Capítulo 7
Durante a semana, Nemo apareceu todos os dias na cela com a bandeja de comida e um pequeno chocolate, o que ela mais gostava. Francesco sumiu nesse período, não tinha mais tanta vontade de machucar a irmã. Às vezes tinha mas, era tão bom e tão novo o que vivia a noite que apenas não queria esquecer com outra memória. Por mais que não se arrependesse de tudo o que tinha feito, não queria repetir. Petrus bateu e entrou na sala do Pontífice.
- Santidade.
- Fale.
O padre olhou para os lados, confirmando que não tinha ninguém e se aproximou para perguntar:
- Não tem mais volta, não é?
Francesco olhou bem para ele e balançou a cabeça negativamente. Não tinha mais o que fazer. Disse:
- Minha única saída é ser melhor do que sou.
E se levantou, disposto a fazer Catherina gostar dele tanto quanto gostava de Nemo. Foi para a masmorra, para a cela dela. Entrou, fechou a porta e puxou a cadeira, sentando-se.
- Sentiu minha falta?
Durante a semana viveu tempos tão calmos que conseguia até esquecer o medo e a aflição que era viver dentro daquelas quatro paredes. Estava apaixonada e isso a movia a continuar dia após dia. Até o momento que acabou. Catherina estava rezando com a bíblia aberta em suas mãos quando escutou a porta se abrir e o som dos coturnos era nitidamente reconhecível. Não se levantou de onde estava, de costas para a entrada, ao que escutava aquelas palavras que só poderiam ser irônicas.
- Por que sentiria, meu irmão? A que devo a visita do Sumo Pontífice ao meu fim de mundo?
- Nada demais. Talvez tenha sentido sua falta - falou como se não fosse casual, olhando ela ali de costas enquanto balançava um talher sujo nos dedos. - Ouvi dizer que tem gemido alto todas as noites. É tão bom assim mesmo?
- Você realmente precisa ser tão baixo?
Perguntou confrontando-o, muito mais pelo simples confronto do que por desejar uma resposta. Como ele já havia bagunçado a sua paz de qualquer jeito, se levantou do chão e foi para perto da mesa, se mantendo a uma distância segura e em pé.
- Você sempre quer alguma coisa.
Puxou até que com cuidado a irmã pelo vestido para o meio das pernas e encostou a cabeça nos peitos dela, as mãos por baixo da saia, acariciava a parte de trás das suas pernas. Na realidade queria alguma coisa, mas não sabia como conseguir.
Catherina deixou-se puxar e, envolvida daquele jeito, quase sentiu pena do irmão. Suspirou cansada e levou as duas mãos para as costas dele, subindo para nuca em um leve abraço.
- Eu já te amei, sabia? Quando eu soube que tinha um irmão mais velho, eu te amei, e não importava o quão mal você me tratasse, eu nunca te machucaria. E estamos aqui hoje - queria deixar claro que as circunstâncias haviam mudado por obra dele. - Você sabe que eu não participei do assassinato de Alessandro. Você é o único que pode me tirar daqui.
O corpo estremeceu com o toque, dessa vez era Francesco mesmo e ela estava o abraçando. Ouviu tudo e congelou no "eu já te amei", não esperava ouvir aquilo e mesmo sabendo que foi em um passado, já era válido para ele. Esfregou o rosto ali e foi subindo as mãos por baixo do vestido, passou por suas pernas até as costas, segurando-a firme.
- Eu sei que não participou.
Ela detestava aquele toque, mas aprendera a não reagir, então só deixou enquanto ele subia com as mãos por sua pele. Não ficava nem um pouco surpresa com a revelação, estava até já esperando por isso. No entanto, havia uma questão central ali.
- Então por que me prendeu?
Em momento algum o soltava. Se isto o fazia falar, quando ela o acalentava como a uma criança, continuaria a utilizar em seu favor.
- Porque eu quis.
Não respondia nada completo e aproveitava os toques da irmã até com os olhos fechados, abraçando-a pela cintura, trazendo mais para perto.
Aquilo não era uma resposta, então ela tentaria mais uma vez, agora com outra abordagem.
- Por que não me deixa ir?
- Porque quero você assim.
Acabava falando demais mas, não se importava tanto. Era a verdade e se queria conquistar ou confundir a irmã, seria necessário falar mais do que Nemo.
