Cap 6 CONFISSÕES
Alguns dias passaram desde a interação mais quente entre Kaoru e Kenshin. Porém o coração da instrutora estava aflito. Megumi tentava auxiliar a amiga remediando esse sentimento e a levando para um passeio no final da tarde apreciando um petisco e caminhando vagarosamente em torno do bosque local, que circundava o agradável lago.
- Pois eu acho que foi só um aviso, Kaoru. – Megumi passeava pelo entorno do lago com a jovem interlocutora pensativa ao seu lado. – Com um pouco de agradável e intensa experimentação como bônus. – E riu sem reservas.
Kaoru ficou com os ombros duros, seu passo retesado, rosto pensativo e angustiado.
- Ele pareceu ficar descontrolado por alguns momentos, o olhar mais perigoso... – O olhar dela saiu de foco, caminhava devagar, sua mente a mil. – Parecia ter se esforçado muito para que nós não... – O vermelho dominou o rosto dela. – Para que ele não continuasse a …. - Ela estancou e gesticulou sem sentido algum. Um suspiro frustrado a venceu. - Ando um pouco distante nesses últimos dias. – E chutou uma pedrinha, cabisbaixa.
- Pois não devia. – O leque da médica ajudava a dissipar o calor. - Ele já estava em conflito com ele mesmo quando conseguiu não forçar que a situação se desenvolvesse – Ela olhou para Kaoru com um olhar malicioso, sorriu e em seguido abocanhou mais um pedaço de seu espetinho, satisfeita com seu raciocínio. – Ele jamais vai avançar sem que perceba que essa seja também sua vontade.
Kaoru permanecia silenciosa. Só deu um aceno afirmativo de cabeça como resposta. Megumi acotovelou a amiga, a tirando do transe.
- Ânimo Kaoru. – E a fez sorrir. – Vocês estão no caminho certo.
A instrutora sorriu ainda encabulada.
- Fico te devendo outra Megumi; obrigada por me ouvir. – A espadachim suspirou fundo, acompanhando a médica até sua casa.
Enquanto isso, no dojo Kamiya...
- Ainda hoje Kaoru não conseguia se concentrar nas aulas totalmente. – Yahiko varria o chão ao lado do ex-hitokiri. Sorriso polido e curioso no rosto. – O relacionamento de vocês está bem ?
- Está. – O olhar de Kenshin não parecia mais tão amigável. – Mas pode ser melhor . – O samurai ruivo juntou um monte de folhas em um canto. – Ela está um pouco tensa ultimamente, por minha culpa. – Ele suspirou alto, frustrado.
- Não acredito que você possa ter feito algo que ela não gostasse . – O jovem parou seu serviço e apoiou sua mão no ombro do amigo mais velho. – O que quer que seja, ela vai perdoar e continuar gostando de você ; é da Kaoru que estamos falando, no fim das contas. – Ele riu, simpático.
- Espero que sim, Yahiko – O sorriso bonachão voltou a figurar no rosto do ruivo.
Poucos dias depois, jantaram em companhia de Sano e Megumi, que ajudou Kaoru com o menu.
Todos comemoraram o final de mais uma semana, com direito a saquê morno consumido debaixo da luz do luar , numa temperatura agradável e com uma brisa leve.
- Fazia tempo que não bebíamos e relaxávamos juntos – Sanosuke despejava mais saquê no copo de Megumi, além de servir a si mesmo. – Foi uma boa ideia, já que todos só conseguimos ficar preocupados com a senhorita – Apontando para Kaoru com o pequeno copo em mãos. – Na ocasião do festival.
- Não escolhi ficar doente Sanosuke! – Kaoru bufou de leve, quase gritando. – E agradeço a preocupação. – O olhar dela exibia um semi-sorriso ameaçador.
- Mas tudo se resolveu logo, com os cuidados rápidos e eficientes do Kenshin, aqui. – Yahiko acotovelou o ruivo que estava ao seu lado.
- Não foi nada demais – Ele sorriu bondosamente, olhando a moça ao seu lado de leve; pegou a garrafa de sake começou a servir Kaoru e todos que estivessem com o copo vazio . – Um brinde à saúde de Kaoru e de todos nós.
Todos levantaram os respectivos copos, bebendo de uma vez, sorridentes.
Comidas apetitosas sendo consumidas entre murmúrios de apreciação, clima com brisa leve e risos um pouco mais acalorados pelo álcool podiam ser ouvidos.
- Por acaso reparou num tal Ryotaro, o aluno novo de comportamento fora do comum? – Kenshin servia novamente a moça enquanto conversavam. – Ando o observando há alguns dias...ele parece ameaçador de algum modo?
- Obrigada Kenshin. – Ela repousou o copo. – Bem, percebi que ele nem está treinando direito; até bronca dei, mas ele só me olhava estranho. – Ela chacoalhou os ombros , sem dar muita atenção ao fato.
