Exarchia, Atenas, Grécia. 2018

AVISO: Este capítulo tem críticas à violência policial e alto teor político.

POV Aiolos

Aiolos dirigia o carro e não se importava muito se estava acima da velocidade da pista. Ainda bem que ele conhecia Atenas muito bem e conseguiu se desviar de vários pontos de trânsito certo para conseguir chegar até Exarchia, o bairro que ocorria os protestos. Ele claramente estava se metendo em uma confusão certa, mas não se importava. Confusão certa era o seu sobrenome.

Aiolos e Aiolia nasceram em Tessalônica. O pai deles morreu logo após Olia ter nascido. No velório do pai, ele com seus sete anos de idade, vendo a mãe chorar com o pequeno Olia, de alguns meses, no colo, ouviu algum tio sussurrar no seu ouvido:

- Agora você será o homenzinho da casa. Cuide bem de sua família.

Ele prometeu que levaria aquela promessa para a vida. Seria o homem da casa, o exemplo para Aiolia. Assim, se esforçou ao máximo para ser um aluno exemplar, com um bom comportamento. Trabalhou cedo para pagar suas contas e estudava também. Além disso, sempre lutava pelo certo e pelo justo, sendo um rapaz honesto, que não tolerava injustiças na sua frente. Na escola, defendia os alunos que sofriam bullying, era elogiado pelos professores e (diferente de Aiolia) tinha um bom comportamento.

O problema é que ele simplesmente não conseguia escapar das confusões.

Veja, ele realmente tentava se esquivar das confusões, mas elas pareciam fãs que perseguem o seu ídolo amado. Na escola, parecia que ele sempre estava na hora errada e no local errado, pois sempre aparecia quando alguém estava apanhando, um casal brigando ou amigos discutindo. E ele, sendo a pessoa que não gosta de ver coisas erradas ou injustas acontecendo, ia tentar consertá-las. E, por mais que ele fosse pacífico, isso já lhe rendeu alguns dentes quebrados ou alguns hematomas em várias partes do corpo.

Para piorar, ele escolheu ser advogado. A profissão dos conflitos.

E assim, ele poderia muito bem, mesmo dentro do direito, ter escolhido uma área tranquila. Trabalhar com investimentos, mercado de capitais, empresas, sei lá. Mas não, ele resolveu arriscar o seu traseiro advogando para pessoas que corriam risco de vida, ou eram perseguidas por governos, refugiados, encrenqueiros. Tudo isso pelos seus ideais, de proteger aqueles que mais necessitassem.

E eles nem pagavam bem, sabe.

Assim, logo que terminou a faculdade, abriu um escritório com mais duas colegas, suas companheiras de luta: Eleni e Maria. O intuito do escritório era a proteção e assistência jurídica de pessoas que estavam, de alguma forma, sofrendo perseguições por parte de algum político ou do próprio estado grego, devido as manifestações que ocorriam no país desde a crise de 2008, que afetou muito a Grécia, deixando o país endividado. Ao longo do tempo, eles estenderam a clientela, passando a ajudar jornalistas e ativistas perseguidos, até mesmo refugiados que queriam abrigo na Europa.

O escritório ia bem, muito bem, obrigado. Só que esse era o problema. Tanto com ele, tanto com o país.

E assim, começaram a monitorar Kanon. Ele surgiu do nada, com documentos que provavam o envolvimento em diversas organizações nos vazamentos de petróleo no Mediterrâneo, que incluíam até mesmo a Fundação Graad. Na época, ele não mostrava o rosto, o que Aiolos julgou ser muito seguro. Ele só lançava os documentos em suas redes sociais e esperava os jornalistas verificarem se aquilo era somente uma fake news. E impressionava a todos quando o que ele dizia era verdadeiro. E, há pouco tempo, teve que revelar a sua face. Agora, ele sofre diversos ataques, tanto da imprensa tradicional, quanto de grupos políticos que cismam que ele é um "destruidor da nação".

Pessoalmente, Aiolos duvidava disso. Kanon era razoavelmente jovem para ser um líder político (parecia na casa dos trinta), e embora sua formação não tivesse nada a ver com política, ele parecia ser alguém bem-informado. Tinha um discurso político forte, afirmava que os políticos da nação tinham traído a Grécia e estavam entregando o país na mão de empresários que poderiam destruir o planeta, causando desastres ambientais, tudo em nome de ambições.