- Por que?
Ela tinha que controlar os impulsos de bater nele, pois realmente era uma vontade que crescia com aquela conversa. Além disso, "quero você assim" precisava se especificações do que era "assim": presa? sem os títulos? fora do Vaticano? ou sem roupas? Estava tudo muito ambíguo.
- Porque isso é bom.
Ele respondeu deixando claro que falava do momento e da forma como era abraçado. Sabia que ela só estava com as mãos encostadas nele, sabia bem o que era um abraço dela mas, pra ele estava bom por enquanto.
Catherina suspirou, era como falar com uma parede (uma parede muito teimosa por sinal), então apenas continuou daquela forma, não se moveu ou fugiu, pois ao menos ele não a estava ferindo ou abusando, então já era um ganho.
Levantou-se bem na frente da irmã, com os corpos colados e as mãos nas costas dela, olhando-a de cima enquanto falava:
- Não quero mais te machucar.
Quando ele levantou, Catherina apenas deixou as mãos deslizarem e irem para os ombros dele, de alguma forma isso tinha efeito. O olhava de forma direta e sem fugir, ao que tentou mais uma vez:
- Me deixe ir.
Sentiu as mãos deslizando por seu peito e chegou a desviar o olhar dela mas, logo voltou. Balançou a cabeça negativamente.
- Você é minha.
- Não - a voz dela era muito calma, mas também era muito firme. - Você pode ter o poder para me manter aqui para sempre, pode se divertir me torturando da forma que bem entender, mas você não manda em mim.
Ela entendera a frase como sendo sobre posse em sentido amplo, logo não se passava pela cabeça dizer que não poderia ser dele se o seu coração já estava ocupado por outra pessoa.
Deslizou uma mão lentamente por suas costas até seus cabelos, afundando os dedos ali com certo cuidado. Nunca tão cuidadoso como Nemo, mas apresentava o normal de Francesco.
- Você fala muito. Mas gosto da sua voz.
Era realmente inútil falar com ele, então apenas ficou ali, em silêncio, sentindo o arrepio que lhe percorria a nuca quando ele afundava os dedos entre os seus cabelos.
Passou a mão repentinamente por cima da mesa e empurrou todas as coisas para o chão, pegando a irmã pela cintura e colocando sentada na superfície. Entre suas pernas e com a mão presa nos seus cabelos sem apertar tanto, perguntou bem próximo dos lábios dela. Alternava o olhar entre os olhos e os lábios dela.
- O que ele faz?
O movimento brusco a pegou de surpresa, ao que logo estava mais uma vez em situação vulnerável. E aquele era Francesco, o irmão que vira nos últimos dias, agressivo, possessivo e... Ciumento? Ergueu uma sobrancelha e perguntou.
- Do que está falando? - Catherina entrava no jogo para jogar.
- Por que gosta tanto dele? O que ele faz? - Se aproximou do ouvido dela, falando bem baixo. - Sei que falar, ele não fala - deu uma risadinha baixa, safada. Continuou perguntando. - Ele beija seu pescoço assim?
E deslizou os lábios do ouvido para o pescoço, beijando, lambendo e chupando lentamente, provocando.
Não responderia aquela pergunta, não entraria em sua intimidade com Nemo, se preservaria esse mínimo, embora logo o irmão fizesse a piada baixa que lhe dava vontade de voar nele.
- Ora…
Mas nem dava tempo de responder, pois logo ele ia para o seu pescoço e fazia todos os pêlos de sua nuca arrepiarem. Tentava se afastar, aquilo não deveria acontecer.
- Pare, Francesco!
Não deixava ela se distanciar e descia os beijos por seu corpo, por cima do vestido até sentar na cadeira, entre as pernas dela.
- Será que ele já fez isso com você? - Então abria suas pernas, levantando o vestido dela. Sorriu de canto. - Por isso se apaixonou?
Ela lutou para se afastar, empurrou, chegou para trás sobre a mesa. Queria fugir, queria correr, não queria entregar o seu corpo para irmão nem mais uma única vez, pois havia agora uma pessoa em seu coração, uma única pessoa com quem gostaria de passar todas as noites pelo resto de sua vida.
