Capítulo 1 – Estranhos
Onde eu estava? Foi a primeira pergunta que fiz para mim mesmo, olhei em volta para ter conhecimento do lugar, acabei me assustando, um dos cantos estava um breu total, mas da penumbra saia um balcão que ia paralelamente com a parede, até o outro lado do recinto, umas mesas tombadas e garrafas, dezenas delas espalhadas pelo chão, optei não me aventurar no breu, corri até a porta do outro lado do bar
Ao sair me surpreendi ainda mais, atualmente resido no Rio de Janeiro, mas ao sair me deparo com meu bairro, onde passei toda minha juventude, em São Paulo, contudo se isto fosse o fato mais estranho eu estaria feliz, normalmente o bairro costumava ser um dos mais movimentados da metrópole, agora nem mosquitos se escutava, corri praticamente em círculos, mas logo estava parando meu fôlego já não é de um adolescente de dezessete anos.
Comecei a entrar em pânico, um dos pesadelos que me acompanha desde meus oito anos, quando fiquei preso em um buraco, desde lá tenho pavor de ficar sozinho. Tudo estava deserto, nada, nem latidos, nem berros, nem buzinas, nenhum barulho, simplesmente nada.
Instintivamente olhei para cima como uma prece a Deus, mas uma gota d'água interrompeu meu movimento, depois um estrondo, um relâmpago talvez? Começou a chover, e pesado. Já não enxergava nada, corri pelas ruas feito um cego. E agora o que aconteceria? Entrei numa casa, só pude distinguir a cor do muro, era laranja. A garagem era coberta, finalmente eu estava livre da chuva, olhei para trás para conferir a intensidade da chuva, quase caí de costas, não chovia, mas o barulho da chuva continuava, e além do mais eu estava todo molhado, como isto pode acontecer?
Mas o que mais me chamou a atenção foi outra coisa, não sei ainda dizer se foi coincidência ou o destino, acabei entrando onde passei vinte anos de minha vida, minha casa, fiquei até emocionado, passei as mãos sobre a parede da garagem, olhei de cima abaixo, ri comigo mesmo as infiltrações da parede que tanto atormentava minha mãe, estavam no mesmo lugar, olhei para o fundo da garagem, onde eu tinha certeza que teria duas portas, uma que daria na sala, no lado direito, e outro que levaria a um corredor, que ia até o quintal da casa, no lado esquerdo da garagem.
Não sei se eu estaria preparado para entrar na minha casa, aconteceu uma coisa terrível, uma coisa que me fez mudar para o Rio de Janeiro, um acontecimento, que nunca me fez olhar para São Paulo com bons olhos de novo, uma coisa que me arrependo profundamente, e que vou levar até o último segundo de vida.
Sentei no chão, com as pernas cruzadas, e apoiei a cabeça sobre as mãos, fiquei naquela posição desconfortável até, mas fiquei, consegui clarear minha mente, pensar com franqueza comigo mesmo, eu estava sonhando, era a única saída lógica não tem outra, não pode haver, tem que ter uma razão para isto estar acontecendo comigo, castigo? Sinceramente não sei, mas continuo sem entender.
Fazia frio, e o incrível era que estava um sol de rachar, meu corpo tremia, as pontas dos dedos da minha mão estavam endurecendo, precisava me esquentar, era quase uma questão de sobrevivência. Encolhi-me no chão, acabei adormecendo.
Tive sonhos, ou pesadelos conturbados, vultos e mais vultos, eu corria, mas no fim eu acabava encurralado, sem saída e ficando sem ar, então uma sombra aparecia e sussurrava palavras estranhas a meus ouvidos, não parecia só uma língua, mas várias. Não dava para distinguir o rosto, mas sua voz era nervosa, e parecia que havia um pouco de urgência, mas as diversas línguas que a sombra falava, parecia que a frase queria dizer sempre a mesma coisa, porém aquela voz sussurrando em meu ouvido parecia uma voz familiar, uma voz que me dava sensação de paz e tranqüilidade. Então acordei com um som estranho, um grito, que penetrou minha alma como um raio.
