Perdão pelo atraso x.x

Pior que eu nem tenho uma boa desculpa, foi pura e simples procrastinação o que nos trouxe aqui.

Anita, obrigada por aceitar participar do amigo oculto, eu tô sempre colocando todo mundo em furadas hahahaha

Você me pediu um clichezão get together, clichezão é fácil, o get together que sempre é meio difícil pra mim, mas acho que eu consegui alguma coisa.

Eis então, a parte I do seu presente.


Cotidiano, Parte I

Quando a gente é criança e está na escola, parece que o tempo nunca passa, a rotina de acordar atrasada de manhã, correr esbaforida para escola, ser colocada de castigo por comer durante a aula porque não deu tempo de tomar café, de passar todas as tardes tomando milk-shakes e jogando no arcade, de encontrar com minhas amigas todos os dias... Eu não era tão boba como as pessoas diziam, óbvio que eu sabia que tudo mudaria depois da graduação. Mas a graduação sempre parecia tão distante. E mesmo depois do último dia de aula, o verão não me parecia diferente de qualquer outro que eu já tivesse vivido antes e, mesmo as pequenas mudanças eram fáceis de ignorar.

Primeiro foi a Mako que conseguiu um estágio numa confeitaria em Misato. Ela ainda continuou morando no mesmo lugar, mas passamos a nos ver cada vez menos já que agora ela, que sempre foi a mais madura e responsável do nosso grupinho, tinha que pegar o trem bem cedo e passar o dia todo trabalhando, sem tempo para festas do pijama, sessões de cinema completamente espontâneas ou simplesmente vadiar pelo shopping como costumávamos a fazer. Ainda assim, pouco do meu dia-a-dia tinha mudado enquanto eu continuasse visitando Ami-chan todas as tardes para lembra-la de comer e descansar também. Ela tinha entrado em primeiro lugar na Toudai, é claro, ninguém esperava menos dela e confesso que fiquei um pouco aliviada quando percebi que ela ainda tinha as mesmas dificuldades para fazer amigos e não iria me trocar pelas pessoas bem mais interessantes do campus. Então, eu ainda aparecia no apartamento dela com bentou, e doces para força-la a largar os livros. Era diferente do tempo em que fazíamos dever de casa juntas, especialmente quando eu passei a encontrar Chiba Mamoru na casa da Ami-chan, eles eram colegas de faculdade. Era irritante no começo, mas ajudava a aumentar a sensação de que as coisas não tinham mudado tanto assim. Afinal, encontrar meu nemesis em situações inusitadas fazia parte do que eu considerava familiar. Mas assim que Ami-chan se formou com honras, ela me informou que estaria saindo do país para fazer residência. Mako tinha se mudado de vez depois de ser efetivada. Claro que eu estava feliz pelas duas, foi só depois que eu percebi que estaria sozinha.

Eu pensei em entrar em contato com a Naru-chan novamente, mas a gente tinha se distanciado, não houve nenhuma briga, mas, lentamente, parecia que não tínhamos mais assunto e eu não queria ser a pessoa estranha do ensino médio que entra em contato com você para tentar te convencer a entrar num esquema de pirâmide. Não que eu tivesse em algum. Mas era isso que ela iria pensar, provavelmente.

Sendo assim, a única pessoa da minha vida antiga que ainda permanecia, por mais absurdo que fosse considerando como era nosso relacionamento quando eu era adolescente, era Chiba Mamoru.

"Porquê dessa cara de bunda, odango?"

Eu revirei os olhos, mas nem de longe me irritei como eu fazia cinco anos atrás. Apenas aceitei o sorvete de morango com cobertura tripla de chocolate e confeitos extra que ele me entregou. Aquilo também havia se tornado uma espécie de rotina, eu e ele, no parque, observando as pessoas, muitas vezes rindo delas. No parque porque era esquisito ir no Arcade, não só porque nós éramos adultos agora, mas porque Motoki não estaria lá. Ele se mudou para Inglaterra de vez para ficar com a Reika dois anos atrás. Puts! Dois anos!

"Nada."

"Nada?"

"Tem água no seu ouvido, por acaso?"

"Nossa, que grosseria. Só fiquei preocupado."

"Preocupado, sei."

"Claro, estamos num local público, sua cara de bunda poderia alertar as autoridades e se você for presa por ato obsceno vai ser demitida da escola e não vai poder me pagar de volta esse sorvete."

Eu não consegui segurar o riso, mas tentei, tentei com tanta força que escapou pelo meu nariz o que fez com que ele risse quase deixando o sorvete dele cair no chão.