Então Francesco parou quando viu todo o desespero da irmã. Ela era fiel e não esperava isso, não na situação que estava. Arrumou seu vestido e a puxou para perto outra vez, agora ele em pé entre as pernas dela e ficou em silêncio, olhando como se reprovasse a atitude mas, sem bater.
Catherina ainda estava ofegante quando ele se levantou, esperando que fosse acertá-la com a maior violência possível, mas nada veio e ela não confiava que não viria. Com um braço na frente do corpo já de forma defensiva, disse encarando-o:
- Acabou. Não vou facilitar pra você - se ele quisesse qualquer coisa, teria que obrigá-la.
Pegou o braço dela e abaixou lentamente. Depois a tocou no rosto, fazendo um breve carinho com o polegar, enquanto a olhava:
- Não vou fazer nada forçado.
Ficou imóvel enquanto ele a tocava, não reagindo de forma alguma exceto olhando para ele. Claro que não acreditava em nenhuma daquelas palavras, achava que só duraria até a próxima lua ou seja tá como funcionava a bipolaridade do irmão.
- Está perdendo seu tempo aqui.
Só então se moveu, se levantando da mesa para pegar a bíblia sobre a cama, se ajoelhar mais uma vez no chão e tornar a rezar.
Deixou ela se afastar e assistiu o que iria fazer. Quando viu a bíblia e a irmã se ajoelhar, apenas respirou fundo, se controlando. Andou até Catherina, parando atrás dela, se abaixou e deu um beijo demorado no seu rosto. Afastou-se e saiu da cela sem dizer mais nada.
Escutando os passos, realmente achou que o golpe viria dali, mas foi um beijo. Ela ainda tremia quando a porta fechou, soltando o ar com força e chorando. Precisava que Nemo viesse logo para cuidar de suas feridas emocionais.
Do lado de fora, Petrus esperava chegarem na sala do Papa para perguntar:
- Sucesso?
- Nenhum.
Estava completamente dividido. Parte estava feliz por ela não ter traído e a outra parte estava triste por não ter conseguido nada. Aquilo era mais complicado do que esperava. Ordenou:
- Hoje o mudinho não vai visitá-la. Leve o jantar para ela.
Petrus pensou em perguntar se tinha certeza, mas desistiu, a intimidade um tinha limite bem claro: quando Francesco não extravasava a tensão com alguma mulher, fosse comendo ou fosse batendo, sobrava para quem estivesse mais perto. Sendo assim, de noite, foi o Padre quem levou a comida, colocando sobre a mesa e encontrando Catherina ainda rezando.
- Seu jantar - ele falou.
A Duquesa se virou na mesma hora, achando estranho depois da semana anterior.
- Onde está Nemo?
O coração dela apertava, se perguntava se Francesco o havia matado. Petrus conseguia notar isso em sua voz.
- Ele está bem, apenas foi destacado para outro serviço essa noite. Coma.
Também não seria excessivamente simpático, mas devia a ela por salvar Paula. Assim, deixou-a sozinha na cela mais uma vez.
Pouco tempo depois, chegava mais um jantar, que era colocado na mesa junto ao dela. Não demorou e quem passava a porta era Francesco.
- Seu mudo não vem hoje - então se arrumava na mesa para jantar.
Mal havia levantado do chão para ir comer quando viu o segundo prato de comida e não entendeu nada até ver o irmão entrar.
- Mais essa agora? - Perguntou indignada.
Estava já com planos de passar a noite abraçada e dormir aquecida pelo corpo do seu homem, planos que pelo visto foram adiados. Ainda assim, com toda a sua majestade, sentou-se na mesa diante do irmão e começou a comer com seus modos impecáveis.
- Pode tentar o quanto quiser nos afastar, não vai conseguir.
Francesco comia sem tantos modos, como se estivesse com seus soldados da Inquisição. Balançou a cabeça como se não estivesse entendendo o que ela falava.
- Foi ele quem pediu para trocar o turno com Petrus. Se não me importei em tirar ele em uma semana, porque faria hoje?
Estreitou o olhar, com clara reprovação à forma como o irmão comia com ela.
- Pelo mesmo motivo que se preocupou de vir comer aqui comigo - o famoso "porque quis" que ele tanto usava.
- Achei que ficaria feliz em ter companhia, já que não vai ter um macho para te domar essa noite - continuou comendo sem se importar com os olhares de reprovação.
