Capítulo 43
Ele não podia afogar os problemas na bebida, nem galinhar por aí até que os esquecesse. Era como se, para cada passo que ele dava na direção de Hermione, tivesse de dar outro para trás. Sim, ainda estava furioso com o fato de ela ter planejado vender informações da sua família em prol do trabalho, mas, quanto mais pensava no assunto, mais a respeitava por ter dito não ao chefe.
Ela precisava de um emprego.
E nisso ela era diferente dele.
Ele poderia passar o resto da vida ostentando, e ainda assim teria mais dinheiro do que poderia contar. Hermione, no entanto, não tinha poupança, caso precisasse. Também não tinha uma mansão multimilionária que pudesse vender, nem dez carros importados.
Ela precisava comer e pagar as contas, coisas com as quais Rony nunca tinha precisado se preocupar. Nunca.
Ele já tinha planejado tudo: faria alguma piadinha para quebrar o gelo e depois pediria desculpas por ter se descontrolado na noite anterior.
Mas então eles tiveram que substituir os noivos naquela maldita cerimônia, e tudo pareceu tão real que ele começou a tremer ao segurar as mãos de Hermione. Quando disse aqueles votos, estava falando sério. Pela primeira vez na vida, queria que o compromisso fosse real. Droga, queria que ela visse além da máscara dele e o aceitasse!
Naquele momento, quando ela segurou as mãos dele, quando ele a olhou diretamente nos olhos azuis, seu coração implorava para que ela visse mais do que todos antes já tinham visto. Pensou que, se existia uma pessoa capaz de ver mais que suas inseguranças, essa pessoa era Hermione.
Mas, em vez de fazer isso...
Ela o deixou exposto como um fio desencapado, para que todo o mundo visse. E, pela primeira vez na vida, Rony ficou sem saber o que dizer para melhorar sua situação. Ele a chamou de escrota e foi embora — outra vez. Foi embora. Era assim que lidava com as coisas? Ia embora e ficava deprimido? Não queria mais ser esse tipo de homem, o tipo que ignorava todas as emoções, que as enfiava na parte mais distante do cérebro e se embebedava para esquecer que as tinha.
O problema em finalmente lidar com os demônios do passado era que eles tinham feito parte dele por tanto tempo que viraram quase uma espécie de conforto, ou, no caso dele, uma muleta.
Rony ainda tinha problemas com a morte dos pais de Gina — nunca superaria o fato de que os dois foram tirados dele e da amiga. E achava que nunca se encaixaria nos padrões rígidos do pai sobre como um Potter deveria se comportar. Além disso, havia a própria crença de que não seria capaz de amar alguém como as pessoas mereciam ser amadas.
Passara a vida inteira com medo de compromissos, mas só agora percebia que estava em uma relação havia vinte e três anos. Estava preso a si mesmo, em um relacionamento com os próprios demônios. A coisa mais importante em sua vida sempre fora aproveitar o momento, viver para si mesmo. É comum que os pais alertem os filhos dos perigos dos relacionamentos ruins com outras pessoas – por que nunca os avisam dos perigos de se relacionarem mal consigo mesmos? Com o próprio coração?
Rony foi para os fundos da casa, até o deque com vista para o rio. Com um suspiro, sentou-se na beirada e ficou observando um restaurante flutuante que navegava lentamente.
A vida era tão mais fácil quando ele era criança! Quando suas únicas preocupações eram se a mãe tinha lavado o uniforme de basquete a tempo ou se as outras crianças da escola queriam jogar futebol.
Ser adulto era uma merda.
E finalmente perceber que era um babaca egoísta não ajudava muito.
— Posso me sentar? — perguntou Harry, atrás dele.
— Claro — respondeu Rony.
— O tempo está ótimo. — Os joelhos do irmão estalaram quando ele se sentou ao seu lado.
Rony assentiu e continuou olhando para a água. Se encarasse o irmão, provavelmente surtaria — estava no limite.
— Quer me contar o que está acontecendo? — perguntou Harry.
Respirando mais fundo, Rony inclinou o tronco para trás, apoiando-se nas mãos, e sacudiu a cabeça.
— Não muito.
Rony percebeu um movimento com o canto dos olhos. Então viu Harry tirar um pequeno envelope do bolso.
— Bem, olhe só. Eu nunca quis lhe entregar isto aqui.
— Quer o divórcio? — Rony tentou soar brincalhão, mas estava um pouco assustado. O que poderia estar naquele envelope?
Harry revirou os olhos.
— Você não vai se livrar de mim assim tão fácil. Não, não é nada do tipo. É só... — Ele soltou um palavrão. — Este ano, Gina finalmente leu algumas das cartas que os pais dela deixaram com o testamento. Parece que eles adicionaram mais coisa no documento um ano antes de morrer e adicionaram algumas palavras para os mais queridos, só por precaução.
Rony mordeu o lábio inferior e desviou os olhos quando as lágrimas ameaçaram sair. Era por isso que nunca falava dos próprios sentimentos. Só de conversar sobre os pais de Gina, sentia o peito doer. Mas que droga! Por que eles tiveram que morrer daquele jeito?
Por que tinha que ter acontecido na mesma noite em que Rony fora pego fazendo outra coisa irresponsável? Por que ele não tivera a chance de pedir desculpas ao pai de Gina?
Harry entregou o envelope a Rony.
— Este aqui é para você.
— Para mim? — Rony pegou o envelope. — Por que vai me entregar isso agora? Por que só agora?
Harry deu um sorrisinho.
— Porque minha futura esposa é persistente... — Ele cutucou Rony. — E porque havia instruções específicas para só o entregar a você quando certa coisa acontecesse.