"Sabe, eu tava pensando em como as coisas mudaram desde a escola, mas tem uma coisa que continua igual, o quanto você é insuportável."

"Ahh poxa, e eu achando que tinha melhorado minha performance. Mas fala aí, o que tá te deixando desanimada, eu tô preocupado de verdade, você nunca fica triste assim do nada."

Eu suspirei e dei mais umas lambidas no meu sorvete que mesmo se eu tivesse dinheiro não iria pagar de volta para ele. Ele é rico, eu ainda moro com meus pais porque o salário de professora do jardim de infância não dá pra nada.

"Já disse, tava pensando em como as coisas mudaram, tanto que agora o único amigo que eu vejo com frequência é você."

"Ui, você fala como se fosse algo ruim."

"E não é? Você não sente falta do Motoki-nii-san?"

"Mais ou menos..."

"Como assim?"

"Ah, a gente ainda se fala pelo Skype às vezes, mas meio que não tem muito assunto, sabe? E eu tenho outros amigos da faculdade."

"Você? Tem amigos? Pff duvido."

"Você acabou de dizer que nós dois somos amigos!"

"Nah, eu só ando com você pelos doces grátis."

oOo

"Quantos alunos você tem, odango?" Ele me perguntou com a boca cheia. Esse homem costumava a implicar comigo por causa dos meus modos. Hoje em dia ele aparece na minha casa sem avisar. Meus pais nem ligam. Quando nós nos tornamos mais próximos foi tão estranho, porque pra mim ele sempre foi uma constante e o relacionamento se tornou amigável de forma tão gradual que eu o trouxe para casa numa tarde como eu traria qualquer uma das meninas e foi só quando todo mundo da minha família pareceu brotar do chão para conhece-lo, que percebi que eles nunca tinham sido apresentados. Foi um inferno inicialmente. Eles ficavam fazendo piadinhas e insinuações que eu negava, é claro. Ele havia sido meu nemesis um dia, hoje era meu amigo, e só. Quero dizer, olha pra ele, todo alto e desengonçado. E eu nunca me envolveria com alguém que é claramente dependente químico. Chocolate é um elemento químico, não é?

"Provavelmente mais do que eu vou ter bombons pra entregar se você continuar comendo todos assim." Eu arranquei de debaixo dele uma embalagem de bombom que ele estava tentando esconder e joguei na cara dele que desviou.

"Nossa, eu só peguei dois!" Ele disse fingindo estar ofendido. Na cabeça dele tinha uma coroa feita de papelão com um enorme coração na frente, aquelas seriam as lembrancinhas que eu iria entregar para as crianças da minha turma em comemoração aos dias dos namorados, assim como bombons de chocolate. Eu, sendo eu, enrolei eternamente para começar e agora já era meia-noite e eu ainda estava cercada de papel picado e purpurina na cara. Um ano depois de eu me formar, meus pais me deram um ultimato, disseram que eu teria que fazer algum curso já que não ia para faculdade. Eu nunca fui boa em coisa alguma, mas acho que foi a Mako quem disse que eu lembrava uma professora do jardim de infância dela, mas no final havia sido Mamoru quem havia me incentivado mais a fazer curso, até mesmo me ajudando a estudar pros testes.

"Dois?"

"Dois e meio?"

"Eu não acredito que fui criticada por anos por uma pessoa muito mais viciada em chocolate do que eu. Anda, grampeia isso mais rápido. Quero terminar isso hoje ainda."

Eu pensei que ele ia responder algo engraçadinho para me provocar, eu esperava por isso, mas tudo que eu ouvi foi o barulho do grampeador caindo. Eu me virei em direção ao som e vi Mamoru me encarando com uma expressão estranha.

"Hey, você tá bem?" Perguntei.

Os lábios dele se moveram como se fossem dizer alguma coisa, mas nenhum som saiu. Eu abanei a mão na cara dele e aí Mamoru fez a coisa mais esquisita. Ele pegou a minha mão e beijou. Ele beijou a minha mão como se nós tivéssemos num filme antigo. Eu não sabia o que dizer depois daquilo, só imagino o quão vermelha minha cara deveria estar. Então ele se levantou do chão do meu quarto tropeçando.

"Er... Eu tenho que ir."

"O que?"

"Eu te ligo mais tarde, tchau, Usa."