- Desde quando se importa com o que me faz feliz ou não?
Aquela conversa estava tendo um rumo surreal, era quase como se estivessem novamente no salão de jantar dos cardeais.
- Deve fazer alguns dias. Talvez desde o dia do cavalo - respondeu assim fácil, ainda comendo sem nem levantar os olhos para ela.
- Havia um cavalo - ela falou indignada, mas bem lentamente, pois era difícil até para ela própria acreditar que ele trouxe um cavalo até a prisão e que pretendia usar para estuprá-la. - Você não tem conserto, meu irmão.
- Talvez eu tenha jeito - comentou já terminando o jantar, limpava a boca enquanto falava como se não quisesse que ela visse ou como se não fosse nada. - O jeito chama Catherina e tem olhos lindos.
Por um instante até se surpreendeu com o comentário do irmão, admitindo que ele era ao menos em parte o que ela estava falando. No entanto, escutou a segunda parte, o que a fez revirar os olhos.
- O que quer alcançar com elogios, meu irmão? - Realmente não entendia que ele estava falando no sentido romântico.
Ela não entendia e ele dava risada, julgando a capacidade da irmã.
- Vamos, não é tão difícil assim entender, minha irmã - os olhos voltavam para os dela enquanto assistia comer. - Estou sendo sincero. Aproveite, não é sempre.
Catherina pousou os talheres na mesa, desistindo de continuar a comer, ao que se afastava um pouco e se recostava na cadeira com os braços cruzados. Sua expressão deixava claro estar ofendida com "ser chamada de burra", mas que ao mesmo tempo não conseguia entender de forma alguma onde ele queria chegar.
Desistindo de tentar fazer a irmã entender, se levantou e foi até as costas dela. Tocou seus cabelos e seu rosto, abaixando bem próximo ao seu ouvido para sussurrar:
- Descobri que gosto de você. Gosto como mulher - e tombou a cabeça dela para o lado, tocando seu pescoço com a outra mão enquanto beijava seu rosto para falar. - Por isso não quero mais te machucar.
O toque era suave, a fazia arrepiar, mas ainda assim a deixava em estado de alerta para quando viria uma agressão. Foi quando escutou aquelas palavras e eram pior do que qualquer ferida física.
- Francesco! - Reclamou indignada, mas ficando com o rosto muito vermelho.
Era absurdo, claro que era absurdo, eles eram irmãos, mas ainda assim era lisonjeiro. O toque em seu pescoço, o beijo, tratou de se levantar e se afastar, ficando de frente para o irmão.
- Está louco!
Uma coisa era satisfazer a luxúria e a dominação, outra coisa era sentimento, aquilo era hediondo.
Ele balançou a cabeça negativamente com aquelas palavras, teria muito trabalho pela frente.
- Talvez.
Continuou em pé, ali no meio da cela enquanto a olhava sem muito mais o que falar, deixando claro que era verdade.
Então a raiva de Catherina ia aos poucos sumindo, ia vendo que ele estava mesmo falando sério. Teria que mudar a abordagem se desejava ter alguma vantagem no terreno. Falou já mais calma:
- E como acha que lhe será útil me manter aqui presa?
- Tenho você a hora que quiser.
Falava com a maior naturalidade do mundo, como se aquilo fosse normal. Sentou-se na cama dela encostado na parede, olhando sem saber muito bem o que fazer. Nunca chegou nessa parte com alguma mulher.
Sem muitas opções, Catherina se sentou ao lado dele, com pouco mais de um palmo de distância entre os dois, ao que realizava o mesmo gesto de encostar a cabeça na parede. Estava cansada.
- Você sabe que este é o máximo que vai ter nessas circunstâncias, certo? Ou em qualquer circunstância. Você é meu irmão.
- Já fizemos muito mais do que dois irmãos fazem.
E se lembrava da última vez, do quanto foi bom. Queria repetir mas não queria obrigar, ela estava tão envolvida com Nemo que nem ele, que era o Nemo, sabia como resolver.
- Você fez - não considerava a própria participação, visto que nada fora voluntário. - Não há nada que eu possa fazer, certo? Vou morar aqui pelo resto da minha vida.
