CAPÍTULO III
Dias depois, Patrick percebeu que Angela não era como as outras garotas com as quais estava acostumado; mesmo que ela não tivesse negado seu convite, ela simplesmente não dava qualquer sinal de que estava ansiosa para sair com ele, tampouco que estava impressionada por seus encantos. Essa atitude desinteressada dela não o deixava irritado, ao contrário, causava-lhe uma excitação e uma sensação inebriante de alegria. Ele sorria todas as vezes que lembrava dela, do seu jeito de andar, dos lindos cabelos loiros descendo às costas e mesmo o velho macacão dela sujo de graxa o deixava encantando.
Toda essa nova sensação acabou trazendo muitos lucros para a barraca deles: Patrick, como nunca, estava lendo e decifrando as pessoas, surpreendendo seu pai, que não tinha ideia de como seu filho de repente tornou-se tão competente na arte de ludibriar as pessoas. Mesmo que a confiança de Patrick vacilasse um pouco nas raras vezes em que Angela visitou o show, ele fixava nela o seu olhar concentrado, e como um pavão, exibia-se com graça e destreza. Ao perceber isso, ela simplesmente balançava a cabeça sorrindo e saía, deixando-o mais inspirado.
Até que um dia, ela ficou até o final do show. Batendo palmas junto com a plateia, mas sustentando um sorriso irônico, ela aproximou-se do pequeno palco onde Patrick e seu pai estavam.
''- Muito bom Garoto Maravilha.'' Ela disse.
Patrick ficou petrificado e sem palavras. Seu pai Alex ficou girou a cabeça, olhando para Patrick e Angela, tentando entender o que estava acontecendo ali.
''- Que bom que gostou senhorita. Gostaria de uma consulta particular?''. Ele tentou engatar uma conversa na qual ele poderia se incluir, já que nitidamente Patrick e Angela conversavam pelos olhares que trocavam entre si.
Angela virou-se para Alex com um rosto desdenhoso. Ele realmente estava dizendo o que ela o ouviu dizer?
'' – Acho que não. Conheço meu passado, vivo no presente e gosto de ser surpreendida pelo futuro.'' Ela rebateu.
Alex continuou encarando-a perplexo. Patrick simplesmente sorria e meio que brilhava na presença dela. Nunca uma garota o fascinou tanto assim.
'' – Sou Angela Ruskin, prazer em conhecê-lo, senhor...?'' ela estendeu a mão para Alex, que a apertou um pouco confuso com a situação.
'' – Alex Jane e este é meu filho Patrick. Você deve ser a filha do grande Martin Ruskin. Não tinha visto você por aqui.''
'' – Eu tenho ajudado meu pai no conserto da roda gigante e na manutenção de outros brinquedos.''
'' – Imagino o quanto deve estar ocupada.''
'' – Mas eu sempre arranjo um tempinho para acompanhar as apresentações do Garoto Maravilha, que vê tudo.''
Ao dizer isso, ela olhou para Patrick com um sorriso delicado. Ele ainda não tinha dito uma palavra sequer, totalmente concentrado em não demonstrar o quanto estava impressionado com ela.
'' – Que bom que gosta do nosso show, Angela.'' – Alex respondeu, cerrando os olhos. Ali estava uma garota formidável, na opinião dele. Pensando em como poderia se aproveitar deste fato, ele fez um maneio com a cabeça a título de despedida e saiu, deixando-os sozinhos.
Angela virou-se para Patrick que continuava encarando-a com firmeza, sustentando um meio sorriso.
'' – Então'' – ela começou – ''se você tiver terminado, pensei que podíamos tomar aquele café juntos, o que acha?''
'' – Ah, claro.'' – ele gaguejou.
Enquanto ele descia do palco, Angela girou em seus calcanhares para ver a barraca: era uma tenda pequena, mas que comportava com algum conforto o público. Tinha luzes amareladas em todo teto e ao fundo, um grande cartaz azul com letras amarelas brilhantes dizendo: Patrick, o Garoto Maravilha que vê tudo. No pequeno palco, tinha apenas uma cadeira simples, na qual Patrick sentava-se para fazer o show. Em um canto do palco, havia uma caixa de som e um microfone, usados por Alex para chamar o público e apresentar o show. As cadeiras do público eram simples e provavelmente pertenciam ao parque de diversões, assim como a barraca.
'' – Bonitinho.'' Ela disse com um ar de diversão.
'' – Bom, é o que temos.''
'' – E você também faz consultas particulares.'' Ela disse balançando a cabeça fingindo estar impressionada.
Ele deu de ombros.
'' – Enfim, vamos?''
'' – Claro!''
Andaram até o trailer do café muito calados, perdidos em seus próprios pensamentos. Patrick estava genuinamente deslumbrado com a garota que caminhava ao seu lado. Ela era linda, determinada e confiante. Ele nunca tinha conhecido uma garota assim. Normalmente, as meninas com quem saíam eram frívolas e embevecidas por suas leituras. Cediam rapidamente a seu charme, como que ansiosas para serem seduzidas pelo ''Garoto Maravilha''. Ele logo cansava deste jogo, dispensava a menina e partia para próxima. Inconscientemente, ele estava procurando alguém como Angela: uma mulher que sabia onde queria estar. Que tinha sua opinião e não se deixava enganar. Uma pessoa que sabia exatamente desejava para si. E isso o fascinava.
