nota da autora: eu não sou dona nem da gata que mora aqui em casa, imaginem se seria dona de Crepúsculo.
Clozinha obrigada por ser inspiração pra essa história e me ajudar no desenvolvimento dela :)
em tempo: leiam Sequin Smile da Clozinha (é a perfeita materialização da nostalgia e da atualidade como coisas espetaculares e indissociáveis! confia em mim, vai ler. tá lá nos meus favoritos)
. : you shoulda put a ring on it : .
— Pelas minhas contas você já está há mais de dois minutos fora da escala. Vai ganhar essa hora extra, Swan?
— Eu estou literalmente dobrando o avental pra ir embora. Que agitação toda é essa? — Olhei por trás do ombro porque Edward soava irritadiço. O sorriso nos lábios contradizendo seu tom arisco.
— Eu tô preocupado com o horário do trem.
— Cara, a gente ainda tem uns vinte minutos de sobra. Sossega. — Ele não pareceu culpado. — Kate tô de saída, tá? Você segura as pontas aí? — Perguntei para a barista e dona do bistrô, que assentiu sorrindo.
— Só tira esse garoto daqui. Edward está me deixando agitada.
O puxei pelo pulso, reclamando que espantaria todos os nossos clientes e sorri quando ele passou o braço por cima do meu ombro. Acendeu um cigarro e, quando resmunguei e ameacei sair do abraço, teatralmente baforou a fumaça por trás da minha cabeça, evitando que eu sentisse o cheiro do tabaco.
— Ué não tá com pressa?
— Que?
— Você fumando aí como se tivéssemos todo o tempo do mundo.
— Do que você está falando, Bella?
— Me encheu a paciência para eu sair do bistrô.
— Eu tava te ajudando — disse em tom ultrajado e gargalhei.
— Pra onde a gente vai dessa vez?
— Eu não—
— Não me vem com essa de surpresa não, Edward.
— Não me vem com essa de surpresa você, Bella. Quase como se não soubesse que eu faço dessa forma todo ano.
— E todo ano reclamo disso — respondi com um sorriso.
— Touche — piscou e apressou o passo na calçada.
Entramos no trem e durante os 20 minutos seguintes, insisti para que ele me contasse o nosso destino. Antes que eu pudesse subir a gravidade das minhas ameaças, me puxou para caminharmos, efetivamente nos tirando do vagão.
— O que a gente tá fazendo em Brooklin? — Ri olhando perplexa ao redor.
— Baldeação. — E antes que eu pudesse questionar, nos guiou até a estação do trem G.
— Cadê? — Perguntei depois de alguns minutos que estávamos dentro do meio de transporte.
— O que?
— Você sabe — sussurrei olhando ao redor. O trem estava cheio, porque era início de horário de pico, e eu comecei a me questionar se o pedido aconteceria dentro do vagão.
— Se eu te falasse teria que te matar.
Ameacei apalpar meu amigo procurando por algo que ele certamente tinha escondido nos bolsos da calça ou casaco, mas antes que pudesse efetivamente tocá-lo, saltou para trás gargalhando.
— Não começa, Isabella.
— Por favor! — Disse, portando a minha melhor expressão de súplica.
— Não.
— Quanto tempo esse vai durar? — Perguntei genuinamente curiosa. Edward sorriu, e na sua expressão tinha ternura.
— Esse o que? — Disse com um sorriso irônico, mas assim que soou o sinal de que o trem chegou na estação, desviou meu olhar.
— Esse mistério pro pedido ué.
— Eu não sei do que você está falando.
— Edward — insisti, alongando o "a" de seu nome.
— Bella — repetiu com a mesma entonação, mas em sua voz soou irritante.
— Você sabe que não dá pra casar se você não colocar um anel no meu dedo, não é?
— Casar? Como assim, Bella? Pra quem não queria mais falar de sexo, você está bem adiantada, hein? Ah já sei, você é mais tradicional, quer se guardar pra depois do casamento, não é? Deixa eu te contar uma coisa porque me parece mesmo que você não lembra: esse navio já zarpou. E zarpou gostosinho — E piscou. O filho da puta piscou um olho.