- Mas a ultima vez você gostou bastante - nem assim conseguia deixar de provocar. Não sabia muito bem como agir nesse momento, definitivamente era muito mais fácil com a máscara. - Talvez. Ou não. Ainda não decidi.
Lançou para ele um olhar de profunda reprovação, claramente irritada com a provocação que lhe era feita. No entanto, ele logo falava que havia chances de sair dali, o que lhe fazia questionar.
- E qual seria o preço?
Francesco moveu-se rápido na cama e a deitou prendendo-a com o corpo. Olhava de cima como se fosse sua propriedade mas, definitivamente tinha algo a mais ali. Ficou em silêncio por um tempo, olhando, e então se levantou. Não iria forçar a nada.
- Vai saber na hora certa.
Foi surpreendida com o movimento, observando-o tão de perto. Aquilo só provava o quanto ele não poderia ser totalmente confiável. Ela definitivamente entendeu o preço, não estava totalmente disposta a pagar. Ainda levou alguns segundos para levantar e se sentar ali novamente, ficando um silêncio constrangedor no ambiente.
Aproximar-se tanto assim dela o deixava transtornado, ainda não sabia lidar sem a máscara. Saiu da cela sem dizer nada, era muito difícil simplesmente não poder pegar o que queria.
Catherina permaneceu ali sozinha, muito confusa. Deitou-se na cama, a bíblia em seu peito, a vontade era chorar. Por que Deus estava fazendo isso com ela?
Nemo não apareceu. Francesco estava confuso demais para conseguir não deixar transparecer qualquer coisa. Tanto o Papa como o soldado não a visitaram por dias, até Francesco conseguir alinhar novamente o pouco que lhe restava de sanidade mental, o que foi muito difícil. Não se lembrava de duas coisas: Ser rejeitado e não conseguir o que queria. Catherina, mesmo na pior das situações, ainda conseguia fazer isso com ele. Quase uma semana se passou e então Francesco passava a porta da cela sem nem dizer nada, só queria estar ali.
Ficar sozinha por tanto tempo deixava Catherina nervosa e ansiosa de duas formas diferentes: fosse pela loucura que era estar numa solitária, fosse pela preocupação com a vida de Nemo. Isso gerava consequências físicas, pois parava de comer. Então quase ficou feliz quando escutou a porta abrir, porém lá estava Francesco. Ela estava deitada na cama, com a bíblia em seu peito, abraçada. Não se levantou.
Se aproximou da irmã e a empurrou para o lado, se deitando na cama junto com ela, sem dizer absolutamente nada, já que nem tinha o que falar. Se virou e a abraçou junto com a bíblia, era estranho até para oferecer qualquer tipo de carinho.
Ele era realmente esquisito, mas se deixaria ser abraçada, ao menos ele não estava sendo violento. Fechou os olhos, o irmão usava um perfume bom, ou seria loção pós-barba? Gostava daquele cheiro, não havia notado das outras vezes. De onde conhecia aquele cheiro?
Francesco já estava sentindo falta de dormir com a irmã, ainda que fosse no chão de uma cela fria, ficava bem confortável com o lugar e com ela. Procurava coisas que Nemo ainda não tinha feito para fazer com ela, então se arrumou com parte do corpo por cima do dela, apoiou a cabeça no braço e tocou a ponta dos dedos por seu rosto, acompanhando as linhas enquanto a olhava.
- Não sei o que você fez comigo.
O toque a arrepiava e seria muito gostoso se não houvesse aquela resistência em seu interior, se o seu coração não tivesse um dono. Respondeu muito calma:
- Você se atrai pelo poder, deseja tudo o que não pode ter - falando assim, até ela achava coerente o fim que levaram.
Catherina não estava errada mas, era diferente com ela. Não era só por isso, tinha algo a mais. Deslizava o polegar por seu rosto e então afastava os cabelos.
- Ele não tem nada para oferecer.
- Ele me deu amor - respondeu de forma direta, olhando bem nos olhos do irmão. - Me deu amor quando todo mundo me abandonou, inclusive você.
Era complicado ouvir isso, já que era ele mesmo. Mal sabia o que tinha feito para conseguir o amor da irmã como Nemo.
- Eu estou aqui agora, ele não.
- Ele está - colocou a mão sobre o próprio peito, indicando que Nemo morava em seu coração. - Você pode ocupar minha cela, minha cama, mas não o meu coração.
