíam correndo, rindo alto em seu caminho. A mulher alta parou diante da menina, e compadecida, ajudou-a a se levantar – Não fique assim, Jordana. Venha, eu vou levá-la para casa.
- M-Meu livro...! M-Meu pai...! – foi tudo o que ela conseguiu murmurar, entre soluços altos.
A governanta a abraçou e a levou até a casa dos Gaarder, ajudando a menina a se banhar e colocando-a na cama, já que Jordana não quisera comer. Deixou a pequena residência, e a garotinha relembrou tudo o que os meninos disseram, tentando entender o que era verdade ou não. Chorava. Eles haviam tocado em uma de suas maiores feridas, e a infelicidade tomou conta de Jordana, sua alma inocente sofrendo com a humilhação a que ela e seu pai foram submetidos.
- Filha, está tudo bem? – a voz de Ibsen veio da porta, e ela ergueu o rosto vermelho pelo choro.
- Papai, estragaram meu livro novo, desculpe. – seus lábios tremiam – Eles eram mais fortes do que eu.
- O livro é o de menos, minha filha. Eles a machucaram? – o ex-monge a escaneava com o olhar – Fizeram algo com você?
A menina explodiu em choro, e despejou tudo o que acontecera, em detalhes; a cada fato narrado, o pai mordia os lábios em raiva, ou abaixava a cabeça em constrangimento. Aquela era uma história que ele queria contar a ela na hora certa, e os filhos de seu patrão arruinaram todo o esforço que ele tivera em poupar um pouco a sua filhinha.
- Jordana, minha filha, eu fui sim, um monge, e até hoje não sou bem visto em alguns lugares devido ao que houve. Sua mãe foi uma mulher muito especial na minha vida, não tenha raiva dela, pois ela me deu você... – ele sorria – Tudo valeu a pena, pois você é um pedaço dela, e está aqui comigo. Ela não a rejeitou, apenas teve que viajar e nos deixar... um dia, quem sabe um dia, ela não volta para te conhecer, hum, minha sereiazinha?
- Papai, isso é verdade? – a menina enxugava as lágrimas – Eu não tenho culpa pelo que aconteceu a você?
Ibsen compadeceu-se da filha; não colocaria esse fardo nas costas dela, pois sabia que os outros tratariam de fazê-lo. Enquanto pudesse evitar o sofrimento dela, o faria.
- Não, minha pequena sereia, não. Você foi a melhor coisa que poderia acontecer na minha vida. E eu vou provar a você o quão especial é, Jordana, dividindo meu maior segredo com você, filha.
- Um segredo? – a menina aprumou-se, contente – Que segredo, papai?
- Você se lembra daquelas histórias que sempre lhe contei sobre mitologia grega? Lembra-se do mito de Pandora? Dos Deuses do Olimpo, e que eles possuíam uma guarda real?
Jordana assentiu com a cabeça, e o homem moreno tirou um grosso livro da valise que carregava, abrindo-o diante da filha. Mostrou a ela uma gravura antiga, mostrando catorze guerreiros de costas, utilizando armaduras douradas. Apenas uma delas possuía asas, a de um homem com uma faixa na cabeça. As outras armaduras eram portadas por homens de diversos portes e alturas, a maioria com cabelos longos, e Jordana observou o desenho atentamente, curiosa.
- Quem são eles? – a pergunta da garota foi direta.
- Esses, minha filha, são os guerreiros imortais da guarda do Olimpo, que mais tarde seriam conhecidos como Senhores do Submundo. – apontava para cada um eles.
Assim, durante aquela noite, o senhor Gaarder contou à filha a verdade contida atrás do mito de Pandora e sua famosa caixa, e apresentou a ela cada um dos Senhores e seus respectivos demônios; uma curiosa e interessada Jordana absorvia tudo o que ele dizia, fazendo suas próprias perguntas, e o pai as respondia prontamente. Ambos se dirigiram à pequena água-furtada da casa, onde o ex-monge guardava tudo o que recolhera durante aqueles anos de pesquisa, desde quando morava na abadia; cadernos e mais cadernos de anotações jaziam em uma pequena mesa, assim como pequenas fitas gravadas. Muitos livros estavam espalhados pelo ambiente, e a menina sorriu, como há muito tempo não fazia.
- CONTINUA -
