Títulos: Versos Brancos
Autora: Ryeko_Dono
Série: Final Fantasy VII
Resumo: Havia poucas regras nos anos de convivência, mas para Sephiroth e Genesis elas eram suficientes. (SephxGen. Lemon.)


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Versos brancos
Versos que possuem métrica, mas não utilizam rimas.

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Capítulo 1

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Não havia arquivos similares na história da Shinra, mas Genesis e Angeal se juntaram a divisão como Soldiers 2ª classe.

O assunto não tardou a alcançar o ouvido dos soldados, incomodados de terem ao seu lado companheiros que não provaram seu valor. Quando os dois novatos se alinharam aos colegas comentários imediatamente se espalharam pela fileira.

O Capitão exigiu silêncio, também analisando os dois soldados. Angeal Hewley, 23, aparentava ser um bom lutador. Ele tinha um físico apropriado e a expressão centrada, olhos afiados que não lhe fitavam. Um claro sinal de respeito. O soldier tinha braços largos e carregava uma espada em suas costas, além da arma base da divisão. O moreno tratou-lhe por senhor e quanto ao seu motivo para se juntar à companhia, a resposta foi alta e clara.

"Pela honra de ser um Soldier."

O segundo elemento lhe preocupava. Genesis, 22, mantinha um olhar entediado em seu rosto. Suas feições eram muito gentis, além de um pequeno curativo que tinha em sua testa, piorando aquela primeira impressão frágil. O cabelo do Soldier era curto e repicado, castanho de brilhos avermelhados. Parecia mais novo do que realmente era e seu físico não inspirava confiança. Os olhos do rapaz eram azuis e fitaram o capitão sem nenhum respeito.

"Genesis Rhapsodos..." – O soldado não respondeu ao chamado.– "Ambos tiveram boas recomendações em seu treinamento." – O Capitão passou os olhos pelas anotações de mau comportamento na ficha do segundo rapaz. – "Por que se juntou aos Soldier?"

Toda a atenção estava voltada para Genesis, o mais novo Soldier na divisão. Naquela ocasião o diretor e o General estavam presentes, único motivo pelo qual o Capitão não repreendia aquele novato impertinente.

A resposta demorou um segundo ousado. Um suspiro partiu dos lábios do rapaz e Genesis olhou seus superiores um a um, pousando sua atenção na figura do general.

Fitando-o.

Por que se juntou aos Soldier?

"Para me tornar um herói como Sephiroth." – O novato cruzou seus olhos com os do herói prateado, como que esperando uma reação a sua fala. "Foi para isso que me juntei aos Soldiers."

O Capitão teve de calar os sussurros. A resposta do soldado havia sido alta e clara. Ele permanecia a encarar o general, o superior que não mostrou reação perceptível a sua ousadia. Aos poucos os sussurros foram contidos.

Ao lado do rapaz, Angeal fechou os seus olhos com um suspiro de resignada desaprovação.

x-x-x-x

Genesis suspirou ao sentar em sua mesa, sozinho e com um olhar desconfiado para a comida.

Não havia ração como no exército comum, ao menos isso fez o rapaz se animar um pouco mais com a sua condição. Ainda assim, o novo Soldier pegou pouco alimento e analisou cada mordida, ignorando olhares indiscretos.

Ele podia ouvir os sussurros, a resposta imediata a sua presença. Genesis estava absolutamente acostumado a eles e até admitia que a situação era extraordinária... Meados de Setembro, e nenhum Soldier era convocado fora de época. Nenhum Soldier entrava na companhia como 2ª classe. Era uma situação excepcional, mas o ruivo a fizera por merecer.

"Ao menos as instalações são melhores do que no exército..." pensou o Soldier, olhando os horários de treinamento fixos nos murais. Uma lista interessante de missões voluntárias.

"Hey, Genesis."

Angeal aproximou-se, sentando-se a seu lado. Estranho vê-lo com o novo uniforme... Genesis analisou de cima a baixo o amigo de infância, abrindo um sorriso discreto e lhe puxando uma cadeira.

Este por sua vez analisou o casaco avermelhado, a armadura dos soldier por debaixo do sobretudo.

"O que você descobriu de novo?" – Perguntou Genesis.

