E eu liguei mesmo.

Mais de uma vez.

Na verdade, todas as vezes que saí naquela semana, e nas semanas seguintes, eu terminei a noite com aquele barman.

Já tinham se passado quase três semanas e eu sequer tinha me dado conta. A gente não se via todo dia, claro. Mas era realmente muito leve encontrar Sirius. Já havíamos batizado vários cômodos da casa dele e alguns do bar. Rolavam também muitas mensagens sacanas. Depois de uma, particularmente excitante, resolvi fazer uma visita pra ele depois de passar uma eternidade embalando lenços pra Lily. Sério, nunca vou entender essas tradições de casamento.

Ele riu quando me viu atravessando a porta do bar.

- Eu sabia que aquela mensagem ia te trazer aqui.

- Agora você vai cumprir o que prometeu.

- Você chegou mais cedo do que eu esperava. – Disse enquanto consultava o relógio. - Me dá uma hora. Meu barman ficou doente e só volta semana que vem e falta um pouco pra encerrar os drinks.

Ele se inclinou pra me cumprimentar com um beijo e eu travei.

Merda.

É o seguinte: Eu não tenho problema algum em ir pra cama com alguém que eu esteja realmente afim. Mas isso não é intimidade. Não de verdade.

Agora é nesses pequenos gestos que mora o perigo. Se você me ver lançando um olhar carinhoso, dando um beijo na testa, segurando a mão de alguém ou cumprimentando com beijo, chama o hospício porque eu inventei de me envolver de novo.

Eu me afastei antes que ele chegasse até mim e emendei uma pergunta pra disfarçar.

- Seu barman?

- É. Esse é meu bar.

- Sério?

Ele riu.

- A gente não conversa muito né?

Era verdade. A gente só falava sacanagem e eu não me demorava muito depois que terminávamos de transar. Eu estou off, galera. Nada de envolvimento, nada de conversas pessoais.

Graças a Deus, ele teve que servir alguém e desistiu de me beijar ali no meio de todo mundo.

Que frescura! Eu sei que é isso que você tá pensando.

Olha, eu não sou completamente esquisita. Eu costumo conversar, perguntar, me interesso pela vida do cara também. E nem sou tão encanada assim com esses gestos quando o cara é só um caso. Mas algo em Sirius é diferente. Tem um alarme na minha cabeça que grita pra me manter afastada dele. Talvez Sirius que vá me ensinar algo sobre desprendimento, afinal de contas.

Então, conscientemente eu mantenho nossas conversas pessoais num nível mínimo e nosso contato físico o mais sexual possível.

Mas me vi sentada naquele bar, com quase uma hora para matar. E como boa geminiana que sou, sem perceber, comecei a puxar papo.

- Você sempre quis ter um bar?

- Não exatamente. – Ele respondeu do outro lado do balcão. - Eu me interesso por muitas coisas, mas gosto de trabalhar com pessoas. Abrir um bar me pareceu uma boa idéia pro momento.

- E qual o interesse para o próximo momento?

- Eu gostaria de reformar motos.

- Sério? Eu nunca andei de moto. – Confessei enquanto me entupia de amendoim.

- Mentira? – Ele parecia ofendidíssimo.

- Juro. Morro de medo.

- Não. Você vai andar comigo. Eu faço questão.

- Você vai ter que me convencer.

Continuamos a conversar e rir. Em outro momento ele se inclinou pra me beijar de novo, ali no meio do bar lotado. Eu coloquei um amendoim na boca dele antes que ele chegasse na minha boca e ele riu. Meu Deus. Até eu já estava me sentindo patética.

- E você, o que faz?

- Sou analista administrativa de uma multinacional.

- Uau.

- O que?

- Não imaginei. Você é muito louca pra ter um trabalho tão certinho. – Eu o olhei com um tom falsamente ofendido. - O que me faz pensar que você tem alguma paixão oculta e nada convencional?

- Porque acha isso?

- Um doido reconhece outro, Marlene.

Eu sorri, mas fiquei impressionada. Ele foi muito perspicaz. Eu me via cada vez mais envolvida na conversa, minha idéia de manter as coisas impessoais indo por água a baixo.