— Edward — repeti, com a certeza de que fingir choro seria a minha melhor alternativa para fugir de uma armadilha que ele provavelmente estava jogando na minha direção.
— Ô, coitadinha da Bellinha. Vem cá — disse com ironia e me puxou para baixo de seu braço enquanto começava a andar, se afastando da estação do trem.
— Quando tempo vai durar dessa vez? — Tentei mais uma vez, escondendo com a mão o sorriso que me tomou de imediato quando me respondeu com uma alta gargalhada.
— O quanto você quiser que dure — murmurou contra o topo da minha cabeça.
Muito embora eu desconfiasse que ele estava dizendo que ainda que amasse me provocar com os pedidos surpreendentes, cederia aos meus pedidos se assim eu quisesse. De alguma maneira, pareceu mais sério do que era e decidi não insistir na brincadeira.
Notando meu silêncio, me apertou mais contra o lado direito do seu corpo, deixando sua mão acariciar meu braço por cima do suéter e apontou para uma carrocinha de algodão doce, prontamente desviando minha atenção para uma das minhas comidas favoritas de infância. Dividimos o doce enquanto caminhamos ainda abraçados por alguns minutos. Decidi frear a busca pela informação sobre um noivado falso, e dediquei os próximos instantes para conversar com ele de verdade.
Já fazia 10 dias que tinha retornado pra Nova Iorque e a gente, de fato, não tinha tido muito tempo sozinhos. Inclusive, só nos vimos uma vez depois do bar com Jacob, porque ele estava bastante ocupado, retornando de viagem, e eu sobrecarregada entre o bistrô e o abrigo de idosos. Em conversa, perguntei alguns detalhes sobre a viagem e sobre seus recentes dias aqui na cidade, cuidando para fazer as perguntas certas para que tivesse algumas respostas específicas sobre Tanya.
— Eu terminei com ela pelo telefone, no táxi, a caminho do porto. Naquela manhã...
— Putz.
— Não me orgulho disso não, Bella. Mas não dava mais pra esticar, sabe? Imagina ficar 3 meses em um navio, preso em um relacionamento que não fazia mais sentido?
— E como ela recebeu?
— Ah... Ela sugeriu que eu estivesse fazendo aquilo só para poder ter liberdade no navio. Deu a entender que eu queria pegar geral. — Gargalhei com a informação, porque Edward era o oposto disso. Meu melhor amigo sempre foi aquele cara que emendava um longo relacionamento em outro. — Pois é — riu, mas me olhou brevemente de uma maneira esquisita.
Deslizou o braço do meu ombro e apertou minha mão quando entramos no Prospect Park. Eu estava chutando as folhas de coloração outonais caídas no chão, enquanto ouvia o som da sua voz me atualizar sobre as semanas no navio. Tentei não demonstrar tantas emoções nas vezes em que ele relatava algo e complementava dizendo o quando queria que eu tivesse visto, ouvido ou experimentado aquilo. Em algum momento mencionou que se aproximou muito de um garçom do navio e que ele estava ansioso para me conhecer. Tentei focar em não deixar meus pensamentos sobrecarregados com o peso do que isso significava, porque muito embora eu soubesse que era a sua melhor amiga e grande parte de sua vida, saber que ele falava tanto assim de mim para uma pessoa que acabou de conhecer, me gerava um turbilhão de sensações que eu não me sentia pronta para lidar.
— Eu consigo ouvir daqui, sabia?
— O que?
— As engrenagens da sua cabeça.
— Ué finalmente aprendeu a ler meus pensamentos?
— Não, só a ouvir essas suas engrenagens girando de maneira excessiva. É porque a máquina é velha, não é? Difícil não esperar que engrenagens tão antigas assim ranjam dessa forma.
Dei um soco leve no braço dele enquanto murmurava um "idiota". Edward sempre implicava com o fato de que eu era alguns meses mais velha do que ele.
Desviei o assunto, perguntando sobre o porquê de termos vindo para esse parque.
— Fico olhando em volta e tenho dificuldade de pensar num momento ou espaço melhor para te propor casamento do que agora.
— Pela segunda vez esse ano, hein? — Pisquei quando percebi que seu rosto corou.