O problema mental era tão grande que conseguia sentir ciúmes dele mesmo. Ficou um tempo em silêncio, olhando-a nos olhos até falar o que queria.
- Quero que se case comigo.
Catherina não teve reação imediata. Não riu, não falou nada, não expressou. Achou que havia escutado errado. Deu um tempo e então disse:
- Que?
- Você disse que faria o que eu quisesse - falava com a maior calma e naturalidade do mundo, como se não fosse nada. - Quero que se case comigo.
Agora Catherina se sentou na cama de imediato, olhando bem pra ele, incrédula que pudesse estar falando sério.
- Você não pode querer isso, somos irmãos! Além disso, deve haver uma fila de mulheres loucas por você!
Olhava toda a forma como ela reagia e definitivamente achava que seria pior. Continuou deitado, olhando para ela.
- Nunca fomos irmãos de verdade. O sentimento que tenho por você é outro. E não me importo com outras mulheres.
- Típico.
Conseguia notar o irmão em todas aquelas palavras, sempre ambicioso pela presa mais difícil, além de que era verdade que nunca se viram como irmãos. Deitou-se de novo, agora virada para cima, apertando mais uma vez a bíblia.
- Quando? - Fizera uma promessa, sabia que teria que cumprir.
- Em dois dias, na capela. Petrus vai nos casar de madrugada - falava tão baixo, como se fosse uma declaração de amor. E talvez fosse mas, só na cabeça dele.
Ela engoliu em seco. Não havia escapatória. Cinco dias para a sua sentença. Havia só uma coisa em sua mente:
- Posso fazer apenas um pedido?
Estar deitado na cama dela com tudo aparentemente calmo o fazia esquecer que podia falar, então apenas balançou a cabeça enquanto olhava, já imaginando o que pediria.
- Eu quero poder ver Nemo.
Sabia que era um pedido arriscado, até absurdo, e que havia boas chances do irmão mandar assassinar o seu guarda, mas tinha que tentar.
- Quero me despedir.
Exatamente por essas considerações, queria poder se despedir de seu amado, para proteger a vida dele e, depois do casamento, ser fiel ao compromisso com o seu marido.
- Eu não preciso aceitar isso - respondeu enquanto tocava a ponta dos seus cabelos com seus dedos, enrolando os fios ali. - Mas, vou autorizar. Será meu presente de casamento - então se levantou, arrumando as roupas brancas. - Vou mandar trazer seu mudo.
Por instantes achou que ele iria negar, porém, tendo uma resposta positiva, o seu coração ficou mais leve. Quando ele se levantou, ela se sentou na cama, já esperando ansiosa. Disse ao irmão antes que ele saísse:
- Obrigada - pois sabia que Francesco não resistia a uma humilhação, então daria a ele essa vitória também.
Sorriu de canto com o agradecimento. Agradecer depois de tudo, por qualquer coisa, certamente não era fácil e gostava quando ela se sujeitava a esse tipo de coisa. Franceso saiu e Nemo demorou quase uma hora para aparecer. O soldado entrava empolgado, mostrando o chocolate que ela gostava. Nem deixou Catherina se levantar, ele mesmo foi imediatamente para a cama já levantando a máscara e se deitou por cima dela, dando vários beijos por seu rosto
Não esperava que ele fosse vir tão rápido, mas o recebeu de braços abertos e com beijos carinhosos cheios de saudades. Poderia se perder naquele momento, pois só queria amá-lo para sempre.
Abraçava, beijava, esfregava o rosto no dela como se tentasse demonstrar de todas as formas o quanto estava com saudade. Queria muito sentir todo aquele amor, mas sem a máscara e ela sabendo quem era. Afastou-se um pouco para olhá-la e passou a mão por seus cabelos, todo apaixonado.
Catherina não aguentou o pequeno distanciamento, ao que mais uma vez avançava, beijando-o em uma louca paixão. Queria que estivesse com ela a todo momento, não se separassem nunca, mas precisava parar. Se distanciou, mas ainda o segurava na nuca.
- Nunca esqueça que te amo.