- Talvez você esteja certo. Talvez não.

Ele abriu um sorriso. Totalmente intrigado.

- Eu adoraria saber que paixão é essa. – Ele se debruçou sob o balcão a minha frente, um sorriso totalmente indecente nos lábios.

Sinto muito, Barman. Não vamos cruzar dessa linha.

- Chega de perguntas. – Disse tomando mais um gole do meu drink.

- Você é muito misteriosa, McKinnon. Você é casada por acaso?

- Ugh, não.

O riso foi mais alto dessa vez.

- Porque essa aversão toda a casamento?

Ele parecia Lily, conseguindo entender tudo nas entrelinhas sem eu precisar falar. Suas perguntas estavam certeiras demais pro meu gosto, já estava me incomodando.

- Você já terminou aqui?

Ele me olhou estreitando os olhos, entendendo que eu não ia responder mais nada. Eu sustentei seu olhar.

- Terminei.

- Ótimo.

Em seguida subimos para o apartamento dele pra fazer coisas que não pediam qualquer conversa.

E enfim o dia da despedida de Lily chegou.

Pra minha imensa decepção James e o Frank iam participar, já que haviam chegado mais cedo da viagem de trabalho. Mas nada me incomodou mais que o fato dela não querer strippers.

- Isso nem é uma despedida de solteira se o noivo vai estar presente! Você tem noção de quantos anos eu esperei pra contratar um stripper pra dançar em cima de você? Quantas noites eu passei ouvindo você falar do James? Tudo por esse momento, Lily! E você tirou isso de mim!

Cadê meu Oscar?

- Se você quiser botar o barman pra dançar pra gente eu não me oponho, Lene. – Maria abriu um sorriso malicioso.

Eu fechei a cara imediatamente. Simplesmente odiei o comentário. E é claro que Lily percebeu.

Chegamos ao bar que estava lotado. Levaram a gente para umas mesas bem próximas de onde a banda tocaria. Eu, Lily, Alice, Dorcas e Maria nos acomodamos. Não demorou muito para que Sirius viesse até nós. Quando me viu abriu um sorriso incrível, me olhando de cima a baixo. Eu estava com meu vestido de seda, que guardo para ocasiões em que quero me sentir especialmente linda. Sem dúvida ele aprovava. Pisquei pra ele em resposta.

- Mesa reservada como pediu. – Ele disse se dirigindo a Lily.

- É perfeita, Sirius! Obrigada!

Sirius orientou o garçom pra nos servir bebidas. Em seguida se aproximou e falou no meu ouvido.

- Você está excepcionalmente linda. – Ah, a noite ia ser boa. Então ele me deu um beijo na testa.

Merda, merda, merda.

Um arrepio percorreu minhas costas e eu fiquei imediatamente tensa.

Só não era pior do que o fato de Lily ter visto tudo e percebido perfeitamente minha reação. Ela me olhava com uma expressão surpresa e eu senti muita dificuldade de sustentar seu olhar.

Por sorte tivemos uma distração nesse momento.

James e seus amigos haviam chegado. Lily correu para os braços do noivo e eu tive um tempinho para me recompor. Mas pra minha surpresa, quem falou foi Sirius.

- Eu tive um pressentimento que era você!

- Você tinha que ser dono do lugar que tá embebedando a minha noiva!

Me virei pra ver com quem ele falava, mas alguém capturou minha atenção antes.

O cara de pau veio com James.

Meu ex-namorado, Amos Diggory. Ele era um dos melhores amigos de James. Lily trazer James para a despedida de solteira dela já estava me causando mais problemas do que deveria.

Eu estava tão puta de ver o demente do meu ex-namorado que demorei uma vida para perceber que meu barman gato e o noivo da minha melhor amiga estavam se abraçando como irmãos.

- Oi, Lene. Você está linda. – Disse o babaca, querendo chamar minha atenção de volta a ele.

Eu o ignorei.

- Nós podemos... – Ele recomeçou, mas eu não dei chance dele terminar.

- Como foi a viagem, James?

- Foi ótima. – Ele respondeu meio desconcertado.

Eu sentia o olhar de Amos me queimando, assim como o de Sirius. Não podia ficar pior.