O único problema é que ele era péssimo com comunicação. Aiolos acompanhou algumas de suas poucas entrevistas, e quando contrariado, Kanon costumava ser sarcástico e ácido. Não era um esquentadinho feito Aiolia, muito pelo contrário, mas ele parecia amar ser debochado. E isso não ajudava muito na sua imagem. Aiolos tentou, de todas as formas contatar o cara, mas ele não era envolvido em nenhuma organização que Aiolos conhecia, não tinha muitos contatos. Ele tinha um grupo de ambientalistas de esquerda do lado dele, que compraram sua briga, mas não pareciam ser muito fortes na Grécia. Era realmente um líder político surgido das massas, espontâneo.

Aiolos chegou perto ao local. Estacionou o carro em um ponto mais distante e foi correndo ao ponto de confronto entre a polícia e os manifestantes. Exarchia era um bairro polêmico em Atenas, cheio de murais políticos e lojas anarquistas. A maioria dos protestos ocorriam lá, e por serem protestos mais... radicais, sempre tinha muita polícia e muito confronto.

Local perfeito para conseguir clientes.

Nem era a primeira vez que ele estava ali. Nem a segunda. Na faculdade, ele havia prometido que não se meteria em confusão. Nada de associação, nada de grêmio estudantil, nada de representação. No fim da faculdade ele já tinha passado pelas três organizações, já tinha ido para atos (muitos naquele bairro em específico, muito frequentado pelos estudantes), já tinha brigado por política, já tinha sido ameaçado.

Ele não aprende.

No meio da fumaça e da algazarra causada pelo confronto entre a polícia e os manifestantes, conseguiu ver Kanon. Ele estava com o corpo em cima do capô do carro, no qual o policial o pressionava, segurando com força as suas mãos pelas costas enquanto tentava algemá-lo.

Péssimo.

- Opa, boa noite, tudo bom? – disse Aiolos para o policial, em seu tom jovial. As suas sócias sempre brincavam com ele que ele não perderia o bom o humor nem se fosse preso. Mal do signo dele (que ele esqueceu qual era) – Tá acontecendo algum problema, senhor policial?

- Esse rapaz está desacatando uma autoridade! – o policial gritou – ele será levado para o diretório por incitar manifestações e desrespeitar uma autoridade policial!

Os olhos treinados e experientes de Aiolos perceberam um detalhe: o policial estava demorando muito para levar Kanon para o diretório. Por quê? Muito provavelmente devido ao fato de que Kanon tem notoriedade pública agora. Qualquer ato que a opinião pública considere injusta poderá trazer vários problemas ao policial.

- Senhor, o que ocorre aqui é uma manifestação legítima, os manifestantes não estão armados – disse Aiolos.

- Esse homem poderá muito bem explicar para o chefe de polícia então, ele não precisa que você o defenda – disse o policial.

- Ele precisará – disse Aiolos, calmamente – E eu posso muito bem defendê-lo. Eu sou um advogado.

- Você é o advogado dele? – disse o policial.

- Você tem algum advogado te representando, senhor Kanon? – disse Aiolos, virando-se para Kanon, que o olhava assustado.

Kanon balançou a cabeça, negativamente.

- Então eu posso representá-lo – disse Aiolos.

O policial parecia prestes a perder a paciência com ele. Mas Aiolos manteve a calma e a postura firme.

- Se você não é o advogado dele, não pode representá-lo. Se você não pode representá-lo, ele vai pro Diretório de Polícia sozinho.

Aiolos estremeceu. Ele sabia o que isso significava.

Em 2008, a Grécia estourou com manifestações contra o governo, pois uma crise econômica havia se instaurado no país (1). De lá pra cá, muitas coisas aconteceram, e uma delas, foram as diversas denúncias que foram feitas por várias organizações, alegando que seus integrantes eram perseguidos e torturados em diversos diretórios de polícia grego. Ele mesmo já pegou casos de manifestantes que foram torturados, espancados e humilhados por policiais. Inclusive, muitos deles o detestavam. O nojo por ele estava estampado na cara daqueles homens e mulheres que diziam defender a sociedade, mas, particularmente, Aiolos nunca presenciou essa "defesa". Você não é defensor de direitos humanos, você é defensor de direitos dos bandidos. Ele sempre escutava isso quando ia tentar defender algum cliente.

Aiolos nunca se importou com esses comentários. Uma vida humana é uma vida humana.

