Finalmente, depois de várias noites com medo e desespero, Audrey Morgan conseguiu dormir. Ela tomou o remédio receitado por John Watson e foi para a cama por volta das dez da noite.

Quando acordou no dia seguinte, faltando cinco minutos para as seis da manhã, quase não acreditou. Não foi apenas uma noite relaxante, foi um sono profundo sem pesadelos.

Ansiosa em começar a semana e manter seu emprego de babá, ela rapidamente levantou, arrumou a cama, desceu para o banheiro onde lavou o rosto e escovou os dentes antes de voltar para o quarto e trocar de roupa.

Estava se preparando para descer e tomar o café da manhã quando ouviu as vozes de John e Rosie no piso principal do apartamento. Audrey desceu para averiguar o que acontecia e encontrou Sherlock Holmes, ainda de pijama com um roupão azul, brincando com a afilhada.

— Bom dia, — cumprimentou ela. — Aconteceu alguma coisa? Eu já estava indo para a sua casa, John...

— A Rosie acordou cedo hoje, então achei melhor trazer ela até aqui.

Audrey abaixou a cabeça, estava com medo que os últimos acontecimentos tivessem colocado certo receio sobre sua capacidade de cuidar da pequena. John percebeu.

— Eu já disse que confio em você — o amigo se aproximou dela e levantou sua cabeça delicadamente com o indicador esquerdo sob o queixo dela. — A Rosie realmente acordou cedo e animada e eu quis te economizar a viagem.

— Escolha interessante de palavras já que eu gastei tudo o que tinha... — a babá comprimiu um lábio contra o outro. — Nem tinha pensado em como faria para chegar lá.

— Se quiser eu posso...

Audrey o interrompeu.

— Me pagar no final do dia que é quando termina o meu expediente — a mulher sorriu.

— Por falar em expediente, preciso ir senão eu chego atrasado — disse o pai enquanto sorria. — Até mais tarde, florzinha — ele pegou a filha no colo e beijou sua bochecha.

— Papai vai bora?

— Preciso ir trabalhar...

— E a gente vai para o parquinho com o padrinho — Audrey se aproximou dela sorrindo ignorando a expressão de Sherlock que não havia sido consultado previamente se queria sair de casa. — Daqui a pouco o papai está de volta! — Ela esticou os braços na direção de Rosie que passou para o seu colo.

— Até mais tarde — John sorriu e saiu rápido do apartamento sem dar tempo para a pequena pensar muito no assunto.

— Agora, enquanto o padrinho vai trocar de roupa, nós vamos comer alguma coisa — Audrey seguiu em direção à cozinha. — Por favor, não demore Sherlock. Quero aproveitar enquanto o sol ainda não está muito quente.

— Não demola — reafirmou a menina.

Sherlock não teve escolha a não ser sorrir e seguir as instruções das duas. Foi uma manhã divertida que se repetiu no dia seguinte, com John mais uma vez trazendo a filha para a Rua Baker ao invés de esperar por Audrey em sua casa.

Na quarta-feira, porém, sem pacientes na parte da manhã, o médico dispensou a babá do serviço e ela aproveitou que o sedativo ainda estava sendo eficaz para ficar na cama até um pouco mais tarde.

Seu plano era dormir até pelo menos dez horas da manhã, mas pouco depois das nove uma dor a acordou. Algo que nunca havia sentido antes, não que se lembrasse.

Começava na parte mais baixa do seu abdômen e se irradiava para suas pernas. Audrey começou a suar frio e encolheu o corpo abraçando os joelhos. Tentou se lembrar de tudo o que comera no dia anterior para saber se alguma coisa poderia ter causado aquilo, mas nada de diferente vinha à sua mente.

Com um pouco de dificuldade acabou pegando no sono quando a dor, que começava intensa e momentos depois diminuía, finalmente deu uma trégua.

A mulher acordou assustada com o que havia acontecido, mas seguiu sua rotina normalmente já que os sintomas tinham desaparecido por completo. Ou pelo menos foi o que ela pensou. Uma nova pontada de dor apareceu quando Audrey estava na cozinha bebendo o chá que tinha acabado de preparar.

Havia procurado entre as opções no armário algo que fosse útil para problemas estomacais depois de achar a informação na internet. Então a volta da dor acompanhada de uma contração estranha e a sensação que precisava ir ao banheiro a surpreendeu fazendo Audrey abandonar o chá pela metade e correr ignorando a expressão preocupada que Sherlock lhe lançou da sala.