Espera, podia sim.

- Boa noite, pombinhos!

Emelina Vance, prima de Amos tinha chegado.

Ela era uma vaca que passou o meu relacionamento inteiro com Amos me criticando por que eu não era a namorada que ele merecia.

- Marlene, que surpresa! – Vi quando os olhos dela se detiveram no homem ao meu lado. Um sorriso maldoso apareceu no seu rosto e ela completou. – Uau, você realmente é uma jogadora, McKinnon.

Se não fosse a despedida de solteira da minha amiga eu tinha jogado um copo na cabeça dela.

Aquilo ficou demais pra mim, então fui até o bar. Pedi uma dose de whisky que virei de um gole. Eu estava fervendo de raiva. Pedi outra dose.

- Você não é uma jogadora, Marlene. – Sirius me seguiu.

- Como você sabe? – Perguntei, um pouco mais agressiva do que deveria, virando a próxima dose.

- Eu tenho um bar, esqueceu? Eu vejo jogadores o tempo todo. Jogadores são mentirosos e fingem. Eu nunca conheci uma mulher mais transparente do que você.

- Você fala como se me conhecesse. Você não me conhece, Sirius. – Eu estava sendo realmente grossa agora.

Pedi outra dose e os olhos dele se estreitaram.

- Então como que eu sei que aquele cara que chegou com o James partiu seu coração?

Foi como se eu tivesse engolido uma travessa de gelo ao invés do whisky. Meu rosto desmoronou e eu me senti a pior jogadora do mundo. Me senti tão vulnerável e exposta que a única coisa que queria era me esconder embaixo das minhas cobertas e não sair nunca mais de lá.

- Eu vou embora.

Passei por ele sem dar chance dele dizer qualquer outra coisa. Eu nem sabia o que tava fazendo. Eu só tentei chegar até a porta o mais rápido possível pra ir embora logo dali. Respirar o ar puro foi bom. Por meio segundo.

- Lene! Você já vai? Eu esperava que a agente pudesse conversar.

O babaca tinha me seguido até a porta.

- Amos, eu não tenho nada pra falar com você. – Puxei meu celular, chamando um Uber.

- Marlene.

Era Sirius. Ele tinha me seguido até a porta do bar também. Tinha uma expressão preocupada, e olhava de mim para o Amos.

- Está tudo bem aqui?

- Lene... tenta me ouvir. – Amos insistiu.

Então fiz a única coisa que parecia ser capaz de fazer o Amos me deixar em paz naquele momento. Fui até Sirius e o beijei.

Não foi nem de longe o beijo sensual que estávamos acostumados. Pra ser sincera foi tão patético que minha vontade era pedir desculpa pra ele assim que acabou. Quando nos separamos o Amos já tinha sumido.

- Ele fez até você me beijar em público. Acho que acertei.

- Eu não quero falar sobre essas coisas!

- Bom, você não quer falar sobre um monte de coisa. Ás vezes é difícil de entender o que você quer.

- Pelo contrário, é bem simples. Quero ter momentos felizes. Só isso. Achei que estávamos na mesma página.

- Talvez a gente tenha visões diferentes do que são momentos felizes.

- Qual sua versão de momentos felizes, Sirius?

Eu o encarei, irritada. Ele não se intimidou nenhum pouco sob o meu olhar. Avançou um passo na minha direção.

- Eu quero te beijar, sem me importar se tem alguém em volta. Eu quero te ver durante o dia. Talvez te levar pra jantar. Ver um filme. Ou que talvez você ao menos passasse uma noite inteira aqui, ao invés de sair correndo de madrugada. – Ele avançou mais um passo. – E adoraria saber o que aconteceu com você pra você ser tão fechada.

Eu ri, tentando fingir que o que ele falou não me afetou.

- E porque ia querer saber isso?

Ele suspirou antes de responder.

- Porque você é a mulher mais interessante que eu já conheci.

Eu travei. Meu fôlego me escapou.

Ele era a porra de um jogador, afinal.

E eu não tinha tempo para esse papinho. E meu uber tinha chegado. Ao menos uma coisa dando certo naquele dia horrível.

- Tchau, Sirius.