— Pela segunda vez. Parece que tirou a sorte grande — piscou e me sorriu aquele sorrisinho torto extremamente debochado. — Você sabe que esse parque é muito importante na vida da minha família, né? Minha bisavó Elizabeth conheceu aqui o amor da vida dela. E foi aqui que ele a pediu em casamento.
— Eu não sabia que eles tinham se conhecido aqui.
— E foi também aqui que casaram — complementou e me sorriu. — Escondidos, claro. Bisa era desquitada e a família só descobriu anos depois.
— Eu amo essa história. Sempre me pergunto o que passou na cabeça daquele juiz de paz em aceitar casar um ex-combatente e uma desquitada — sorri e encostei a cabeça no braço dele. Apontei para um banco de madeira de frente para o lago e fomos até lá.
Edward ainda segurava minha mão enquanto eu mantinha a cabeça aninhada em seu braço. Estávamos sentados, olhando os patos nadando no lago e fazendo comentários aleatórios sobre fenômenos da natureza e sobre as pessoas que nos rodeavam. Havia algumas pessoas correndo pela pista do parque, outras recostadas nas árvores, mexendo no celular ou lendo livros. As árvores estavam começando a perder a coloração esverdeada, agora com nuances quentes dos tons outonais. Era lindo, e eu conseguia entender com perfeição o porquê de ele ser tão apaixonado por essa estação.
Estávamos em silêncio, ainda observando a vida selvagem da pata e seus 11 patinhos quando ele depositou um beijo na minha mão.
— Eu amo que você os conheceu, sabia? Você é a única pessoa da minha vida, para além da família, que conheceu a bisa e o biso.
— Eles foram incríveis. Queria ter tido mais tempo com eles.
— Eu também. Tá vendo aquela árvore ali? — Com nossas mãos entrelaçadas, apontou para uma árvore frondosa e toda vermelhinha na outra margem do lago, bem em frente de onde estávamos sentados. — Foi debaixo dali que ele a pediu em casamento.
— Vamos lá? — Pedi e o questionei com o olhar quando não fez menção de andar. — Edward? — o chamei e demorou alguns segundos para que me olhasse.
Seus olhos verdes eram inquisitivos e inquietos enquanto passavam por todo meu rosto. Não sei exatamente em que momento nos aproximamos, mas fui capaz de perceber seu músculo do maxilar tensionar e depois relaxar. Depois de segundos que pareceram uma eternidade, Edward largou minha mão e segurou meu rosto, com os polegares acariciou o topo da minha maçã do rosto.
— Você tem alguma ideia do quanto eu te amo, Bella? — Murmurou encostando nossas testas. Maneei afirmativa e delicadamente a cabeça, toquei seu peitoral e levei meus olhos aos dele.
— Acho que faço alguma ideia. Só não falo muito pra não inflar ainda mais seu ego. As vezes eu temo que você vá explodir ou flutuar pra longe de mim — murmurei sorrindo. — O que houve? O que tem de errado.
— Nada. — Fechou os olhos e me abraçou, escondendo o rosto no meu pescoço. — Nada mesmo — murmurou e senti a pressão de seus lábios ali.
O abracei de volta, sem entender ao certo o que estava acontecendo e acariciei suas costas por cima do casaco. Repousei minha cabeça na dele e levei uma das mãos ao coração. Assim, esperei as batidas começarem a desacelerar antes de me mover. Alguns minutos depois, afastei nossos corpos e o puxei pela mão, levantando-nos do banco.
— Vem, você tem um pedido pra me fazer. Foi isso que a gente veio fazer, não foi? — Impliquei e ele sorriu com o rosto inteiro.
— Eu não vou amaldiçoar o ninho de amor dos meus avós, Bella.
— Como ousa? — Fingi ofensa e o empurrei para longe.
Edward gargalhou e me puxou para perto. Passou o braço acima dos meus ombros e voltou a nos guiar pelo parque. Andamos por vários minutos, apontando pessoas, objetos e locais, enquanto ríamos de absolutamente tudo. O pedido de casamento, permeando cada pensamento meu em uma antecipação que beirava o ridículo.