Para piorar, tudo isso acontecia pois acreditava-se que alguns membros da polícia grega eram ligados a Alvorada (2), que perseguia diversos militantes antifascistas. Kanon poderia ser facilmente uma nova vítima, e o próprio sabia disso, uma vez que ele estremeceu levemente.

- Eu não vou ao diretório sem a presença de um advogado! Então Aiolos vai comigo! – gritou Kanon, sentindo as mãos do policial em suas costas.

- Ele não tem nenhuma procuração dizendo que te representa. Você só vai com um advogado se tiver um.

A sua sorte (e a sorte de Kanon) é que, de repente, apareceram diversos celulares apontados para eles, e, como estava escuro, seus flashes estavam ligados. Assim, milhares, ou até mesmo milhões de pessoas, estariam assistindo agora um policial tentar levar não somente um manifestante, mas o líder deles, sozinho, sem a defesa de um advogado, para um departamento de polícia que foi protagonista de inúmeras polêmicas nos últimos anos.

As pessoas começaram a gritar. A protestar. O chamaram de fascista. De porco traidor. Diziam que iriam denunciá-lo. Que todos veriam o que ele está fazendo. O policial percebeu. Ele não seria o herói salvando a cidade dos baderneiros. Ele seria o vilão.

O policial olhou para os dois e disse:

- Tudo bem. Os dois irão ao diretório.

- Por quais motivos? – perguntou Aiolos.

- É só para esclarecimentos sobre o ocorrido – disse o policial, tentando conduzir Kanon para o carro.

- Pode deixar que ele vem no meu carro – disse Aiolos.

Ele sabia que em qualquer situação, o policial teria, no mínimo, falado alguns impropérios para ele. Mas eles estavam na frente de câmeras de celulares, e câmeras poderiam ser poderosas, quando bem utilizadas.

- Tudo bem. Uma viatura vai na frente e outra vai atrás do seu carro.

Assim, Aiolos indicou com a cabeça para Kanon e os dois saíram para o local onde o carro de Aiolos estava estacionado.

- Eu posso ir de moto – disse Kanon para Aiolos, quando eles atravessavam a rua – eu a estacionei aqui perto, posso pegar e ir.

- Não é recomendável – disse Aiolos – nesse exato momento, a polícia está desconfiando de suas atitudes. Qualquer atividade fora do combinado pode te colocar na cadeia.

Eles dois entraram no carro, e Aiolos deu partida. Começou a seguir o carro da polícia que rumava para o diretório, enquanto olhava atentamente, pelo retrovisor, para o carro da polícia atrás.

- Obrigado por me ajudar – disse Kanon – eu acho que provavelmente eu estaria com uma algema nos punhos agora se não fosse por você.

- Não me agradeça ainda – disse Aiolos - o que a gente vai tentar fazer é que hoje, seja no máximo alguns esclarecimentos, um "me desculpa aí, foi mal" e vamos embora para casa. Vocês tinham autorização para protestar naquele local?

- Sim – disse Kanon

- Ninguém estava armado ou algo do tipo? – perguntou Aiolos

- Não, era um pessoal pacifista.

- Ótimo. Não queremos mais incidentes do que os que já podem ocorrer.

-Você está desconfiando de mim? – disse Kanon – você é um completo desconhecido, aparece do nada oferecendo ajuda, me bota dentro do teu carro junto com a polícia, mas é você que está desconfiando de mim?

Aiolos passou a mão na testa e na franja, impaciente. O cara era difícil.

- Olha Kanon, você tá ficando muito conhecido nas redes sociais e na mídia. Só que você tá sem advogado, é um ativista de causas mais... controversas e...

- De esquerda. Pode falar que eu sou de esquerda. Não é um demônio – disse Kanon, ironicamente.

- Para onde estamos indo, é sim – disse Aiolos.

Kanon bufou, impaciente.

- Olha Kanon, eu não me apresentei propriamente. Eu sou Aiolos, e eu advogo para em causas humanitárias. Presto assistência jurídica para ativistas, políticos, militantes, organizações, refugiados... Meu escritório presta todo tipo de ajuda para essas pessoas.

- É caro? – perguntou Kanon

Meu Deus, como alguém podia se ajudar tão pouco?

- Dá pra fazer no precinho pra você – disse Aiolos – aliás, é por isso que você não procurou advogado? Por conta de preço?

