N/A: Sábado de capítulo duplo! Meu Deus não acredito que consegui! Enfim, esse é o último capítulo de introdução de personagem, agora todos estão na república e tem uma surpresinha no final. Percebi que tem muita gente lendo Enquanto Lamentamos depois que comecei a postar essa fanfic, muito obrigada!
Ah, um pequeno aviso, realmente retirei as fanfics de CDZ do AO3, decidi deixá-las apenas aqui no mesmo.
[Todos os personagens pertencem ao Masami Kurumada e a Shiori Teshirogi!]
5
O Estranho
Sāmya
Um dos gêmeos estava de pé sobre o degrau que separava a sala de estar da cozinha, uma das sobrancelhas erguidas assim como o queixo, como se quisesse demonstrar confiança. O outro estava encostado à porta do quarto que também devia ser o meu, mas ele não conseguia me encarar, pelo contrário, parecia tão atento aos passos de minha irmã que eu parecia ter me transformado em uma sombra incômoda.
Eu não conseguia diferenciar os dois, então chamaria de gêmeo número um o que ligou para minha irmã avisando da minha chegada e de gêmeo número dois aquele que ficava seguindo-a com o olhar. O problema era quando eles mudavam de posição, pois assim tinha que ficar atento aos gestos de cada um novamente, então acho que já devo ter me esquecido quem era quem.
Além dos gêmeos havia um terceiro morador, mas ele ainda não havia chegado ou já tinha sido avisado da minha presença e preferiu não aparecer. Sorte a dele.
- Devia ter me ligado mais cedo – Sibyl voltou do quarto, já livre das roupas que usava para a faculdade. Ela usava um pijama no formato de macacão preto com orelhas de gato e secava o cabelo molhado com uma toalha.
Aparentemente ela já estava voltando para a república quando recebeu a ligação do gêmeo número um. Conseguíamos sentir quando o outro estava por perto, sempre fomos assim.
- Não sei mexer nessa coisa – tirei o celular do bolso. Ele não reagia a nenhum toque, nem mesmo quando apertava os botões da lateral.
- Você lembrou que precisa carregá-lo?
- Ah... Então era isso – respondi. Sabia que estava esquecendo de algo, mas sem Sibyl para me lembrar de algumas especificidades da tecnologia algumas coisas me fugiam da memória.
Acredito que o gêmeo número um soltou uma risada de desdém. Dessa vez acertei quem ele era porque o número dois ficava olhando para as orelhas de gato do pijama de Sibyl como se estivesse hipnotizado.
- Já mostrou o quarto a ele, Télos? – Sibyl perguntou ao gêmeo que aparentemente tinha uma estranha atração por pessoas vestidas de animais.
- Sim, é claro! – Télos respondeu com um entusiasmo exagerado. Não sabia como Sibyl conseguia chamá-lo pelo nome correto quando havia uma cópia perfeita bem ao lado.
De fato Télos havia me mostrado o quarto que dividiríamos, era razoavelmente grande para duas pessoas e eu ficaria com o beliche de cima. Sibyl já havia arrumado a maioria das minhas coisas, agora eu só precisava aprender onde cada uma estava.
Enquanto esperávamos por ela o gêmeo que agora eu presumia ser Télos me serviu um chá quente enquanto o outro me fazia perguntas indiscretas sobre como era minha relação com Sibyl e por que nós não nos parecíamos fisicamente.
É claro que não respondi nenhuma delas.
- Obrigada por tudo – afastei a cadeira para me levantar e fiz uma pequena reverência com a cabeça para os gêmeos.
- Pode deixar aí – Télos disse quando eu estava prestes a levar a xícara para a pia – vou comer algo antes de dormir, aproveito e lavo a louça.
- Obrigada – Sibyl respondeu por mim, acrescentando um sorriso. Não sei como Télos sobreviveu, mas vi quando o outro gêmeo cujo número eu não recordava mais revirou os olhos e entrou no próprio quarto.
A República Olimpo me era estranhamente familiar.
XXX
Segui Sibyl até seu quarto, ela já o havia deixado com seu jeito é claro. Cheirava a lavanda e roupa limpa, havia livros abertos na escrivaninha e a cama estava bem feita.
Sibyl estendeu a toalha molhada na cadeira enquanto eu deitava em sua cama.
- Como é bom esticar as costas – me espreguicei e tirei os sapatos, então fechei os olhos. Quase conseguia ver o universo.
- Tem certeza de que não está com fome? – Sibyl perguntou, me trazendo de volta a este mundo. Nossos celulares eram iguais então ela usou seu carregador para trazer o meu de volta a vida.
Assenti levemente com a cabeça. Havia comido no avião, mas agora estava mais cansado do que com fome.