Uma das principais ilusões que me permiti acreditar nos últimos meses, foi a de que eu seria capaz de colocar algum tipo de barreira entre nós. Edward e eu éramos o simbolismo perfeito do pieguismo. Éramos daqueles pares que conseguem se entender com o olhar, que completam a frase iniciada pelo outro e que são tão parceiros que nunca se sabe quando um começa e o outro termina.
Me peguei sorrindo, ao perceber que a reflexão tinha surgido justamente no meio de uma história em que eu comecei, e ele terminou.
— Acho que a gente tem que ir. O parque deve estar prestes a fechar. — Comentei desgostosa.
— Vamos lá pra casa? Minha mãe tá reclamando que faz tempo que não te vê.
— Você não está esquecendo de nada não? — Impliquei, exageradamente tocando em meu rosto com o dedo anelar.
— Não — respondeu com um sorriso gigantesco. — Tudo o que eu tenho está aqui — Respondeu me puxando pra um abraço — e aqui. — Apalpou o bolso da calça e eu imediatamente levei minha mão ali.
— Opa opa, Bella. — Disse com humor, levando as mãos para cima. — Achei que você não queria mais me pegar.
— Ai que ódio de você — ri e o empurrei para longe. — Vamos logo. Tô com saudade da sua mãe e exausta de lidar contigo.
Edward respondeu rindo e, virando de costas pra mim, balançou o bumbum em um rebolado completamente desengonçado. O bolso da calça vazio.
Dessa vez voltamos de táxi porque a casa dos pais do Edward ficava suficientemente próxima. Ao chegarmos lá, fui invadida por um cheiro tão familiar que fez meu coração triplicar de tamanho. Imediatamente olhei para Edward, que me sorriu em repetição da minha própria fisionomia.
— Não me diz que isso é o ravióli de cogumelo da Elizabeth.
— Certo. Não é.
— Ah não, Edward! Sério?
— Não.
— Não?
— Sim.
— É ou não é?
— Por que você não vai lá descobrir?
Ele não precisou sugerir uma segunda vez. Minha reação foi tão imediata que quando ele riu, já tinha colocado alguns metros de distância entre nós.
Entrei na cozinha a tempo de vê-la despejando o meu molho favorito em uma travessa de vidro. Antes que eu pudesse me manifestar, ela sorriu. Imagino que minha felicidade tenha sido suficientemente barulhenta.
— Tia Lizzy! — Gritei quando ela me envolveu em seu abraço. Tão caloroso e materno quanto possível.
— Você sumiu, Bella! — Reclamou e me deu um beijo no rosto.
— Comecei um trabalho voluntário, e fiquei um pouco enrolada no bistrô.
— Sei — comentou compreensiva, mas seus olhos verdes vibravam com curiosidade.
Na manhã que Edward partiu para o cruzeiro, Elizabeth estava na cozinha, preparando um café da manhã. Ela tinha o rosto inchado e vermelho, provavelmente decorrente de uma despedida apressada de seu filho único.
Ela me viu sair do quarto dele com uma expressão corporal que gritava "transei a noite inteira com seu filho, mas felizmente não me lembro muito então não me pergunta, e por favor, muito embora ele já seja adulto, deixo-o de castigo quando voltar porque ele não teve a decência de me acordar", mas, obviamente, nada falou. Passei aquela manhã em sua companhia, indo embora apenas quando notei que estava mais tranquila.
A ajudei a terminar de preparar o jantar, certificando-me de fazer a tradicionalíssima limonada Swan, que sempre abrilhantava nossas refeições, em uma grata lembrança da ocasião que nos conhecemos.
O jantar, ainda que agradável, não foi suficiente para aplacar a minha angústia de não saber o que estava acontecendo. Não tinha nada particularmente estranho na nossa interação, mas de alguma maneira tudo parecia esquisito. Edward estava quietinho, deixando sua mãe conduzir as principais conversas. Ela, por sua vez, perguntava questões específicas sobre atualizações da minha vida nesses três últimos meses.