- Bom, se esse cara sair da linha, vai ter que se ver com o Kenshin. – Sano deu um tapa nas costas do amigo. – Disso tenho certeza, não é ?
Todos riram alto; Kenshin e Kaoru um pouco menos, se olhando um tanto encabulados.
- Ouso dizer que sim - Kenshin confessou entre um gole de saquê e outro. – Tudo tem um limite, afinal. – Ele passou os dedos entre os cabelos, respirando um pouco mais fundo.
- Não sabia que você fazia o tipo ciumento, Kenshin. – Kaoru já começava a falar com um pouco mais de dificuldade; bochechas permanentemente rosadas. – Achei que esse seria meu papel pra sempre. – Ela cobriu a boca com a mão, rindo um pouco mais sonoramente.
- Pois eu também achei. – Megumi brindou a isso, rindo maliciosamente. – Surpresas da vida, não? – A médica acariciou de leve o bíceps de Sano, o olhando.
O lutador a encarou arrematando seu próprio copo de saquê, se inclinando ligeiramente para frente.
- Bom, os casais fiquem à vontade, porque tenho planos com a Tae assim que ela acabar o expediente no Akabeko. – Ele se levantou e se dirigiu aos portões. – Divirtam-se! – E saiu tranquilo.
Os quatro se olharam.
Os homens estavam servindo mais uma rodada de saquê para as moças; estavam brindando descontraídos e conversas paralelas entre as duplas.
- Kaoru, devagar no saquê, da última vez você nos deu trabalho. – Megumi retirava novamente seu leque , o abrindo e abanando vagarosamente.
- Sano me ensinou a tomar um pouco de água nos intervalos, vai dar tudo certo. – Ela levantou seu copo para o lutador, que retribuiu o gesto sorridente.
Kenshin olhou confuso, já que o papo dos rapazes era outro.
- Então está se sentindo possessivo ultimamente, senhor auto-controle? – Sano já estava servindo dois copos de uma vez para cada um dos dois. – O tal Ryotaro está testando seu pacifismo?
- Não exagera, Sano. – O ex-battoussai se recostou numa pilastra próxima de suas costas, confortavelmente. – Só me preocupo com a segurança e o bem-estar dela...- Ele arrematou mais uma dose de bebida. – E se ele tocar num fio de cabelo dela sem permissão... – Não deixou de estralar alguns dedos de sua mão.
Kaoru pegou esse final de conversa e o encarou feio; o máximo que podia, considerando que ainda exibia um meio-sorriso.
Ao final da noite Kenshin e Sano decidiram disputar quem terminava mais rápido uma garrafa de saquê completa.
Sano venceu em velocidade.
Já Kenshin não derramou uma gota sequer, ao contrário do amigo.
Kaoru, por sua vez, havia se esquecido de suas doses esporádicas de água.
Megumi já repousava confortavelmente a cabeça no ombro de Sanosuke, sem encarar nada em particular.
- Não acha que uma garrafa de saquê é muita coisa? – Kaoru segurou um soluço bem na hora, tapando a boca.
- Pois de dose em dose, quanto você acha que bebeu, Kaoru? – A sobrancelha brincalhona dele, com o olhar desafiador.
-Bem, vocês podem continuar disputando, vou levar essa moça que já está quase dormindo pra casa. – Ele se levantou , a colocou de cavalinho em suas costas e se virou para o casal. – Boa noite pra vocês e juízo.
Todos se despediram. Kenshin e Kaoru trancando o dojo.
Foram se sentar nos degraus da varanda. Um ao lado do outro, bem próximos.
- Bom, vou descobrir o que você faz quando fica alcoolizado ? – Kaoru apoiou seu queixo no ombro do rapaz, o olhando curiosa.
- Pode ser que sim. – Ele virou a cabeça para encará-la. - De minha parte, eu sei que você fica mais meiga e com a fala mais solta. – E acariciou o queixo da moça, ajeitando o rosto dela em seu ombro um pouco melhor.
- E fico com sono, ao que parece. – E bocejou longamente. – Mas isso também pode ser cansaço.
E se encararam por alguns momentos.
- Vou aproveitar que você parece ficar menos tímida também e perguntar. – Ele se ajeitou, sentado ereto, ela também o seguiu, prestando muita atenção no que ele falaria, de frente para o ruivo. - Te assustei muito naquele dia ?
Ela sabia imediatamente do que ele estava falando; o encarava sem medo.
– Um pouco; por isso fiquei um pouco mais calada e tímida com você nesses últimos dias. – Ela sentiu a face esquentar, olhou para o chão alguns segundos e retomou a conversa. - Mas você não fez nada de errado , eu só fiquei confusa e ... – Ela tomou fôlego , o encarando. - ...E me assustei. – Ela gesticulou um pequeno pulo em seu lugar e ambos riram.
Ele trouxe as mãos dela para as suas.