"Nossos quartos, horários, fichas de alimentação e uniformes." - Angeal esperou a aprovação do amigo, recebendo em troca um mero menear de cabeça. – "E você, o que encontrou?"

Genesis estendeu o seu sorriso. "A biblioteca"

O soldado tirou um livro do meio de suas vestes, um volume grosso de poesia. Angeal o fitou em silêncio por um instante, rindo alto no momento seguinte. Parecia que com aquela risada o moreno liberava também um pouco do seu nervosismo. "Algumas coisas nunca mudam." Pensou. Genesis continuava distraído, comendo pouco e não se atendo ao que pensavam sobre ele. Extremamete calmo, mesmo naquela situação.

O mais novo olhou ao redor, tomando consciência dos olhares irritados. Tão indiscretos... Sua pergunta foi tomada de ironia.

"Acha que conseguiremos algum guia para nos mostrar as instalações?"

Angeal trancou o sorriso. Sua sobrancelha se ergueu levemente, como sempre fazia quando o assunto era a falta de noção do colega. Sua resposta foi inevitavelmente dura. "Genesis, você não devia ter dito aquilo ontem"

"Por que não? Eu não estava mentindo, você sabe muito bem disso."

"Você foi petulante!"

Genesis sorriu com a lembrança... os sussurros. Ele não se importava. Ignorou a bronca, prestando mais atenção em seu rolinho primavera. O rapaz evocou na memória a lembrança de Sephiroth. A resposta inexpressiva, inalterada do general.

"O que você achou do general? Ele me pareceu menos agressivo do que eu imaginava. Mais novo também."

"Ele não é mais velho do que nós."

"Não... Isso não é simplesmente detestável?"

Genesis bufou. Seus olhos brilharam com uma determinação perigosa e o rapaz afastou seu prato, ignorando o incômodo de Angeal com a quantidade de comida desperdiçada. O moreno sempre reclamava de suas atitudes... a única pessoa no mundo que sequer se importava com elas.

"Vamos!" – Genesis se levantou rapidamente. "Vamos encontrar algum lugar para treinar, Angeal. Eu ainda não me vinguei por você ter cortado meu rosto..."

O curativo havia sido retirado, mas a bochecha direita mantinha a leve escoriação. O ruivo apontou o indicador para a face do amigo, o meio-sorriso brilhando um desafio familiar.

"Foi muito baixo."

x-x-x-x

A discussão podia ser ouvida à distância.

Uma dezena de Soldier estava reunida na porta do centro de treinamento, muitas vozes se pronunciando ao mesmo tempo. Um rapaz loiro tentou se sobresair perguntando o que estava acontecendo, mas apenas recebeu uma resposta grosseira. O soldado que a proferiu engoliu em seco ao perceber que aquele loiro intrometido era na verdade o diretor Lazard.

Felizmente para ele o rapaz o ignorou. Mais importante era se aproximar do núcleo da discussão, seguido de perto por Sephiroth. Os dois superiores conversavam antes de se misturarem a situação, ou ao menos Lazard conversava e o Soldier permanecia irremediavelmente calado. Cabia ao loiro qualquer tipo de comunicação, mas o diretor sabia que tinha de manter os assuntos em dia com Sephiroth.

"O que está acontecendo aqui?"

Nenhuma palavra foi dita. Lazard encarou os soldiers um a um até descobrir os dois novatos que ele procurava. Bem no centro da discussão.

"Genesis, Angeal. Que bom que os encontrei!" – Seu tom de voz foi amigável, como se tivesse se esquecido politicamente do imprevisto. - "Venham caminhar conosco. Se os senhores nos dão licença..."

Os dois se entreolharam e concordaram, ainda atraindo olhares irritados. Lazard queria saber o que aconteceu, mas não queria indispor os dois rapazes logo no primeiro dia. Disciplina cabia aos capitães, não a ele. O diretor tinha motivos suficientes para mantê-los por perto.

"Não liguem para isso. Logo se acostumarão com a rotina do centro, eu tenho certeza."

Angeal respondeu um "sim, senhor" padronizado e Genesis não disse nada. O grupo caminhou pelo centro de treinamentos externos. Seguiram as marcações no chão, usando uma trilha bastante usada para corrida, senão para punições. Durante o percurso Genesis por vezes observava o general com o canto dos olhos.