'' – Um centavo por seus pensamentos.'' Ela o despertou do seu devaneio enquanto estavam na fila do café.
'' – Estava pensando em como você é linda.'' – ele respondeu dando seu melhor sorriso charmoso.
'' – Ah sei, conta outra.'' Ela rebateu desviando o olhar.
'' – Sério, você é uma garota muito bonita. E esperta.''
Desta vez ela sorriu para ele com sinceridade ao seu elogio. Aí está. Ela gosta que reconheçam a capacidade dela e não a beleza. Ele pensou vencedor.
'' – Você diz isso só para me agradar.''
'' – De maneira alguma. Um café e um chá e para acompanhar, dois muffins?'' Ele perguntou para ela quando chegaram ao balcão.
Ela acenou com a cabeça, e enquanto ele pagava, ela pegou os pedidos. Procuraram uma mesa próximo e sentaram-se.
''- Você é uma pessoa inteligente'' – ele começou depois de tomar o primeiro gole do seu chá – '' mas sente que seu talento está sendo subestimado por seu pai, quem você admira muito. Gostaria de fazer muito mais do que separar ferramentas e desfilar pelo parque. Gosta de música, deixa eu ver, clássica. Aprendeu algumas notas de piano em uma das viagens da sua família pelos circos e realmente desejaria ter um piano para praticar. Também gosta de decoração, sonha em terminar os estudos e quem sabe fazer uma faculdade.'' Ele terminou com um leve sorriso de vitória.
Angela simplesmente revirou os olhos:
'' – Você deveria saber que não me impressiona com suas leituras.''
'' – Tem certeza?''
'' – Absoluta. Ninguém pode conhecer alguém só de observar. Com certeza você andou perguntando sobre mim para alguém. Quem te disse tudo isso? Danny? Ah, eu vou matar aquele desgraçado.'' Ela bufou com frieza.
'' – Não perguntei a ninguém. Somente li os sinais: você tem os dedos um pouco calejados, com as pontas mais inchadas, mostrando que é alguém que toca ou já tocou piano. Sua postura quando entregava as ferramentas para seu pai mostrava que estava desempenhando um papel ridículo. Seu modo de avaliar o ambiente e as pessoas mostra que gostaria de saber mais sobre o mundo, portanto, é uma pessoa que gosta de estudar. E cá entre nós, sabemos muito bem que não temos acesso a uma educação formal descente com esta vida itinerante. '' Ele finalizou com ar de superioridade.
Angela olhou para ele legitimamente admirada.
'' – Como você faz isso?''
'' – Sou vidente, esqueceu?'' ele respondeu dando uma piscadela prazerosa.
Ela expirou com pouco caso, balançando a mão em sinal de descrença:
'' – Sério, como você faz isso? É impressionante. ''
'' – Eu só presto atenção.'' Ele deu de ombros.
'' – Com este talento, você poderia estar rico!''
'' – É, poderia.'' Ele respondeu cabisbaixo. ''Mas não estou e por sorte, isso me levou a conhecer você.'' Ele retrucou rindo largamente.
Ela ficou alguns segundos encarando seu olhar, procurando ali alguma mentira ou provocação. Não encontrando nada além da verdade, baixou seus olhos para suas mãos e fingiu estar muito concentrada em seu bolinho de amora. Ficaram em silêncio até terminarem suas bebidas e bolinhos, sentindo-se de repente muito confortáveis na presença um do outro. Patrick tomou coragem e muito lentamente levou sua mão para segurar a dela em cima da mesa, e fazendo um carinho circular com seus dedos nas costas da mão dela, disse:
'' – Gosto de verdade de você.''
Angela não disse nada, mas deixou que ele continuasse com os movimentos circulares em sua mão. A sensação era boa demais e ela, pela primeira vez, se sentiu reconhecida por alguém. O que Patrick demonstrava era muito mais do que uma simples admiração por sua beleza: ele conseguia enxergar a verdadeira Angela e admirava a pessoa que ela mantinha bem escondida dentro de si.
Gentilmente, ele levantou-se, ainda segurando a mão dela e devagar caminharam até o trailer dela, não falando nada, apenas aproveitando o momento que estavam vivendo. Quando chegaram, ele virou-a para ele, segurou a outra mão dela e delicadamente, beijou o canto de sua boca e cada uma das suas mãos. Com um sorriso ardente, ele disse:
'' – Eu gostaria de repetir isso. E você?''
'' – Eu também.''
'' – Certo, então eu posso te buscar depois de amanhã para um encontro? Algo mais longo do que um café?''
'' – Não vejo a hora.''
'' – Combinado então.''
Ele afastou-se, acenando a mão em despedida, deixando para trás uma Angela enamorada e desejosa para conhecer mais daquele garoto realmente estranho, mas ao mesmo tempo, doce e gentil.