- Como foi na Grécia? – Sibyl perguntou. Ela pegou outro travesseiro e o dispôs ao meu lado, depois se jogou por cima dele e apoiou a cabeça em meu ombro – Não vou dizer nada ao nosso pai, só quero que saiba que pode me falar, se quiser.
- Sabe que não gosto de comentar sobre as minhas viagens – acho que minha resposta foi um pouco insensível demais, mas Sibyl já estava acostumada.
- Queria ter ido com você, ao menos seria ignorada pessoalmente.
- Eu não te ignoro.
- Não, só esconde coisas de mim, igual ao nosso pai.
Suspirei e olhei para Sibyl, eu poderia brigar com ela, mas já tínhamos tido essa conversa centenas de vezes, então simplesmente cutuquei sua testa com o indicador.
- Por acaso se esqueceu do que combinamos? – perguntei – Não quero que se cobre tanto por causa dele.
- Eu sei, eu sei... Eu me lembro Sāmya.
Cutuquei sua testa de novo, dessa vez mais forte.
- Sāmy! – ela se corrigiu usando o apelido que costumava me chamar – Desculpe!
Sibyl sorriu e eu também. Era melhor que ela ficasse no escuro sobre algumas coisas, ela não precisava saber de tudo, apenas se divertir e sorrir enquanto o destino seguia seu curso.
- Então não vai me contar nada sobre a Grécia?
- Achei que odiasse mitologia.
- Mas não sou ignorante sobre o assunto – Sibyl insistiu, seu capuz com as orelhas de gato haviam caído, então a ajudei a arrumá-lo – você visitou os monumentos ou as praias?
Respirei fundo, não queria que ela soubesse a verdade, então acho que tinha que responder alguma coisa até que Sibyl se esquecesse do assunto.
- Os monumentos, sabe que gosto de coisas antigas.
Me esforcei para sorrir, não queria que ela tivesse a impressão errada.
Mas não foi o suficiente.
- Espero que não tenha sido solitário – disse Sibyl, sua expressão havia mudado, estava mais séria.
- Na verdade acabei encontrando antigos amigos por lá.
- Amigos? – Sibyl levantou depressa, ficando ajoelhada. Ela bateu palmas e sorriu. – Quem são eles? Posso conhecê-los?
- Não acho que eles saiam de lá com muita frequencia.
O sorriso de minha irmã murchou, ela voltou a deitar ao meu lado e deu um longo suspiro.
- Não quero que fique solitário Sāmya.
- Não sou solitário, sempre terei você ao meu lado.
Sibyl assentiu.
- Já pensou o que aconteceria se eu morresse amanhã? Quem cuidaria de você?
- Eu ficaria bem, acabaríamos nos encontrando de novo.
Minha falta de reação deixou Sibyl assustada, percebi pela forma como ela segurou minha mão, como se temesse evaporar no momento em que terminei de falar. Ela pensava demais no futuro, temia coisas que não tínhamos controle e temia ainda mais o nosso pai.
Ela tinha uma vida nova, mas não conseguia aproveitá-la direito, por isso eu tinha que estar sempre por perto.
- Ah, quase esqueci – Sibyl levantou e pegou uma caixa que estava em sua escrivaninha, perto dos livros abertos – fui ao hospital da faculdade e peguei seu colírio novo. Espero que não tenha tido problemas na Grécia por causa de seus olhos.
- Obrigado – peguei a caixa e baguncei o cabelo de Sibyl com uma das mãos, é claro que ela não gostou – então, está gostando mesmo daqui?
Sibyl assentiu, ela tentava desembaraçar o cabelo molhado com a ponta dos dedos.
- Sim, mas ainda não sei por que nosso pai insistiu tanto que viéssemos para cá tão encima da hora, você estava longe e todos os apartamentos da cidade ocupados – Sibyl suspirou, só agora percebi o quanto ela estava cansada, deve ter sido difícil fazer tudo sozinha – além disso, tenho aula extra as terças agora, por causa das matérias diferentes.
- Ótimo – respondi – menos tempo para ficar me vigiando.
- Não seja ingrato – ela me mostrou a língua, depois sua expressão ficou mais alegre, deve ter se lembrado de algo bom – não faz ideia de quem é o outro morador!
- Não me diga que são trigêmeos... – esfreguei os olhos. Mal consegui conversar direito com aqueles dois, se tivesse um terceiro estaria completamente perdido.
- É aquele youtuber que costumo assistir! Aquele que faz vídeos estudando!
Assenti, não ligava para vídeos na internet, mas Sibyl parecia tão animada que não quis dizer nada que a abalasse como, por exemplo: "por que ele faz isso?".
- Percebeu que um dos gêmeos fica olhando para você de maneira estranha?