"Vocês foram muito bem recomendados pelos seus superiores... penso que a escolha de tê-los promovido para 2ª classe tenha sido correta depois das missões arriscadas que realizaram no exército. Ainda assim essa decisão é um pouco inusitada." Ambos concordaram "Estava comentando com Sephiroth agora mesmo como é raro, mesmo entre os Soldier, um soldado que realmente se destaque."

Os elogios não eram desmerecidos, mas constrangiam Angeal e ao menos aparentemente entediavam o ruivo. A tarde estava nublada e os quatro rapazes, imponentes a sua maneira, caminharam em silêncio quando cessaram os agrados do diretor.

O silêncio foi quebrado pela fala de Sephiroth, analisando Genesis brevemente.

"Soldiers têm de usar os seus devidos uniformes."

A voz do rapaz era grave, forte demais para um semblante andrógino. O ruivo olhou suas próprias vestes avermelhadas, então fitou o general nos olhos, sem compreender o quanto aquilo era raro.

"Você não usa o seu."

Ao seu lado Angeal engasgou e Lazard arregalou os olhos, surpreso com a ousadia do novato. Sephiroth, entretanto, não mostrava reações. Sua resposta foi tão séria quanto seu comentário.

"Eu sou um Soldier 1ª classe."

Genesis entreabriu os lábios para responder, então sorriu levemente. Seus olhos se abaixaram apenas para tornarem a encarar o general com um brilho determinado.

"Então... Quando eu for um 1ª classe eu poderei me vestir dessa forma?"

"Por que tem tanta certeza de que será um 1ª classe?"

O Soldier não respondeu. O rapaz apenas sorriu para o general, uma pontada de arrogância em seus lábios. Provavelmente espontânea. Sephiroth contraiu seu olhar naquela certeza, mas nada mais foi dito entre eles.

Lazard quebrou o silêncio com uma risada nervosa.

"Confiança é uma boa qualidade em um Soldier..." Seu tom não parecia concordar inteiramente com aquela afirmação. "Mas venham comigo vocês dois, precisamos discutir seu treinamento em particular."

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Genesis empurrou o seu prato e suspirou.

A comida estava satisfatória, mas algo tirava o seu apetite... Provavelmente os 3 rapazes que cercavam sua mesa, gritando provocações que o ruivo não fazia questão de ouvir. Aquela situação se mantinha há quase 5 minutos e Genesis encarava os agressores como se procurasse alguma intenção por trás das palavras.

A porta do refeitório foi aberta. Seus olhos azuis, assim como tantos outros, observaram o rapaz que entrava, sempre procurando algo mais na figura do general.

Sephiroth caminhou, mas não precisou procurar lugar para sentar. Dois soldiers 3ª classe se levantaram e lhe fizeram uma continência, cedendo o lugar que o 1ª aceitou inexpressivo.

"Por que fizeram isso...?" - Genesis não podia deixar de reparar que os soldados não o olhavam nos olhos.

"Sephiroth é nosso general" - Disse um dos agressores que cercavam sua mesa.

"Não pense que um novato como você está à altura dele."

Genesis suspirou. Os soldiers não eram muito mais velhos do que ele e o ruivo os encarou com um olhar cansado. Ergueu-se e caminhou para fora do refeitório, sendo imediatamente seguido pelos três rapazes. Bem pouco discretos, na verdade.

Sephiroth observou a movimentação com o canto dos olhos. No dia anterior ele havia entreouvido uma conversa de seus superiores, comentando que o ruivo era insubordinado. Infelizmente para o general, Lazard o pedira apenas algumas horas mais cedo, para que ele ficasse de olho naquele Soldier impertinente.

O General não se sentia satisfeito com aquelas pequenas tarefas, mas também estava curioso. Vislumbrou um treino dos 2ª classe e então compreendeu o sorrisinho orgulhoso de Genesis. Ele e Angeal eram extremamente talentosos, rápidos e certeiros nos golpes. Estes se tornavam ainda mais impressionantes quando eram trocados entre eles, dando a entender que estavam bastante acostumados a praticar juntos.

Na realidade Sephiroth detestava aquelas ordens pequenas, mas admitia que estava um pouco curioso.