— Ah, é? Que coisa? Quando eu ficasse maluco?
Harry umedeceu os lábios e desviou os olhos.
— Não. Quando você se apaixonasse.
— Acho que estamos tendo um momento especial — brincou Rony.
— Cale a boca. — Harry deu uma risada. — Eles escreveram cartas para a família e os amigos. Parece que a mãe de Gina gostava muito de fazer anotações. Tem um caderno cheio de pensamentos e poemas. De qualquer forma, só restaram duas. Uma para Gina, para que ela lesse no dia do casamento, e outra para você...
— E você? Também ganhou uma carta? — perguntou Rony.
Harry sacudiu a cabeça.
— Eu ganhei Gina. Acho que veremos o que a carta dela diz amanhã, quando dissermos os votos. Você ainda tem planos de levá-la até o altar com papai?
Rony lutou contra as marteladas no interior da cabeça e assentiu.
— Que bom. — Harry deu um tapa nas costas do irmão. — Vou deixá-lo sozinho com isto. — O irmão indicou a carta. — A gente se vê durante o jantar.
Rony apertou a carta nas mãos e esperou enquanto Harry saía. Com os dedos trêmulos, ele abriu o selo e retirou do envelope um pedaço de papel. O conteúdo era curto e direto, escrito em garranchos.
Eu sabia que isso ia acontecer. Disse isso à Molly hoje mesmo, pela manhã, e ela riu da minha cara. Eu me pergunto se foi Gina quem finalmente despertou seu interesse. Ah, um pai sempre sabe! Você olha para ela como um homem olha para a melhor amiga. Dá para perceber.
De qualquer forma, nunca conversamos sobre aquela noite, Rony. Sabe de qual estou falando. Bem, duvido de que vá se esquecer de ter cavado buracos no jardim e se desculpado várias vezes por ter sido pego com drogas na companhia de mulheres com quem não devia se meter. Você sempre foi muito espirituoso. Rony, naquele momento eu sabia que você provavelmente cresceria e se tornaria um daqueles empresários executivos. Aqueles com carros chiques e mulheres fáceis. Dava para ver isso em você, e tenho que admitir que fiquei um pouco assustado ao pensar em você e Gina juntos.
Acho que vou ter que confiar em que continua aí dentro o que lhe ensinaram quando você era pequeno. Deve ter continuado se depender daquela sua avó.
Molly disse que precisamos escrever cartas para nossos amigos e a família, só por precaução. Sei que você deve estar se perguntando por que escrevi uma para você. Você sempre foi como um filho para mim, Ron. Eu o conheço desde que você usava fraldas. Mas hoje me ocorreu uma pergunta: e se eu não chegar a vê-lo crescer? E se eu não estiver no seu casamento? E se eu não puder fazer parte da sua vida, do seu futuro? Quando envelhecemos, pensamos no passado, nos nossos arrependimentos. Meu maior arrependimento é de não ter conversado uma última vez com meu pai, antes de ele ir para o outro mundo. Embora você tenha um pai maravilhoso, sempre me senti como uma segunda figura paterna para você. Dito isso, Rony, quero que saiba que tenho muito orgulho de você. Imagino que já tenha passado por sucessos e fracassos, mas, mais do que isso, estou orgulhoso por você ter encontrado alguém a quem valha a pena se apegar. Quando os homens se apaixonam, eles se apaixonam mesmo. A queda é terrível, caem de bunda na água e sem salva-vidas. Você é um desses homens, Rony. Quer um conselho? Seja homem. Não se deixe afogar. Não corra nem nade para longe da segurança do barco. O barco é a sua casa, a sua família, a sua vida. Já aquilo que o faz flutuar, sua boia, sempre será sua esposa, sua parceira. Sem algo em que se agarrar, você se afoga. Sem alguém que se agarre a ela, a boia também não tem propósito. Então, já deu para entender que vocês precisam um do outro... Precisam se apoiar um no outro para tudo. Nunca se esqueça de que, se não vale a pena lutar por algo, não vale a pena tê-lo. Quando você pensar em desistir, quando achar que não é bom o bastante, lembre-se de que ninguém é. Nenhum de nós merece as mulheres em nossas vidas, mas ai de nós se não nos esforçarmos a cada dia para nos tornarmos dignos do amor delas! Acho que o que estou tentando dizer é... Ame, agrade, aprecie essa mulher e, pelo amor de Deus, filho, é melhor você provocar mais sorrisos que lágrimas!
Para o meu segundo filho... e sua nova esposa... que a cama de vocês seja cheia de risadas; as noites, cheias de prazer; a casa, cheia de cheiro de comida gostosa; e os corações, cheios de alegria. É para isso que estamos neste mundo — para amar.
Rony engoliu o gigantesco nó na garganta e enfiou a carta no bolso. Maldito fosse Arthur, por fazê-lo se sentir como uma mulher emotiva!
Ele a amava?
Hermione?
Sua respiração ficou acelerada quando começou a pensar nas últimas semanas. Sim, tinham acabado de se reencontrar, mas ele a conhecera a vida toda. Conhecia as sardas em seu quadril, sua aversão a picles, ou a qualquer coisa verde, e também sua risada.
Ah, conhecia bem a risada dela! Ele se sentia como um super-herói toda vez que a fazia rir.
E, no momento, se sentia um babaca, porque fazia tempo demais que Hermione não dava uma risada, e ele realmente ajudara a provocar as lágrimas dela.
Soltando um palavrão, ele se levantou do deque e voltou para a casa.
N/A: Aqui estou eu, com um dia de atraso, maaaaaaas com os 3 capitulos que prometi. Espero que gostem e tentarei ao maximo não atrasar, beijos e ate semana que vem.