- Já chega – Sibyl tentou me empurrar para fora da cama – boa noite. Não esqueça que temos aula amanhã.
- Boa noite irmãzinha.
Dei um beijo em seu rosto antes de sair, meu colega de quarto me esperava.
XXX
Fui o primeiro a acordar no dia seguinte, mas não quis incomodar ninguém. Meu colega de quarto, o gêmeo que devia se chamar Télos roncava alto, parecendo muito cansado, então tomei meu café calmamente, apreciando o silêncio e minha torrada com abacate. Ficar por tempo demais preso dentro daquelas paredes me deixavam claustrofóbico e vi uma escada que levava ao terraço antes de entrar na república, então lavei a louça e saí antes que alguém me visse.
O terraço era quadrado assim como o resto da casa, mas tinha uma vista bonita do bairro e a brisa gelada da manhã me trazia ânimo. Pela quantidade de plantas que havia na entrada e no terraço deduzi que a dona da propriedade gostava da natureza, acho que acabaria propondo a ela uma pequena horta no jardim, pois gostava de legumes frescos.
Escolhi um lugar de onde poderia ver a rua e me acomodei em uma das almofadas que encontrei perto dos móveis de madeira. Meditar fazia parte da minha rotina diária, não conseguia começar o dia sem isso, nem terminar. Eu fechava os olhos e deixava que meus sentidos se aguçassem.
Nada seria capaz de me surpreender enquanto eu estivesse concentrado o bastante, nem mesmo um deus. Se bem que os deuses pareciam muito silenciosos ultimamente, ou então era essa forma em que estava preso temporariamente, incapaz de sentir com clareza os movimentos do céu.
Enquanto pensava nos deuses e nos planos que ainda estavam por vir, vi quando um dos residentes da República Olimpo saía para seus exercícios matinais, provavelmente aquele que Sibyl me falou com tanto entusiasmo. Ele se alongou por alguns minutos no jardim, depois saiu para correr pelo bairro. Mesmo vendo-o de longe, ele me lembrou alguém que conheci.
Fiquei observando o humano até que o perdesse de vista, me dando conta de que todos daquela casa eram semelhantes a companheiros antigos, então tirei três coisas do bolso do meu pijama, um caderno de anotações que era menor que a minha mão, uma caneta e um isqueiro.
Eu não fumava e também não mostrava aquilo para ninguém, mas o isqueiro era necessário para o que eu iria fazer. O fogo era sempre a melhor ferramenta para apagar evidências.
Peguei o caderno e reli algumas das coisas que escrevi enquanto estava na Grécia, o reencontro com alguns antigos amigos. Ambos já estavam mortos, é claro, mas seus espíritos ainda vagavam pela Terra, sempre procurando, sempre dispostos a ajudar.
Não entendi porque vieram falar comigo, não quando eu não era mais digno da ajuda de ninguém. Peguei a caneta e comecei a escrever o que mais me afligia no momento.
A ida a Grécia foi um erro, um grande erro, e o deus viria cobrar de mim depois, mas eu suportaria a punição. Ele podia me afligir fisicamente, mas não correria o risco de acabar com meu corpo físico, não quando sua filha dependia tanto de mim.
Se ele me matasse em nosso próximo encontro o que seria de Sibyl?
Esbocei um sorriso ao escrever aquele nome. Demorou anos para me acostumar a chamá-la daquele jeito... Sibyl, preferia o nome antigo, assim como seu jeito antigo, mas logo ela estaria de volta, era apenas uma questão de tempo, talvez um pouco mais do que esperávamos já que os gêmeos também renasceram juntos nessa era.
- Traiçoeiro como sempre, Aspros. – sussurrei para mim mesmo quando terminei de escrever.
Ele havia seguido o irmão, talvez para se redimir. Ou então havia seguido aquela que o assassinou para impedir sua felicidade.
Arranquei as páginas do caderno, então as queimei com ajuda das chamas do isqueiro.
Esperei um pouco, até que a ponta dos meus dedos também fossem levemente queimadas pelo fogo, então larguei o que restou das páginas do caderno e as observei se extinguir por completo.
Sem provas, sem lembranças antigas, sem nada que interrompesse o ciclo dos deuses.
Guardei o caderno, a caneta e o isqueiro de volta em meu bolso e voltei a meditar.
Era muito difícil viver como Sāmya cheio de lembranças de meu antigo eu.
Da próxima vez que Dafne acordasse eu rogaria que ela me chamasse de novo pelo meu nome verdadeiro, Asmita.
Continua...
N/A: Se vocês querem saber como está o cabelo do Sāmya, chequem a apresentação ao vivo do grupo Astro no programaMusic Bank do dia 16 de abril (tem no youtube), o cabelo foi inspirado no integrante Moonbin.