Acabou ignorando os três rapazes que seguira Genesis, priorizando a sua comida. A ordem de Lazard podia esperar que ele terminasse o seu café da manhã.

Quinze minutos depois o General caminhava pelo centro. Seus caminhos eram quase sempre alternativos, fugindo de aglomerações populares. Sephiroth não se sentia confortável em cruzar o caminho dos soldados, tampouco estes conseguiam ignorar sua presença. Estava atravessando a parte de trás do refeitório quando entreouviu algumas vozes. Os três agressores continuavam a cercar Genesis, Soldier que parecia entediado com aqueles insultos, sem conseguir segurar um bocejo.

"Cansado, Soldado?" – Alfinetou um dos rapazes que o cercava.

Genesis sorriu, respondendo em baixo tom. "Apenas pessoas tolas são geniais no café da manhã."

Os olhos do agressor se comprimiram com o tom irônico. "Você está me chamando de idiota?"

"As palavras são de Oscar Wilde, mas sinceramente..? Creio que ele daria tanta atenção às suas palavras quanto eu estou dando no momento....."

Um sorriso maldoso por trás da retórica. O agressor não foi tão letrado e tentou alcançar o pescoço do ruivo, mas esse se esquivou com grande velocidade. Um ódio inesperado luminou o seu rosto, prestes a revidar apesar da aparente sonolência.

"Genesis Rhapsodos."

O chamado firme parou os quatro soldados. Os três agressores engoliram em seco, mas Genesis apenas fitou o General. Levemente frustrado por não ter conseguido acertar as contas. Nada surpreso pelo rapaz lembrar o seu nome.

"Lazard tem uma mensagem para você. Venha comigo."

Os três engoliram em seco, bateram uma continência para o General, sendo imediatamente ignorados. Genesis umedeceu os lábios e acompanhou-o, concordando com um menear de cabeça.

Os passos foram rápidos, o ruivo fez questão de estar longe do alcance dos soldados para então falar.

"Mensagem de Lazard? Uma maneira de facilitar que vigie os dois novatos, talvez?"

Sephiroth ignorou a impertinência. Não que estivesse acostumado a ela. Na realidade, o General nunca conheceu ninguem que ousasse falar com ele daquela forma. A falta de surpresa era apenas um reflexo de sua personalidade. Isso aquele soldado ruivo nunca conseguiria desafiar.

"Tao cedo e já está tendo problemas?"

Genesis riu, enfiando as mãos nos bolsos e encarando um ponto no chão. "Nada que não seja previsível."

Previsível... o general se perguntava. Passou-lhe as ordens de Lazard e dispensou o rapaz, analisando o uniforme dos segunda classe que ele vestia. O sobretudo vermelho parecia combinar melhor com aquele rapaz, mas Sephiroth esperaria para ver.

Genesis se virou para partir, então parou. Voltou-se para o General com palavras lentas, talvez premeditadas. Ainda assim falava com clareza.

"Eles o respeitam, mas parecem temê-lo." – Sephiroth não reagiu. – "Os outros, eu digo. Julgam uma heresia o fato de eu lhe dirigir a palavra."

Não houve resposta, apenas um silêncio tenso. Genesis sorriu, como se adorasse aquele tipo de reação e Sephiroth apenas aguardou. Fitou o ruivo e esperou o comprimento ironicamente militar, a partida lenta do rapaz.

Sephiroth reconhecia a verdade na sentença, detestava aquela reação automática a sua presença. O segunda-classe parecia diferente, mas nunca faria o General se surpreender. Isso Sephiroth prometeu a si mesmo enquanto o via partir.

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Não demorou muito para que Genesis ficasse conhecido na divisão.

O motivo, porém, era suspeito. Sephiroth já havia vislumbrado um verso ou dois, mas de nenhum ângulo aquele passatempo parecia sensato. Era comentário geral na sala dos comandantes. O passatempo do ruivo, tão inadequado para um soldado.

Loveless era uma poesia famosa na cidade, principalmente pelas constantes apresentações de teatro. Um hobby do Soldier, assim parecia, sem medo de recitar os versos abertamente, ignorando zombarias.

A situação de Genesis era delicada, uma figura inquieta. Logo nos primeiros meses o rapaz atraiu uma atenção negativa, insensível a ela. Suas respostas constrangiam os soldados e Angeal era o único com o qual ele conversava.