E eu tenho certeza que algum comitê esportivo consideraria o que ele estava fazendo como 'corrida', pois quando eu cheguei na porta do meu quarto ele já tinha se mandado. Eu cheguei a perguntar pro Shingo que estava jogando videogame na sala se Mamoru tinha dito alguma coisa, mas o inútil do meu irmão estava de fone de ouvido e não me ouviu.

oOo

Mamoru não me ligou mais tarde como ele tinha prometido, também não me ligou no dia seguinte e no outro depois desse. Não é como se eu tivesse morrendo de saudades dele, mas depois de três dias eu comecei a ficar um pouquinho preocupada. O que havia dado nele afinal? Diarreia depois de comer todo aquele chocolate e ele tinha ficado com vergonha de usar o banheiro da minha casa? Lembrou que tinha deixado o fogão ligado? Recebeu mensagens alienígenas da janela e agora estava em uma nave espacial sendo estudado por ETs verdes?

"Nah, é charminho, ele só quer que você fique com saudades," disse a voz risonha de Mako pela chamada de vídeo.

Eu revirei os olhos.

"Para, Mako."

"Usagi-chan, esse menino gosta de você há séculos."

"Lá vem ela..." eu cantarolei.

"É verdade. Todo mundo sabia. Motoki, as meninas, menos você."

"Uhum, tá," eu tentei desconversar porque sabia que aquela era uma discussão que só iria me irritar. Mako insistia nisso quase tanto como ela insistia em só sair com caras que lembravam o antigo namorado dela de alguma forma. "Hey, você viu que apareceu agora um vilão fantasiado também?"

"Ah vi, o tal ladrão de joias, " disse a Mako bocejando, ela tava de camisola apesar de ainda ser cedo, ela acordava muito cedo, "eu quero só ver onde isso vai dar, essa galera acha que está num filme, já não bastava aquela tal de Sailor V."

"Ah, mas a Sailor V é legal, vai," eu disse sentindo minhas bochechas corarem um pouco, eu sou MUITO fã da Sailor V.

"O que ela é, é doida."

"Poxa, Mako, ela ajuda as pessoas."

"Porque você está defendendo tanto? Olha Usagi, se eu souber que você está correndo por aí de saia curta lutando com monstros..."

"Eu? Mako, você já esqueceu de como eu era nas aulas de educação física?"

O rosto de Mako mudou de uma expressão de sono para uma gargalhada.

"Lembra daquela vez que você tentou sacar no vôlei e acertou sua própria cara duas vezes seguidas?"

Quando deu cinco dias de mensagens e ligações não respondidas eu resolvi ir ver se ele tinha morrido e virado comida pro gato da vizinha chata dele. Por falar em gato tinha um que ficava revirando o lixo lá de casa. Meu pai grita e joga água fria pela janela, mas o gato não se manca e fica fazendo uma algazarra horrível acordando todo mundo. Enfim, os gatos da vizinha chata do Mamoru não são assim, eles são muito fofos, o Nikuman é meu preferido por ser o mais rechonchudo, mas o Anpan é muito mais simpático eu e Mamoru gostamos de imaginar como seria sequestra-los pra salvar da vizinha chata, mas nenhum de nós dois realmente tem tempo para animais de estimação.

Antes que eu pudesse chegar ao condomínio chique onde o apartamento de Mamoru ficava, eu entrei numa relojoaria, na vitrine tinha um cartaz anunciando uma promoção de brincos e sinceramente eu queria fazer hora porque não sabia se seria ignorada novamente ou pior, não sabia se queria ouvir dele porque eu estava sendo ignorada. E já era de noite. Vai que ele estivesse com alguém? Vai que era uma mulher... Não que eu tivesse enciumada. Enciumada de que, afinal? Se ele preferia passar o tempo com qualquer uma daquelas meninas metidas da faculdade dele em vez de comigo, problema dele!

Eu estava tentando experimentar um par dos brincos da promoção com força demasiadamente excessiva quando me olhei no espelho e vi um monstro. Não estou me chamando de feia. Era um monstro mesmo. De verdade. Verde e com coisinhas saindo da cara. Eu dei um gritão e tentei sair correndo, mas acabei tropeçando em alguma coisa e caí de cara no chão.

A alguma coisa era um gato preto que caminhou em volta de mim e sentou na minha frente.

"Não faça escândalo," o gato disse, bem era uma gata, eu acho, pela voz, "vai atrair a youma para nós. Venha comigo."

"Mas-"

"Eu disse pra não fazer escândalo," era repetiu irritada e se levantou, caminhando para trás do balcão e então virou o rosto na minha direção por cima do ombro, "venha."

E o que você faz quando você está numa loja sendo assaltada por um monstro verde com a cara cheia de coisinhas e uma gata que você reconheceu como fêmea pela voz manda você calar a boca e a seguir? Eu segui né.


Eu vou postar a segunda parte ainda "hoje" em nome de nosso senhor Lucifer!