Droga, droga, droga.

Não bastassem todas as funções chatas, minha chefe tinha mesmo que me passar trabalho extra às 18hs de uma sexta-feira? Seria desumano em qualquer sexta, mas logo hoje que minha amiga neurótica e extremamente pontual me aguardava? Merda, se soubesse que teria que correr dois quarteirões eu não tinha colocado esses malditos saltos.

- Atrasada!

Foi como fui recebida quando enfim cheguei no bar lotado.

- Oi pra você também, Lily.

Lily Evans, minha melhor e mais antiga amiga. Chata pra caralho. Mentira. Eu a amo. Lily é a irmã mais velha que eu não tive. Ela me conhece do avesso, até melhor do que eu mesma boa parte das vezes. E nunca teve receio de me falar o que quer que fosse na minha cara. E não se assuste, quanto mais palavrão você ouvir por aqui, maior é o nível de afeto.

- Relaxa, ruiva. Eu tive uma semana de merda e ainda assim estou aqui. – Disse antes que ela brigasse mais comigo, jogando minha bolsa na cadeira mais próxima.

- Se você se atrasar no dia do meu casamento eu vou dar na sua cara. – Ela respondeu enquanto colocava mais um amendoim na boca.

- Você tá muito nervosa para quem vai casar com o amor da sua vida em algumas semanas. – Olhei na mesa, dando falta de algo. - Porque não estamos bebendo?

Me dirigi até o balcão e Lily gritou para eu pegar bebida para Alice que estava no banheiro.

- Três cervejas, por favor!

Tive que falar um pouco alto porque o barman estava de costas para mim. Então ele se virou lentamente enquanto enxugava um copo.

Opa, posso acrescentar o barman no pedido também?

Que. Homem. Lindo.

Marlene, foco. Você não veio aqui pra isso hoje.

Mas eu devo ter feito uma cara muito safada porque ele abriu um sorriso enviesado (porra, que sorriso) me entregando os pedidos. E como eu não sou obrigada, também não resisti em abrir o meu melhor sorriso e piscar um olho displicentemente, antes de voltar para minhas amigas.

- Aqui. – Coloquei as cervejas na mesa.

Alice tinha voltado do banheiro. Ela esticou o braço para uma das garrafas e se sentou na minha frente.

- Ele está olhando pra sua bunda.

- Quem?

- O barman gato. – Alice gesticulou com a cabeça, já tomando um gole de cerveja, enquanto olhava para ele por cima do meu ombro.

Olhei por cima do ombro, seguindo seu olhar. E ela estava absolutamente certa.

Na verdade, olhar para minha bunda era uma afirmação suave. Ele tinha as duas mãos apoiadas no balcão do bar, na mesma posição que eu o havia deixado, encarando abertamente. Alargou o sorriso quando viu que foi pego no ato, sem um mísero sinal de constrangimento.

Eu sorri de volta por meio segundo. Até levar um tapa de Lily.

- Ai!

- Nem inventa! Você está aqui pra comemorar comigo.

Levantei as mãos em rendição. Mas não resisti em dar mais uma espiada enquanto me sentava. Ele ainda estava olhando.

Estávamos em pé, cantando e dançando com a banda local favorita de Lily.

Várias rodadas de cerveja depois, as quais fui impedida de ir buscar no bar para não cair em tentação, e a conversa já tinha decaído severamente.

- Eu não sei onde eu tava com a cabeça para inventar essa regra de não-sexo antes do casamento. Se eu ficar com mais tesão vou agarrar uma de vocês.

Eu tinha mais resistência que Lily e Alice, ainda assim decidi maneirar um pouco. Se não, em breve seríamos três moças se arrastando pelo bar, e eu queria manter o que restava da minha dignidade.

Uma música que Lily particularmente adora começou a tocar e ela, empolgada, derramou metade da cerveja em si mesma.

- Ok, você precisa de água.

A meio caminho do bar Lily me alcançou.

- Não! – Ela se meteu na minha frente, chegando antes de mim. - Eu pego! Você não pode falar com ele. Água, por favor. – Acrescentou com um sorriso gentil, como se ele não tivesse ouvido uma palavra anterior.

O barman olhava divertido dela para mim enquanto a servia. Lily mergulhou no copo como se não visse água a meses e ele aproveitou para falar comigo.

- Fiquei esperando você vir pegar outra rodada.

- Sinto muito. Aparentemente, hoje eu sou a babá.

- Qual a ocasião?

- Ela vai se casar em algumas semanas. – Apontei a ruiva com a cabeça.

- Despedida de solteira?

- Ainda não.

- Quando ela estiver sóbria fala para voltarem. Eu vou garantir que tenha algo especial para vocês.

- Vou contar com isso.

- Nããoooo. – Um dedo embriagado tentava mirar na cara do homem. - Ela não pode falar com você! Hoje ela é minha.

- Ok, ruiva. Acho que está na hora de ligar pro noivo te levar para casa.

- Não precisa. – Alice chegou tropeçando até nós. - Chamei um taxi, já está aí na porta. Vamos?

Meio a contragosto de acabar minha conversa com o barman, me despedi.

- Até a próxima então.

- Eu vou esperar. – Aquele sorriso devia ser crime.

Demorei tanto para enfiar aquela ruiva no carro que deu tempo do barman nos encontrar na porta.

- Você esqueceu isso.

Meu celular. Na mão dele.

- Oh, Meu Deus. Obrigada! – Mas quando estiquei a mão para alcançar o aparelho, o barman (que era bem mais alto que eu) o tirou do meu alcance.

Evitei o constrangimento de parecer uma garota de doze anos tentando alcançar algo e o olhei com interesse. Algo ele devia querer.

- Você quer que eu acredite que não deixou pra trás de propósito?

- Porque eu faria isso?

- Pra ter uma razão para voltar.

- Len! Acho que Lily vai vomitar e prefiro que isso não aconteça no meu colo. – O grito veio de dentro do táxi.

- Isso é, se suas amigas deixarem você conversar comigo.

- Sabe... – Disse me aproximando dele. – Eu nunca fui muito obediente. Além do mais o que eu tinha em mente não envolvia muita conversa mesmo.

Não. Eu não gosto de perder tempo.

Ele pareceu paralisado, eu senti. Mas se recuperou rápido. Foi até a janela e falou para o motorista.

- Leva elas em segurança, Ben.

- Opa, opa, espera um pouco. – Alice reunia o resto de sobriedade que tinha e tentava alcançar meu braço pelo lado de dentro do carro.

- Está tudo bem, Alice. Nos falamos amanhã.

Eu vi todo seu esforço em focar o barman com uma cara intimidante.

- Sabia que você não ia aguentar. – Sussurrou. – Juízo.

Ficamos na calçada até o táxi sumir na esquina.

- Então, onde você quer não conversar comigo? – Perguntou, enfim me devolvendo o celular.

- Alguma sugestão?

- Eu moro no andar de cima. – Seu indicador apontava para a janela acima das nossas cabeças.

- Você mora em cima do bar? – Perguntei com escárnio.

- O que eu posso dizer? Gosto do lugar e sou um funcionário exemplar. – Respondeu, totalmente inabalado.

E realmente sem muita conversa, eu o segui para o andar de cima.