"Pare com isso, Genesis!" – Angeal suspirou, fincando a arma no chão depois do treinamento. Os dois se encontravam em um salão virtual e o rapaz deixou o corpo escorrer pela parede. O moreno arfava levemente pelo treino e uma gota de suor escorria de sua testa.

"Por quê?" – Replicou o ruivo, arfando um pouco mais do que o moreno, porém ainda de pé. – "São missões opcionais, não são?"

"Você não pode se alistar em todas elas... Por que se esforçar desse jeito?"

O ruivo deu os ombros e sentou-se ao lado do moreno. Ainda sentia seu corpo palpitar com o esforço físico, uma sensação que lhe agradava, apesar das gotas de suor. Sorriu para o amigo, reconhecendo a sobrancelha arqueada, insatisfeita com seu comportamento. Genesis apoiou a cabeça em seu ombro.

"Não se preocupe... E de qualquer forma, não é como se você não soubesse o motivo." Angeal balançou a cabeça negativamente. "Nós estamos nisso juntos, não?"

O soldado encarou o ruivo apoiado em seu braço. Genesis havia ficado ausente numa missão de 3 dias. Na manhã seguinte os dois partiriam para Wutai e o rapaz ainda o havia convencido a treinar um pouco. Angeal suspirou.

"É claro que sim. Mas não seja tolo, Genesis... vai acabar se matando desse jeito..."- Olhou para o amigo com o canto dos olhos, havia olheiras fundas embaixo dos olhos azuis. "Você sequer dormiu?"

O ruivo sorriu, se apoiando ainda mais no amigo de infância.

"Não." – O olhar de Angeal tornou-se irritado e Genesis sorriu. – "Por isso que eu preciso de você lá... pra impedir que eu durma em cima do Capitão. Todas aquelas ordens tediosas..."

Angeal encarou o rapaz com o canto dos olhos, uma proximidade que sempre fazia o mais velho comprimir os ombros, por um motivo ou dois. O rapaz detestava a própria tensão, assim como detestava a falta de cuidado do outro rapaz. Queria negar. Sabia que era o único que falava com o rapaz, o único que o acordaria. Talvez se ele negasse, se o acusasse, talvez assim Genesis passasse a tomar mais cuidado com as suas ações.

Encarou a expressão do rapaz. O ruivo havia fechado os olhos por um instante, então abriu-os para fitar o chão. Talvez fosse o certo a se fazer, porém era sempre difícil contradizer Genesis.

"Você nunca aprende..." – Angeal suspirava, assim como fazia todas as vezes que o amigo estava tão perto. – "Certo... mas tente dormir um pouco da próxima vez."

Genesis concordou, satisfeito como sempre.

x-x-x-x

Não houve mais treinamentos naquela tarde.

O dia se desenrolou com assuntos leves, um banho demorado para Genesis. O rapaz deixou a água quente cair por suas costas, mentalizando aquele contato. Em Wutai não haveria conforto. Não haveria água quente, tampouco limpa. Não haveria o precioso silêncio que as gotas d'água traziam. Haveria luta, o que para Genesis sempre queria dizer alguns momentos de êxtase, seguido de um inevitável e longo desconforto. Rações, soldados feridos, acordos políticos e a longa volta para casa.

Um mal necessário.

Enquanto vestia o uniforme o rapaz analisava o brasão que ele tanto tentou alcançar. Era tão errado querer mais? Ao menos suas aspirações eram claras...

O ruivo conseguiu dormir por algumas horas, mas estava bem acordado na hora da janta. Assim que chegou ao refeitório, porém, viu que as portas haviam acabado de se fechar. Genesis suspirou. Ele não estava com fome de qualquer forma... e Angeal nunca saberia. O rapaz resolveu caminhar um pouco pelas instalações, antes se infiltrando na cozinha do lugar. Roubou uma maçã, fruta que lembrava bastante a de sua cidade.

Já era bem tarde quando retornou para o pátio. Um horário proibido, mas o soldado não se importou. Estava pensando em tudo o que alcançou desde Banora, sentindo raiva do garotinho doente que ele foi, tanta raiva contida dos pais. As lembranças o queimavam; tardes tediosas na fazenda, livros, os comentários dos moradores. "Peões ignorantes..". Pensou cercado dememórias inadequadas.