- Não quero mais que você se assuste com nada vindo de minha parte. – Ele pegou uma das palmas da mão dela mais para perto e passou a alisar os dedos, um a um. – Você está vendo esse meu lado e me conhecendo melhor só agora. – Ele sorriu para ela, já a abraçando de lado. - Na verdade naquele dia eu também fui apresentado a um lado um tanto mais perigoso de mim - Ela o encarou nesse ponto, olhos ligeiramente sobressaltados. - Vou precisar de um pouco mais de controle; iremos devagar.
- Bem, percebi algo diferente em seus olhos, realmente...Mas nunca deixaria de confiar em você. – Ela se aninhou junto ao peito dele. – Vamos ter bastante tempo e paciência daqui pra frente. – Ela acariciou a linha do maxilar dele.
- Espero que tenhamos até o resto de nossas vidas. – Ele mirou os olhos na face dela, aguardando.
Somente as cigarras faziam algum som; os pares de olhos azuis não paravam de se encarar.
- Eu espero que sim, Kenshin. – Ela se aproximou dos lábios dele e iniciou mais um beijo que se aprofundava a cada segundo.
Logo as respirações começaram a se alterar e Kaoru sentiu que aprendia algo mais que não conhecia : sentiu a "umidade" do beijo aumentar e abriu os olhos, os arregalando em choque. Fechou os lábios e se afastou, confusa.
O samurai a olhou pacientemente, afagando seu rosto.
- É só me imitar, Kaoru; pense como mais um músculo a ser trabalhado. – E riu roucamente, frontes se tocando, seus narizes em contato. – Mais devagar então .- Ele olhava as íris dela como se a hipnotizasse.
Eles voltaram a se beijar, agora com empenho maior da parte dela, que parecia entender o mecanismo de um beijo mais íntimo; ambos se empenhavam a cada segundo. Ele a segurando pela cintura, ela se apoiando no pescoço dele.
Os ânimos de Kenshin se afoguearam novamente; teve que desacelerar, mais uma vez, em nome da inexperiência dela.
A moça ainda parecia ávida por um pouco mais de contato, demorando a deixá-lo terminar seus beijos.
- Kaoru . – Ele abriu os olhos vagarosamente, acariciando a nuca dela. – Você já aprendeu, melhor pararmos agora. – A voz dele não passava de um sussurro rouco; seus olhos avisando a expressão embevecida dela que o perigo de não pararem era bem óbvio e já havia sido previamente discutido.
Ela ainda segurava o pescoço dele, agora roçando levemente suas unhas em sua nuca; estava perdida no olhar, neste ponto, quase grave dele. Não conseguiu evitar um mínimo sorriso, porém também não conseguiu proferir palavra; poderia ser o saquê, a dormência de seus músculos ou seu extremo estado de relaxamento.
Ele notou a vulnerabilidade dela e decidiu levá-la para o quarto ; levantou-se e a carregou no colo enquanto ela enrolava mechas de seu cabelo avermelhado em seus dedos, rindo carinhosamente pelo breve caminho.
- Pronto, agora pode descansar. – A colocou sentada no futon. – Boa noite... – Ele ainda encarou o rosto dela, um sorriso sedutor em sua face. – Minha Kaoru. – E pressionou demoradamente seus lábios com os dela, que agora já estava deitada, se separando aos poucos, observando-a carinhosamente.
Ela riu baixo e puxou o braço dele.
- Durma aqui comigo. – Ela o olhou como se esse fosse o pedido mais inocente e natural do mundo.
Ele se surpreendeu com o olhar pidoncho dela. Hesitou alguns instantes e se agachou ao lado dela.
- Não acho que seja uma boa ideia... – Ele tentava soltar seu braço delicadamente.
- Não tem problema Kenshin, vou dormir melhor com você ao meu lado. – Ela se posicionou para dar lugar a ele. – Quem sabe você dorme melhor também. – E já cerrava os olhos, se deitando confortavelmente, despreocupada e cada vez mais relaxada.
Ele sabia que não aconteceria nada se simplesmente dormisse ao lado dela; não a estaria desrespeitando de qualquer forma. Só estariam literalmente dormindo juntos.
Se deitou um pouco atrás. Logo ela buscou o braço dele e puxou para si, o colocando em sua cintura, de modo que estavam agora muito próximos.
- Sempre quis dormir sendo abraçada por você, Kenshin. – A confissão saiu natural , sem vestígio de timidez, pontuada pela voz sonolenta da espadachim.
- Também já ando pensando nisso há um bom tempo , Kaoru. – Ele afagou os cabelos dela, se aprofundando no aroma que sentia no momento.
Só precisava conter seus impulsos e tentar dormir em paz durante a longa noite que se colocava à sua frente. Se havia algo de vestígio de sua vida ex-hitokiri desejava que nesse momento fosse seu calculismo e frieza; pedia internamente a si mesmo que houvesse restado o suficiente.
