Primeiro tema: Sono. Porque cada um dormia do seu jeito.
1. Sleep
Remus sempre tinha aquela aparência cansada. Um pouco desgastada. A lua cheia, embora apenas uma vez por mês, tinha o poder de sugar dele toda a sua energia. Quando ele parecia prestes a recuperar o fôlego, lá estava ela de novo, insistente e inevitável como a morte.
Apesar disso, não conseguia deitar na cama e simplesmente dormir. Precisava abrir um livro antes, mesmo que os outros soubessem que ele não passaria nem da primeira página. Era como se funcionasse para ele da mesma forma como uma canção de ninar funcionava para um recém-nascido. Mas passados pouquíssimos minutos, adormecia quase de imediato, com o livro sobre a barriga. Um dos outros garotos sempre retirava cuidadosamente o livro e o postava sobre a mesa de cabeceira do lupino. Era o primeiro dos Marotos a se entregar ao sono, e parecia sentir especial prazer com isso. Tinha um jeito muito característico de se enrolar no edredom, formando um casulo de onde se via apenas seu nariz por onde pudesse respirar, e alguns fios castanho-claros desalinhados. Era talvez o único momento em que se mostrava completamente sereno, em paz absoluta e calmaria quase invejável.
Mas ele tinha o sono leve. Quando Moony dormia, e como era o primeiro, havia um acordo silencioso de que os outros não podiam fazer o menor ruído. Todos os três respeitavam e velavam o sono do licantropo, mesmo que ele próprio jamais tivesse se dado conta disso. Andavam de meias pelo dormitório para abafar os passos, apagavam as luzes e ficavam quietos, e talvez aquela cena estranhasse profundamente quem estava acostumado com o caos que os quatro eram quando acordados. Mas não quando Moony dormia. Porque sua respiração era agradável, e muitas vezes era o que conduzia Sirius — cuja cama ladeava a dele — ao sono.
Quando Remus acordava no meio da madrugada, no entanto, era difícil dormir de novo. Seu estado de alerta voltava com força total de madrugada, e na maioria das noites ele não pregava novamente os olhos. Mas quando ele olhava os outros três — ele dormia sempre virado para o lado direito, para que tivesse uma visão das outras camas —, tão profundamente adormecidos logo ao lado, ele sentia que não tinha motivos para se preocupar — talvez nunca mais na vida —, e isso era o suficiente para que descansasse, com os olhos fechados ou abertos.
Sirius tinha o sono pesado. Tão pesado que não parecia haver energia o suficiente para roncar, e até mesmo se mover. Ele caía sobre o edredom, muitas vezes mal se cobrindo, porque dizia odiar a sensação de estar preso sob os lençóis — Sirius exigia sua liberdade até quando adormecido. Às vezes ele acordava exatamente na mesma posição em que se lembrava de ter dormido. Com os braços dormentes e a cara amassada, pois dormia largado de bruços. Remus costumava dizer que faria mal a sua coluna, mas não adiantava, era um hábito arraigado. Ele dormia assim e ponto, de bruços. E a menos que James ousasse algumas de suas gracinhas noturnas desnecessárias, ele dormia direto a madrugada inteira.
Mesmo em noites frias ele teimava em não se cobrir. No máximo colocava o edredom sobre os pés, o que era a coisa mais infantil que James alegava já ter visto na vida. Quando ele dormia nessas noites gélidas, acordava enrolado na coberta, e ele sabia que algum dos outros era responsável por aquilo. Muitas noites tentou ficar acordado para saber quem o cobria antes que começasse a tremer de frio, mas nunca chegou a descobrir pois sempre adormecia antes — ele jamais saberia que, como Peter era sempre o último a se deitar, ele era o responsável por Sirius não congelar durante a noite, sempre resmungando como o animago era teimoso e idiota.
Tinha o sono realmente pesado. Tão pesado que nem os roncos ocasionais de Wormtail o acordavam, embora pudesse ser justificável pelo fato de que suas camas fossem as mais distantes uma da outra. Ele quase não sonhava também. E quando o fazia, eram imagens tão desconexas e confusas que há muito ele desistira de interpretar — para o desgosto da professora de Adivinhação.
James era hiperativo. Mas tão hiperativo que os outros se perguntavam frequentemente como diabos sobrava toda aquela energia com a qual acordava no dia seguinte. Movia-se na cama o tempo inteiro. Às vezes tanto, que acordava com o travesseiro e os lençóis no chão, de barriga para cima de modo desconfortável, depois de tanto rolar na cama. Os outros haviam há muito desistido de tentar cobri-lo no meio da noite, pois eventualmente ele derrubaria tudo no assoalho de novo. Ele logo se dava conta e recuperava-os por contra própria, porque James muito raramente dormia direto. E ele sempre se deitava exatamente ao mesmo tempo que Sirius, pois o mundo parecia ligeiramente desinteressante perante a inconsciência do amigo.
