Read my mind
A figura estava parada no meio da campina, encarando o horizonte. Os raios suaves do crepúsculo passavam por cima das árvores e acariciavam sua pele docemente. Ela não produzia som algum. Sequer parecia viva de verdade.
Crack!
O som quebrou a tranqüilidade da campina. O garoto misterioso pareceu ficar tenso por um momento, como se temesse que algum inimigo poderoso saltasse dos arbustos e o atacasse pelas costas.
De fato, uma enorme figura surgiu, abandonando a segurança das trilhas da floresta. Os últimos raios solares do dia iluminaram seus densos pêlos longos e avermelhados.
Um lobo.
Um poderoso guerreiro dotado de presas terríveis, patas fortes capazes de correr distâncias enormes, um focinho que captava cheiros diversos e um uivo ao mesmo tempo sedutor e apavorante.
- Jake... – disse o garoto.
O lobo balançou suas orelhas triangulares e avançou lentamente pela campina. Deixou uma fileira de pegadas grandes na terra, pegadas que poderiam deixar o maior dos caçadores com medo.
A fera acabou com a distância que a separava da figura misteriosa e tocou sua mão com o focinho. O vampiro sorriu e afagou sua cabeça, como se estivesse brincando com um dócil husky e não um de seus irmãos distantes e ferozes.
- Jake! – disse o vampiro, quando o lobo começou a saltar a sua volta – Fique quieto, parece um cachorro idiota!
O lobo fez um barulho parecido com um espirro e deitou o corpo de lado no chão. Virou a enorme cabeça para poder mirar os olhos dourados com seus olhos castanhos.
"Eu não sou um cachorro idiota. Sou um lobo. Posso te matar, se quiser..."
- Não teria coragem. – zombou o companheiro de olhos dourados, chutando amigo nas costas.
- Arf! – fez a fera, virando a cabeça ainda mais para tentar abocanhar o pé do vampiro.
- Viu? Não consegue nem mesmo me machucar!
O lobo virou-se de barriga para cima e abanou a cauda, soltando pequenos ganidos de filhote. Seus pêlos pareciam tão vermelhos, tão suaves e densos... Como seria bom poder abraçar aquela criatura tão magnífica! Como seria bom cravar as presas em seu pescoço, mesmo que isso fosse fatal...
- O que está pensando?
"Fala como se não pudesse entender, mas sei que pode."
- Ora, eu devo estar perdendo a razão. Você é idiota demais para saber o que quer. E não abra tanto as patas, eu sei que você é macho!
- Arf!
O lobo ficou de pé em menos de um segundo e derrubou o vampiro no chão com uma investida. Antes que o companheiro pudesse se levantar, Jake colocou as patas sobre seu peito, em uma inútil tentativa de imobilizá-lo.
- Andou melhorando o ataque surpresa, hein? – o vampiro riu – Mas eu sou mais forte.
Ele agarrou o lobo pelo pescoço e inverteu as posições. Agora, Jake é que estava imobilizado no chão.
- Devia ter previsto isso, cão idiota...
O lobo rosnou, mas logo voltou a se calar. O vampiro fazia carinho em seu pêlo. Era estranho sentir seu contato frio e não ter vontade de cravar suas presas e garras nele... com o intuito de matar.
- Você é tão quente... – o lobo sorriu – Pervertido. Quis dizer no sentido literal!
Jake abanou a cauda, impaciente e tentou se levantar, mas o vampiro o obrigou a abaixar a cabeça de novo. Ele estava começando a rosnar quando ouviu um sussurro que o fez estremecer:
- O que faço com você agora? Mato ou atiro de um penhasco?
O lobo observou o amigo pelo canto do olho. Era impossível dizer ao certo o que sentia. Talvez imaginasse um jeito de se livrar daquela situação tão constrangedora e mostrar ao vampiro que ele era o chefe.
Virou a cabeça de novo. Seu focinho estava a apenas alguns centímetros do rosto do outro. O céu já estava mais escuro e as primeiras estrelas da noite surgiam.
"Leia minha mente." foi seu pensamento ousado.
O vampiro estremeceu.
- Não me peça algo assim! – ralhou.
"Então me atire do penhasco." foi a resposta do lobo, que tentava dar uma patada no amigo.
- Você é mesmo um lobo idiota... – murmurou o vampiro, afagando sua cabeça.
"Posso ser idiota, mas é por isso que você me ama!"
O vampiro sorriu, incapaz de negar as "palavras" do companheiro. Então, sob a luz do luar, realizou o desejo do lobo.