De fato, depois que Edward e eu transamos, não voltei a pisar na casa dela. Mantivemos contato por telefone, mas os jantares quinzenais, que eu jurei que participaria mesmo enquanto ele estivesse no navio, foram apenas uma promessa. Ainda assim, conseguia perceber o quanto ela se esforçava para manter o clima agradável, muito embora seu filho estivesse mais quieto do que o normal.
Da mesa de jantar, fomos para a sala de estar, onde assistimos um filme de comédia. Edward estava do meu lado e mesmo que eu estivesse sentindo meu corpo rijo na presença dos dois, a tensão não se estendeu por mais do que alguns minutos e logo me senti em casa.
— Edward será que você pode tocar um pouco pra gente? — Elizabeth perguntou quando os créditos do filme subiram na tela.
— Claro — murmurou e a puxou pela mão. — Faz companhia para a Bella. — Pediu e Elizabeth rapidamente sentou-se ao meu lado no sofá.
— Você tem que ver a desenvoltura dele. Está tão mais solto — sussurrou enquanto Edward andava até o piano de calda repousado na parede da sala.
O piano ficava em frente a uma grande janela que tinha vista para o Jardim Botânico de Brooklin.
Era quase 7 da noite e o sol estava terminando de se pôr em um céu com cores alaranjadas e azuladas. O contraste das cores se mesclando com os tons outonais nas árvores do jardim e do acinzentado das construções da cidade era belíssimo.
Me permiti ser abraçada por Lizzy assim que os primeiros acordes que Edward criou tomaram o ambiente. Sem desgrudar os olhos do pianista, o ouvi passear por múltiplas melodias nas mais distintas harmonias. E, de fato, ele estava diferente. Algo em sua postura mostrava assertividade e segurança. Era como se ele finalmente tivesse respondido às inquietações que o perseguiam há anos.
Observei em admiração até o sol terminasse de se esconder por entre aquela selva de pedra. Em algum momento, Elizabeth avisou que se recolheria para dormir, mas eu fui incapaz de desgrudar meus olhos da cena e a ofereci um singelo aceno de cabeça. Meus olhos pulando entre o pianista e o cenário, mas decidindo se manter na contraposição dos dois.
Quando ficamos sozinhos, nossos olhares imediatamente se encontraram, e permaneceram fixados enquanto ele acariciava as teclas em uma outra música. Era um combinado de notas doces em uma melodia tímida, quase insegura. Já no meio alcançava um crescendum estrondoso e vibrante por onde permaneceu por grande parte, e então terminou e um suave dedilhar de notas.
Durante todo o tempo em que tocou aquela melodia, me olhou. Era como se já conhecesse cada particularidade daquela música. Quase como se ela já fosse parte de si. A intensidade do olhar acompanhando a intensidade musical me deixaram completamente sem palavras por alguns instantes.
— Qual é essa? — Perguntei em um sussurro tão inseguro que temia que não tivesse me ouvido do outro lado da sala.
— É a sua — disse, quebrando nosso olhar e encarando as teclas. Um rubor em suas bochechas naturalmente branquinhas me deixando intrigada por sua fala.
O silêncio se estendeu por um tempo grande o suficiente para nos deixar desconfortáveis, mas curto demais para que eu fosse capaz de elaborar uma resposta suficientemente boa.
Em um tempo que pareceu infinito, se levantou e foi até a cozinha, onde pegou duas taças e uma garrafa de vinho tinto. Sentou-se ao meu lado e me ofereceu a bebida.
— Gostou? — Tinha insegurança na voz e eu sorri, porque a ideia de vê-lo inseguro ao tocar algo tão lindo era absurda.
— Eu acho que foi uma das coisas mais lindas que já ouvi em toda a minha vida — comentei, sorvendo a bebida.
— Bebe devagar.
— Está aqui, não está? — Perguntei excitada e levantei a taça contra a luz para tentar ver se havia algum objeto brilhante ali dentro.
— Tô falando isso só porque você tem mania de virar vinho igual água e essa é a última garrafa — riu e eu rolei os olhos tentando esconder a ansiedade.
Sem me perguntar, ligou a tv e colocou em uma série de comédia com capítulos curtos que adorávamos assistir juntos. Mas por alguma razão, não consegui prestar atenção no enredo dos episódios que começavam e terminavam na frente dos meus olhos. Pelas horas seguintes, só repliquei as reações de Edward aos episódios.