Retribuía aos beijos com todo o carinho característico dessa personalidade de Francesco. Assim que ouviu, procurou a bíblia rápido para poder responder mas, não encontrou, então pegou a mão dela e colocou no peito, onde fica o coração e a olhou nos olhos. Era como conseguia expressar que também a amava.
Com a mão sobre o peito dele vieram as lágrimas, ao que encostou o rosto ali, sobre o coração, depositando um beijo.
- Eu terei que me casar com Francesco, mas quero que saiba que te amo.
Aquilo doeu até nele, sendo que ela iria casar com ele mesmo. Já estava em conflito com suas personalidades. Ficou um tempo olhando sério, como se não tivesse entendido e tocou nos cabelos dela, abaixando para beijar os fios, claramente chateado com a notícia.
Quanto mais ele era gentil, mais ela chorava, pois mais doía ter que falar essas coisas.
- Não podemos mais nos ver - disse com a voz triste e terminava quase sem conseguir falar: - Nunca mais.
Procurou a bíblia com mais cuidado e encontrou, abriu e foi formando "Foge comigo" outra vez, era quase um teste para a irmã.
Catherina fechou os olhos após ler a frase, pesadas lágrimas caindo pela sua face até o peito. Disse pausadamente, morrendo por dentro.
- Eu não posso. Eu sou fiel a minha Igreja - dever vinha acima de tudo, inclusive da felicidade.
Então não tinha mais o que ser perguntado. Fechou o livro, colocou ao lado e deitou-se na cama, abriu os braços como fez por todas as noites e esperou ela se deitar. Pela primeira vez se sentia culpado de fazer algo, mas iria até o fim.
Catherina não se sentia tão mal desde a morte de Alessandro, pois era como se ela própria estivesse morrendo. Deitou-se e, sem dizer uma única palavra, passou o resto da noite sentindo o coração dele com a mão sobre o peito, a respiração. Não dormiu, pois desejava guardar aquele momento para sempre.
Ele também não dormiu e passou a noite abraçado com ela, com os dedos inquietos por seus cabelos e a mão que deslizava por suas costas, os braços e o rosto sem tirar os olhos. A porta abria, provavelmente já era manhã e sem ninguém entrar, fechava. Era o aviso, era hora de ir embora. Se virou na cama, por cima dela, tocou seus lábios com as pontas dos dedos e deslizou por seu rosto, acariciando com a mão cheia enquanto abaixava por cima dela e dava um beijo lento, calmo, cheio de amor mas que era uma clara despedida.
Imaginava o que a mudança significava e recebeu o beijo com novas lágrimas nos olhos. Retribuiu com todo o seu amor e lutou para sorrir, levando as duas mãos para a nuca dele como se assim pudesse segurá-lo para sempre.
Afastou-se mesmo sem querer e puxou a mão dela novamente, tocando seu peito da mesma forma para dizer que a amava e se levantou, arrumando a máscara já indo para a porta. Antes de sair, fez o mesmo gesto só que com a mão dele e saiu, fechando a passagem.
No corredor, Petrus andava ao lado do chefe enquanto este arrancava a máscara.
- Acabou. Você vai nos casar em dois dias, na capela.
- O que Vossa Santidade fez? - Perguntou Petrus sem entender nada.
- Pedi Catherina em casamento.
Sozinha em sua cela, Catherina chorou sem parar, gritando toda a dor que sentia em seu peito como se estivesse morrendo, pois, de certa forma, ela estava.
Petrus, por sua vez, não acreditava no que havia acabado de escutar.
- Como? - Era a única pergunta que conseguia formular. - E eu não posso casá-los, sabe disso.
- Eu a obriguei. E isso é uma ordem, é o único que sabe, só você pode fazer isso - dizia já trocando de roupa mais rápido, preocupado que alguém pudesse ver, já que tinham passado do horário normal.
Tudo naquela fala fazia sentido, embora Petrus não concordasse com nada. Era também ele obrigado a aceitar as ordens.
- Dois dias - confirmou.
- Libere Paula para a cela de Catherina. Devo aparecer só amanhã.
Já pronto, se afastou sem dizer mais nada e foi para a sua sala, não iria dormir, não conseguia. A estranha sensação de despedida não o deixava em paz, como se não conseguisse entender que era ele ali o tempo todo. Trabalhou pelo resto do dia, mesmo que assombrado por aquela lembrança. Só precisava dormir e esquecer.