- Você está me stalkeando?

- Eu trabalho na área, eu conheço todos os advogados da região que trabalham com isso e todos estavam tentando te achar pra pegar teu caso. Só que ninguém nem sabia onde você morava!

- Eu não estava precisando de advogados!

- Kanon, você é uma pessoa pública agora. E pior, é um ativista de causas ambientais, que tá fazendo muita polêmica na mídia! Você vai precisar de um advogado dia e noite na tua cola. A polícia queria te levar pra delegacia sem motivo nenhum! Num país que foi marcado por violência e tortura policial nos últimos anos, num país que tem partidos fascistas com infiltrados dentro da polícia!

Kanon ficou quieto.

- Eu já tinha ouvido falar de você – disse Kanon – meu irmão já tinha achado teu contato com um colega e tinha me mandado ligar pra você. Eu não fiz por falta de tempo. Foi uma estranha coincidência você estar aqui.

Aiolos suspirou.

- Você devia escutar seu irmão mais vezes, Kanon – finalizou.

Os dois chegaram na delegacia. Aiolos desatou a falar:

- Se a coisa ficar muito feia, utilize seu direito de silêncio. Lembre-se que estamos aqui somente para prestar esclarecimentos sobre o protesto. Mais que isso, só na presença do juiz.

- Entendido – disse Kanon, mecanicamente.

- Você ainda não é um suspeito Kanon. Mas pode se tornar um se a gente não for cuidadoso.

- Eu não fiz nada de errado – disse Kanon, calmamente.

- Você incitou um protesto anti-governo. Isso já é o suficiente.

Ambos esperaram na sala de espera do diretório. Quinze minutos depois de espera, uma ligação veio no celular de Kanon, que atendeu a contragosto.

- Oi Saga. Tá tudo bem Saga. Saga, foi algo que saiu do controle, eu não tive co... Saga, Saga, escuta. Escuta. Tá tudo bem. Foi só o policial que não foi com a minha cara. Saga... Espera, como você sabe que eu tô...? Não Saga, tá tudo bem, foi só para prestar esclarecimentos. Não Saga, não precisa vir. Saga, não, você não está em condições... Saga, olha, escuta, eu já arranjei um advogado e vai ficar tudo bem.

Kanon seguia brigando com o seu irmão no telefone enquanto ele se lembrou do seu irmão. Resolveu olhar o aplicativo de mensagens para ver se tinha algo.

"Maninho [19:57]: tá td bem?

Você [20:32]: tá td bem sim, a gente só teve q vir pro diretório

Maninho [20:34]: pq?

Você [20:34]: só pra prestar esclarecimentos.

Você [20:34]: Conheço um pessoal aqui, consigo sair dessas

Você [20:34]: Acho que às 22h eu tô em casa.

Maninho [20:37]: ok, vou preparar algo leve pra quando vc chegar"

Aiolos deu um leve sorriso. Seu irmão era muito dedicado com aqueles que gostavam, e principalmente com ele, Aiolos. Sentia que Olia lhe respeitava como um pai que ele nunca teve. Aiolos entendia que era um referencial para o irmão, mas às vezes, isso podia o sufocar. Sua imagem sempre tinha altos e baixos, indo para extremos. Não que seu irmão lhe cobrasse muito, mas os outros parentes sempre lhe cobraram. Ele era o santo, o aluno exemplar, o irmão dedicado. Mas se cometesse um erro, por mais banal que fosse, seria julgado e massacrado pelos membros da família. Isso era sufocante. Além disso, Aiolia precisava de uma figura para ser seu guia, e ele se colocou nessa tarefa de ser um, mas isso lhe cobrou seu preço. Teve que viver a vida em rédeas curtas.

Isso o afetou na universidade. Quando chegou na graduação, viu jovens sendo jovens, despreocupados, indo para festas, vivendo a vida. Ele não estava acostumado com tanta liberdade e acabou se bloqueando do mundo, ainda vivendo a vida "certinha" que ele vivia com a sua família. Afinal de contas ele já era "pai", mesmo não possuindo idade para tal. Era um pai simbólico, tinha a cabeça de pai. Até as piadas de gente velha ele fazia. Demorou muito tempo para ele entender que não havia mais necessidade de tanta responsabilidade, Aiolia já tinha crescido, ele estava em uma cidade diferente, poderia sair de suas amarras um pouco. E assim o fez, e conseguiu viver um pouquinho, sem tanta crise.