Eventualmente passou o braço por trás do meu pescoço, trazendo-me para perto para repousar a cabeça em seu peito e entrelaçou os dedos de nossas mãos. Quando senti seu polegar acariciando meu dedo anelar, o olhei de esgueira e notei que ele ainda tinha o olhar grudado no programa com um sorriso relaxado nos lábios.
Eu parecia o oposto. Não havia nada em mim relaxado. O carinho no meu dedo anelar me fazia sentir o coração disparar no peito, e o estômago mergulhar numa piscina de gelo. O tum tum no meu ouvido fazendo daquela carícia singela, algo gigantesco.
Edward tinha o costume de iniciar nossa temporada de casamento de maneira padronizada. Anualmente arrumava uma forma autêntica de me propor noivado, colocando em meu dedo um anel de qualidade duvidosa que não tardava muito para esverdear a minha pele.
Da primeira vez que ele teve a ideia, estávamos a caminho da nossa segunda recepção em que entraríamos de penetra. Ele então me puxou para uma loja de departamento que ficava aberta 24h e comprou um anel tão falsificado que eu tinha certeza de que identificariam na entrada do hotel. Na sua concepção, precisaríamos de provas materiais que estávamos juntos.
Nesse dia, ele pediu o microfone do anunciante das promoções, deu um discurso inflamadíssimo sobre como eu era a melhor parte de seus dias, e como dormia e acordava pensando em mim. Disse que seu maior desejo é que ele pudesse passar o resto da sua vida comigo em seus braços, enquanto se manteria dormindo e acordando pensando em mim. Finalizou seu primeiro pedido de casamento dizendo "Mas não se esqueçam, pessoal, a promoção da lata de milho é só enquanto durarem os estoques", então devolveu o microfone ao anunciante, ajoelhou na minha frente e prontamente colocou o anel no meu dedo (ainda com uma etiqueta de 12,00 US$).
Da segunda vez estávamos alimentando esquilos no Central Park quando acima de nós sobrevoou um ultraleve vermelho puxando alguma faixa enorme. Não dei muita atenção, mas Edward estava inquieto apontando freneticamente para a aeronave. A reação que tive quando li a frase "Casa comigo, Bella?" foi expansiva. Gargalhei alto e sorri quando o percebi ajoelhado em minha frente. O anel dessa vez era um "anel nó dos amores". Dessa vez o anel que é feito por duas finas tiras que se entrelaçam em dois nós, não esverdeou o meu dedo.
Me lembro que na ocasião, depois que ele colocou o anel e me beijou a mão, brinquei que um dia aceitaria me casar de verdade. A expressão de terror que surgiu como resposta foi tão espontânea que me vi incapaz de deixar a brincadeira ser mais do que isso, mesmo que apenas em minha cabeça.
De fato, Edward foi o meu primeiro amor, mas depois de ter sido também o meu primeiro beijo - uma experiência terrível, diga-se de passagem - passou a ser apenas o meu melhor amigo. Ainda assim, era impossível não perceber o como ele era espetacular. Edward é íntegro, verdadeiro, atencioso, leal e uma das pessoas mais acolhedoras que já conheci em toda a minha vida. O fato de portar um rosto impecável e um corpo de dar inveja, servia apenas para compor o perfil de "homem perfeito" que ele honrosamente vestia.
Da terceira vez que "noivamos", estávamos assistindo os Yankees serem humilhados no nosso estádio de beisebol pelos Red Sox. Eu, consternada com o fato de que o time de Boston estava nos destruindo, encarava a barba do Mike Napoli com sangue nos olhos. Edward não parecia tão diferente de mim, embora eu gostasse muito mais do esporte do que ele, era impossível não sentir-se mal quando perdíamos em nossa própria casa.
No entanto, como tudo com a gente é irônico, e o universo parece gostar de nos colocar em situações constrangedoras - sempre com a anuência de Edward, claro - no intervalo antes do último turno, a câmera que busca casais sedentos por atenção nos encontrou. Edward então, ao invés de me beijar como todo aquele estádio estava esperando, ajoelhou e me pediu em casamento. Dessa vez o anel foi feito com o canudo do refrigerante que eu estava segurando.