Fechou os olhos, contendo aquela cadeia de pensamentos. Quando abriu, prestou um pouco de atenção do cenário particular que estava. Genesis gostou muito do que viu.

Estava parado em uma ponte de estilo oriental, muito parecida com a de sua casa. Um lago com peixes e um jardim zen que combinava muito pouco com o clima competitivo da Shinra.

Genesis sorriu, observando a imagem, apenas inspirando aquela paz. Era errado desejar mais? Decidiu que não. Querer ser o melhor o levara até alí... aonde mais aquela ambição o levaria?

"O toque de recolher já foi soado."

Uma voz o atraiu de seus pensamentos. Genesis detestava aquele tipo de interrupção, geralmente ofensivo quando era desperto daquela maneira. Assim que reconheceu quem lhe falara, porém, conteve as palavras.

"Você deveria voltar para seu dormitório."

Genesis pensou que deveria fazer um comprimento militar. Ainda assim não o fez. Passou os olhos pelas feições do general e continuou, como se ela não o fizesse ter algumas memórias ardidas. Apoiou-se na ponte. "Eu perdi o horário."

Os olhos azuis do rapaz miravam o lago. Sephiroth se perguntou como poderiam ser azuis se receberam a ação do Mako... Ainda assim o general cruzou a ponte com a pretensão de partir. Ultrapassou o rapaz com passos largos, sem punir a desobediência do 2ª classe.

"Você acredita em religião?"

A pergunta lhe parou. O general não responderia a chamados, mas a pergunta o fez olhar para trás. Para os olhos azuis que lhe encaravam de soslaio.

"Não."

"Eu tive de ler a bíblia quando era menor... uma imposição dos meus pais. O melhor livro é o primeiro, o que é meio ridículo de ser dito já que é dele que vem o meu nome." Genesis sorriu para a noite, sem encarar o general. "Todas aquelas punições horríveis... em troca de um desejo tão simples."

O rapaz ergueu a fruta, girando a maçã em suas mãos.

"O fruto proibido do conhecimento..." - Ele suspirou, então deu uma pequena mordida. "A religião tem o papel de cegar as pessoas para ele, assim como a mediocridade." Genesis fechou os olhos, o tom levemente malicioso. "Não que eu seja exatamente um rapaz católico..."

Sephiroth não disse nada, apesar da pergunta entalar em sua garganta. O rapaz queria perguntar o porquê daquele discurso, mas apenas observou. O silêncio não constrangeu o soldado como parecia constranger a todos os outros.

O ruivo se aproximou alguns passos do general. "Desde criança o meu sonho era estar aqui dentro, superar o grande herói Sephiroth..."

O sorriso do rapaz foi provocativo, como se esperasse uma punição pelas palavras. Apertou, porém, a fruta em suas mãos, suspirando novamente.

"Tanta burocracia inútil..."

"Você não deveria falar sobre sonhos." – Genesis encarou a resposta de Sephiroth. – "Nem para mim nem para ninguém. Também não deveria citar o meu nome."

"E por que não?"

Um olhar direto. Apenas em uma luta o general recebia aquele tipo de olhar, e ainda assim de poucos soldados. A ousadia fez uma sombra de sorriso aparecer em seus lábios. Discreta demais para o Soldier notá-la.

"Você não deveria ser tão arrogante... se quer ser um herói."

Genesis abriu os lábios para responder, mas não encontrou argumentos. Preferiu suspirar e encarar novamente o lago. Recitou, por fim, com suas palavras calmas e límpidas.

"There is no hate, only joy for you are beloved by the goddess." O azul o fitava. Genesis umedeceu os lábios antes do próximo verso, saboreando cada sílaba. "Hero of the dawn, Healer of worlds."

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Nota da autora: Fic longa do Genesis, enfim. Já imaginei e reimaginei essas cenas tantas vezes... eu simplesmente adoro o Genesis! Uma bichinha magnífica! Ainda que faça eu me envergonhar toda vez que ouço Gackt... é fangirlism demais com alguém que dá nome pro próprio pênis...(Não que eu ligue exatamente). (E não que o Genesis dê um nome pro seu pênis).

Não o meu, pelo menos xD