Não é que tivesse o sono leve ou tivesse dificuldade para dormir novamente quando isso acontecia, no entanto, quase todos os dias acordava antes do amanhecer. Às vezes mais de uma vez. Ele guiava-se facilmente de volta à inconsciência. Talvez apenas tivesse alguma coisa a ver com sua hiperatividade, que não o largava nem nos sonhos. Eles eram sempre coloridos, confusos e barulhentos, e ele frequentemente se lembrava de tantos detalhes que a professora de Adivinhação batia palmas excitadas quando era a vez dele narrar seus sonhos na sala de aula. Sirius sempre revirava os olhos nessa parte, e dizia que os dois pareciam duas comadres conversando com entusiasmo, enquanto fazem seus tricôs.
Barulhos muito específicos acordavam James Potter. Seu cérebro tornou-se quase treinado e seletivo ao longo dos anos a esses sons. Apenas alguns pareciam aptos a penetrar em sua mente, e ele acordava imediatamente ao ouvi-los. Talvez o principal fosse o som de Remus acordado. A respiração dele era diferente. Ele podia distinguir facilmente o ritmo, o ruído, a intensidade, e tornou-se fácil saber quando o lobisomem estava em um de seus momentos de desagradável insônia. Ele também se movia de modo diferente. Mais arrastado, por vezes impaciente, e era muito fácil distinguir isso do Remus profundamente adormecido. Ele se preocupava, mas nunca havia levantado para ajudá-lo, pois sabia que isso talvez constrangesse Remus. Mas ele erguia a cabeça. Olhava na direção do lupino e resmungava com uma voz quase paternal, "vê se dorme, Moony, ou amanhã vai estar com aquele maldito mau-humor de novo", e havia um som de sorriso em sua voz. Remus sorria também, e embora nunca tivesse contado isso a James — até porque, isso seria constrangedor e sem sentido —, aquilo era normalmente uma das pouquíssimas coisas que o fazia relaxar, e aumentava suas probabilidades de cair no sono novamente. Já James adormecia imediatamente após perceber a respiração novamente serena do licantropo. Para ele, era sinônimo de paz.
Peter roncava. Não no modo trator ou terremoto. Ele apenas ressonava de modo muito característico, e com o tempo isso deixou de incomodar os outros Marotos. Ele dormia virado para a esquerda, a testa quase encostada na parede fria. Às vezes ele falava durante o sono, o que deliciava e incitava provocações por parte dos outros três.
Ele adorava o barulho da chuva. Os relâmpagos também eram agradáveis, quando lançavam sombras pelo quarto em um azulado típico. Ele não cobria os pés. Dizia que era o melhor jeito de regular a temperatura — nem muito quente, nem muito frio, e ele já quase infartara várias vezes quando James resolvia que era divertido agarrar seus pés no meio da madrugada—, mas nas noites geladas, Remus enfiava meias de lã nele, e ele reclamava, mas acabava agradecendo no final. Era o oposto de Sirius, e isso os divertia de certo modo. Ele nunca dormia imediatamente. Era sempre o último a se deitar, pois demorava muito no banheiro todas às vezes. James costumava bater na porta e perguntar sugestivamente o que diabos ele estava fazendo.
Ele gostava de travesseiros fofos, mas em demasiado, como se quase com meio quilo de penas. Também gostava de mais de um, porque não conseguia dormir sem algo entre os joelhos. Remus dizia que era assim que Sirius devia dormir também, antes que estragasse sua coluna, mas nenhum deles realmente se importava, porque Remus sempre tinha aqueles acessos de discursos quase maternais. Se sonhava ou não ele nunca sabia, pois simplesmente nunca se lembrava. Seus cadernos de Adivinhação eram obviamente cem por cento inventados por causa disso. Isso quando ele simplesmente estava desinteressado demais e os entregava em branco. Uma única vez deixou que Sirius e James fizessem essa lição para ele, mas fora tão traumático e vergonhoso quando a professora o lera em voz alta na sala de aula, que ele nunca mais ousou repetir o feito.
Ele usava um tapa-olho ridículo, que era motivo de frenéticas risadas entre os outros, e uma vez James usou um feitiço para que se colasse ao rosto do garoto, que pensara seriamente que estava ficando cego e caíra de cara no chão, seus pés embolados nos lençóis. Ele sabia que dormir de costas para James era um perigo constante — aliás, sequer virar as costas para James já era considerado de alto risco —, mas não conseguia evitar. Gostava de encostar no frio da parede, ajudando a regular seu termostato.
NA: Obrigada pela leitura.