Nem tudo era horrível, pelo menos. Pelo fato de que Aiolia o respeitava como pai, eles quase nunca brigavam. Não tinham aquelas brigas de irmãos intermináveis e cheias de alfinetadas como a que Kanon tinha naquele exato momento.

- Saga quando tira o dia para encher o saco de um, faz da vida dos outros um inferno – resmungou Kanon, desligando o celular.

Uma sensação estranha percorreu o seu corpo quando ouviu o nome "Saga". Ele jurava ter ouvido esse nome em algum lugar. A sensação era muito mais forte do que a de um simples déjà vu. Ele devia conhecer o sujeito em questão, só não sabia de onde.

- Seu irmão tá preocupado com você? – perguntou Aiolos.

- Ele tá é puto, isso sim. Como se eu tivesse culpa do que aconteceu.

Aiolos riu. É, se fosse Aiolia no lugar de Kanon, ele estaria do mesmo jeito.

No diretório, não aconteceu muita coisa mesmo. Parecia que o chefe de polícia não estava muito interessado na ocasião e nem no que tinha ocorrido. Aiolos estranhou um pouco, visto que, devido Kanon ser uma figura polêmica, ele achou que teria mais trabalho. Mas resolveu não reclamar da sua sorte. Ele olhou as redes sociais e viu que a internet estava borbulhando com os vídeos daquele protesto em questão, e deduziu que deve ter sido por isso. A polícia grega não iria querer se meter em mais alguma confusão por violência policial, não é mesmo?

Entraram no carro e não conversaram muito, chegando logo ao local que Kanon havia estacionado a moto, no bairro de Exarchia. Kanon aceitou procurá-lo quando fosse necessário e Aiolos recusou o pagamento, já que ele não tinha feito muita coisa mesmo (e não, ele não era um advogado que extorquia dinheiro das pessoas, como o estereótipo de advogado que as pessoas tinham).

- A gente se vê por aí – disse Kanon, apertando sua mão.

- Não se meta em tanta confusão, Kanon – disse Aiolos.

- Digo o mesmo para você – riu Kanon, que colocou o capacete, dando partida na moto e saindo do estacionamento, deixando-o sozinho.

Chegou em casa, e viu que Aiolia estava o esperando, assistindo alguma série na Netflix, fazendo carinho na cabeça do gato, que dormia do lado dele.

- Fiz uns sanduíches e suco natural. Tá na geladeira.

- Brigado, Olia.

- Como foi?

- Estranhamente calmo. Os policiais não queriam muita conversa. Mas temos um cliente novo.

- Pelo menos isso, né. Aliás, que sortudo, hein? Não é à toa que não morreu ainda.

- Kanon é uma pessoa bem arisca, mas tá indo pelo caminho certo. Só que eu juro que conheço ele de algum lugar.

Olia olhou para ele.

- Você acredita que tenho a mesma sensação? Eu o vejo nas lives e fico pensando "esse cara não me é estranho".

- Bizarro né? Ele falou do irmão dele, e eu tive a mesma sensação.

- Estranho demais – sorriu Aiolia – vai ver é porque Atenas é um ovo.

- Ou nos conhecemos em outras vidas – sorriu Aiolos de volta, pensando nas coincidências da vida. Se ele não tivesse na hora certa e no lugar certo, o que aconteceria?

Só Deus sabe.

(1) Em 2008, ocorreu uma forte crise na Grécia, devido a uma enorme dívida pública que o país tinha com a União Europeia. Para isso, a Grécia teve que aderir a diversos pacotes de austeridade (ou seja, teve que apertar os cintos) para conseguir se manter na Zona do Euro. Isso deixou a população revoltada, pois diversas políticas públicas foram afetadas e prejudicaram a população. Para piorar, a polícia grega foi extremamente violenta, inclusive matando Aléxandros Grigorópulos, um estudante de 15 anos, no meio das manifestações. Isso gerou um escândalo enorme e teve muito debate sobre violência policial em manifestações na Grécia desde então. Além disso, houve denúncias de alguns manifestantes de que teriam sido torturados pela polícia grega, para revelar informações sobre suas organizações.

(2) Aqui eu tive que inventar um nome para a tal organização, por questões de segurança. Mas existem muitas dessas organizações espalhadas pelo mundo, viu. Inclusive lá. E aqui.