Na quarta, e última vez, a gente estava vendo o episódio 13 da 5ª temporada de The Office, o americano, claro. Depois de um surto de risadas descontroladas quando viu Angela jogar seu gato para Oscar, levantou-se, pegou uma sacola tipo ziplock e jogou na minha direção. Peguei ansiosa, achando que seria o anel, mas era uma chave de metal, aparentemente de um cadeado (daqueles pouco confiáveis). O olhei inquisitiva, mas antes que ele pudesse responder, me percebi sendo jogada em uma caça ao tesouro. Cada "fase" respondida por alguma pista de algo que vivenciamos ao longo da nossa história, me levando de volta ao passado ao mesmo tempo em que escancarava o presente e solidificava o futuro.
Por alguma razão que eu nem começava a conseguir entender, dessa vez foi diferente. Pra começar, todas as outras três vezes foram em público, e nenhuma delas era verdadeiramente romântica. Sempre foi uma encenação espalhafatosa, que nos dava motivos para rir por vários meses. Dessa quarta vez, éramos só nós dois na minha casa, que servia de palco para revivermos lembranças tão especiais que foram parte da nossa história. Esse pedido, ao invés de se tornar uma piada, parecia cada vez mais uma alusão de carinho e afeto a tudo o que já vivemos juntos.
Claro, o intimismo poderia estar atrelado ao fato de que ele estava namorando, e um grande gesto em público, ainda que encenado, poderia ser desrespeitoso com Tanya. Ou poderia significar uma despedida, visto que a viagem dele deveria terminar com promessas que garantissem a ele o futuro na música com que sempre sonhou. Sabe-se lá se teríamos tempo para seguir na brincadeira de entrar de penetra em casamentos com uma agenda lotada que ele, provavelmente, teria.
Fato é que nas três horas seguintes, minha casa tinha sido inundada por lembranças, e tanto amor que não cabia naquele apartamento de apenas um quarto. O anel que ele colocou em meus dedos era simples. Composto por uma tira dourada e uma pedra solitária em um tom esverdeado que me fazia lembrar o verde que se vê no bagaço de limões. Os limões do dia que nos conhecemos. Ainda que certamente fosse apenas uma bijuteria de pouca qualidade, tinha mais importância do que um diamante de 24 quilates.
— Tá pensando no que? — O ouvi perguntar e arfei quando percebi que o programa já não estava mais passando.
Desencostei minha cabeça do peito dele e sorri marota.
— Ainda não consegue?
— Ler sua mente? — riu. — Não, mas as engrenagens... Bella... — suspirou de maneira exagerada em uma falsa irritação.
— Só trabalho. — Dei de ombros, me levantando do sofá.
— Eu não sei ler mentes, mas sei quando você mente.
E era verdade. Ele dizia que eu tinha um caguete e, de fato, sempre sabia quando eu mentia. Evitando me embananar ainda mais nas palavras, optei por silenciar.
— Acho que vou indo — bocejei e me espreguicei
— Não quer dormir aqui? Tá tarde.
— Eu preciso ir.
Não é como se a gente nunca tivesse dormido juntos. A gente fazia isso com alguma frequência. Mas depois que o "dorme aqui" virou uma analogia para sexo, deixei de me sentir confortável.
— Você precisa ou você quer?
— Faz diferença pra você? — Ele apenas me olhou, esperando que eu desenvolvesse o raciocínio. — Eu não voltei ao seu quarto desde aquele dia...
Edward se levantou do sofá, pegou a minha mão e me puxou em direção ao seu quarto. Antes que pudéssemos ir longe, travei os pés no chão e o encarei séria.
— Edward não.
— Bella, sou eu. — Disse, em um suspiro, sem me olhar. Sua voz parecia cansada.
— Eu queria que você tivesse um pouco mais de empatia.
— Eu queria que você tivesse um pouco mais de confiança. — Disse e eu consegui perceber a irritação na voz.
— O que você quer dizer com isso?