Ao contrário do que esperava, atender suas necessidades fisiológicas não surtiu muito efeito. A dor continuava e quando ela estava se limpando, o papel higiênico sujo de sangue acrescentou outro sintoma ao seu quadro. Em choque ela recorreu mais uma vez à internet.

Abriu o Google no celular e digitou dor abdominal, dor nas pernas, sangramento e em meio a várias doenças graves com outros sintomas que ela não tinha, um resultado chamou sua atenção. Cólicas menstruais.

Pesquisou especificamente sobre o assunto e descobriu informações a respeito do período menstrual, como lidar com aquilo e constatou que era um acontecimento comum geralmente desde os 12 anos. Algo com o qual ela deveria estar habituada não fosse sua falta de memória.

Ainda assim Audrey precisava de ajuda. Duvidou que Sherlock soubesse o que fazer a respeito, e não se sentiu muito à vontade para falar com ele. John certamente saberia bem mais do que ele, mas preferiu pedir ajuda a alguém que provavelmente já passara pela mesma situação e se colocara à sua disposição sempre que precisasse.

— Molls, eu preciso da sua ajuda — ela sussurrou ao telefone ainda dentro do banheiro.

— O que está acontecendo, Audrey?

— Eu estou sangrando.

— Você está ferida? — A voz de Molly deixou transparecer a aflição do outro lado da linha.

— Não... eh... eu pesquisei na internet e aparentemente é comum esse tipo de coisa acontecer com quem tem útero, se é que me entende.

— Oh — o sorriso da amiga era de compreensão e tranquilidade. — Entendi.

— Não tem como eu ir à rua comprar absorvente e não estou a fim de pedir pro Sherlock. Acho que ele vai ficar tão confuso quanto eu.

— Tudo bem, tudo bem — respondeu Molly. — Olha, não demora muito para meu horário de almoço. Em meia hora no máximo chego aí. Você acha que consegue esperar? Senão vou agora.

— Sim, consigo. Dei um jeito com um pouco de papel higiênico — dessa vez foi Audrey quem riu da situação.

Do outro lado da linha, a amiga também ria.

— Molly, mais uma coisa. O que eu tomo pra parar com essa dor?

— Vou levar um remédio para você também.

A mulher suspirou aliviada.

— Obrigada.

— Não precisa agradecer — disse Molly. — A gente se encontra daqui a pouco.

Audrey sorriu enquanto desligava o celular antes de deixá-lo sobre o armário de toalhas para poder checar se havia sujado a roupa ou alguma outra coisa. Depois se preparou psicologicamente para sair do banheiro.

— Audrey, você está bem? — Perguntou o detetive de pé na cozinha.

— Sim, Sherlock — ela sabia que estava correndo risco de ele perceber a falsidade do seu sorriso. — Onde está meu chá?

— No mesmo lugar onde você deixou antes de entrar correndo no banheiro.

— Então já deve estar frio... — ela se aproximou para checar. — Que pena...

A mulher jogou o resto da bebida na pia e lavou a xícara.

— Vai me contar o que está acontecendo ou terei que descobrir por minha conta?

— Não tem nada para descobrir, Sherlock — a mulher precisou se conter para não deixar transparecer a pontada de dor que sentiu.

— Estando na posição de seu irmão mais velho...

— Eu já falei com a Molly, — Audrey o interrompeu. — E não tem nada com que você precise se preocupar. Ela vai chegar daqui a pouco.

— Então acho que você não vai precisar da ajuda do John... — afirmou o detetive.

— Ah, Sherlock... você não fez isso.

— Ele também está vindo.

Audrey sentiu as bochechas arderem enquanto ria da situação sentindo-se como se fosse uma adolescente. Mais um inconveniente da sua falta de memória na vida dos amigos. A mulher ficou com pena de Sherlock ao perceber seu olhar sincero de preocupação.


Nota da autora: Bom, era uma coisa que iria acabar acontecendo já que a Audrey está há tanto tempo com eles. O problema é duas pessoas sem habilidade para lidar com a situação enfrentando algo assim. O que vocês acharam da reação do Sherlock? Eu particularmente acho que, mesmo tendo conhecimento sobre o ciclo menstrual, ele nunca deve ter lidado com a situação de tão perto.