— Cacete, Bella... O que você acha que eu vou fazer contigo? — Me perguntou de maneira dura e me olhou. Seu rosto estava endurecido. — Eu já entendi que você não quer retomar o que a gente começou antes da minha viagem. De verdade, eu já entendi. — Exasperou e soltou minha mão. — Eu não tô te levando pra lá pra te comer. Eu tô te levando pra lá pra te mostrar que é só o meu quarto. Porra Bella, sou eu!
Senti meu estômago retorcer porque ao mesmo tempo em que eu não queria ceder às possibilidades do que poderia existir entre nós, apavorada com a ideia de destruir nosso relacionamento, também não queria machucá-lo me refreando de algo que era alimentado apenas na minha cabeça. Aparentemente, não tinha solução. Em qualquer alternativa, alguém sairia machucado.
— Eu não quero te machucar. — Confessei.
— Então decide se você vai foder ou sair de cima.
Nosso olhar se cruzou em irritação, mas depois de alguns segundos foi impossível não cair na gargalhada em razão da ironia do que disse.
— O que eu quis dizer foi: ou você confia na solidez do que a gente tem, e me dá mais uns beijos na confiança de que a gente não vai se perder no caminho, ou você firma a ideia de ser só a minha amiga, e aí, se esse for o caso, seja mesmo só a minha amiga e confia que vou fazer o mesmo por você.
— Mas é isso que eu estou fazendo.
— Não, não é.
— Como não, Edward?
— Bella eu não fiz nada de errado. Eu te puxei pra ir pro meu quarto como a gente fez durante toda a nossa vida, e imediatamente você assumiu que eu ia arrancar a sua roupa.
— Não é isso. Eu só não quero que as coisas fiquem embaçadas entre nós.
— Elas estão só pra você, Bella. No dia que a gente saiu com o Jake e eu aceitei que você não queria mais pensar no que rolou, eu realmente aceitei. Eu não fiz nada que te levasse a pensar o contrário.
— Eu sei…
— Então para de buscar razões para desconfiar de mim. — O olhei de maneira apologética e ele me sorriu com carinho. — Eu realmente acho que a gente seria um casal espetacular, você também acharia se lembrasse como foi… foi mal, foi mal! Desculpa — riu. — Sério, foi mais forte que eu.
— Tá vendo? É disso que eu tô falando.
— Disso o que, Bella? Eu não posso nem brincar com isso?
— Não é brincadeira pra mim, Edward.
— Aí você tá sendo injusta. A gente sempre brinca com essas coisas. Aquele nosso primeiro beijo é sempre mencionado quando algum lugar de NY alaga por causa de chuvas. Sempre.
— Eu sei — ri. — Mas isso é diferente.
— Por quê?
O fitei nos olhos por vários instantes, tentando entender o porquê disso ser diferente. Enquanto encarava o rosto do meu melhor amigo, percebi ser incapaz de responder àquela pergunta. Eu realmente não fazia ideia do porquê era diferente, apenas sabia que era. Na ausência de uma resposta, murmurei um pedido de desculpas, o beijei no rosto e me dirigi até a porta.
— Eu vou de táxi, não se preocupa. — Ofereci antes que ele demonstrasse sua preocupação cotidiana quanto à minha segurança nas ruas de Nova Iorque.
Quando já estava quase chegando em casa, ouvi o barulho do meu celular apitar, sinalizando a chegada de uma mensagem.
[Edward]: A gente tá bem?
[Bella]: E quando é que a gente não tá?
[Edward]: eu te amo, Bella.
[Bella]: Não me amola. (já cheguei)
[Bella]: eu te amo. desculpa por ser imbecil assim.
[Edward]: eu sei que você faz o que pode ;)
[Bella]: este usuário bloqueou o seu contato
[Edward]: putz... uma pena que você não vai mais conseguir se comunicar comigo porque eu ia montar a sua mesa de cabeceira por esses dias, né?
[Bella]: você não sabe da maior... meu celular foi hackeado. desconsidera qualquer mensagem sem noção que possam ter te enviado. NÃO FUI EU.
[Edward]: hahahaha
[Edward]: boa noite, swan
[Bella]: boa noite, cullen
nota da autora: se você tem vontade de casar, me conta como seria seu pedido de casamento ideal?
